E agora?

[Vanessa Ferreira Souza]

O que ninguém te conta, a vida depois da depressão e depois dos antidepressivos.

 

Inicio esse texto a contar que ele só vai existir porque achei que seria o mínimo apoio para quem deixa os antidepressivos e se julga (com apoio médico ou não), curado.

A verdade é que a depressão é uma doença sem volta, não me venham com merdas de que tem cura … porque eu realmente e infelizmente não acredito e nem vivencio isso.

Tudo começa cm uma possível depressão há 6 anos atrás, primeiro tratamento com psicóloga por motivos que nem valem a pena serem ditos, um encaminhamento para um psiquiatra e tcharan … Um diagnóstico para te fuder basicamente a vida …

Dai então o percurso cada vez mais obscuro, cheio de incertezas, de medo, e do principal… TABUS. Além de medicações, e dramasssss, muitos dramas. A partir do primeiro comprimido que se mete a boca ficas logo a achar que tudo o que está em volta de ti é relacionado com o teu estar.

A minha história conta com pessoas a volta que se fingem interessadas em saber como tu estas, até com o notar de uma ligeira pena … Mas aviso, dificilmente alguém com quem falas que não tem depressão, saberá te apoiar ou minimamente vai acreditar que a tua história/doença/estado é real.

A verdade é que não há nenhum exame específico para saber se alguém está com depressão, não é uma falta de ferro ou glóbulos que acusam em uma página de papel de laboratório. Por isso, alguém ( em tese uma psicóloga) diz-te que estás em depressão e bora lá começar a tratar.

Confesso que desde que me foi diagnosticada, tenho mil e uma dúvidas se isso é realmente o que eu tenho …porque ninguém nunca me provou nada.

Cabisbaixa, triste, nervosa, irritada… Ok, isso há aqui para dar e vender .. Mas de todo não sinto que a medicação melhorou, apenas consigo viver sem fazer os dramas que fazia antes.

O tempo passou, fiquei de saco cheio de ser a pessoa em depressão, nada melhorava, nada mudava, nada felicitava, nada ficava mais alegre … mais do mesmo! Então decidi que por algum raio queria começar o desmame, já a tempos nessa merda e mais do mesmo.

Uma pessoa apática, com dificuldade de raciocínio, muito mais calma é verdade …. Mas muito mais tonta também, tiha uma capacidade enorme de digerir os problemas e engolir tudo o que me fazia mal ou bem u médio. Exato, a medicação tem esse poder.

Nada doía, mas também nada era demasiado feliz, nem alegre, era só uma pessoa no automático … Ninguém era mal tratado, tudo era digerido facilmente, inclusive os problemas e dramas, afinal eles não existiam.

Passando para a parte do pós medicação que ninguém me contava … O voltar a ser EU, sinto que o deixar da medicação (feito com um desmame bem elaborado) está a ser muio conturbado … É nítido que os parafusos aqui estão todos a solta, a pessoa que eu sou voltou a sair, já não papa merdas, é extremamente impaciente e irritada… Além de que ainda não sabe de todo lidar com as frustrações, até mete medo …

Será que vai ser isso daqui pra frente ?

Não quero voltar a ser essa pessoa impaciente e talvez até má, mas me sinto em um pós parto em que tenho que aprender tudo sozinha, nãoo tenho ajuda porque afinal as pessoas nem sequer percebem o que é que se passa.

A agressividade tem sido presente,  a irritação é surreal, o choro não cessa.

O que fazer? Voltar a ser uma cobaia da medicação e viver assim inóspita até o dia em que bater com as botas ou tentar me aguentar sem a medicação e rezar para isso tudo ir ao sítio e eu voltar a sentir coisas boas, sensações agradáveis sei lá .. vontade de viver !  Isso demora? Acontece sequer ? Voltas a ser uma humana normal?  Ou digna de não só chorar ou pensar porcarias …. ???

 

 

[Ivana]

Olá Vanessa, obrigado por participares com o teu testemunho. Abordaste temas deveras importantes, que ilustram bem a realidade e o percurso de quem é diagnosticado com depressão.

Acredito que já estás a meio caminho para qualquer solução, pois conseguiste identificar os "problemas". Existe na depressão uma parte mais biológica, a desregulação dos químicos existentes no corpo, e a parte puramente psicológica (que acredito ser a causa da desregulação a nível biológico). É necessário tratar a parte biológica, pois o cérebro é biológico. A finalidade de todos os medicamentos que tomamos é aliviar os sintomas, não tratar. Ao colocar alguma ordem hormonal, dá espaço à mente para agir, contudo a meio gás. A mente fica limitada pelas consequências dos medicamentos que se toma. Como bem referiste, ficas em piloto automático. Tomar ou não tomar é optar pelo menos mau. Ao contrário do que os médicos dizem, acredito que também os medicamentos nos estragam a vida, apenas de uma forma diferente. No entanto, acho que não devemos parar até que os profissionais de saúde nos digam para o fazer, não só porque os efeitos do desmame são severos mas também porque a desregulação de que falei tem que ser controlada, sob risco de se agravar ainda mais e condicionar ainda mais a mente e por conseguinte a depressão. 

O segredo está em manter a medicação enquanto for biologicamente necessária, e fazer um trabalho paralelo de tentar perceber as causas e como contornar essas causas e lidar com os efeitos da depressão. Por vezes a ajuda de psicólogos não leva a lado nenhum  e é demasiado lenta. Acho que vale sempre a pena tentar, pois ajuda muito a esclarecer dúvidas e orienta-nos para o caminho mais adequado. Porém, o trabalho é nosso. Mesmo com ajuda externa, o trabalho é individual e tem que ser feito por nós, ninguém o fará por nós, acredite. 

Esse trabalho consiste em analisarmo-nos profundamente de forma a identificarmos o que nos está a perturbar e as suas origens. Só se pode melhorar/curar o que se conhece. E engane-se quem acha que se conhece bem, pois a verdade é que somos um mistério até para nós próprios. Ajuda muito ler sobre o tema e principalmente sobre emoções e sentimentos. À medida que fores tomando consciência do que se passa contigo e das suas causas, vais poder começar a encontrar formas de relativizar, contornar ou encontrar "muletas". É um processo para toda a vida, mas que melhorará progressivamente a tua qualidade de vida. 

Tens também que desmistificar a depressão. Não é como uma gripe, mais como uma diabetes. No início é complicado, mas à medida que aprendes a controlá-la, fazes uma vida normal, mesmo que ela não desapareça. 

Eu não penso na depressão como uma verdadeira doença, mas um estado. Resulta da incapacidade que um indivíduo tem em processar o que vai acontecendo com ele. Porque a mente é um labirinto tão intrincado onde até o dono se perde, e tal como o oceano, só se conhece a parte superficial. Há monstros nas profundezas, reais ou imaginários, que só se vão conhecer se mergulharmos fundo.

Espero ter ajudado. 

[Vanessa Ferreira Souza]

Obrigada pela clareza das palavras, foi muito gratificante ler esse apoio ! De coração ♥

[Stephane Ketlin Ribeiro Moreira de Souza]

Nossa Ivana, gostei das palavras que disse. Esta parte foi minha preferida e colocou realmente muito muito bem <3 "Eu não penso na depressão como uma verdadeira doença, mas um estado. Resulta da incapacidade que um indivíduo tem em processar o que vai acontecendo com ele. Porque a mente é um labirinto tão intrincado onde até o dono se perde, e tal como o oceano, só se conhece a parte superficial. Há monstros nas profundezas, reais ou imaginários, que só se vão conhecer se mergulharmos fundo." Exatamente isto! <3 Eu meditava e me ajudava demais a silenciar minha mente, até isso parei... minha auto-sabotagem sempre à tona desde sempre, em toda minha vida... =(

Com Meus Melhores e Mais Sinceros Cumprimentos,

Stephane Ketlin Ribeiro Moreira de Souza.

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