o "bug" do Marco Civil da Internet - responsabilização de provedores de aplicações

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Augusto Herrmann

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Jul 22, 2014, 2:43:23 PM7/22/14
to thac...@googlegroups.com
Pessoal,

não sei o quanto esse assunto chegou a ser discutido aqui, mas, em primeira análise, me parece que o texto final sancionado em lei do Marco Civil da Internet [1] tem um "bug" que deixa vulneráveis os prestadores de serviços onde o usuário pode postar conteúdo.

Art. 19.  Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. 
 
O texto da lei fala apenas em responsabilidade civil, omitindo qualquer disposição em relação à responsabilidade criminal. Suspeito que isso coloque uma situação de maior risco para os provedores de serviços que hospedam conteúdo de usuários (como blogs que têm comentários, fóruns, redes sociais, etc.) em comparação com o ordenamento jurídico anterior. Isso porque, antes, nada a lei dizia a respeito de responsabilidade por conteúdo de terceiros. Agora, a lei fala que o provedor de aplicações não pode, salvo no caso de descumprimento de determinação judicial, ser responsabilizado civilmente. A omissão quanto à esfera criminal pode levar um juiz a uma interpretação de que o provedor de aplicação pode sim ser responsabilizado criminalmente por conteúdo postado pelos seus usuários (ex.: calúnia, injúria, difamação, racismo, crimes eleitorais, violação de direitos autorais, etc.).

O que acham?
A falta de proteção do provedor de aplicações contra responsabilização criminal por conteúdo postado por usuários foi uma grave omissão mesmo do Marco Civil da Internet?
Isso vai fazer que os provedores de plataformas na web aumentem o policiamento e a censura de conteúdo por medo de serem responsabilizados?
O fechamento de plataformas online de participação social durante o período eleitoral já seriam um reflexo dessa problemática?


Abraços,
Augusto Herrmann

Diego Rabatone

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Jul 22, 2014, 4:21:28 PM7/22/14
to Transparência Hacker
Augusto,

eu acho que em certa medida você tem razão, rolou uma omissão.

Mas isso talvez porque a maioria dos problemas que podem ocorrer desse ponto de vista (comentários em blogs, etc) será mesmo na esfera civil, e não na criminal. Não vejo muito o que pode haver de problema criminal nesses casos.

Quanto ao fechamento de plataformas online de participação social durante o período eleitoral, não sei exatamente quais os argumentos, mas acho um pouco "estapafúrdia" essa política (assim como a política de retirar sites que sequer são plataformas de participação*). Eventualmente até aceitaria discutir a necessidade de se "fechar" o espaço para novos conteúdos, mas retirar o "passado" não faz sentido.

* O Governo do Estado de SP retirou praticamente todos os sites do ar, sites como IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), Corpo de Bombeiros, Secretaria de Saúde, Polícia, Arquivo Público do Estado, etc.... muito absurda essa situação, com uma leitura tosca de uma lei que nunca havia sido olhada da forma como está sendo olhada.


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Mario Mol

unread,
Jul 22, 2014, 4:24:55 PM7/22/14
to thackday
aqui em minas foi a mesma coisa...

mas quem tira os apps do ar é o servidor ou gestor com medo da lei... que prega isso.. (orientado pelos advogados ..)

então assim.. acho q é mais um problema do legislativo do q do executivo..


Tiago Cardieri

unread,
Jul 22, 2014, 10:14:16 PM7/22/14
to thac...@googlegroups.com
Augusto,

é verdade que o Marco Civil fala apenas de reponsabilidade civil.

Mas é porque existe um entendimento nos tribunais de "responsabildiade objetiva" (ou "responsabilidade solidária"). Isso significa que o nexo causal entre o dano e a pessoa não precisa ser direto para que ela responda por esses danos.

É muito comum no direito do consumidor (previsto no código) e pela similaridade com as relações na internet, estava sendo "emprestado" - os dois são direitos difusos, o usuário em certa medida é um consumidor, se os dados forem tidos como meio de pagamento etc.

>>no direito do consumidor, um exemplo é vc processar o grupo pão de açucar por um defeito num produto da casino: ela não produz, mas ela é um fornecedor, então responde solidariamente. Ou uma casa de festas responder pelo que faz um segurança. Ou um shopping responder pelo que fez uma loja.

Esse empréstimo é a "interpretação por analogia", prevista na LICC - Lei de Introdução ao Código de Direito Civil.

Prova disso é que as "direções" (leading cases, súmulas e informativos) sobre essa matéria de repsonsabilidade na internet estava sendo dada pela Ministra Nancy Andrigh, exatamente <uma das> especialistas em Direito do Consumidor no STJ - Superior Tribunal de Justiça.

Com o Marco Civil, a analogia não funciona mais, e existe uma regra específica - e bem diferente - para as relações na internet.

Quanto à questão criminal, essa responsabilidade objetiva (ou solidária) praticamente não existe. Nunca foi uma grande problema na justiça pois não é (nem era) alguem responder criminalmente pela conduta de terceiro.

O direito penal/criminal no brasil é bem positivista, e se a conduta não está especificada num tipo penal do código, vc não responde.

Então não é necessariamente uma brecha, porque o problema nunca existe (ao menos não de forma relevante).


Tiago Cardieri

unread,
Jul 22, 2014, 11:14:27 PM7/22/14
to Transparência Hacker

PS. Esse enquadramento de formação de quadrilha nas recentes prisões no rj, e um ativista responder (ainda q indiretamente) "pela arma com porte vencido do pai de outro ativista", unhidos exclusivamente pela mesma investigação e pedido judicial, é algo extremamente incomum, extraordinário e BIZARRO na cultura criminal do país.

Teoria do domínio do fato idem.

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