Livro Araceli Meu Amor Pdf Download
Vennie Fireman
Aos 8 anos de idade, em 18 de maio de 1973, a menina Aracelli foi estuprada e assassinada a dentadas pelos filhos da elite de Vitria (ES), Dante Michelini Jr. e Paulo Helal, mas, julgados foram absolvidos, protegidos pela polcia, Justia, militares e governantes durante a ditadura.
Em seu livro Aracelli, meu amor, relanado neste ano, voc explica que Dante Michelini Jr., o Dantinho, e Paulo Helal, o Paulinho, assassinaram Araceli, em uma festinha violenta do pessoal da motoca. As famlias Helal e Michelini eram traficantes de drogas?
Eu passei uns dois anos colhendo material, devo ter ido umas 50 vezes escondido para Vitria. Eu fiz essa investigao com a ajuda do perito Asdrbal de Lima Cabral, o Dudu, o reprter Jorge Elias, do jornal ltima Hora e a fotgrafa, Ednalva Tavares, minha mulher na poca.
Ao invs de ouvir as fontes oficiais, voc procurou ouvir as pessoas do povo, nas ruas, na periferia de Vitria, na barbearia, na mercearia, no bar, porque eles tinham as informaes que a polcia e os militares escondiam?
Sim, mas depois eles foram matando as testemunhas, como o Homero Dias, que trabalhava no servio secreto da Polcia Militar, enviado para investigar o assassinato, e mataram tambm a namorada do Homero, que no tinha nada a ver com a histria.
A partir da identificao do corpo, uma longa e misteriosa novela comeava, com direito a um livro sobre o caso censurado pela ditadura ("Araceli, meu amor", de Jos Louzeiro) e uma Comisso Parlamentar de Inqurito classificada como "falha" pela imprensa da poca.
No decorrer das investigaes, testemunhas tidas como chave pela polcia, como uma ex-amante de Paulo Helal, Marisley Fernandes Muniz, e o mecnico Wilson Cabral Gomes contaram aos policiais detalhes macabros, como o suposto fato de Paulo ter pedido uma boneca para atrair a menina, dias antes do crime, conforme noticiado em reportagem do GLOBO do dia 5 de setembro de 1977. No mesmo artigo, um inqurito apontava que Dante Micheline havia destrudo provas do crime, alm de denncias de que eles teriam comprado o silncio de testemunhas e autoridades, o que nunca foi comprovado.
Trs anos depois, eles seriam considerados culpados e condenados a 18 anos de priso e multa de Cr$ 18 mil. Em 20 de junho de 1980, o ttulo da matria do GLOBO informava: "Matadores de Araceli condenados a 18 anos vo apelar em liberdade".
O Acervo O GLOBO um site que permite o acesso verso digital de todas as pginas e matrias do Jornal O GLOBO desde sua primeira edio, em 29 de julho de 1925.As pginas digitalizadas esto organizadas por edio e podem ser acessadas de duas formas: pela data exata, usando a ferramenta de busca por edio; ou na pesquisa por termos e palavras-chaves.As matrias consistem em fragmentos das pginas digitalizadas, que foram extradas com o objetivo de facilitar a busca no site e a leitura desses textos, ao serem ampliados na tela.
A reprter Marie Declercq fascinada por histrias de crimes bizarros. Comeou com os romances de detetive, mas depois ela sacou que a realidade sempre vence a fico no quesito crueldade. A cultura da violncia do Brasil infelizmente um terreno frtil, e aqui voc vai conhecer os crimes mais bizarros e brutais da histria do pas.
Desde a criao desta coluna, me dediquei a pesquisar e escrever quase que exclusivamente a respeito de assassinos em srie brasileiros. Diante de crimes que se transformaram em pgina virada de jornais e encontraram seu desfecho, por mais trgicos que fossem, pensei: e aqueles que no foram solucionados?
Infelizmente, h uma vala metafrica (e outras tantas literais) no longo captulo de crimes no solucionados na histria do Brasil. Os responsveis por ela no so assassinos em srie com infncias atormentadas e problemas psicolgicos, mas sim a ditadura civil-militar.
Segundo o relatrio final da Comisso Nacional da Verdade, divulgado em 2014, o nmero total de mortos e desaparecidos durante os 25 anos de regime militar de 434 pessoas. Dentro desse perodo, centenas de pessoas foram submetidas a sesses interminveis de tortura e dentre as vrias modalidades se destacam o pau-de-arara (uma barra de metal atravessada entre os punhos e as pernas amarradas da pessoa, deixando ela pendurada para receber porradas), choques eltricos pelo corpo, estupros, afogamentos e tortura psicolgica, praticados por cerca de 377 agentes da represso.
Essa violncia era autorizada pelo Estado como um instrumento de poder e de preservao do governo. Os filhos dos que eram perseguidos, crianas na poca, tambm foram torturados. Ainda constam 210 desaparecidos. Na Vala de Perus, localizada no cemitrio Dom Bosco em So Paulo, foram encontradas mais de mil ossadas de indigentes, perseguidos polticos e vtimas de esquadres da morte -- at hoje a maioria segue sem identificao por conta da influncia do tempo e da natureza. Tambm estima-se que oito mil indgenas foram mortos pelo regime, sob a desculpa de serem um atraso para o desenvolvimento da nao.
No entanto, durante o mar de violncia dos assim chamados Anos de Chumbo, dois casos se destacam em suas similaridades. So duas crianas, Araceli e Ana Ldia, assassinadas respectivamente em maio e setembro de 1973, ambas na faixa dos 7-8 anos. As mortes, apesar de serem separadas geograficamente, so quase iguais. Ambas foram torturadas pelos assassinos por longas horas e largadas em um matagal para serem engolidas pela terra e, eventualmente, esquecidas. Os dois crimes no possuem ligao entre si alm das caractersticas macabras e o perfil dos suspeitos principais. Todos eram membros de famlias influentes, seja poltica ou economicamente, e por conta desses privilgios no tiveram que prestar contas perante a Justia. Sejam eles culpados ou inocentes.
So dois casos que foram abafados e engolidos pela ditadura na poca, e que desde a reabertura democrtica em 1985 so ressuscitados regularmente para lembrar que, sim, a ditadura civil-militar tambm trabalhou para acobertar estupro e mortes de crianas. Custe o que custar. Este s mais um registro desses casos.
Araceli Cabrera Sanchez Crespo nasceu em 2 de julho de 1964 e teve sua vida abruptamente tomada entre os dias 18 e 24 de maio de 1973 em Vitria, capital de Esprito Santo. A menina de oito anos foi estuprada sob efeito de barbitricos e seu corpo foi desovado em um matagal. Os principais suspeitos do caso foram absolvidos e a histria da morte de Araceli permanece um mistrio at hoje. O crime emblemtico fez o Congresso Nacional instituir o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Explorao Sexual de Crianas e Adolescentes no dia 18 de maio.
Filha do eletricista espanhol Gabriel Crespo e da boliviana radicada no Brasil Lola Snchez, Araceli nasceu em Cubato (SP). Por conta de sua bronquite e a forte poluio da cidade, os pais se mudaram para Vitria, aproveitando uma proposta de emprego de Gabriel no Porto de Tubaro. Na cidade a famlia se estabeleceu definitivamente com o primognito Carlos e Araceli.
No dia 18 de maio de 1973, como de costume, Araceli saiu de casa rumo a Escola So Pedro. Por conta do horrio de sada, s 16h30, Araceli no estava conseguindo pegar o coletivo para casa que saa no mesmo horrio. A pedidos da me, o colgio liberou Araceli mais cedo, s 16h10, para dar tempo de a menina chegar em casa. Nesse horrio, uma testemunha viu Araceli acariciando um gato na frente de um bar no cruzamento das avenidas Ferreira Coelho e Czar Hilal, e essa foi a ltima vez que a menina foi vista viva. Era uma sexta-feira.
Quando a menina no apareceu em casa dentro do horrio combinado, os pais de Araceli foram at a polcia comunicar o desaparecimento. No entanto, as autoridades afirmaram que no poderiam fazer nada at segunda-feira. Ento, por conta prpria, ambos comearam a procurar a filha pela cidade. Achando que se trava de um sequestro, levaram a foto da filha para os jornais locais. J na segunda-feira, a polcia iniciou as buscas oficiais e o caso foi atraindo a curiosidade da populao capixaba.
No s a polcia e os pais de Araceli tinham certeza de que a menina estava viva, como tambm apareceram parapsiclogos e videntes afirmando que ela no havia morrido. O fio de esperana se rompeu no dia 24 de maio, seis dias depois do desaparecimento, quando Rogrio Monjardim encontrou o corpo de Araceli num matagal nas imediaes do Hospital Infantil de Vitria.
Mesmo 40 anos aps o ocorrido, as fotos em preto e branco da criana sendo retirado da mata ainda causam desconforto. Nos registros, alguns policiais retiram partes do pequeno corpo em uma maca onde a nica coisa reconhecvel so as madeixas longas de Araceli. Ela foi encontrada em um estado de decomposio avanado e j devorada por animais da regio, a ponto da percia ter de recorrer a peneiras de garimpo para encontrar dentes e outras partes corporais no meio da terra.
De acordo com a tese da acusao, Araceli teria sido raptada por Helal na frente do bar onde pegava o coletivo e levada at o Bar Franciscano na Praia de Camburi, propriedade de Dante Michelini. L. supostamente foi mantida em crcere privado, agredida, torturada, drogada e estuprada por Dantinho e Paulo. Estima-se de que Araceli sofreu por 72 horas nas mos dos jovens privilegiados. O excesso de barbitricos identificado posteriormente na percia deixou Araceli em coma e, segundo a acusao, os dois jovens tentaram levar a menina at o hospital, mas ela no resistiu. H especulaes que de ela foi colocada em um freezer at decidirem o que fazer com seu corpo.
Alm do escabroso crime, outras questes levantadas pela acusao causaram alarde. Por serem membros de famlias ricas, pesa a acusao de Dante Michelini ter usado sua influncia e ligaes com a polcia para abafar o caso e atrapalhar as investigaes. De fato, o prprio Dante admitiu suas amizades com o alto escalo da polcia, como o capito Manuel Arajo, mas afirmou que o seu envolvimento e de Dantinho e Paulo foi fruto de uma reportagem escrita por um jovem jornalista que teria insinuado uma relao dos Michelini com o crime. Dantinho, em uma entrevista para o Jornal Nacional, disse que s conhecia Paulo de vista.
Piccin morreu no mesmo dia em que o corpo de Araceli foi encontrado no matagal, supostamente de malria. Seu nome pipocou nas investigaes quando a defesa de Dante apareceu na polcia com um pedao de tecido que supostamente pertencia saia de Araceli e fora desenterrado no quintal da casa de Piccin. O pai do garoto chegou a dizer para a imprensa que nunca suspeitou de nada do filho at ser chamado pelo delegado da Polcia Federal, Lincoln Almeida, afirmando que estavam tentando empurrar a autoria da morte da menina para inocentar Dante, Dantinho e Paulo. As acusaes contra Piccin foram consideradas uma ttica de confundir o trabalho policial na poca.
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