Atualizações ao longo da semana (na medida do possível), espaço para comentários (agora ativados!) e outros assuntos mais edificantes que a Veja...No blog http://papelotes.blogspot.com/
- Da Carta ao leitor, comemorando a edição 2000 da revista:
“Ao lançarmos um olhar sobre o tempo que nos separa da criação de VEJA, sobressai a constância, semana após semana, na obediência a certos princípios que definem o que se chama de "linha da revista". Um deles é a busca incessante – muitas vezes até temerária – pela informação exclusiva, confiável e independente. Outro é a preocupação em fornecer ao leitor análise clara e honesta sobre os fatos relatados, contextualizando-os no tempo e no espaço.
O Brasil é o único país do mundo em que uma revista semanal de informação é a revista de maior circulação. VEJA alcançou esse posto graças à aprovação de seu jornalismo por milhões de leitores e milhares de anunciantes, com os quais forma uma comunidade unida na defesa da democracia representativa, das liberdades individuais e da livre iniciativa.”
“Análise clara e honesta sobre os fatos relatados”. Beleza então.
No especial sobre suas 2000 capas, diz o seguinte:
“Uma grande revista precisa ter coração, consciência e pontos de vista francos. Precisa ter isso tudo em cada uma de suas edições durante décadas. A consistência é qualidade nobre.”
Tá certo, então...
- No especial, Veja tenta distorcer uma das maiores polêmicas da sua história. A cobertura da morte de Elis Regina. Para isso a ofende de novo com um quadro intitulado “a cantora do contra – como Veja”. Não. Elis não era simplesmente “do contra”, ainda que se definisse assim, de forma modesta... Muito menos como a Veja.
- Em outro quadro, Veja lembra a capa e a pergunta de dar uma “banana” para o mercado americano foi coragem ou estupidez. “A realidade deu a resposta: estupidez.” Engraçado é que é difícil achar meia-dúzia de analistas internacionais que subscrevam isso. Até W. Bush falou que os países não podem dar de graça que os EUA vão querer abrir mercados para eles. Veja diz que as questões comerciais se tornaram muito sérias e complexas para ficarem nas mãos do Itamaraty (que como todo mundo sabe, é formado por gente muito burrinha...) e que houve predomínio do ideológico sobre o racional na política externa. Acho que é o contrário. Veja que sofre da síndrome de “Marquinhos” (ver Sobrinhos do Athayde...)
- A revista está paz e amor com o governo nesta
edição. Fala de Odílio
Balbinotti, o que foi sem nunca ter sido ministro da Agricultura, mas
cita os
problemas que FHC também teve com o PMDB. E elogia o pacote de Lula
para a
educação. Fofo. É claro que trata-se de coincidência (mesmo), mas é
também a
primeira vez em muuuuito tempo que surge um anúncio de estatal ou do
governo
federal na revista. É um de página dupla do Banco do Brasil.
- A matéria “Eu sou capitalista” dae Juliana Linhares e Marcelo Carneiro, sobre as atividades de lobbista de José Dirceu, é ótima! José Dirceu é um daqueles assuntos paradigmáticos, como Guerra do Iraque, Cuba etc...Quem ainda acha que o cara é de esquerda, ou luta por ela, ou é ingênuo ou está de engodo também. . Quem acha que no governo ele era o contraponto de “esquerda” de Pallocci, não entendeu nada...A grande causa de José Dirceu, e isso faz muito tempo, é José Dirceu. E a lógica fisiologista-arrivista de parte (grande) do PT, como os citados na matéria Candido Vacarezza (o que negocia apoio de Maluf para Marta em 2008), Arlindo Chinaglia, eleito presidente da Câmara para tentar aprovar a anistia de Dirceu, e Carlos Zaratini. A chegada da anistia dele no congresso é aguardada com água na boca pela oposição ao governo Lula. Porque irá consumir o capital político que ele ganhou no segundo turno, desmoralizando o governo, e os dará uma bandeira excelente, porque corretíssima. Pra que? Para uma ala do PT recuperar seu capo e Dirceu sonhar em ser governador de São Paulo ou presidente do Brasil, o que não será, jamais. Ridículo...
- A matéria de Marcelo Bortoloti sobre o drama da modelo Bia Furtado, queimada em um ônibus incendiado por traficantes no Rio de Janeiro, é emocionante.
- No seu artigo desta semana, Stephen Kanitz defende a queda dos juros, “ao lado” de Dilma Rousseff, para redução dos ganhos da renda fixa, vulgo, rendimentos de juros por conta da alta taxa de juros. “O custo do capital no Brasil é alto porque os juros da dívida interna são altos”. Kanitz escreve que com a queda dos juros, o capital no Brasil deixará de ter sua “estabilidade de funcionalismo público” (a expressão é minha, não dele) atrelado a Selic, sendo forçados a investir em projetos reais. Sensacional até aí. Kanitz explica porque os juros altos impedem o crescimento do Brasil (e o aumento da taxa de investimento, seja pública ou privada). O engraçado é quem ele culpa pelos juros altos: os economistas desenvolvimentistas, começando por uma leitura no mínimo simplista das idéias de Celso Furtado (e ignorando completamente o contexto delas...). Os desenvolvimentistas defendem a queda de juros há anos, contra os economistas associados ao setor financeiro, que defendem, e lucram, com as altas taxas. É bacana que Kanitz não invista em renda fixa por razão ética, como diz no texto. Ele poderia até relacionar a necessidade do estado financiar seu déficit com os juros altos, e a (possível) contradição dos desenvolvimentistas entre pedir mais gastos públicos ao mesmo tempo de queda de juros. Mas não é disso que o artigo trata. Ainda assim, este artigo de Kanitz, vindo de onde vem e publicado onde está, já é uma evolução.
- Duas cartas de leitores desta semana, atacando índios, Funai, CIMI, Ibama etc.., chegando a chamá-los de “terroristas” e o escambau vêm de cidades do Mato Grosso: Colíder e Vila Bela da Santíssima Trindade. São cidades de fronteira agrícola, onde grileiros, desmatamento, trabalho escravo e homicídios agem em nome do “prugresso”, aqui em aliança com a “pós-mudernidade” da Faria Lima-Berrini. Isso não significa que estas pessoas estejam necessariamente associadas à isso. Seguem abaixo: “Pergunto,
muitíssimo indignado: até quando órgãos públicos como a Funai e o Ibama
serão
gerenciados por pessoas incompetentes? Num país onde não há governo
central, os
dirigentes de órgãos e autarquias deitam e rolam, praticando as mais
absurdas
estripulias. Desconsideram as leis e o mais elementar bom senso, como
ocorre
com o Ministério do Meio Ambiente na demarcação de áreas de preservação
sobre
fazendas produtivas. Até quando?
Fernando Nunes da Cruz
Colíder, MT
Funai, ONGs, Cimi.
Poderíamos chamá-los de
terroristas do meio rural brasileiro. A pretexto de proteger nossos
índios e
minorias, espalham mentiras, pobreza, fome e, principalmente, preservam
um
imenso pedaço do território brasileiro como reservas indígenas para que
países
do Primeiro Mundo nos tomem quando bem entender. Parabéns ao repórter
José
Edward pela clareza e imparcialidade.
Luciano Barbosa
Vila Bela da Santíssima Trindade, MT”
- Durante a semana, uma polêmica mobilizou
os blogs de Pedro Dória e Reinaldo Azevedo. O papa disse na sua
“exortação
apostólica” que o segundo casamento é uma “praga”, como na tradução
oficial do Vaticano do
latim para o português e como publicou e comentou a Folha de S. Paulo,
ou
“chaga” como defendeu Reinaldo Azevedo. Veja assumiu “chaga”
até na legenda,
mostrando como a vaidade do seu blogueiro tem contaminado a edição da
revista...Enfim, se é chaga ou praga, eu prefiro perguntar questões
mais
relevantes, como: seria tal opinião do papa baseada em suas
experiências
matrimoniais? Queria ele dizer que as coisas começam a ficar boas não
no
segundo, mas sim no terceiro, talvez no quarto casamento? Alguém que
nunca se casou quer dizer para a Dona Maria e o Seu João que eles tem
que agüentar
um parceiro que não amam, ou não suportam ou que batem nele, e que Deus
assim quer que seja? Que chaga...
- Poucos temas são
mais chatos e mais importantes
que sistemas de previdência. Antonio Ribeiro, de Paris, escreve “A
pensão
Viking” sobre o sistema sueco de previdência, baseado em poupanças
individuais,
como apregoa o neoliberalismo. Em tese, este sistema compensaria o
envelhecimento
da população. A lógica de “poupar hoje para gastar amanhã” faz sentido
perfeito
aplicada individualmente. Mas o sistema econômico não funciona assim. A
poupança feita hoje, para ser gasta amanhã, tem que estar lastreada na
economia
de amanhã. As aposentadorias sempre serão pagas pela atividade
econômica de
hoje, não de ontem. Seja através de impostos redistribuídos pelo Estado
(o
sistema brasileiro atual) ou de rendimentos dos recursos acumulados e
investidos pelo sistema financeiro (o sistema de contas individuais).
Uma das
diferenças do sistema é justamente quem controla a bolada, o Estado ou
o
sistema financeiro privado. Detalhe, a transição de um sistema para o
outro
custa uma fortuna e foi o que derrotou esta proposta, de W. Bush, nos
Estados Unidos.
“Na Suécia, aclamado estado de bem-estar social, a Previdência não
funciona
como um corretor de desigualdades. A contribuição previdenciária de um
banqueiro de Estocolmo não subsidia a aposentadoria de um pescador de
bacalhau.
Cada um recebe o que pagou.” Bem, eu adoraria que minha mãe
recebesse ao menos
metade do que pagou, mas FHC fez isso ser impossível (vide “fator
previdenciário). A Suécia, para começo de conversa, tem um sistema de
ensino
suficientemente igualitário para ser um país que as pessoas tem uma
“largada”
mais justa que o Brasil. Veja odeia a idéia de qualquer
solidariedade nacional
que possa dar cola à isto que deveria ser uma sociedade. Depois reclama
da
violência. Imagina o efeito de arrebentar-se a distribuição de renda
feita através
de programas de previdência...O sistema pode perfeitamente funcionar na
Suécia.
A previdência brasileira é cheia de absurdos, principalmente no
funcionalismo
público. Mas a discussão de reforma aqui beira o ridículo. Todos os
neoliberais
que discutem idade mínima de 65 anos, fingem que é a mesma coisa um
médico, um
advogado, um engenheiro, que tem ensino superior e começam a trabalhar
depois
dos 20 anos, e que tem expectativa de vida maior, e devem realmente se
aposentar mais tarde, com pedreiros, motoristas de ônibus, empregadas
domésticas e trabalhadores rurais que começam a trabalhar mais cedo,
tem
expectativa de vida menor e profissões desgastantes. Eles não têm dó
nem
negociam o sarrafo do aumento das desigualdades que propõem nas costas
dos
outros. O mesmo problema contamina a discussão da emenda 3 do projeto
da Super
Receita. A emenda propunha que auditores fiscais federais não
poderiam
apontar vínculos empregatícios entre empregados e patrões, mesmo diante
de
irregularidades. Somente a Justiça do Trabalhoé que estaria autorizada
a
resolver esses casos. O Estadão de sábado
publicou a
seguinte manchete “imparcial”: “Lula insiste em superpoder de fiscal”,
porque o
presidente vetou a emenda. Quem lê a matéria, parece que o problema só
trata de
profissionais liberais na Faria Lima. Na realidade a emenda acabaria
com o
combate ao trabalho escravo no país. É esse mínimo de sensibilidade e
esta aliança com o atraso que desmoraliza
os conservadores neste país...
Marcelo Marthe assina o ataque de Veja a proposta de uma rede de TV federal, que ainda não sabemos se será estatal e pública. A mídia grande brasileira é engraçada: ela crê que a diversidade de fontes de informação faz mal para a liberdade de imprensa...Bom mesmo é o monopólio de meia dúzia de famílias...Marthe recria entre aspas os “princípios da democracia”, do próprio punho: “O governo faz, a imprensa avalia e o público julga.” Como assim, só a imprensa avalia? E quem avalia a imprensa? Vale aqui citar o final da coluna de hoje do Ombudsman da Folha de S. Paulo, Marcelo Beraba:
“Chega de estatísticas. O ponto é que, na minha opinião, as empresas jornalísticas erram ao represar uma discussão que cresce a cada dia e será incontrolável. Ao não atentarem para a importância do debate que as envolvem perdem confiança e credibilidade. O melhor a fazer é enfrentar a discussão e os questionamentos com profissionalismo e honestidade, informando, expondo claramente as suas posições sobre cada um dos temas e abrindo igual espaço para as dezenas de outras posições que convivem na sociedade e estão insatisfeitas com o modelo atual. Enquanto a discussão não for ampla, ficará sempre polarizada entre empresas e governos, e sempre tenderá à irracionalidade. A garantia do espaço para a discussão é uma das responsabilidades do jornalismo.”
O link para a coluna completa está aqui: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ombudsma/om1803200701.htm
E a definição de que o debate entre imprensa e governo sobre a comunicação é “irracional” é perfeita. As mídia brasileira, é formada de empresas familiares rançosas e ultrapassadas, cada diz mais para trás do resto da sociedade brasileira em termos de diversidade de opiniões, e cada vez mais fechadas entre si e dentro delas, na defesa de uma opinião monocórdia, principalmente em torno dos seus interesses financeiros.