Veja Q Porcaria n. 21 - 2006

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José Chrispiniano

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May 31, 2006, 10:48:43 AM5/31/06
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- Veja atirou no que viu (o dossiê armado por Dantas sobre contas de Lula e outros membros do governo no exterior) e acertou no pouco que viu,  a reunião de Thomaz Bastos com Daniel Dantas e o medo que o governo tem do banqueiro. Assim a revista pode reeditar a carga que tinha feito para derrubar o ministro no caso Francenildo. Após meses tratando com Dantas da publicação do seu trabalho, a revista começa a jogar fachinhos de luz no mundo de “Opportunities” do banqueiro. Talvez magoada dele ter dito isso em uma reunião: “Não sou burro. Divulgar uma lista como essa é uma burrice.” Aí a revista, chateada de ter sido chamada de burra, chamou-o de “Dantas, o burro”. Seu burro, burro é você, coisa de jardim da infância...Assim como a revista rebater Mino Carta e o Estado de S. Paulo, dizendo que eles representam o “velhíssimo jornalismo”, por o jornal tê-la criticado e Carta ter dito que a revista inventou o “novíssimo jornalismo” com a publicação do dossiê, batizada de “conspirata”, uma brincadeira com o termo “pensata”, usado na redação de Veja para definir as teses que depois as matérias simplesmente "comprovarão". Aliás, sobre o mesmo caso, que também está na sua  capa, a Carta Capital desta semana traz matéria imperdível de Serio Lírio “Dantas e os petistas”. Veja também, com semanas de atraso, começou a incluir o PFL e o PSDB na roda. Agora, os caras são tão loucos, que até ameaça andam fazendo pelas suas páginas. Olha, só:

“Há três semanas, o senador Arthur Virgílio, do PSDB do Amazonas, denunciou a tentativa de achaque a Dantas feita por Delúbio Soares. Depois de VEJA revelar que as relações entre o banqueiro e o governo eram mais complexas, muito mais complexas, Virgílio sumiu do mapa. Por que será? Dantas sabe.”

E Veja, sabe o que Dantas sabe? Se sabe, por que não publica, só o ameaça assim, para que ele não “suma” de atacar o governo? Bizarro...

- A revista recebeu 51 cartas sobre o caso Daniel Dantas. As sete publicadas  defendem a revista no caso. Imagino que como todas as outras 44...Uma delas merece ser publicada, para mostrar que Veja não publica as cartas que a criticam, mas imprime coisas como esta:

“Será que o inocente presidente Lula não sabe o que é VEJA? Sinceramente, é de pensar que ele não sabe, mas eu gostaria tanto de dizê-lo: VEJA é a nossa voz, e nós somos nada menos que o povo.
Ruth Carla Corrêa
Arcoverde, PE”

- Nem deu quinze dias da crise da segurança em São Paulo, e Veja faz troça da história, com uma matéria ridícula onde “entrevistam” um celular, tirando sarro da análise dos policiais e do esforço para coibir seu uso por facções criminosas. Eles devem ter achado a matéria da semana passada “séria” demais...Agora o assunto deve desaparecer e não ser tratado seriamente para não machucar a campanha de Geraldo Alckmin, até a próxima crise de segurança fazê-lo voltar a tona. E assim, Rio e São Paulo seguem seu padrão de lidar com o problema, ora ignorando, ora reagindo histericamente...

- Julia Dualibi assina a matéria “Votando com a barriga”, que no viés de desqualificação do voto dos pobres em Lula (já tem gente chamando o bolsa-família de mensalinho), mostra que houve um aumento no poder de compra do salário mínimo e queda nos preços dos alimentos. Quer dizer, as classes altas e o setor político, ao invés de ficarem feliz com a melhora de condições de vida de grande parte população, observam a coisa pelo viés da disputa de poder...Mas como sempre, Veja precisa desqualificar melhoras deste governo, mesmo que soe como algo sem pé nem cabeça com o resto da matéria. Isso provavelmente advém do modo de produção da revista. O repórter faz o texto, que vai para o editor e depois o mesmo só vê ele com seu nome assinando e cacos e mudanças feitas pela chefia.

Obviamente, o presidente Lula não se interessa em ressaltar em seus discursos que o bom desempenho do preço dos alimentos não é resultado de políticas específicas de seu governo, mas da estabilidade monetária, cujas bases foram plantadas por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso.

Na seqüência, diz isso:

 “Em 2004, Lula eliminou a incidência de dois tributos, o PIS e a Cofins, sobre uma série de produtos alimentícios de consumo popular, numa tentativa de favorecer a mesa dos brasileiros mais pobres, mas os economistas são unânimes em dizer que o efeito sobre o preço final da cesta básica foi praticamente nulo.

Que economistas? Isso não é uma política específica. O que quer dizer “praticamente nulo”? Ademais a matéria faz questão de ignorar que este governo teve uma política de aumento de poder de compra do salário mínimo (em 25%), com critérios bem diferentes para seu reajuste do que os de FHC. Veja tem razão de que há fatores, talvez os mais importantes, que fogem a ação do governo, como o fato da valorização cambial despejar alimentos baratos no mercado interno. Mas é uma piada explicar o aumento de poder de compra ser graças a FHC (sendo que não ocorreu durante os seus 8 anos, mas só depois...)e ao acaso e nada graças a “políticas específicas”. Distorce-se uma boa notícia no contexto mais mesquinho possível.

- Veja publica matérias importantes de marcação cerrada em cima de Duda Mendonça em campanhas do PT e dos estranhos negócios de José Dirceu com o russo Boris Berezovsky, dono da MSI, para viabilizar que este compre a Varig (Berezovsky conhece o setor, é acusado de aplicar um golpe bilionário na Aeroloft, quando dirigia a estatal russa). A relação do PT com gente como Dantas e Berezovsky é temerária. Seria mais bacana ainda se Veja exercesse o mesmo tipo de marcação sobre outros partidos.

- Veja dedica seu editorial, as páginas amarelas com o presidente da Comissão Européia, e uma matéria sobre o México a duas coisas: criticar o avanço “populista”, da América Latina, e a exaltar o modelo dos tratados comercias bilaterais, que com o fracasso das negociações na Organização Mundial do Comércio, proliferam na criação de novas zonas de influência da Europa e dos Estados Unidos. Compra e revende algumas teses: a "pós democracia" (eles não chamam assim...), com Banco Central independente e uma série de decisões fora do alcance dos efeitos eleitorais e a divisão entre uma esquerda boa e outra má na América Latina. Como diz o próprio editorial, “O jornalista Diogo Schelp, 30 anos, editor de assuntos internacionais de VEJA, viu-se ocupado em diversas ocasiões em explicar aos leitores a extensão do avanço do populismo na América Latina.” Há outras análises sobre o tema, bem mais interessantes. Kenneth Maxwell, que não pode ser acusado de ser de esquerda, em entrevista ao Mais! deste domingo é um dos que expõem o simplismo desta visão “meramente instrumental” da tese de Veja (traduzindo, com fins políticos de dividir aliados e “rebeldes” em relação aos EUA), e mais ainda José Luís Fiori, em texto na Carta Maior, ao ampliar a discussão e mostrar que o ressurgimento de estratégias e discursos nacionais em torno de disputados recursos energéticos é uma tendência mundial, não só latino-americana. Temos ainda a Carta Capital, com Antonio Luiz M. C. Costa, que também amplia o foco, ao mostrar o importante papel indireto da ascensão chinesa nas mudanças política na América Latina. Se considerarmos que irresponsabilidade fiscal, táticas para se perpetuar no poder, rompimento de acordos, e nacionalismo são “populistas”, por que Veja não aborda nesta perspectiva o próprio governo Bush?

- A revista é engraçada. Algumas semanas atrás, sugeriu em editorial a formação de um tal “eixo do bom senso”. Esta semana, o mesmo eixo imaginado pela revista, sem que acontecesse nada no mundo real, aparece como fato consumado em suas páginas “Brasil, Chile, Uruguai, Colômbia e México formam um eixo de bom senso que se contrapõe ao avanço do populismo, da demagogia e da ideologização representados por Hugo Chávez e suas marionetes na América Latina.” Esta frase é uma obra de auto-alucinação. Veja  inventou e reportou o "eixo do bom-senso". Este outro trecho também é impressionante: “afinal, o eleitor mexicano pode ter tudo isso e ainda avanços maiores se simplesmente votar em Calderón.” (Calderón é o candidato apoiado por Vicente Fox, contra López Obrador, o candidato da esquerda).  Declaram voto na eleição dos outros...O México é exaltado como um “sub-Chile” como modelo de desenvolvimento. A própria revista, de forma mais discreta, traz as informações que suavizam esta exaltação. As dependências das exportações para os Estados Unidos, já que  sua economia é uma extensão dessa, e da remessa de divisas pelo mutirão de imigrantes, quando diz que o índice de desemprego explodiria se 15% da força de trabalho não tivesse ido para os Estados Unidos (o índice é impressionante e a matéria é honesta ao dizer que foi isso, e não o Nafta, que tirou as pessoas da pobreza) e não fizesse remessas essenciais para a economia do país. E em um quadro a 50 páginas da matéria, a informação de que o Estados Unidos está construindo um muro de 1.200 quilômetros na fronteira entre os dois países. Que belo modelo de integração. É engraçado. Mesmo enfrentando muros e a ilegalidade, 15% da força de trabalho do México foi para os Estados Unidos e o país não é visto com fracasso, apesar de ele mesmo estimular esta imgiração. Se os mexicanos não podem entrar nos Estados Unidos, os cubanos não podem sair de Cuba, mas se chegarem lá com os chamados "pés secos" são imigrantes legais com apoio do governo norte-americano. São contextos diferentes, mas tratamento midiático ainda mais diferente que o contexto, para estes dois tipos de refugiados latino-americanos.

- Em matéria sobre a crise do Masp, que culminou com o corte de luz do museu, Veja pega muito leve com Julio Neves, o presidente da instituição mais interessado em especulação imobiliária que qualquer outra coisa, e faz questão de bater de novo em Cláudio Lembo pelo uso do termo “elite branca”. Houve um tempo em que governos censuravam o que a imprensa dizia. Hoje, a imprensa censura o que governantes podem dizer. Por exemplo, o termo maldito “burguesia” já foi excluído da fala de Lembo (que é um conservador a moda antiga, da linha estóico, moralista, contra o hedonismo e o consumismo. Sua crítica foi muito mais moral do que de classe propriamente). Em 13 de junho de 2005, Mario César Carvalho publicou na Folha este diagnóstico perfeito da atuação e modificações da “elite branca” nesta questão, opondo aos que construíram o Masp (diga-se de passagem na contramão da elite local já naquela época) os que hoje, como a Veja faz, adulam e visitam a Daslu. Vale a pena ler de novo: A morte do Masp. Ano passado visitei o Masp com o filósofo italiano Giorgio Agamben. Sem saber da história da sua formação, ele ficou impressionado com a inteligência de que quem fez o museu na seleção das obras, “uma ou duas obras de cada artista, mas algumas das melhores e mais importantes”, e quase embaraçado de não saber que existia um museu deste nível em São Paulo. Estava maravilhado. Até que no fim da visita, quis comprar um livro com o acervo do museu. Não tinha. “Como assim?”, achou que era engano da tradução. Não, não tinha mesmo...Pietro Maria Bardi, Lina Bo Bardi e Assis Chateaubriand, onde quer que estejam, devem estar enfurecidos com as mãos que hoje tocam e destroem seu legado...

- É claro que Veja traz algumas coisas boas. Antigamente eu fazia um É mais por aí, para as coisas legais da revista. O artigo de André Petry sobre direitos humanos e PCC é ótimo, perfeito, recomendo, a repórter Adriana Maximiliano, que faz um frila sobre livros infantis gays, é excelente, torço para que não acabe trabalhando lá, há uma entrevista com a cartunista argentina Maitena, que eu adoro, e eles indicam o DVD do filme Profissão: Repórter (The Passanger), de Michaelangelo Antonioni, que é uma obra-prima tremenda, cuja cena da inversão da câmera: “suas perguntas revelam mais sobre você do que as minhas respostas revelarão sobre mim”, deveria ser objeto de reflexão obrigatória para todo o ser humano, ainda mais jornalista, ainda mais da Veja...

- Retomando a brincadeira: Moacir Scliar faz resenha elogiando o livro de Roberto Pompeu de Toledo, que, nem dava para disfarçar mesmo, foi citado como jornalista de Veja. Três semanas depois de Jerônimo Teixeira fazer resenha elogiando o livro de Moacir Scliar esta uma semana após Moacir Scliar colaborar para a Veja com uma resenha sem que seja citado na resenha de Jerônimo Teixeira que Moacir Scliar é colaborador da revista Veja. Ufa...Mas o livro de Pompeu de Toledo parece ser mesmo bem interessante. Além de ninguém saber pousar para foto com cara de inteligente melhor que ele, ainda mais com esta nova barba estilosa.

- Não tive tempo de ler o especial da Veja “O que sobrou do feminismo”. Ao folheá-lo faltou também interesse e “coragem”...



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