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- Dois “conflitos de interesse” neste boletim. Serão citados conforme aparecerem.
- O especial que a Veja traz sobre a China é muito interessante. Tem
muitas informações, histórias, muita empolgação com “empreendedorismo”, mas
até trata das contradições políticas, das duras condições de vidas de operários
e as violentas expulsões de moradores para abrirem caminho aos arranha-céus
e especulação imobiliária. As comparações trazem as obsessões internas das
revistas: mensalidade nas universidades públicas por exemplo. Mas apontam
como crédito barato e investimentos em ciências e tecnologia são fundamentais
para o crescimento chinês. A revista deveria um dia ir ouvir o cientista
Leopoldo de Meis, para ver como enquanto a China importa cérebros e financia
seus cientistas, nós estamos jogando projetos científicos de qualidade no
lixo e exportando doutores do país. A edição do caderno tem umas falhas,
repete dados e temas, perdi a conta de quantas vezes é citada a inter-dependência
EUA-China, e as pressões sobre meio ambiente e preço das commodities. É que
também ninguém lê estas coisas inteiras. Outras duas falhas do especial é
que é pouquíssimo analisada, fica só no plano empresarial, e não político,
as relações Brasil-China. Tinha que ter no mínimo um histórico delas, analisando
a política recente. E a revista não traz uma matéria mais ampla sobre violação
de direitos humanos. Existem citações a repressão no campo e muitas contra
a liberdade de imprensa. Mas não há nada sobre as execuções de penas de morte
em série no país. Seria legal, mesmo já imaginando a carga ideológica, que
poderia ser reduzida ao menos um pouquinho, né?, que a revista fizesse um
especial pé na estrada deste pelo próprio Brasil. Como está agora, a redação
Veja já andou mais pela China do que pelo nordeste.
- A editora em que eu trabalho, a Boitempo, está lançando um extenso e interessante
livro de entrevistas do jornalista franco-espanhol Ignacio Ramonet com Fidel
Castro. O lançamento estava programado para o aniversário de 80 anos de Castro,
e a divulgação acabou antecipada por conta do anúncio de sua doença. Por
isso, acompanhei bastante as matérias sobre o assunto na última semana. Independente
da posição de um veículo ou outro sobre Cuba, o Mais! publicou uma
boa matéria de John Lee Anderson A ilha do
dia anterior. E a matéria de capa da Carta Capital, escrita por
Antonio Luiz M. C. Costa, "Fidel Castro no ocaso" é muito ampla e equilibrada,
sobre o legado de Fidel, enfim, são peça jornalísticas. A questão não é a
Veja ser contra Fidel e Cuba. É fazer pastiche de jornalismo, sonegar
informações, gerar uma paródia, negar qualquer informação que vá contra a
sua tese, enfim, distorcer e forçar a barra. E não se precisa disso para
criticar Fidel, ainda mais do ponto de vista da Veja. Vários dos pontos
citados são pertinentes. Mas parece que lá, quanto mais tosco, melhor. Um
pouco dos “melhores” momentos:
Olha esta legenda:
“Fidel discursa na Argentina, no mês passado: um ator que viveu para o
papel que criou para si próprio.”
Esta frase é extraída da declaração de uma exilada cubana que está na matéria,
obviamente uma declaração “imparcial”, que na legenda Veja retira das aspas
e assume. É reduzir a muito pouco um personagem histórico deste tamanho.
Olha este trecho:
“A Cuba de Fulgencio Batista era, em muitíssimos aspectos, melhor para
os cubanos que a de Fidel. Antes da revolução, os cubanos usufruíam a quarta
maior renda per capita da América Latina. De lá para cá, caiu para a 29ª
posição.
(...)
Se tivesse seguido a vocação turística das ilhas caribenhas e explorado os
benefícios oferecidos pela geografia – a paisagem deslumbrante e a proximidade
dos Estados Unidos-, Cuba provavelmente seria tão rica quanto a vizinha Bahamas,
arquipélago cuja renda per capitã é seis vezes maior que a Cubana.”
Bem, também não havia liberdade política na época de Batista, muito mais
pródiga de registros de tortura que o período de Fidel (hoje, o único registro
de tortura na ilha, de acordo com a Anistia Internacional, acontece em Guantánamo,
no campo de prisioneiros norte-americano). Veja sonega no texto que
Cuba tem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) melhor que o do Brasil, mortalidade
infantil mais baixa que a norte-americana e a população com melhor índice
educacional da América Latina. Além disso, o perfil, em termos de tamanho
de Cuba é muito mais semelhante ao da Republica Domincana, Jamaica ou Haiti
do que o das Bahamas. Todos estes são países com situações sociais longe
de exemplares, e com muita pobreza. O Haiti, cujos governos tiveram na maior
parte do período pouca democracia e boas relações com os Estados Unidos,
e nunca foi comunista, é um estado falido. Medir um país, especialmente socialista,
apenas pelo critério de renda per capita impõem distorções e Veja
sabe disto. Aliás é limitado medir qualquer país apenas por renda per capita.
Há a distribuição da renda, poder de compra etc...
“O grande feito de Fidel foi pegar uma ilha caribenha, famosa pelos cabarés
e charutos, e a colocar no centro das preocupações internacionais.”
“Os historiadores do futuro talvez venham a qualificar Fidel Castro entre
os mais sangrentos farsantes de todos os tempos.”
“Um mito persistente é o de que a hostilidade americana empurrou o jovem
guerrilheiro para os braços soviéticos. A verdade provavelmente é mais prosaica:
o ditador cubano é um demagogo cujo único compromisso é a própria sobrevivência.
Foi sobretudo para poder levar adiante seu projeto de uma ditadura personalista
que Fidel ofereceu seus serviços a Moscou. "Desde o ataque de Moncada, ele
começou a dizer a seus colegas que a revolução deveria ter apenas um líder",
escreveu o americano Brian Latell no livro After Fidel (Depois de Fidel).”
“Talvez”, “historiadores do futuro”, “verdade provavelmente”. Os trechos
acima são tão fracos de sustentação que tem que se apoiar nestas construções
bizarras em textos jornalísticos. É o novíssimo jornalismo que Veja
pratica. O que Veja chama de “mito” é um dos fatores considerados
pelos historiadores sérios que analisam o assunto. Não é o único. Mas a análise
da Veja é personalista e tirada do fundo do colete.
“A imprensa cubana, diante da doença de Fidel e da troca de comando, limita-se
a publicar mensagens de pronto restabelecimento enviadas ao comandante. É
o tipo de controle rígido da informação que alguns amigos de Fidel tentam
implantar no Brasil.”
A informação está bem controlada no Brasil. Toda a mídia grande reagiu coordenadamente
contra a proposta de obrigatoriedade de diploma de jornalista. Toda a mídia
grande não achou importante a censura prévia executada por decisão do Tribunal
Superior Eleitoral em cima da Revista do Brasil, financiada por um
conjunto de sindicatos e com conteúdo produzido pela Agência Carta Maior.
Atenção: censura prévia. Pedida pela coligação PSDB/PFL, que não creio serem
os amigos de Fidel citados na matéria. A liberdade de imprensa no Brasil
parece ser atributo exclusivo de empresas privadas financiadas por grandes
anunciantes e pelas amizades governamentais. Sindicatos não podem se meter
a financiar publicações? A informação no Brasil seria mais diversa se houvesse
uma presença maior, ao lado da imprensa comercial, de uma forte imprensa
sindical, e também de sistemas públicos federais e estaduais (com autonomia
em relação aos governos e forte presença da sociedade civil) de TV, Rádio
e Agência de Notícias, ampliando e institucionalizando o trabalho que, por
exemplo, o ex-executivo da Abril Eugênio Bucci desenvolve na Radiobrás. Teríamos
mais diversidade, e menos controle de informação.
- A curiosa convivência, na mesma edição, de diferentes tratamentos jornalísticos
para a China e Cuba, não só em extensão, mas principalmente em tom, para
países que tem problemas políticos semelhantes, mostra que na visão estritamente
capitalista de mundo a grande liberdade que interessa, de fato, é a de ganhar
e gastar dinheiro.
- Veja aumentou a diversidade de posições nas cartas publicadas sobre
o conflito do Oriente Médio, inclusive publicando cartas de leitores de origem
árabe. A matéria desta semana é bem melhor que a da semana passada. Fica
aqueles “esquecimentos” convenientes: em uma semana foi por terra a tese
que estava na revista semana passada, de que Israel estava isolando politicamente
o Hezbollah no Líbano (e que então já era ridícula). E tenta relevar um pouco
a questão das vítimas civis: Se por uma lado o Hezbollah se esconde entre
os civis (em parte porque é uma resistência irregular), por outro se reconhece
que isso é consequência de bombardeios a distância de Israel. Assim, com
um jornalismo que fica mudando de rumo para não admitir os erros, não consigo
concordar com estas duas cartas publicadas na revista:
“VEJA tem sido um oásis na imprensa nacional pela maneira como aborda
a situação da guerra entre Israel e o Hezbollah. Vem sendo imparcial, ponderada
e responsável, passando a seus leitores o diagnóstico correto de todo o conflito,
diferente de tudo o que tenho lido nas últimas semanas em grandes veículos
de imprensa ("Existe guerra justa?", 2 de agosto).
Flávio Stanger
Rio de Janeiro, RJ”
“Nenhum órgão da imprensa, até este momento, descreveu com tanta clareza,
detalhando fatos reais, o que só não vê quem não quer: quem começou a guerra
foi o Hezbollah. Israel está respondendo ao ataque inicial, principalmente
porque esse grupo terrorista vem sendo financiado pelo Irã e pela Síria,
que querem que Israel vá pelos ares. Por que o Líbano permitiu que o Hezbollah
ocupasse suas fronteiras?
Marcia Algranti
Rio de Janeiro, RJ”
A única carta sobre o artigo de Alan Dershowitz, o elogia. Vamos acreditar
então que ninguém mandou carta contestanto aquela abominação.
- A proposta de constituinte feita em duas páginas pela revista Veja não
é matéria, sequer editorial: é um programa de partido político. De uma arrogância
e usurpação inacreditável.
- Veja publica duas páginas assinadas por Jerônimo Teixeira sobre
o escritor paquistanês Tariq Ali, que é ex-editor, e cuja mulher, Susan Watkins
é a atual editora da revista New Left Review, da Verso, editora inglesa
de esquerda, que tem vários títulos lançados no Brasil pela Boitempo, onde
eu trabalho. É um “perfil” de Ali. O gracioso título: “O perfeito idiota
paquistanês”. Começa assim:
“No mercado internacional de idéias, o antiamericanismo vende bem. Não
requer originalidade nem brilho – apenas uma cantilena contra George W. Bush
e o imperialismo. Há intelectuais que ganham a vida explorando esse filão.”
Eu fiz uma paródia:
“No mercado nacional de idéias, o antiesquerdismo vende bem. Não requer
originalidade nem brilho – apenas uma cantilena contra Luís Inácio Lula da
Silva e o socialismo. Há intelectuais (e jornalistas) que ganham a vida explorando
esse filão.”
Fica para o leitor os perfis de quais pessoas poderiam ter o começo acima.
A matéria da Veja traz aquele clássico moralismo ridículo “como o
sujeito é de esquerda e vive bem em um bairro bacana de Londres, foi estudar
em Oxford e não na Etiópia, ou no Iraque?”. Ser de esquerda, até onde eu
sei, não é igual a fazer voto de pobreza. Eu não compartilho de muitas das
posições de Ali, principalmente as referentes ao conflito nos Bálcãs. Mas
o que irrita é que as coisas funcionam assim para Veja: Tariq Ali, ainda
de esquerda, crítico feroz da guerra do Iraque, vem para Festa Literária
de Parati (Flip), então porrada nele, inclusive no julgamento de seus romances.
Cristopher Hitchens, vem para a mesma Flip, ex-esquerda, defensor da guerra
do Iraque, páginas amarelas simpáticas para ele. Itamar, dez anos sujeito
ridículo, louco de hospício. Anuncia apoio à Alckmin, tomou rumo na vida.
É o tribunal dos pequenos juízos e juízes da Marginal Pinheiros.
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