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Em 25 de dez de 2019, à(s) 14:15, Carlos Gonzalez <gonz...@gmail.com> escreveu:
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João Marcos escreveu:
> Rodrigo, a sua resposta ajuda a corroborar a minha afirmação que a
> demonstração do teorema de incompletabilidade gödeliano NÃO depende
> da "aritmetização da sintaxe" (como defendeu a autora do artigo
> citado no começo da presente discussão).
Permitam-me assumir o ultrajante papel de advogado do diabo. :-)
Rodrigo Freire escreveu (ênfase minha):
> TMR apresenta a seguinte versão do teorema de Godel (citando de
> memória, pode haver alguma variação inessencial)
> *Se T tem nomes para suas fórmulas* (item 1 da codificação na minha
> mensagem anterior) e é consistente, então T não representa
> simultaneamente a operação de diagonalização nas suas fórmulas e a
> dedutibilidade em T.
Ora, é fácil se livrar da aritmetização se simplesmente a assumirmos
como hipótese!
O resultado de Kleene também foi aludido nesta discussão como
evidência em favor da tese de João Marcos. Esse resultado, de fato,
implica uma *versão* do resultado de Gödel que trata de teorias
recursivamente axiomatizáveis nas quais *as funções recursivas
primitivas são representáveis*[1]. Ora, para se chegar ao enunciado
original de Gödel, é necessário ainda estabelecer que as funções
recursivas primitivas são representáveis nas teorias fundacionais tipo
Principia Mathematica. É precisamente isso que é alcançado por meio
da aritmetização. Ainda que seja repertório básico para os lógicos de
carreira contemporâneos, isso não é evidente. Inclusive, pode-se
dizer que Gödel inaugurou com seu artigo os estudos do que hoje
chamamos de funções recursivas primitivas.
Se estamos pensando em demonstrações do enunciado original de Gödel,
com todo seu impacto e consequências, então não creio que seja
possível evitar a tal aritmetização (bem como diagonalização).
Supostas demonstrações livres dela estão fadadas a pressupô-la de
alguma maneira, seja explicitamente, ou embutida em definições.
Certamente, como já foi observado nesta discussão, há uma certa
vagueza em "demonstrações do resultado de incompletabilidade de
Gödel". Não está perfeitamente claro quando um resultado deve contar
como uma demonstração do enunciado gödeliano. Ademais, quando estamos
discutindo o que é ou não necessário para se demonstrar um resultado,
há que se considerar ainda uma certa ambiguidade na noção de
demonstração. Afinal, há boas e más demonstrações. Qual o valor de
se evitar esta ou aquela técnica se o preço é terminarmos com uma má
demonstração?
Assim como qualquer resultado, as demonstrações do teorema da
indecidibilidade do Gödel podem ser inseridas num espectro com relação
a sua perspicácia e poder elucidatório. Num dos extremos está algo
como a demostração do próprio Gödel (talvez com algumas melhorias
inessenciais na codificação) e no outro extremo está aquela em que
simplesmente se assume o enunciado do teorema como hipótese.
Afinal, o resultado é conhecido como teorema de Gödel e não teorema de
Finsler[2]. E, a julgar pela escassa correspondência entre os dois[3],
os detalhes técnicos, inclusive aritmetização, são uma importante
razão para essa nomenclatura. Portanto, não diria que seja matéria
apenas para hackers[3].
Notas:
[1] Em conversa privada, João Marcos indicou a excelente nota de Peter
Smith sobre o assunto:
https://www.logicmatters.net/resources/pdfs/KleeneProof.pdf
[2] Paul Finsler. Formale Beweise und die Entsheidbarkeit. Mathematische
Zeitschrift, Band 25, 1926, S. 676-682.
[3] Kurt Gödel. Collected Works, Volume IV, p. 405-415.
[3] A codificação particular escolhida por Gödel é, de fato,
inessencial, como observou o próprio Gödel, e pode ser substituída,
eventualmente por versões melhores, sem qualquer prejuízo. Porém, a
aritmetização em si me parece desempenhar um papel central.
--
Hermógenes Oliveira
"The competent programmer is fully aware of the strictly limited size
of his own skull; therefore he approaches the programming task in full
humility, and among other things he avoids clever tricks like the
plague." Edsger W. Dijkstra
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> A hipótese que T tem nomes para suas fórmulas significa apenas que
> as fórmulas de T e os termos fechados de T estão em correspondência
> 1-1: a cada fórmula F corresponde um termo fechado ‘F’. Nem precisa
> mencionar aritmética. Qualquer teoria em que o numero de fórmulas é
> igual ao número de termos fechados satisfaz isso por definição.
> Que T não representa simultaneamente sua diagonalização de fórmulas
> (a operação que associa F(‘F’) à fórmula F) e sua teoremicidade é a
> conclusão (em TMR), e também dispensa qualquer menção à
> aritmética. Não é preciso qualquer menção, por exemplo, às funções
> recursivas nesse teorema. Onde está a aritmetização como hipótese?
Bem, Rodrigo, acho que podemos concordar que a questão em pauta não é
a simples *menção* do termo "aritmetização", ou outro termo que o
valha, mas se a técnica em si não é, de alguma maneira, pressuposta
nas demonstrações alternativas que estamos discutindo.
No caso da sua proposta específica, você pergunta:
> Onde está a aritmetização como hipótese?
Eu necessitaria de mais detalhes para fornecer uma resposta mais
enfática, mas faço algumas indicações a seguir.
Você propõe:
> Se o numero de fórmulas de T é igual ao número de termos fechados de
> T, e T é consistente, então T não representa simultaneamente a
> operação de diagonalização nas suas fórmulas e a dedutibilidade em
> T.
Ora, consideremos uma teoria matemática fundamental, numa formulação
qualquer, digamos, nos moldes do Principia Mathematica, como Gödel
fez. Vamos avaliar a sua (in)decidibilidade com base no enunciado
acima.
Suponhamos que essa teoria é consistente. O critério de que o número
de fórmulas seja igual ao número de termos fechados, claramente, não
pode ser suficiente para a indecidibilidade (ex. Aritmética de
Presburger). O outro critério seria que T "*representa* a operação de
diagonalização nas suas fórmulas". O que significa isso? Seria
possível avaliar esse critério para a nossa teoria sem apelar para a
aritmetização?
A minha aposta é que não.
Imagino que você tenha em mente algo similar ao que consta no TMR,
§II, Theorem 1. Ali, o resultado está enunciado em termos da noção de
definibilidade (§II.2), onde, assim eu mantenho, estaria embutido o
apelo à aritmetização. Inclusive, esse termo "definível"
("definierbar") é o mesmo usado por Gödel no artigo original. Porém,
enquanto Gödel meticulosamente constrói as classes definitórias dos
predicados e relações metamatemáticas por meio da aritmetização, TMR
simplesmente substituem uma definição existencial, inserem como
hipótese do enunciado e pronto! Típico matemático clássico! Sempre
que há uma bela e elegante construção, substitui uma definição
existencial e alega um resultado mais geral e abstrato. ;-)
A questão é: Como seria possível demonstrar o existencial ali com
respeito a função D de diagonalização para uma teoria particular, como
o Principia Mathematica (e, assim, obter o resultado original de
Gödel), sem usar aritmetização?
--
Hermógenes Oliveira
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Eu não li a tese de doutorado do Smullyan ou o artigo de 1959, mas
conheço o livro de 1992, Gödel's Incompleteness Theorems. De acordo
com o prefácio, ideias daquelas obras anteriores estão incorporadas
ali.
Dentre a literatura secundária sobre os teoremas de Gödel, esse livro
do Smullyan é o meu predileto. Me lembro de nós termos usado ele,
juntamente com o artigo original do Gödel, num curso do mestrado na
UFG em meados de 2011. Um dos cursos mais divertidos dos quais eu já
participei!
O livro apresenta codificações bem perspicazes que, na minha opinião,
são melhores que as do artigo original. Contudo, ele não abre mão da
aritmetização em momento algum, ainda que em alguns momentos a
pressuponha *explicitamente* quando apresenta formulações abstratas
do resultado gödeliano.
--
Hermógenes Oliveira
________________________________________
From: Francisco Miraglia Neto <mira...@ime.usp.br>
Sent: Sunday, 29 December 2019 12:47
Cc: Lista brasileira
Subject: Re: [Logica-l] Kurt Gödel and the mechanization of mathematics
--
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Olá, Carlos.
> Eu , (pura teimosia?) continuo insistindo que a raiz do problema
> está na definição recursiva que usam as linguagens formais, que
> passam a ser, como Kleene disse, aritméticas.
Bem, eu, particularmente, não vejo nenhum problema com isso.
Você havia observado:
> Se demonstrar que o conjunto das fórmulas que não são teoremas não é
> recursivamente enumerável, então o conjunto dos teoremas não é
> recursivo, E isso pode ser provado de maneira finitária. Certo?
O problema em se abordar o resultado obtido por Gödel em termos da
teoria das funções recursivas é que se perde de vista, ou simplesmente
se pressupõe, a relação entre esses conceitos da teoria da
recursividade e as teorias formais com aspirações fundacionistas.
Hoje isso faz parte do repertório do lógico, e alguns poderiam mesmo
tomar como óbvio ou evidente, porém, foi algo que Gödel precisou
demonstrar! E, se parece tão natural agora, é porque ele o fez!
Após o teorema demonstrado, fica fácil olhar para trás e formular
enunciados equivalentes ao resultado original de Gödel os quais, ao
menos superficialmente, não fazem uso dos conceitos e métodos
encontrados no original.
Observações semelhantes se aplicam à sua sugestão envolvendo modelos
não-standard.
Imagine que você voltasse no tempo, para 1928, e se encontrasse com
Hilbert, ou Ackermann ou Bernays e dissesse a eles que o programa do
Hilbert não pode triunfar porque "nem toda função recursiva parcial é
potencialmente recursiva" (ou qualquer outro enunciado da teoria da
recursão que o valha) e prosseguisse com as definições dos conceitos
que ocorrem no enunciado e uma demonstração dele. Qual seria a
reação deles?
Ou, se viagem no tempo for ficção científica demais, imagine que
você está *demonstrando* para seus alunos o resultado de Gödel e
explicando seus efeitos sobre o programa de Hilbert. Você usaria
modelos não-standard? Teoria da recursividade?
Uma boa parte desses conceitos, como o de modelos não-standard, só
fazem sentido hoje *por causa* do resultado de Gödel e, portanto, não
podem prescindir dele ou substituí-lo.
Por isso, me parece que algumas alternativas propostas nesta discussão
pressupõe, ainda que implicitamente, o resultado original (ou uma
parte importante dele).
Nós podemos, eventualmente, nos contorcer com considerações informais
baseadas no nosso já solidificado conhecimento de lógica, dizendo que
é evidente a relação entre sistemas formais e recursividade, ou que é
óbvio que qualquer teoria adequada da matemática permite
diagonalização, ou coisas do gênero. Mas quando se trata de
*demonstrar* essas alegações, fazer as continhas mesmo e mostrar o
recibo, acho que é difícil escapar de algo semelhante ao trabalho
meticuloso do original.
Não lembro onde li isso, mas dizem que Gödel considerou o seu teorema
a partir de algumas ideias bastante informais, de ordem semântica,
envolvendo autorreferência. Mas ele sabia que esse tipo de argumento
não convenceria os vovozinhos de Göttingen e sentou para elaborar uma
demonstração completamente sintática. O esforço teria o custado uma
temporada no sanatório. Mas, em troca, recebemos uma bela demonstração.
--
Hermógenes Oliveira
> Legal, vamos ver como o teorema de Godel na versão que mencionei
> (TMR) *se aplica* nesse caso sem aritmetização no sentido usual
> (sequer há um predicado para os números naturais).
Ora, se a teoria é decidível, ninguém disputa que a aritmetização pode
ser dispensada! Trata-se, porém, de dispensá-la em demonstrações de
*indecidibilidade*!
> [...]
>
> Agora a aritmetização: Entendo que esse termo está sendo usado para
> um tipo de implementação da “representação formal da matemática” em
> T. Há outros modos de fazer isso que não apelam para números. Acho
> que essa é a “eliminação” da aritmetização que está em questão. É
> claro que não se está propondo a eliminação da “representação formal
> da matemática em T”. Se você identifica essas duas coisas, tudo
> bem. Mas não acho razoável. “Representação” é muito mais geral que
> “aritmetização”. Me parece claro que “aritmetização” é um tipo muito
> particular e restrito de “representação” que remete ao uso de
> operações aritméticas básicas com números apenas. Mas essa é uma
> discussão sobre a identificação de dois termos indefinidos.
Bem, então me parece que há uma maneira bastante direta de se resolver
a questão.
Considere o mencionado teorema 1 na seção II.2 do TMR. Tome uma
formalização qualquer T, em primeira ordem, da aritmética. Você
poderia, porventura, *demonstrar*, sem uso da aritmetização, que a
função D é definível em T (sob a hipótese de que T é consistente)?
Sinta-se a vontade para usar qualquer outro tipo de "representação
formal da matemática" que não seja aritmética (que não apele a
números), ou para, alternativamente, apenas indicar uma referência
na literatura onde isto tenha sido realizado.
--
Hermógenes Oliveira
Kurt Gödel and the mechanization of mathematics
- Juliette Kennedy discusses Kurt Gödel’s Incompleteness Theorems: the
ingenious proofs and enduring impact
https://www.the-tls.co.uk/articles/kurt-godel-incompleteness-theorems/
JM
--
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--
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Em 2 de jan de 2020, à(s) 19:28, Valeria de Paiva <valeria...@gmail.com> escreveu:
Para ver essa discussão na Web, acesse https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CAESt%3DXsQDdKFtXARM%3DfoUkR6TBWT5N5dKW8xVTiLRQ_AtzaWCw%40mail.gmail.com.
Carlos Gonzalez <gonz...@gmail.com> escreveu:
> Más o artigo é muito ruim, um lixo.
>
> [...]
>
> Mas acho que os mal-entendidos dessa senhora são tão básicos que
> dificilmente seja interessante continuar discutindo esse artigo.
>
> Com relação à senhora Juliette Kennedy, talvez seja conveniente
> pensar seriamente em abandonar a filosofia da matemática.
>
> [...]
>
> Não sei, gostaria de ver a posição dos colegas e que me falem se
> estou exagerando.
Quem acompanha a lista, sabe que eu sou bastante crítico de peças de
divulgação científica[1][2]. Mas nunca sugeri que a publicação de
tais peças fossem motivo para que os(as) autores(as) abandonassem suas
áreas de investigação ou suas profissões. Afinal, para ficar apenas
nos casos mencionados nesta mensagem, tanto os professores Lynch e
Floridi quanto a professora Kennedy possuem artigos propriamente
acadêmicos, com todo o rigor e citações bonitinhas que isso acarreta.
Nessa parte, Carlos, se me permite ser sincero, acho que você exagerou
um pouco. O teor do resto de suas críticas, contudo, me parecem
razoáveis e ecoam, num certo sentido, as minhas próprias desconfianças
com peças de divulgação. Reconheço, porém, que muitos desses
problemas são devidos a limitações dos veículos de publicação e uma
série de pressupostos que normalmente se faz sobre o público alvo
delas (pressupostos esses que, quando não menosprezam abertamente a
capacidade do leitor, acabam se mostrando, pelo menos, um tanto
paternalistas). Devo dizer, no entanto, que as objeções que faria à
peça de Kennedy seriam certamente menos contundentes do que aquelas
que fiz à peça do Lynch referenciada abaixo, por exemplo.
Dito isso, devo admitir que, com relação à minha participação nesta
discussão até aqui, eu havia me limitado à questão proposta por João
Marcos sobre a possibilidade de se dispensar a "aritmetização" na
*demonstração* do resultado gödeliano e me propus o papel de advogado
do diabo com respeito a essa questão apenas. Nunca houve, da minha
parte, a intenção de vindicar a peça de Kennedy como um todo.
E, a propósito...
Rodrigo Freire <freir...@gmail.com> escreveu:
> O teorema como apresentado abstratamente no clássico TMR não tem a
> alegada hipótese existencial que esconde uma construção. Eles
> demonstram que para *qualquer* nomeação das fórmulas, ou falha a
> representabilidade da diagonalização ou falha a representabilidade
> da teoremicidade. Qual vai falhar, depende da nomeação, como mostrei
> aqui. Não é questão de concordar, só de entender o enunciado. Não há
> uso de codificação na demonstração.
A julgar pelo que o Rodrigo escreveu acima, talvez ainda convenha
destilar algumas minúcias.
Cabe esclarecer que a minha alegação sobre uma "aritmetização"
escondida numa hipótese existencial não diz respeito estritamente ao
resultado abstrato em TMR ou na sua demonstração (e isso já estava
explícito nas minhas mensagens anteriores). Para benefício da
discussão, talvez seja proveitoso listar aqui alguns pontos que eu
*não* disputo, e nunca pretendi disputar:
- O enunciado em TMR é um resultado abstrato. Ele se aplica
igualmente a qualquer teoria formal T, seja ela decidível ou
indecidível.
- A demonstração *do resultado abstrato* em TMR não *depende*,
explícita ou implicitamente, de qualquer "aritmetização" ou
"codificação".
Ora, do que se trata então a minha alegação de que haveria uma
"aritmetização" sendo pressuposta em TMR? Bem, tentarei reconstruir o
argumento de maneira mais detalhada abaixo.
Como o Rodrigo explicou, o resultado de TMR nos apresenta com uma
dicotomia: uma teoria T qualquer, ou bem não é diagonalizável ou bem é
indecidível. Porém, eis uma tese que eu, de fato, disputo:
- O resultado abstrato de TMR é equivalente ao resultado original de
Gödel, o implica, ou pode, de alguma forma, substituí-lo.
Ora, quais seriam as minhas razões para isso?
Ao considerarmos teorias formais *particulares*, o resultado abstrato
não fornece, *por si só*, uma demonstração de (in)decidibilidade (ou,
alternativamente falha/sucesso da diagonalização). Ele apenas nos
garante a dicotomia (típico matemático clássico, não é mesmo,
Valéria?). Em contraste, o resultado de Gödel nos fornece, para uma
teoria *particular* que pretende ser uma formalização adequada da
aritmética, que ela é, com efeito, indecidível, resolvendo a dicotomia
para um dos lados.
Como nós poderíamos, contudo, com base no resultado abstrato de TMR,
*demonstrar* o resultado de Gödel para uma formalização particular A da
aritmética? Seria necessário resolver a dicotomia, a qual, neste
caso, como nós já *sabemos*, mas gostaríamos de *demonstrar*
independentemente de Gödel, pende para um dos lados. Isto é, seria
necessário demonstrar que a função D de diagonalização é definível em
A. Essa demonstração, juntamente com a dicotomia já demonstrada em
TMR, nos daria então o resultado desejado, que é a indecidibilidade de
A. Consultando as definições relevantes em TMR, em particular a
definição de "definível", constatamos que a nossa missão seria
demonstrar um resultado existencial. E eis aqui, finalmente, a minha
alegação:
- Uma *demonstração* de que a função D de diagonalização é definível
em A não pode dispensar de aritmetização.
Em especial, essa alegação *não* pretende ser interpretada das
seguintes formas:
- Para se compreender o enunciado abstrato de TMR e sua dicotomia
subjacente é necessário apelar à aritmetização.
- A noção de "aritmetização", ou "representabilidade da matemática" é
uma panaceia que remonta, pelo menos, aos tempos de Pitágoras.
No próprio livro TMR, as demonstrações de indecidibilidade de teorias
particulares, especialmente no teorema 9, §II, assumem explicitamente
(nota de rodapé 7, §II) a recursividade da função D, e aqui se aplicam
as minhas observações anteriores sobre as propostas alternativas nos
moldes de Kleene.
Em resumo, o enunciado abstrato de TMR nos fornece a dicotomia:
¬ D (diagonalização) ∨ ¬ T (teoremicidade)
o que, para quem está familiarizado com a lógica proposicional
clássica, é equivalente a
D → ¬T
Se o resultado pretendido é, para além da dicotomia abstrata de TMR, a
indecidibilidade, isto é ¬T, de uma teoria particular A para a aritmética,
então, temos ainda que demonstrar D. Ora, pelas definições em
TMR, D é um enunciado existencial. Por isso eu falava de uma hipótese
existencial embutida.
> No que me concerne, foi me perguntado se eu poderia, porventura,
> representar a diagonalização *na aritmética* sem usar
> aritmetizacao. Pois bem, posso resolver o problema sem usar a
> divisão em primos e compostos. Se eu usasse só a divisão entre pares
> e ímpares estaria bom? Ou a dicotomia pares e ímpares ainda conta
> como aritmetizacao?
Está concedido que existem codificações distintas e, porventura,
melhores do que aquelas utilizadas por Gödel e que, por sua vez, podem
apelar para as mais variadas propriedades numéricas. Isso significa
que qualquer codificação funciona para se aritmetizar a teoria, desde
a noção de fórmula até a noção de derivação formal, e que basta
mencionar números para que se tenha aritmetização? Não me parece
razoável.
Agora, nós poderíamos, eventualmente, fornecer critérios gerais (por
exemplo, por meio de definições) que uma codificação precisa obedecer
para desempenhar o papel pretendido na aritmetização. Isso não
significa, porém, prescindir da aritmetização. Seria apenas o mesmo
que dizer, em termos coloquiais: "Não enche o saco! Gödel já mostrou
que dá pra fazer! Ninguém tem tempo ou interesse nessas continhas.
Com exceção, talvez, dos hackers. Vá amolar um construtivista!"
Referências:
[1] https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msg/logica-l/3r3JuY79Ojc/r-G5sBKzBgAJ
[2] https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msg/logica-l/dAbP6w2kx8w/VawkJgKnBwAJ
--
Hermógenes Oliveira
»Die Mathematiker sind eine Art Franzosen: Redet man zu ihnen, so
übersetzen sie es in ihre Sprache, und dann ist es alsobald ganz etwas
anderes.« Johann Wolfgang von Goethe
Como nós poderíamos, contudo, com base no resultado abstrato de TMR,
*demonstrar* o resultado de Gödel para uma formalização particular A da
aritmética? Seria necessário resolver a dicotomia, a qual, neste
caso, como nós já *sabemos*, mas gostaríamos de *demonstrar*
independentemente de Gödel, pende para um dos lados. Isto é, seria
necessário demonstrar que a função D de diagonalização é definível em
A. Essa demonstração, juntamente com a dicotomia já demonstrada em
TMR, nos daria então o resultado desejado, que é a indecidibilidade de
A.
Consultando as definições relevantes em TMR, em particular a
definição de "definível", constatamos que a nossa missão seria
demonstrar um resultado existencial. E eis aqui, finalmente, a minha
alegação:
- Uma *demonstração* de que a função D de diagonalização é definível
em A não pode dispensar de aritmetização.
Em especial, essa alegação *não* pretende ser interpretada das
seguintes formas:
- Para se compreender o enunciado abstrato de TMR e sua dicotomia
subjacente é necessário apelar à aritmetização.
- A noção de "aritmetização", ou "representabilidade da matemática" é
uma panaceia que remonta, pelo menos, aos tempos de Pitágoras.
No próprio livro TMR, as demonstrações de indecidibilidade de teorias
particulares, especialmente no teorema 9, §II, assumem explicitamente
(nota de rodapé 7, §II) a recursividade da função D, e aqui se aplicam
as minhas observações anteriores sobre as propostas alternativas nos
moldes de Kleene.
Em resumo, o enunciado abstrato de TMR nos fornece a dicotomia:
¬ D (diagonalização) ∨ ¬ T (teoremicidade)
o que, para quem está familiarizado com a lógica proposicional
clássica, é equivalente a
D → ¬T
Se o resultado pretendido é, para além da dicotomia abstrata de TMR, a
indecidibilidade, isto é ¬T, de uma teoria particular A para a aritmética,
então, temos ainda que demonstrar D. Ora, pelas definições em
TMR, D é um enunciado existencial. Por isso eu falava de uma hipótese
existencial embutida.
Está concedido que existem codificações distintas e, porventura,
melhores do que aquelas utilizadas por Gödel e que, por sua vez, podem
apelar para as mais variadas propriedades numéricas. Isso significa
que qualquer codificação funciona para se aritmetizar a teoria, desde
a noção de fórmula até a noção de derivação formal, e que basta
mencionar números para que se tenha aritmetização? Não me parece
razoável.
Agora, nós poderíamos, eventualmente, fornecer critérios gerais (por
exemplo, por meio de definições) que uma codificação precisa obedecer
para desempenhar o papel pretendido na aritmetização. Isso não
significa, porém, prescindir da aritmetização. Seria apenas o mesmo
que dizer, em termos coloquiais: "Não enche o saco! Gödel já mostrou
que dá pra fazer! Ninguém tem tempo ou interesse nessas continhas.
Com exceção, talvez, dos hackers. Vá amolar um construtivista!"
--
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