Veja Q Porcaria n.35 - 2006

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José Chrispiniano

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Sep 13, 2006, 12:26:56 PM9/13/06
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- Semana passada, não tive tempo de escrever o boletim. Estive em Açailândia, Maranhão, que deve ser um daqueles lugares que o Diogo Mainardi paga para não ir, onde todas as falhas e injustiças do nosso modelo de desenvolvimento dos últimos 50 anos ficam expostas. Todo o "progresso" está lá (infra-estrutura, investimentos externos, grandes empresas, eucalipito e latifúndio), e é um sólido e retumbante fracasso ambiental e social, um modelo extrativista, concentrador de renda e cruel. Seria muito mais interessante escrever sobre a viagem do que sobre a Veja. Mas não é função do boletim.

Bem, chega de nariz de cera.
 
- Como a edição da semana passada da Veja estava "especial", tem coisas que não dá para deixar de comentar. Vamos passar batido pela matéria de capa e como ela diz que existe a guerra de civilizações, o conceito simples e racista de Samuel Huntington (a guerra seria entre Islã e Ocidente, e atente, para ele a América Latina não é Ocidente), por perguntas distorcendo fatos na entrevista com Arnaldo Jabor, na matéria de capa ou na sobre o programa do PT, onde Veja inventa uma nova Carta aos Brasileiros "virtual" de Lula para cobrar lá na frente, ou mesmo Mainardi retratando Daniel Dantas como um coitado que foi vítima do governo do PT...
 
- Vamos ficar na leitura mentirosa das pesquisas assinada por Julia Dualibi na matéria "Dividir para governar". O olha da matéria diz que “O voto dos pobres se distancia do voto da classe média em intensidade inédita. Esse divórcio facilita a exploração e manipulação eleitoral”. Além de preconceituosa e annti-democrática, a tese é mentirosa, como aponta Elio Gaspari em texto na sua coluna na Folha de S. Paulo de domingo. Lula ganha nas classes mais baixas, mas a classe média está dividida. Existe descolamento, mas não existe, significativamente, divisão de classes propriamente dita, já que metade da média e um terço da alta votam em Lula. Veja esconde, propositadamente, isso ao não mostrar os índices de Alckmin na classe média. Uma farsa intelectual de quinta para promover preconceito, o que está se tornando uma especialidade de Dualibi. Depois, a declaração do olho é da revista. Está baseada em absolutamente nada, talvez em uma visão de que a classe média sabe mais o que é melhor para os pobres do que os próprios pobres (um princípio perigoso).  Coroa a matéria a seguinte legenda: “Getúlio, o pai dos pobres: ele também provocou uma divisão entre as classes.” Uma pérola do neolacerdismo proposto por FHC. Inclusive por implicar pelo uso do "também" que Lula promove uma divisão de classes, o que evidentemente é uma fantasia paranóica. O governo Lula tem algumas qualidades e muitos defeitos. Promover a luta de classes, você ache qualidade ou ache defeito, não é  uma delas. Esta semana Dualibi escreve um texto mais sóbrio, onde se contradiz e saca um novo fenômeno (olha a mudança em apenas uma semana...) que seria a influência dos pobres sobre o eleitorado rico. Como qualquer jornalista sabe, há cientistas políticos suficientes no Brasil para se validar qualquer tese instantânea.
 

- Menos um desempregado no Brasil: o prolixo Reinaldo Azevedo foi incorporado ao time da Veja. A revista publicou semana passada um impagável artigo da lavra do ex-editor da revista e site Primeira Leitura, sob a alcunha que lhe dá caráter editorial: “Artigo Veja”. Diz o texto que urna não é tribunal e não absolve ninguém, o que é verdade, indicando a possibilidade de um impeachment ou tentativa de impugnação judicial do segundo mandato de Lula. Ao menos a redação da revista conteve a sua pedante e hermética mania de chamar Lula de apedeuta. De resto, solta impropérios contra Marilena Chauí e termina com o cívico, “Se reeleito, Lula que se cuide. A luta continua”. Mas tem um  trecho mais engraçado.

“O programa de governo do PT prevê, diga-se, o incentivo oficial à “mídia independente”. Em lulês, significa financiar, com o dinheiro dos desdentados, a sabujice disfarçada de jornalismo. A prática já está me curso. Felizmente, a democracia é um regime legitimado pela maioria, mas sustentado pelas elites, de que a imprensa faz parte. As esquerdas se arrepiam diante dessa afirmação. Entendo.”

Nossa, como Azevedo é importante...Ou ao menos se acha. Sabe o que é o engraçado do texto? A revista e site que Azevedo dirigia, e que eram de propriedade de um mandarim tucano, acabaram assim que Alckmin saiu do governo do estado de São Paulo, cujas estatais anunciavam na sua revista, para concorrer à presidência. Coincidência cuja relação causa-efeito foi negada por Azevedo, antes que a acusação sequer surgisse. O mesmo Azevedo que por “coincidência”, iniciou no fim do ano passado o massacre pessoal ao padre Júlio Lancelotti em contra-ataque “coincidente” as críticas  deste ao projeto de Andrea Mattarazo, secretário de José Serra, de “revitalização” (demolição + especulação imobiliária=negócios privados) do centro de São Paulo. Mattarazo, cuja irmã lança livro sobre boas maneiras e que esta semana aparece na Veja, mas não é ridicularizada, como habitualmente acontece, ainda mais com frescuras do tipo, pela irônica Heloisa Joly na sua coluna de perguntinhas. Capice? Sacou como funciona? É, Azevedo deve entender mesmo de sabujice disfarçada de jornalismo. Esta semana Veja publica cartas, todas elogiando o seu artigo (Mainardi, se cuide no ranking de missivas), e publica texto onde ele desanca o novo filme de Cacá Diegues como “populismo de exaltação” (e olha, que nem Cacá Diegues ter sido um crítico pesado do Minc aliviou sua barra) que se segue ao “esquerdismo bocó dos anos 60”. Mais trechos, um incompreensível, outro impagável, (ou talvez pagável com anúncios da Nossa Caixa):

“Queremos ser conscientizados pelo oprimido. No livro Genealogia da Moral, o filósofo alemão Nietzsche vê no servo que reivindica o direito de falar como servo o fim da civilização.” ????? (acho que ele quis dizer, “sendo o fim da civilização)

“Ninguém quer ensinar Mozart ou Kant aos pobres. Eles têm de aprender batuque, funk e rap. É batata: há uma relação inversamente proporcional entre a variedade de instrumentos de percussão e saneamento básico. Onde excedem o "baticumbum" e os versos de pé quebrado, falta água encanada. E sobejam verminoses.”

Quer dizer, como se já não bastassem o Sabino e o Mainardi, eles acham que é mais disso que a Veja precisa... Reinaldo Azevedo é alguém cuja especialidade é florear com disfarces "intelectuais", grossos  e rasteiros preconceitos. Faz disso uma carreira que ele chama de jornalismo. Eis que agora, este boletim e seu autor correm o risco de uma séria sobrecarga de trabalho...
 

- Mario Sabino, redator-chefe de Veja, está processando Emir Sader e o site Carta Maior, por Sader tê-lo chamado em texto no site de “escriba de plantão”, por conta de sua matéria sobre o livro de Fernando Henrique Cardoso neste texto. Como podem ler, Sader não o cita nominalmente. E não entendo no que Sabino se ofende. Ele escreve, então é escriba. Precisa de uma Operação Portugal para elogiar a biografia do Frias, ele está ali, sempre a postos, produzindo a obra encomendada, no prazo, solicito. Então, de plantão. Logo: escriba de plantão. Não consta que Machado de Assis tenha movido um processo póstumo contra Moacir Scliar quando este publicou na Veja, por força do redator-chefa da revista, resenha em que diz que o livro do redator-chefe da revista “emulou” o velho mestre. Isso para não mencionarmos a manipulação grosseira de certo ranking de livros mais vendidos, um episódio digno de um, digamos assim, Supernarciso. Tem gente que precisa de uma dose cavalar de senso de ridículo.

- Por falar em FHC e Veja...O que seria dele sem ela para elogiar sua carta, que deu xabu e foi criticada em absolutamente toda a imprensa, e dentro do seu próprio PSDB. Veja tem a cara de pau de tratá-la como um “documento para a história”, emulando a carta do suicídio de Getúlio. “A mais clara condenação do governo petista que já saiu da pena ou da boca de qualquer outro político”. Falou...Tem pessoas que gostam de cultivar ilusões. Como esta, de que FHC tem alguma influência no cenário político atual. Como disse o enrolado Eduardo Azeredo, citado na carta como um “erro”, pelo PSDB não tê-lo punido, FHC é escondido no programa do PSDB e só é citado no programa do PT, porque dá ibope falar mal dele. Que decadência...Bem, se pegar uma foto dos colegas da época dele (Fujimori, Menem etc...) até que ele não está mal.

- A Veja desta semana traz algumas matérias OK, não boas, mas acima dos padrões habituais da revista. “A hora da degola” sobre reforma política, a de capa, sobre o You Tube é bem interessante (chama Chávez e Fidel de detestáveis tiranos, mas enfim, é a Veja), e “Foi o PT que pagou”, de Marcio Aith, sobre publicidade do governo federal que foi distribuída pelo PT é boa também. Além da sobre pedágio urbano, que sequer tem, e até ironiza, a tirania ante qualquer imposto ou taxa, mesmo as justas.

- A propaganda da Veja que ressuscita, dentro de uma foto real de sem-terras manipulada, mostrando um deles lendo a infame capa “A tática da baderna”, mostra que a revista ainda se orgulha do que deveria se envergonhar.

- Alguns textos, antídotos para  as receitas de Veja. Este saiu faz um tempo, mas é um bom texto sobre a mania de se importar “modelos” e “receitas” que Veja tanto gosta: de José Paulo Kupfer - Pedra no sapato neoliberal
 
- Este é de Leon Cakoff, sobre o festival de Veneza. Quatro filmes que tratam da ascensão chinesa e de uma conversa incrível com aquele que não é só o mais velho, mas provavelmente o mais sábio cineasta em atividade: o português Manoel de Oliveira, que do alto dos seus 98 anos diz mais em termos de valores que todo o especial da Veja sobre a China. No link: http://www2.uol.com.br/mostra/29/p_jornal_430.shtml

- Paulo Betti, Wagner Tiso e Marilena Chauí tem sofrido um massacre pessoa pela Veja,  que ignora de propósito o que realmente disseram, o contexto em que isso ocorreu, e retratações posteriores para promover um linchamento das suas figuras públicas. No caso da filósofa, talvez o que mais irrite a mídia seja seu silêncio. Paulo Betti escreveu um artigo, em que se defende, na Folha de S. Paulo. No link abaixo, para assinantes do UOL, e posso enviá-lo para quem não for assinante.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0509200608.htm

- Já faz tempo, Jerônimo Teixeira usou uma resenha de um livro de Ricardo Piglia, para distorcer o que este fala no livro sobre Che Guevara. Na resenha de José Castelo na Entrelivros, o memso capítulo do livro brota de forma bem diferente: O revolucionário amor pelos livros



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