Uma nova classe de modelos para a Teoria Paraconsistente de Conjuntos

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Walter Carnielli

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Dec 5, 2019, 3:36:02 PM12/5/19
to Lista dos Logicos Brasileiros
Caros colegas:

Em vista do interesse do assunto, julgamos apropriado divulgar,
abraços,
Walter
=========================
Twist-Valued Models for Three-valued Paraconsistent Set Theory
W. Carnielli and M. E. Coniglio
https://arxiv.org/pdf/1911.11833.pdf

Light abstract:

Paraconsistent set theory (PST) is the theoretical move to maintain
the freedom of defining sets, while stripping the theory of
unnecessary principles, so as to avoid triviality -- a disastrous
consequences of contradictions involving sets in ZF. A hard problem
is to find good models for PST.

B. Löwe and S. Tarafder proposed in 2015 a class of algebras based on
a certain kind of implication which satisfy several axioms of ZF. From
this class, they found a specific 3-valued model called PS3 which
satisfies all the axioms of ZF, and can be expanded with a
paraconsistent negation *, thus obtaining a paraconsistent model of
ZF. The logic (PS3 ,*) coincides (up to the language) with da Costa
and D'Ottaviano logic J3, a 3-valued paraconsistent logic that have
been proposed independently in the literature by several authors and
with different motivations such as CluNs, LFI1 and MPT.

We propose in this paper a family of algebraic models of ZFC based on
LPT0, another linguistic variant of J3 introduced by us in 2016. The
semantics of LPT0, as well as of its first-order version QLPT0, is
given by twist structures defined over Boolean algebras.

Twist-valued models are natural generalizations of the Boolean-valued
models of set theory independently introduced by Scott, Solovay and
Vopěnka.

Our twist-valued models are adapted to provide a class of twist-valued
models for (PS3,*), thus generalizing Löwe and Tarafder's results. It is
shown that they are in fact models of ZFC (not only of ZF).
====================================

Walter Carnielli
https://waltercarnielli.com/

Centre for Logic, Epistemology and the History of Science and
Department of Philosophy
State University of Campinas –UNICAMP
13083-859 Campinas -SP, Brazil

CV Lattes : http://lattes.cnpq.br/1055555496835379

Tony Marmo

unread,
Dec 5, 2019, 5:05:26 PM12/5/19
to Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caro Walter, 

Já que levantou o assunto, vou fazer uma pergunta:

Os conjuntos paraconsistentes existem?

Uma paráfrase possível para essa pergunta: o que garante a existência de conjuntos paraconsistentes?

Obrigado

--
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Walter Carnielli

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Dec 5, 2019, 5:21:19 PM12/5/19
to Tony Marmo, Lista dos Logicos Brasileiros
Oi Tony,

A pergunta é boa. E a minha resposta, da maneira mais simples
possível, vai ser também. :-)
A teoria de conjuntos clássica (standard) é apenas uma coleção de
sentenças. O que garante a "existência" dos conjuntos clássicos?
Seus modelos, levando em conta o Axioma do Infinito.

Mas o que é "existir"? Existe o modelo de Von Neumann dos naturais,
por exemplo?
Em ZF os números naturais são definidos recursivamente. via ordinais
de von Neumann tomando 0 = { } (o conjunto vazio)
e n + 1 =S(n)= n ∪ {n} para cada n. A estrutura ⟨N, 0, S⟩ é um modelo
dos axiomas. de Peano.
A "existência" do conjunto N segue do axioma do infinito de ZF.
É natural aceitar esta noção de "existir" como "estrutura.
matemática definidarigorosamente". Existe
tanto, ou msis, quanto a ironia, o bom gosto ou a boa-vontade.

Analogamente, o que garante a existência de conjuntos
paraconsistentes? Resposta: seus modelos;
Nossos modelos, baseados em Twist-Valued Models, são bastante
próximos, neste sentido, dos modelos standard de ZF.
Abs

W.

Tony Marmo

unread,
Dec 5, 2019, 8:01:35 PM12/5/19
to Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Pois é, mas se pensarmos em termos de linguagem, ou seja, que uma teoria é uma coleção de asserções, ainda temos diante de nós o dilema sobre qual visão semântica é a mais adequada para aquela linguagem: se uma que considera somente os cavalos ou "aceita também os unicórnios". 

Eu, se fosse defensor da existência de conjuntos paraconsistentes, optaria por pedir o benefício da dúvida. Não sei se os animais em comento são como cavalos, ou estão mais para unicórnios. Então, eu me permitiria perguntar mais acerca deles até ter em mãos mais argumentos para responder a questão. Metaforicamente, eu me permitiria perguntar se "o chifre do unicórnio perfura alguma coisa", ou seja, tentaria achar quais são suas utilidades possíveis.

Joao Marcos

unread,
Dec 5, 2019, 10:54:33 PM12/5/19
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Coincidentemente (?), o Sourav Tarafder fez uma excelente exposição do trabalho precursor dele sobre o tema, esta tarde, na USP:

1st Workshop "Studies in Mathematical Workshop"

Vocês têm sorte de poder dialogar diretamente com ele sobre o assunto, dado que ele é atualmente Professor Visitante aí mesmo na UNICAMP, trabalhando com o Giorgio Venturi!

Abraços, 
JM


Joao Marcos

unread,
Dec 5, 2019, 11:56:37 PM12/5/19
to Tony Marmo, Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
> Pois é, mas se pensarmos em termos de linguagem, ou seja,
> que uma teoria é uma coleção de asserções, ainda temos diante
> de nós o dilema sobre qual visão semântica é a mais adequada
> para aquela linguagem: se uma que considera somente os cavalos
> ou "aceita também os unicórnios".

A propósito, é possível considerar teorias contendo tanto asserções
quanto denegações (i.e., assertions & denials):

What is a logical theory? On theories containing assertions and denials
https://link.springer.com/article/10.1007/s11229-019-02183-z

Neste tipo de teorias é possível rejeitar diretamente alguns
unicórnios, se eles lhe aborrecerem.

###

<humor>
E por falar em unicórnios com chifres perfurantes, esta paródia dos
Simpsons feitas pelo Banksy é afiada!
https://youtu.be/DX1iplQQJTo?t=84
</humor>

###

Joao Marcos

--
http://sequiturquodlibet.googlepages.com/

Carlos Gonzalez

unread,
Dec 6, 2019, 6:21:33 PM12/6/19
to Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA, Carlos G González, Carlos González
Caro Walter e lista,

Ai, a velha questão da existência em matemática!

Parece que o tua posição está inspirada de alguma maneira em Hilbert ou no formalismo, quando você escreve:
>>>
É natural aceitar esta noção de  "existir" como  "estrutura.
matemática definida rigorosamente". 
<<<

Se não assumir uma posição idealista ou platonista extrema, a existência em matemática é uma analogia ---quase uma metáfora--- da existência metafísica na realidade ou na natureza.

Suponha que formalizamos Chapeuzinho Vermelho em ZF:
∅ é Chapeuzinho
{∅} é a mãe dela
{{∅}} é a vovozinha
{∅,{∅}} é o lobo mau
{∅,{{∅}}} é o caminho do bosque
etc.
Podem ser definidas relações: "x mãe de y", "x avô de y", "x come y", "x vai por y", etc.
Um hilbertiano poderia afirmar que Chapeuzinho Vermelho existe. Mas é uma existência matemática, não existe na natureza.

Isto não é uma brincadeira, mas um problema muito sério.
Por exemplo, pensemos na relação Bedeutung de Frege, mal traduzida como "denotação", etc.
Nessa concepção, o termo "mesa" nunca pode "denotar" a mesa que eu estou usando para escrever, nem o termo "rio Amazonas" pode "denotar" o rio homônimo no norte do Brasil:
 o termo "rio Amazonas"  "denota", na concepção fregiana, um objeto matemático, porque a relação foi definida à maneira matemática.

Possivelmente, atrás desse problema e do abuso de maneiras matemáticas esteja mais uma vez alguma forma do "paradoxo da análise", como parece assinalar o trabalho de Tomas Moro Simpson.
  "Formas Lógicas, Realidad y significado", cuja leitura recomendo, apesar dele ter sido argentino e sócio da SADAF (que nem eu :-) )

Carlos




Walter Alexandre Carnielli

unread,
Dec 7, 2019, 12:23:28 AM12/7/19
to Carlos Gonzalez, Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA, Carlos González
Olá Carlos e tod@s,

SIm, é a velha questão da existência, mas não somente em matemática.
Na matemática temos a questão da existência dos números complexos,
do infinito,do ponto...mas também fora disso há a questão da
existência do estilo, do bom gosto, etc. O formalismo é uma saída.
confortável,
e talvez a única. Não tenho nada contra os sócios da SADAF (que
sempre me pareceu saída de um conto do Borges) e menos ainda
contra os argentinos :-)

Abraços,

Walter

Em sex., 6 de dez. de 2019 às 15:21, Carlos Gonzalez
<gonz...@gmail.com> escreveu:
> --
> Você recebeu essa mensagem porque está inscrito no grupo "LOGICA-L" dos Grupos do Google.
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Carlos Gonzalez

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Dec 7, 2019, 12:47:13 AM12/7/19
to Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA, Carlos G González, Carlos González
Prezado JM e lista,

Lembro-me de que Klimovsky considerava uma teoria científica como um conjunto de objetos linguísticos, seja um conjunto de proposições, seja um conjunto de asserções, etc. Então estava forçado a recorrer a algum procedimento que fornecesse os detalhes da semântica. Poderiam ser as velhas "regras de correspondência" ou conceitos de outros filósofos que eu nunca entendi muito bem.

Eu sou o suficientemente kuhniano como para rejeitar essas visões linguísticas, fanaticamente linguísticas. Mas Kuhn não elucidou suficientemente o problema ---até onde eu entendi--- chamando a algumas fórmulas da teoria de "generalizações simbólicas" que formam parte do paradigma quando é entendido como "matriz disciplinar". Porque Kuhn praticamente desconheceu os problemas linguísticos, sobre tudo semânticos, envolvidos nos conceitos científicos. Filósofos da ciência atuais, como Nancy Cartwright, tratam com muito respeito a "rede semântica" envolvida nas teorias científicas, mas parece que não tem se preocupado muito por elucidar esse funcionamento semântico das teorias científicas, até onde eu conheço e entendi.

Se considerarmos o problema num isolamento da linguagem (coisa criticada por vários autores, como Adam Shaff ou Julia Kristeva) então "f=m.a" é só um "x=y.z" , apesar de que na teoria científica o primeiro nunca trabalha semanticamente como o segundo em matemática.

Talvez no fundo de tudo isso esteja o problema de que estamos entendendo de uma maneira muito errada o que é uma linguagem, porque von Humbolt, Saussure, Frege e outros seguiram um caminho muito errado que deve ser desandado com o uso da crítica. Eu repito constantemente a frase de Kristeva de que os estudos da linguagem ficaram a cargo de arquivistas e necrófilos. Ou o provocador título de um do seus livros: "A linguagem, essa desconhecida". Mas eu não vejo em Kristeva uma crítica suficientemente aprofundada como para ser coerente com a sua posição radical sobre a linguagem.

Carlos

A frase de Kristeva citada acima:
Pensees d'archivistes, d'archeologues ou de necrophiles que nos philosophies du langage, avatars de l'Idee, qui se fascinent devant les restes d'un fonctionnement entre autres discursif, et remplacent, par ce fetiche, ce qui l'a produit. 
Julia Kristeva. La révolution du langage poétique, Vol. 48. Editions du Seuil, 1974.. p. 11

--
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Carlos Gonzalez

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Dec 7, 2019, 1:31:42 AM12/7/19
to Walter Alexandre Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA, Carlos G González, Carlos González
Prezado Walter e lista,

Coincido contigo, que o formalismo ---e fundamentalmente o de Hilbert, entre tantas variantes dele--- é uma saída "confortável" e eu acrescentaria: genial. Além disso, o formalismo foi apresentado mais de uma vez como uma alternativa ao idealismo-platonismo.

O problema está quando o platonismo que jogamos fora pela porta, entra pela janela de uma concepção platonista da linguagem. Claro, um problema para aqueles que se reivindicam não platonistas, como eu. 

Sim, "não somente em matemática" como você disse. Porque envolve-se em contextos mais amplos que o relacionam com vários outros problemas, como posições realistas e não realistas em ciência empírica: 
existe o eléctron?
existe o inconsciente?
existe a vida?

Carlos




Durante

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Dec 9, 2019, 7:39:06 PM12/9/19
to LOGICA-L, walt...@unicamp.br, gonz...@gmail.com, filon...@yahoo.com
Prezados,

Aqui vão meus "dois tostões" de comentários alegóricos sobre o formalismo.

O que é isso que existe, que uma formalização bem definida indica existir? Acho que o formalismo jamais chega àquilo que existe, mas apenas ao conceito daquilo que se considera que existe. A formalização, como o nome indica, nos leva a formas não a substâncias (conteúdo), e o formalismo, eu acho, identifica a forma com o bolo.
Mas parece que algo se perde aí, afinal, é o bolo que sacia o apetite, não a forma. Mas, para aquilo com o que não conseguimos tropeçar, que não dói quando cai na nossa cabeça, que não é captado pelas antenas de nossos celulares, o que haveria além da forma? Eu acho que há um elemento extra não capturável pelo mero formalismo. Há uma disposição.
A existência, em um sentido amplo, me parece ser apenas uma disposição do pensamento.
As pedras não são meros conceitos (formas), mas existem (têm substância, realidade, conteúdo, são instanciadas) porque nos dispomos a pensar que elas existem, e estamos assim dispostos, porque dói se as ignoramos.
Do mesmo modo, o valor do dinheiro existe porque nos dispomos a pensar que ele existe, e estamos assim dispostos, porque dói (mais até do que algumas pedras) se o ignoramos.
Algumas das entidades matemáticas existem porque nos dispomos a pensar que elas existem, e estamos assim dispostos, porque elas dão estrutura à nossa concepção da realidade, e a pressuposição desta estrutura nos ajuda a prever e evitar situações em que sentiríamos a dor das pedras e das dívidas. Ou seja, estamos dispostos a pensar que algumas entidades matemáticas existem, porque dói se as ignoramos.
O chupa-cabras não existe porque não estamos dispostos a pensar que ele exista, e não estamos assim dispostos, porque ignorá-lo não dói.
Quanto ao estilo e ao bom gosto, bem, eu diria que variadas versões deles existem para alguns, mas não existem para outros. Existem para aqueles cuja sensibilidade mais frágil os faria sentir dor em situações nas quais eles os ignoram. E não existem para aqueles mais casca grossa para quem ignorar o estilo e o bom gosto jamais provocaria qualquer dor.

Saudações,
Daniel.
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Tony Marmo

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Dec 9, 2019, 11:32:48 PM12/9/19
to Durante, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Ou seja, dir-se-á que não existem os unicórnios porque podemos ignorá-los já que eles não podem atacar-nos com seus chifres, ao contrário dos rinocerontes.
Mas, então qual seria a consequência de ignorar conjuntos paraconsistentes? Qual seria o dano?

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Durante

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Dec 10, 2019, 2:21:17 PM12/10/19
to LOGICA-L, dur...@ufrnet.br
Oi Tony,

Ou seja, dir-se-á que não existem os unicórnios porque podemos ignorá-los já que eles não podem atacar-nos com seus chifres, ao contrário dos rinocerontes.
Mas, então qual seria a consequência de ignorar conjuntos paraconsistentes? Qual seria o dano?

Acho que esta é a pergunta fundamental! E não cabe aos matemáticos, aos lógicos e nem aos filósofos respondê-la. Apesar de fundamental, é uma pergunta que não merece nossa preocupação. Se a inclusão de conjuntos paraconsistentes na estrutura que pressupomos para a realidade nos ajudar a prever e evitar situações que, caso os ignorássemos, sentiríamos a dor das pedras e das dívidas, então nós nos disporemos a considerá-los existentes, reais. E não será preciso nenhuma filosofia para isso ocorrer, tanto quanto não é preciso nenhuma filosofia para reconhecermos que o valor do dinheiro existe. Ou seja, resumindo, se e quando os conjuntos paraconsistentes tiverem aplicações não matemáticas, eles passarão a existir, independentemente de nossa vontade ou tendências teóricas.

Saudações,
Daniel.
 

Antonio Marmo

unread,
Dec 10, 2019, 2:41:35 PM12/10/19
to logi...@dimap.ufrn.br
Entendo sua intuição. Mas, não saberia definir o que é uma aplicação não-matemática. Com auxílio da matemática todos os dias resolvemos problemas difíceis e criamos ferramentas úteis para nosso cotidiano, como o sistema de GPS, o termostato que regula o ar condicionado, o controle remoto da TV e tantas coisas mais que já incorporamos à vida moderna. Nosso coletivo usa e se aproveita tanto da matemática que nem se dá conta dela!

Mas, enfim, vamos afunilar a questão: quem defende a existência de conjuntos paraconsistentes já tem uma ideia de possíveis aplicações tecnológicas do conceito? 

On 10 Dec 2019, at 11:21, 'Durante' via LOGICA-L <logi...@dimap.ufrn.br> wrote:


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Joao Marcos

unread,
Dec 10, 2019, 2:52:16 PM12/10/19
to Tony Marmo, Walter Carnielli, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
> Os conjuntos paraconsistentes existem?

Em princípio, o uso da terminologia "conjunto paraconsistente" parece
bastante infeliz, já que o adjetivo em questão se aplica usualmente à
noção de consequência subjacente à teoria em questão (e não aos
objetos cuja existência seria sancionada por tal teoria).

Dito isto, recordo-me que Thierry Libert usou tal terminologia (de
maneira razoavelmente informal) neste artigo, de um volume que editei
em 2005:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1570868304000503

JM

Durante

unread,
Dec 10, 2019, 3:04:39 PM12/10/19
to LOGICA-L
A minha intuição aqui, continuando a falar de modo alegórico, é que a matemática pura não dói. Assim como as estórias ficcionais não doem. Uma aplicação não-matemática seria qualquer coisa que dói. A tecnologia dói, mas a aplicação (não-matemática) nem precisa ser tecnológica. A organização econômica, que não é material, mas abstrata, também dói. A justiça institucionalizada (o direito) dói. Até o bom gosto, para muitos, dói. As possibilidades de aplicação são vastas.

Daniel.

Walter Carnielli

unread,
Dec 10, 2019, 3:38:42 PM12/10/19
to Joao Marcos, Tony Marmo, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
De fato, nós  pelo menos nunca falamos em "conjuntos paraconsistentes ".

Referimo-nos à teoria paraconsistente de conjuntos:


Falar em "conjuntos paraconsitentes " seria  um erro categorial, seria como se referir a uma "situação paraconsistente " quando uma situação fosse contraditória.

 Paraconsistente seria nossa atitude racional em relação a ela.


W.

Giorgio Venturi

unread,
Dec 15, 2019, 4:04:33 PM12/15/19
to Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caros membros da lista de lógica,

Escrevemos a respeito do artigo recentemente (5 de dezembro) publicado nesta lista: "Twist-Valued Models for Three-Valued Paraconsistent Set Theory", de Carnielli e Coniglio. Em razão do tema, tão próximo ao nosso trabalho, sentimos a necessidade de apontar alguns aspectos importantes, para que as afirmações não induzam em erro os pesquisadores que trabalham nessa área.

Em primeiro lugar, a validade nas estruturas Twisted, que são as novas estruturas introduzidas no artigo, é booleana e, portanto, o primeiro resultado principal Teorema 8.21 (como todos os lemas precedentes) é uma consequência direta (e não uma extensão) do resultado bem conhecido de que as estruturas a valores booleanos validam todos os axiomas ZFC (veja o livro do Bell "Set Theory"). A razão é que

(i) a validade é definida apenas em função do primeiro componente do produto (definição 4.7),
(ii) as operações "meet", "join", "arrow", e "~" da Twist-algebra são as mesmas da álgebra booleana, no primeiro componente,
(iii) o conjunto de valores designados de álgebra booleana twisted é tomado como {(1,a) : a é qualquer elemento da álgebra}.

o que leva ao fato de que as álgebras booleanas twisted com as operações mencionadas em (ii) e o conjunto de valores designados mencionado em (iii) não são nada além de álgebras booleanas. Portanto, as estruturas twisted não oferecem novos modelos para ZFC.

O segundo resultado principal do artigo Theorem 9.4 e Remark 9.5 afirma que a estrutura twisted para PS_3 (introduzida como reasonable implication algebra, necessária para produzir modelos de teoria de conjuntos no artigo "Generalized algebra-valued models of set theory", de Loewe e Tarafder) é um modelo de todos os axiomas de ZFC. Embora não haja provas desta afirmação no artigo, é fácil mostrar que isto é falso. De fato, há instâncias (do esquema) de separação que não são válidas no modelo a valores na álgebra PS_3.

Atenciosamente,
Sourav Tarafder
Giorgio Venturi

--
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Marcelo Esteban Coniglio

unread,
Dec 16, 2019, 7:45:27 PM12/16/19
to Giorgio Venturi, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caros Sourav e  Giorgio,

Com relação à sua mensagem, agradecemos pelo interesse em nosso artigo, mas gostaríamos de esclarecer alguns enganos de vossa parte na apreciação dos resultados.

(1) Vocês afirmam "Em primeiro lugar, a validade nas estruturas Twisted, que são as novas estruturas introduzidas no artigo, é booleana e, portanto, o primeiro resultado principal Teorema 8.21 (como todos os lemas precedentes) é uma consequência direta (e não uma extensão) do resultado bem conhecido de que as estruturas a valores booleanos validam todos os axiomas ZFC (veja o livro do Bell "Set Theory") [...] o que leva ao fato de que as álgebras booleanas twisted [...] não são nada além de álgebras booleanas. Portanto, as estruturas twisted não oferecem novos modelos para ZFC."

Há aqui um engano. As estruturas twist para a lógica 3-valorada LPT0, a partir das quais construímos os modelos de ZFC, formam uma variedade de álgebras que é termwise equivalente à variedade MV3 de MV-álgebras que são a classe de modelos de L3, a lógica 3-valorada de Lukasiewicz. Isto é consequência do fato de que LPT0  coincide (a menos de linguagem) com a lógica J3 de da Costa e D'Ottaviano, a qual é por sua vez equivalente (no sentido introduzido por Blok e Pigozzi em "Abstract algebraic logic and the deduction metatheorem") com L3. Logo, do ponto de vista algébrico, os twist-valued models que nós introduzimos para a teoria de conjuntos vão além dos Boolean-valued models: as MV álgebras de MV3 não são Boolean algebras em geral. Checar a satisfação dos axiomas de ZFC nessas estruturas requer uma análise minuciosa da longa demonstração apresentada no referido livro de Bell, adaptando em certos pontos alguns detalhes técnicos para o contexto mais geral das twist-structures. As estruturas twist para LPT0 contém álgebras de Boole como subestruturas (por exemplo, o conjunto dos pares da forma (a,~a)), mas  há mais coisas nesses modelos: a segunda coordenada dos pares nao é necessariamente o complemento booleano da primeira, há uma negação paraconsistente, e há conjuntos "inconsistentes" x tais que (x=x) e não (x=x) é o caso, onde obviamente "não" é a negação paraconsistente. Assim, os Boolean-valued models foram levados para um contexto mais geral.  

Se a proximidade dos twist-valued models com os Boolean-valued models no fragmento sem negação paraconsistente (o ZF "puro") é visto como uma limitação,  essa limitação já aparece no (único) modelo de ZF "puro" apresentado no artigo de Lowe e Tarafder, PS3. Com efeito, o raciocínio que vocês apresentam para as estruturas twist para LPT0 no início da sua mensagem pode ser aplicado mutatis mutandis às estruturas twist para PS3, também apresentadas no nosso paper: aqueles items (i) a (iii) valem também para as estruturas twist para PL3. Logo, a classe de modelos de ZF baseados nessas estruturas  (em particular PS3!) seriam Boolean-valued models de ZF, segundo seu raciocínio. Mas já esclarecemos acima que esse não é bem o caso.
 
Justamente um ponto interessante do nosso artigo é que apresentamos uma abordagem diferente daquela apresentada por Lowe e Tarafder, abstraindo a estrutura de PS3 para estruturas twist em lugar de analisar as propriedades das implicações (como é feito naquele artigo, que de todas maneiras explora muito bem diferentes implicações para definir novos modelos algébricos de fragmentos de ZF),  o que permitiu obter uma classe de modelos de ZF, um modelo para cada álgebra de Boole completa. Analisar as coisas desde essa perspectiva permitiu provar que PS3 é *também* modelo do axioma da escolha, adaptando a prova para LPT0 dada no paper (adaptada, por sua vez, da prova de Bell, como foi mencionado antes). Os detalhes não foram dados no artigo porque é realmente uma adaptação imediata do caso de LPT0. Isto nos leva à segunda questão:

(2) Vocês mencionam no final da mensagem que "O segundo resultado principal do artigo [...] afirma que a estrutura twisted para PS_3 [...] é um modelo de todos os axiomas de ZFC. Embora não haja provas desta afirmação no artigo, é fácil mostrar que isto é falso. De fato, há instâncias (do esquema) de separação que não são válidas no modelo a valores na álgebra PS_3."

Esta frase é curiosa, dado que Lowe e Tarafder mostram no Corollary 11 que PS3 é modelo de ZF. Em particular, o esquema de Separação é satisfeito por PS3 (é uma consequência dos Theorems 4 e 9). Evidentemente houve aqui também um engano. O que é mostrado nesse artigo, na seção "Comparison to other paraconsistent set theories" (Theorem 15), é que PS3 não satisfaz algumas instâncias do esquema de *Compreensão* da teoria ingênua de conjuntos, que no entanto é satisfeito por algumas teorias paraconsistentes de conjuntos apresentadas na literatura.

Finalmente, consideramos que é muito bom que a área de teoria paraconsistente de conjuntos tenha novas propostas, saindo da tradicional abordagem da teoria ingênua de conjuntos e tentando, no seu lugar, analisar (extensões de) ZF/ZFC. Alguns anos atrás nós propusemos uma variante paraconsistente de ZF, baseada em lógicas da inconsistência formal (LFIs),  no artigo "Paraconsistent set theory by predicating on consistency" publicado em 2013 no Journal of Logic and Computation. Ali nos baseamos em LFIs muito fracas, não algebrizáveis, e apresentamos uma versão axiomática, sem modelos. O passo seguinte era utilizar lógicas mais fortes, e J3 era a opção mais óbvia. Assim, motivados pelo  belo artigo de Lowe e Tarafder, decidimos retomar a questão, introduzindo os twist-valued models. Achamos que esta semântica pode oferecer uma perspectiva interessante para diversas teorias paraconsistentes de conjuntos.

Um abraço

Walter e Marcelo

Giorgio Venturi

unread,
Dec 17, 2019, 2:55:30 PM12/17/19
to Marcelo Esteban Coniglio, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caro Marcelo e Walter,

Obrigado pelo e-mail. Depois de lê-lo, continuamos a insistir nos pontos matemáticos que mencionámos no nosso e-mail anterior, que diz precisamente o seguinte. 

(1) Nós não dissemos que a estrutura twisted para a lógica LPT0 é booleana: é claro que ela contém duas negações diferentes "~" e "\lnot".

A estrutura twisted para LPT0 sobre uma álgebra booleana A é uma estrutura TA = ( TA, meet, join, arrow, ~, lnot ), onde as operações meet, join, arrow, e ~ são definidas de forma que a primeira coordenada é igual à do meet, join, arrow, e ~ da álgebra booleana A (Definição 4.6; p8). O conjunto designado de TA é D = {(1, a) : onde a é qualquer elemento de A e 1 é o elemento superior de A}. 

Nós afirmamos que a subestrutura TA_sub = ( TA, meet, join, arrow, ~ ), excluindo o conectivo "\lnot", com o conjunto designado D é igual a uma álgebra booleana no seguinte sentido:

(#) uma fórmula phi (expressa na linguagem com assinatura (meet, join, arrow, ~)) é válida com respeito a (TA_sub, D) iff é válida com respeito a uma álgebra booleana.

Agora, um dos principais resultados do trabalho de vocês, Teorema 8.21 é o seguinte." Todos os axiomas (daí todos os teoremas) do ZFC, quando restritos a línguas ZF puras Lp(TA) (ver Definição 7.2), são válidos em V(TA), para cada A. ". 

($) Note que a Definição 7.2 diz que a linguagem ZF pura não contém o conectivo "\lnot", ou seja, os únicos conectivos são os conectivos de TA_sub.

Combinando (#) e ($) dissemos isso: Teorema 8.21 é equivalente ao conhecido resultado "todos os axiomas (daí todos os teoremas) de ZFC são válidos em V(B), para cada álgebra booleana completa B".

Infelizmente, não há nenhuma prova no paper de que esta equivalência não seja correta. Em outros termos, embora as estruturas twisted pareçam interessantes, elas não fornecem, no paper, novos modelos de ZFC.

(2) Não existe nenhum Corolário 11 (nem Theorem 9 e 4) no paper de Loewe e Tarafder. Provavelmente o corolário que você queria mencionar é o Corolário 5.2 (na página 10); a versão publicada deste artigo está anexada a este correio. Este corolário apenas diz o seguinte:

"O fragmento livre da negação de ZF é válido em V(PS3)".

Existem casos de Axioma de Separação, contendo negação, que não são válidos em V(PS3)! Como podemos entender isso de forma errada quando Sourav é um dos autores do artigo?
Por essa razão  uma estrutura a valores em PS3 não pode fornecer modelos de ZF completo. Deve necessariamente haver algo errado no segundo resultado principal Teorema 9.4!

Saudações,
Sourav e Giorgio

Marcelo Esteban Coniglio

unread,
Dec 18, 2019, 12:04:50 PM12/18/19
to Giorgio Venturi, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Prezados Sourav e Giorgio

Muito obrigado mais uma vez pelas observações. No entanto, infelizmente tem alguns erros de argumentação que acabam invalidando as mesmas.

Antes de prosseguir, gostaríamos de passar a limpo os objetivos das suas críticas, (1) e (2).

A crítica (1) visa mostrar que nosso primeiro resultado principal (Theorem 8.21), que estabelece que os twist-valued models sobre LPT0 satisfazem ZFC, seria trivialmente obtido do resultado clássico descrito no livro de Bell, de que os Boolean-valued models satisfazem ZFC. Isto é resumido na seguinte frase da sua última mensagem:

[começo da citação]

<<Teorema 8.21 é equivalente ao conhecido resultado "todos os axiomas (daí todos os teoremas) de ZFC são válidos em V(B), para cada álgebra booleana completa B".>>
[fim da citação]

A crítica (2) aponta um suposto erro no nosso segundo resultado principal (Theorem 9.4), que estabelece que os twist-valued models sobre a lógica (PS3,*) satisfazem ZFC. A razão seria simplesmente que V(PS3) é modelo do fragmento sem negação de ZF, e não de ZF completo (com negação), estabelecido no Corolário 5.2 do paper de Loewe e Tarafder. Isto é resumido nas seguintes frases da sua última mensagem:

[começo da citação]
<<Este corolário [5.2 do paper Loewe-Tarafder] apenas diz o seguinte:
[fim da citação]

"O fragmento livre da negação de ZF é válido em V(PS3)".

Existem casos de Axioma de Separação, contendo negação, que não são válidos em V(PS3)! Como podemos entender isso de forma errada quando Sourav é um dos autores do artigo?
Por essa razão  uma estrutura a valores em PS3 não pode fornecer modelos de ZF completo. Deve necessariamente haver algo errado no segundo resultado principal Teorema 9.4!>>

A primeira coisa que tentamos explicar na mensagem anterior é que as críticas (1) e (2) são (classicamente) contraditórias.
Ou seja: não dá para sustentar as duas críticas ao mesmo tempo. A explicação é simples: o argumento apresentado para "provar" (1) pode ser aplicado, mutatis mutandis (e a prova disto segue abaixo), para "provar" a seguinte variante da sua afirmação acima:

Teorema 9.4 é equivalente ao conhecido resultado "todos os axiomas (daí todos os teoremas) de ZFC são válidos em V(B), para cada álgebra booleana completa B".

Se assumimos que os resultados do livro de Bell são corretos (acho que concordamos nesse ponto), então a crítica (2) (que afirma que o Tteorema 9.4 não vale) é falsa. Logo, (1) e (2) são inconsistentes.

[Só pra constar: como é que aplicamos os seus argumentos de (1) mutatis mutandis para PS3 e (PS3,*)? Muito simples: a conjunção e disjunção de PS3 coincidem com a de LPT0. Dado que PS3 tem bottom 0, o termo x => 0 define a negação forte ~x de LPT0. Assim, as operações das estruturas twist de PS3 para a conjunção, disjunção e negação forte são as mesmas daquelas consideradas em (1). Com relação à implicação => de PS3, diferente daquela de LPT0, quando passamos para as estruturas twist, a primeira coordenada da implicação nas twist para PS3 coincide com a primeira coordenada da implicação nas twist para LPT0 (sendo nos dois casos a implicação Booleana das respectivas primeiras coordenadas). Isso mostra que as operações consideradas no argumento em (1) para LPT0 também se aplicam para PS3. E dai para (PS3,*), dado que a negação paraconsistente * é a mesma de LPT0.]

Visto que não dá para fazer as duas críticas simultaneamente, e esperando não cansar os outros leitores desta lista com esta longa discussão, apresentaremos a seguir breves considerações para mostrar que nenhum dos argumentos dados na sua mensagem em favor de (1) e (2) procedem.

Comecemos por (2), que é mais fácil de analisar por se tratar apenas de um erro de interpretação da terminologia. O Corollary 5.2 do paper de Loewe-Tarafder diz exatamente:

COROLLARY 5.2. For any filter D, all axioms of NFF-ZF are D-valid in V(PS3).

Esclarecendo para os demais leitores, D é o conjunto de valores distinguidos para analisar os modelos. Pode ser D={1} ou D={1, 1/2}.
Por outro lado, NFF é definido na pag. 193 (pag. 2 do pdf) como sendo o conjunto de "negation-free formulas". Tecnicamente, e como consta nesse trecho do artigo, é a álgebra de fórmulas obtida das atômicas com os quantificadores universal e existencial, conjunção, disjunção, implicação e  bottom.  Assim, a negação clássica pode ser definida em NFF (embora o nome possa levar a enganos). O artigo esclarece isso em várias oportunidades. Por exemplo, no fim da pag. 193 (pag. 2 do pdf) é afirmado:
"if the logic we are working in allows to define negation in terms of the other connectives (as is the case, e.g., in classical logic), then every formula is equivalent to one in NFF". Ou seja: negation-free fórmulas sobre a lógica clássica tem negação clássica (embora não primitiva). Não paraconsistente ou paracompleta, mas clássica.

E o que significa então a NFF-ZF do Corollary 5.2? Obviamente é a teoria de conjuntos ZF da lógica clássica expresada na linguagem NFF. Sem negações clássicas (explícitas), mas representando elas como ~p = p -> F onde F é o símbolo do bottom. Logo, NFF-ZF coincide com ZF clásico completo, com negações clássicas (mas não paraconsistentes ou paracompletas), e então o Corollary 5.2 afirma, *sim*, que V(PS3) é modelo de ZF clássico, completo, sem negações paraconsistentes (mas com negações clássicas).  Para constatar estas afirmações reproduzimos o final do primeiro parágrafo da pag. 197 do paper de Loewe-Tarafder (pag. 6 do pdf):

We write NFF-Separation and NFF-Replacement for the axiom schemes where we only allow the instantiation by negation-free formulas, and we write NFF-ZF− and NFF-ZF for negation-free set theory using these schemes [ZF− é ZF menos Foundation]. We emphasize once more that in settings where negation can be defined in terms of negation-free formulas (such as classical logic), this coincides (up to provable equivalence) with standard Zermelo-Fraenkel set theory.

A última frase é definitiva: NFF-ZF coincide (a menos de linguagem) com ZF completa (com negação). Logo, repetindo mais uma vez, o Corollary 5.2 prova que V(PS3) é um modelo de ZF, incluindo NFF-Separation (que é equivalente o axioma de Separação clássico, como consta na frase acima extraída do texto original).
Nós mostramos no nosso artigo que é possível generalizar PS3 (que é uma estrutura twist definida sobre a álgebra de Boole de 2 elementos) para estruturas sobre qualquer álgebra de Boole completa, e todas elas (incluindo PS3) satisfazem *também* o Axioma da Escolha (ver Teorema 9.4).

Vamos agora à crítica (1): a crítica aponta a suposta trivialidade do Theorem 8.21, que estabelece que os twist-valued models sobre LPT0 satisfazem ZFC. Isto seria obviamente deduzível do resultado provado em Bell para Boolean-valued models. Vamos ao seu argumento:

[começo da citação]
<<A estrutura twisted para LPT0 sobre uma álgebra booleana A é uma estrutura TA = ( TA, meet, join, arrow, ~, lnot ), onde as operações meet, join, arrow, e ~ são definidas de forma que a primeira coordenada é igual à do meet, join, arrow, e ~ da álgebra booleana A (Definição 4.6; p8). O conjunto designado de TA é D = {(1, a) : onde a é qualquer elemento de A e 1 é o elemento superior de A}.

Nós afirmamos que a subestrutura TA_sub = ( TA, meet, join, arrow, ~ ), excluindo o conectivo "\lnot", com o conjunto designado D é igual a uma álgebra booleana no seguinte sentido:

(#) uma fórmula phi (expressa na linguagem com assinatura (meet, join, arrow, ~)) é válida com respeito a (TA_sub, D) iff é válida com respeito a uma álgebra booleana.>>
[fim da citação]

Aqui encontramos um problema técnico insalvável. O reduto (não subestrutura) TA_sub de TA não é uma álgebra Booleana, de maneira alguma: não tem elemento máximo, condição sine qua non para ser uma álgebra de Boole. Por sinal, (z1,z2) join ~(z1,z2) = (z1,z2) join (~z1,z1) = (1, z1 ^ z2) (onde "1", "~" e "^" denotam o elemento máximo, o complemento Booleano e o ínfimo em A respectivamente). Mais ainda, se fosse verdade que TA_sub é uma álgebra de Boole, então tomando A={0,1} (a álgebra de Boole de 2 elementos) então TA_sub teria como domínio (1,0), (1,1) e (0,1), isto é, seria uma álgebra de Boole de 3 elementos (por sinal, neste caso TA_sub é isomorfo a PS3).

Continuado com o raciocínio, a afirmação (#) parece não ter sentido: qual seria a álgebra Booleana? TA_sub?

A conclusão obtida por vocês a partir de (#) e da constatação ($), de que o que nós chamamos de "linguagem pura de ZF" é a o fragmento sem negação paraconsistente (isto é correto), é a seguinte:

[começo da citação]

<<Combinando (#) e ($) dissemos isso: Teorema 8.21 é equivalente ao conhecido resultado "todos os axiomas (daí todos os teoremas) de ZFC são válidos em V(B), para cada álgebra booleana completa B".>>
[fim da citação]

E nós continuamos a perguntar: qual é a álgebra de Boole B? TA_sub?

Enfim, achamos que a discussão está ficando um pouco longa e talvez entediante para as demais pessoas. Pode se questionar se os twist-valued models são interessantes ou não, ou se poderia ser simplificada nossa prova do Teorema 8.21. Mas não deveria haver dúvidas da correção do Teorema 9.4, dado os argumentos exibidos acima.

Resumindo: no nosso artigo apresentamos uma expansão dos Boolean valued models com uma negação paraconsistente, permitindo considerar conjuntos "inconsistentes". O fato de ter uma família de modelos baseada nas álgebras de Boole completas permite, por exemplo, o estudo do forcing na teoria paraconsistente ZF-LPT0. isso é um ganho com relação ao (excelente) trabalho pioneiro de Loewe e Tarafder, no qual só uma estrutura paraconsistente estava  a disposição.

Agradecemos a vocês pela análise minuciosa e aguda que fizeram, que nos obrigou a repensar e justificar melhor a importância da nossa proposta. Este tipo de discussões acadêmicas sadias é muito edificante.

Um grande abraço

Walter e Marcelo

Marcelo Esteban Coniglio

unread,
Dec 18, 2019, 12:09:52 PM12/18/19
to Giorgio Venturi, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caros,

Na nossa  mensagem anterior, o sinal de  [fim da citação] da segunda citação deveria ir logo após a frase

"Por essa razão  uma estrutura a valores em PS3 não pode fornecer modelos de ZF completo. Deve necessariamente haver algo errado no segundo resultado principal Teorema 9.4!>>"

Abraços

Walter e e Marcelo
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