Eliana Guimarães (Psicóloga)
unread,Dec 7, 2008, 3:37:44 PM12/7/08Sign in to reply to author
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to Midiateca: Eliana Guimarães (Psicóloga)
RAZÃO E EMOÇÃO:
O imaginário humano, suas interligações e implicações nas organizações
sociais.
Prof a Maria Cláudia Tardin Pinheiro *
O objetivo deste artigo está em apresentar como se dá a interligação
na subjetividade entre a razão e a emoção e propor formas de lidar com
esses processos psíquicos de maneira mais integrada, questionando os
modelos de organizações sociais que impõem obstáculos a tal processo.
Utilizar-se-á a definição de imaginário de Laurent Lapierre (um
professor canadense, psicanalista e consultor organizacional), que
coloca, no livro “Imaginário e Liderança” por ele coordenado, o
seguinte.
“...Imaginário é um universo fantasmático, em parte inconsciente,
subjacente ao pensamento e à ação de um sujeito e que estrutura tanto
sua relação com seu mundo interior quanto com o mundo exterior. A
palavra imaginário aqui utilizada remete ao processo e ao produto da
imaginação, tanto em sua dimensão cognitiva (as idéias, os
pensamentos e as concepções de vida) quanto em sua dimensão afetiva
(os afetos, os desejos e as defesas psicológicas), permanecendo as
duas dimensões indissociavelmente ligadas”. (1995, p.30)
O fantasma que surge nas subjetividades é profundamente pessoal; já a
imaginação é, ao mesmo tempo, pessoal e pública. A esfera pessoal da
imaginação é criativa e mágica. Já a esfera pública é aquela que
reflete um enquadramento social. As idéias e os pensamentos que a
constituem são organizados pelas crenças adquiridas na cultura.
O imaginário cognitivo é organizado a partir do imaginário afetivo,
buscando dar sentido às experiências internas e externas vividas e,
principalmente, conferindo uma significação ao que se sente.
No decorrer da vida, aprende-se como falar, com quem falar, como se
comportar, o que não se deve fazer e pensar, o que não se pode sentir
e desejar.
Diante de tantas regras conscientes e inconscientes para pensar, para
sentir e agir, o indivíduo esquece de perceber que a cada instante
está comunicando um afeto, ou seja, uma emoção em suas relações.
Como pode, então, fluir livre e interligado o seu imaginário?
Ao longo do aprendizado cultural “afetivo-comportamental” que se
recebe em sociedade, aprendem-se muitas coisas como, por exemplo, o
incentivo à não percepção, a desvalorização e a falta de comunicação
consciente das emoções. Desta forma, limita-se o desenvolvimento da
criatividade, da criação e manutenção de relações harmoniosas consigo
e com os outros. Com isso, intensifica-se o turbilhão de emoções, o
não saber lidar com elas, a criação de fantasmas (uma vez que são
singulares, tornam-se difíceis de ser traduzidos em palavras, mantendo
toda sua complexidade), aumentando o sofrimento nos relacionamentos.
Aos poucos, a coerência interna de uma pessoa se perde cada vez mais
neste mundo de mentiras afetivas para si e para os outros, gerando
discursos verbais contraditórios com as inúmeras outras comunicações
não-verbais de seu comportamento, incentivando que seus fantasmas
passem a dirigir suas atitudes.
Torna-se, então, freqüentemente, possível uma autêntica dissociação
entre essas duas vertentes do imaginário: a cognitiva e a afetiva
através do aprendizado social distorcido da comunicação do afeto que é
passado entre as gerações.
Aprende-se socialmente a dar sentido às emoções de forma distorcida,
coercitiva, desvalorizando-as e não as compreendendo, o que acaba por
gerar grande tensão (estresse), falta de capacidade criativa e de
comunicação, incoerência interna e externa do que se pensa, diz e faz,
do que se sente e expressa, em suma, uma fragmentação do imaginário.
Quando há a repressão à representação cognitiva do afeto vivenciado,
ou seja, quando não se pode ter consciência do que se está sentindo,
este afeto não é nunca aprisionado, mas é associado a uma outra
situação cognitiva, a uma outra compreensão do que ocorre, distorcendo-
a, impedindo o sujeito de dar conta do que lhe acontece no mundo
real, criando obstáculos ao sentir e olhar a realidade com autonomia,
liberdade e criatividade. Em outras palavras, quando o indivíduo não
consegue suportar, conscientemente, o que está sentindo e o que está
entendendo do que vive, ele distorce sua percepção, deslocando o
conteúdo da idéia insuportável ao inconsciente e criando outra idéia
mais tolerável para substituir a original em sua consciência. Só que a
emoção vivida não pode ser esquecida e permanece a atormentá-lo e,
ainda pior, ligada a um conteúdo de pensamento distorcido. Diz-se,
então, que o sujeito está movido por uma falsa consciência, ou atribui
uma falsa motivação às suas ações.
Quando, também, há fortes conflitos no imaginário afetivo, observa-se
um embotamento do desenvolvimento cognitivo do imaginário. Como, por
exemplo, podem-se tomar os sentimentos de rivalidade por alguém,
juntamente com uma culpa vivenciada por senti-los. Essas duas emoções
em conflito embotam o desenvolvimento do imaginário cognitivo, uma vez
que a pessoa sente medo de sua própria agressividade, isto é, medo de
competir e destruir os outros (seus fantasmas). Outra vez, percebe-se
a influência da educação repressora às emoções (incutindo a culpa
neste caso aos desejos agressivos), distorcendo as representações
cognitivas dos sentimentos (neste caso, os agressivos são
representados socialmente com uma potência aniquiladora incrível) e
inibindo o crescimento pessoal.
Por outro lado, a vivência da rivalidade motivada por uma grande
inveja, ou seja, por um forte impulso de superar o outro, mas sem o
sentimento de culpa, pode incentivar o desenvolvimento do imaginário
cognitivo.
Percebe-se, nestes casos, a falta de consciência do processo vivido
pelo sujeito, impedindo a expressão livre e interligada dos
imaginários afetivo e cognitivo. Quando as pessoas não conseguem
perceber e entender, com coerência, o que sentem e pensam sobre o que
lhes perturba, fica muito desgastante para elas lidar com o vivido,
entender suas contradições e tomar decisões.
Dessa forma, acredita-se que a educação familiar e a escolar, entre
outros processos formadores de atitudes no decorrer da vida (como os
meios de comunicação de massa, grupos religiosos, empresas,
universidades etc.) têm grande importância na integração do imaginário
humano e devem fornecer o máximo de paradigmas possíveis à criança e
ao adulto para serem por eles incorporados.
É importante estimular a criança, desde cedo, e o adulto a
conviverem com a heterogeneidade de idéias, sensações e visões de
mundo para que consigam maior habilidade para lidar com conflitos e
resolver novos problemas durante sua vida.
A DIFICULDADE DE LIDAR COM A EMOÇÃO
O ser humano é eminentemente emocional, e essa energia é a propulsora
de sua vida.
As emoções são expressões naturais humanas. Elas não são positivas ou
negativas. A consciência emocional e o comportamento do indivíduo é
que podem ser classificados como positivos ou negativos para ele e
para o ambiente.
Portanto, uma pessoa pode viver expressando suas emoções de forma mais
assertiva, ou seja, sabe impor-se sem se indispor. Pode também
expressar suas emoções de forma reativa, aparecendo pela
intempestividade (agressão destrutiva) ou pela passividade
(subordinação ao outro). Tudo depende da forma como aprendeu a
conviver com elas, isto é, da educação afetiva que recebeu desde
pequena e que, quando não tem consciência do que faz consigo, a
perpetua indefinidamente, sem perceber se sua conduta afetiva lhe está
auxiliando a viver ou lhe atrapalhando e a aprisionando em modelos
desatualizados de relacionamentos.
O que geralmente ocorre nas empresas, assim como na família, na
escola, num relacionamento amoroso, numa amizade e em todo grupo
social no qual o indivíduo se insere é a percepção, mesmo que
inconsciente, das regras de viver (de pensar, de sentir, de falar e de
agir) em suas relações, o que pode ser chamado de cultura, que
transparece em suas atitudes. Em geral, o indivíduo normal percebe o
que se espera dele no ambiente social. Ele sente essas cobranças e
compara-as com suas expectativas e questões internas.
Além disso, todo grupo tem seu código (suas normas) de como expressar
ou não as emoções. Só que não se pode evitar sentir medo, alegria,
tensão, inveja, ciúme, angústia, ansiedade, tristeza, raiva e todos os
outros sentimentos. Ao negar-se ou evitar-se o que se sente, começam
os maiores problemas de falta de consciência interna, de
relacionamento interpessoal, de aceitação e compreensão dos outros.
Pode-se citar o exemplo muito escutado na ideologia gerencial das
organizações de que um bom profissional não desanima, não tem tristeza
e depressão e está sempre sorrindo e otimista. Em geral, há também uma
expectativa não manifesta de que este profissional não deva questionar
as práticas e políticas organizacionais, uma vez que essa atitude pode
representar, em algumas instituições, ingratidão com a empresa e
falta de equilíbrio interno. Essas expectativas profissionais geram
muitas contradições nas subjetividades e nas intersubjetividades,
negando os conflitos nas relações de trabalho que daí são
originados.
Como se pode aumentar o envolvimento de pessoas em seus trabalhos se
não é possível expressar suas idéias que questionam as práticas de
gestão impostas? Como é possível estar o tempo todo bem internamente?
Existe algum ser humano assim? Como administrar o sofrimento no
trabalho? É possível torná-lo criativo?! O problema é que essas
questões ainda não são problematizadas a ponto de terem relevância nas
reflexões sobre os problemas de gestão e na busca de alternativas nos
processos de tomada de decisões e resolução de conflitos.
Aprender a expressar “adequadamente” as emoções é um desafio e uma
“arte”, pois não podem ser evitadas, mas pode ser minimizado o seu
efeito doloroso momentaneamente. Pode-se crescer muito neste percurso
adquirindo-se segurança, autonomia, leveza, expansão da vida interior,
respeito social e capacidade cada vez maior de experimentar o prazer.
Torna-se necessário aprender a trabalhar as emoções internamente, na
relação interpessoal e intergrupal em qualquer ambiente para se viver
melhor.
É preciso saber conhecer-se, compreender-se e aceitar-se, buscando
não exigir a perfeição de si próprio, transpondo o mesmo movimento
para as relações com as outras pessoas. É preciso também buscar
aceitar as pessoas como elas se apresentam (o que não significa
concordar com suas ideologias e ações), sabendo impor os limites para
as relações sobreviverem e crescerem, sem delas exigir a perfeição que
corresponde às expectativas que alguns exigem de si mesmos e que são
refletidas numa rejeição ao comportamento do outro.
O RELACIONAMENTO HUMANO E
OS EFEITOS COMPORTAMENTAIS DA COMUNICAÇÃO
Como se organizam, no indivíduo, a razão a e emoção? (Dois processos
indissociavelmente ligados)
Numa relação interpessoal, os afetos e toda a comunicação não-verbal,
são os primeiros fatos que se percebem.
O comportamento dos homens é fundamentado na maneira como eles sentem
e interpretam o que lhes acontece. Em sua vida imaginária, que
funciona paralelamente ao mundo real, vão-se registrando e
significando os acontecimentos que se sucedem.
A conduta individual está intimamente relacionada com a maneira de a
pessoa sentir sua vida e interpretar, com seus pensamentos, a
realidade vivida. Portanto, cada um, pela forma de lidar com suas
emoções e criar crenças e concepções do mundo, sofre forte influência
da educação recebida em seu meio.
Os problemas nos relacionamentos originam-se mais da maneira de pensar
(no imaginário) e de interagir de cada um, influenciando muito também
o aprendizado cultural, do que da maneira de lidar consigo e com o
outro.
No convívio social, aprende-se muito como se deve pensar, sentir e
comportar-se. Todavia, em geral, não se observam espaços sociais em
que as pessoas questionam a eficácia dessas regras de acordo com seus
objetivos da sua vida. E, muitas vezes, as suas contradições estimulam
a criação de fantasmas (falta de contato com a realidade) e um “tabu”
ao falar do tema.
Existem regras que impedem a interligação do imaginário, destacado-se
a seguinte: a razão pode controlar o curso ameaçador interno, quando o
que se sente incomoda. Por isso, muitas pessoas acreditam que é
possível o controle psíquico pelo apelo a uma razão coercitiva.
No decorrer da existência, aprendem-se socialmente inúmeras regras de
viver que levam a uma autêntica dissociação entre as duas vertentes do
imaginário humano (a cognitiva e a afetiva). Aprende-se a desligar a
consciência do que se sente, dissociando o pensamento do sentimento.
Esse mecanismo psíquico, criado pela educação repressora no convívio
social e pela falta de habilidade do sujeito em tolerar a frustração
sentida, é acionado diversas vezes e limita o desenvolvimento da
inteligência, da criatividade, da espontaneidade, do pensamento
crítico e reflexivo, da alegria, da capacidade de persuasão e
realização humana.
Aprende-se que não é possível lidar com as emoções; que elas só
atrapalham o percurso autônomo do ser; que o movimento, a mudança, a
crise, os problemas e as falhas ou os erros são “malvistos”.
Contudo, a existência humana é uma constante pulsação entre movimento
e transformação (o que gera insegurança) e, por outro lado, a
tentativa de organizar o que se vive (a busca das certezas, verdades
que dá a sensação de segurança).
É natural que o ser humano seja contraditório. O controle total sobre
si mesmo e sobre as situações vividas não é possível. Ele pode
conhecer-se cada vez mais, melhorar seu modo de viver com os outros
e de sentir-se mais feliz na vida.
Então, quais os caminhos do resgate do funcionamento livre e
organizado do imaginário dos homens? Como diminuir a fragmentação do
imaginário que durante séculos foi incentivada? Como ampliar a
inteligência humana que conduz à felicidade?
Uma vez que o homem é um ser eminentemente emocional, como perceber,
entender e lidar com seus sentimentos? Tema este tão importante é,
geralmente, negligenciado no trabalho, nos convívios sociais, até
mesmo na educação escolar.
O que não é mencionado e “trabalhado” se torna mais difícil de lidar,
passando a ser tabu entre as pessoas.
Que pode ser feito?! É possível administrar as emoções? Como
transcender o sofrimento patológico e torná-lo criativo? As pessoas
podem desconstruir os condicionamentos que as limitam em novas
oportunidades de crescimento e prazer?
QUE ACONTECE NA COMUNICAÇÃO DOS RELACIONAMENTOS HUMANOS?
A comunicação, seja verbal seja não-verbal, é muito importante, pois
é ela que estimula e dá o rumo da relação dos intelocutores, gerando
seus comportamentos.
No primeiro contato, geralmente se dá a expressão de desejos, imagens
de si e do outro, gerando inúmeras expectativas e dramatização de
papéis sociais. Consciente ou inconscientemente, as questões abaixo
passam na subjetividade das pessoas, fundamentando e organizando suas
ações:
“Como quero que o outro me veja?”
“Como vejo o outro?”
“Qual a imagem que tenho de mim?”
“Qual a imagem que acho que o outro tem de mim?”
“Qual a imagem que o outro demonstra que tem de mim?”
A forma como cada um lida com esses questionamentos vai determinar a
comunicação que lança no ambiente.
Depois que já se forma uma opinião sobre o outro (quem ele é ? como se
comporta ? e, conseqüentemente, como será a relação com ele ?),
geralmente se criam profecias auto-realizadoras, pois o desejo de um
estimula o desejo do outro influenciando suas ações.
Muitas vezes se esquece de perceber que a interação entre duas ou
mais pessoas é definida em conjunto. Os seus olhares, as suas
posturas corporais, as suas expressões fisionômicas, os seus suspiros,
os tons de voz, as respirações, as suas palavras ou silêncios conduzem
o rumo da relação. Mas a postura de espectador impede as pessoas de
perceber que elas também são co-responsáveis pelo que acontece em suas
relações.
Nos seus contatos, as pessoas expressam como querem que o outro as
veja, ou seja, a imagem que querem que o outro tenha delas.
Demonstram também a forma como vêem a outra pessoa, manifestando o
desejo de que essa pessoa mantenha esse padrão de comportamento
esperado.
Um dos problemas dos relacionamentos humanos é que, através do
aprendizado comportamental, se aprende a aceitar e executar o desejo
do outro (as regras de relação que estão por trás de todo olhar,
gesto, expressão fisionômica e palavra), sem questionar e entender o
seu sentido.
Então, para o aprimoramento das relações interpessoais, é importante a
reflexão:
“Como é o meu olhar para o outro?”
“Que tipo de relacionamento me proponho a estabelecer com ele?”
“Tenho necessidade de ser olhado como vítima? Como perseguidor? ou
Como salvador ?”
Esses são papéis sociais que, na visão da Análise Transacional, as
pessoas assumem quando querem controlar suas relações e manter seus
scripts de vida escolhidos, gerando relacionamentos de dependência
recíproca, o que impede a percepção de que é possível lidar, de uma
forma mais construtiva, com o sofrimento que carregam.
Numa relação entre duas pessoas, ambas são co-responsáveis por tudo
que ali se passa. Mas, se um indivíduo busca crescer, é fundamental
que se predisponha a ultrapassar as barreiras de comunicação que
surgem nesse vínculo. Não se pode mudar o outro.
Viver é uma “prática” constante consigo mesmo e com o próximo.
Não é nada fácil relacionar-se consigo e com as outras pessoas. As
relações são trabalhosas e exigem empenho e disposição.
O maior instrumento profissional de um indivíduo é o seu próprio
desenvolvimento como pessoa.
A DIFICULDADE DE LIDAR COM A RAZÃO
Quanto ao desenvolvimento do imaginário humano, é importante entender
e aprender a lidar com a razão coercitiva, que muito aprisiona a
inteligência.
Algumas crenças que são aprendidas nessa cultura incentivam a
fragmentação do imaginário e impedem o crescimento pessoal e dos
relacionamentos.
Aprende-se a pensar de uma forma binária, dualista, em que se divide o
mundo em duas esferas: a do bem e a do mal. Dessa maneira, incentiva-
se a postura mais infantil e egocêntrica, pois se acredita que, diante
do sofrimento, o inimigo está sempre presente. Nesse caso, o culpado é
sempre e só o outro. Diminui-se o entendimento da situação vivida,
pois não se busca a co-responsabilidade nas relações sociais.
Assim, estimula-se outra maneira de pensar: a de que o outro se deva
relacionar consigo da mesma maneira que é tratado. A maneira
egocêntrica de o indivíduo posicionar-se em suas relações, buscando
satisfação imediata de suas vontades, dificulta que assuma uma postura
mais madura e menos infantil. Isso também se relaciona com a
dificuldade de aceitação do espaço alheio, suas singularidades e do
não-controle das situações. Por outro lado, a capacidade de um
indivíduo lidar com imagens contraditórias de si e do outro, imagens
positivas e negativas que constrói, desconstrói e reconstrói ao longo
da vida é que lhe possibilita o desenvolvimento da segurança e
maturidade pessoal.
Outra crença que dificulta a expansão do imaginário é a de que, para
se manterem bons relacionamentos, é fundamental a uniformidade de
idéias e expressões. O problema é querer ser criativo quando só se
convive com aqueles que estimulam a mesma reprodução de mundo, de
maneira de pensar, de expressar-se e de agir. Nesses casos, diante da
heterogeneidade de expressões, o comportamento reativo e defensivo é
acionado, sem perceber o quanto se perde no não-questionamento de suas
próprias convicções.
A educação repressora dos sentidos (cognitivos e afetivos) estimula
os preconceitos e estereótipos que dificultam a abertura a novas
experiências e idéias. A dificuldade em lidar com as mudanças no
ambiente pode representar a insegurança e a intolerância a suas
próprias inovações e ao apego a modelos mentais (formas de entender o
mundo) que levam à conformidade, à falta de perspectiva, à reprodução
de ações insatisfatórias e à revolta. No aparecimento de raciocínios
distorcidos, as pessoas geralmente utilizam generalizações exageradas,
rotulagem destrutiva, leitura de pensamentos alheios, estipulam regras
de como o outro deveria agir e aumentam a importância de um
acontecimento.
Diante da adoção dessa postura reativa e defensiva, é preciso
solidificar os modelos mentais que se sustentam. Aprende-se a crença
de que a solução para os problemas pessoais está em mudar o outro,
coagindo-o, ameaçando-o, atribuindo-lhe culpas e remorsos. Assumir
responsabilidade perante suas escolhas não é um processo fácil de ser
aprendido. Muitas vezes se opta por coerções a outrem na busca de
alívio emocional, o que só intensifica a tensão interna.
Por outro lado, existe a exigência da perfeição de si e do outro. Esse
processo de exigência pode tornar-se muito doloroso pela falta de
compreensão e tolerância consigo e com os outros, em vez de se buscar
o aperfeiçoamento em suas ações.
Como ser perfeito ou querer que o outro o seja se não é possível
expressar o que se sente, pois externar as emoções é sinal de
fraqueza? Neste sentido, fica complicado atingir os ideais de
crescimento sociais, uma vez que não é possível conhecer-se, expandir-
se e transformar-se. Emoção significa movimento para fora. Ela assim o
pede. O movimento de expressão emocional permite o indivíduo diminuir
a alienação pessoal, ser mais coerente e persuasivo. Mas não basta
apenas a pura catarse emocional. Há situações em que é melhor nem
haver a catarse, pois existem outros sofrimentos acumulados a serem
descarregados em alvos inapropriados. O importante é expressar-se,
questionando seu modo de perceber e o do outro, lembrando-se do
objetivo que existe em comum para não se perder o foco das
comunicações e a responsabilidade de cada um nesse trajeto.
Existe uma crença nessa cultura de que o erro é um fato abominável em
todas as circunstâncias. A forma como se encara o erro é muito penosa,
impedindo a criatividade e o crescimento das pessoas.
Ao mesmo tempo, incentiva-se o pensamento de subestimação e a postura
de retirada das relações sociais: Não vou fazer o que quero, pois,
certamente, alguém já pensou isso e fará melhor que eu.
A retirada das relações sociais é a maior frustração que alguém se
pode impor e, ao mesmo tempo, enfraquece a subjetividade e mina a
energia do organismo.
Como não se aprende a lidar com as emoções e principalmente com o
sofrimento, ensina-se a postura de orgulho e a reatividade. O excesso
de valorização de si mesmo é ensinado como demonstração de quem possui
amor próprio e, conjuntamente, a subestimação dos referenciais
alheios. Essa atitude pode representar inconscientemente a dúvida em
si, a inveja por alguns, e o resultado é que quase sempre afasta os
outros.
O SOFRIMENTO HUMANO: DO SOFRIMENTO PATOLÓGICO AO CRIATIVO
A vida, assim como qualquer atividade nela realizada, pode ser fonte
tanto de prazer quanto de sofrimento. Dependendo da forma como se
estabelecem as relações de trabalho e como as pessoas se posicionam e
lidam consigo mesmas, pode-se fazer com que o sofrimento, que,
geralmente, leva a doenças, se torne criativo, isto é, leve ao
crescimento pessoal e profissional.
Um dos objetivos deste artigo não é querer eliminar o sofrimento da
vida humana. Isso seria em vão, se não absurdo. Mas, pretende minimizá-
lo e possibilitar uma reflexão em que se possa crescer com ele.
Pretende-se refletir sobre a forma de se encarar o sofrimento. Parte-
se do pressuposto de que ele pode adquirir um sentido: a busca de
desafios, dentre outros.
Muitas criações vêm do sofrimento. Por exemplo, tem-se o encontro de
respostas práticas na situação de trabalho, no cotidiano, no
desabrochar da imaginação, na criatividade e na iniciativa dos
trabalhadores.
Refere-se aqui ao resgate do trabalho de concepção que é produzido por
um ser pensante, sensível e criativo, em oposição ao trabalho de
execução produzido por um ser embotado, com atitudes de um autômato.
A transformação do sofrimento em criatividade passa pelo espaço da
consciência e da palavra: o diálogo entre os homens ou “espaço
público” (conceito de Chanlat, 1993, p.171), que é construído pela voz
e decisão nos atos.
Esse espaço público passa pelo diálogo que conduz ao resgate da
transparência e das relações de confiança, a qual só se estabelece na
naturalidade dos gestos e na expressão coerente entre o pensamento e a
emoção.
O sofrimento pode-se tornar criativo quando os indivíduos, aprendendo
a lidar consigo mesmo nas situações que lhe são embaraçosas, com os
seus pensamentos e suas emoções, aprendem a ser felizes; canalizam a
energia para alvos que dão significado à existência. Sublimam...
Sublimar o sofrimento implica um trabalho criativo e de concepção, em
que muitas questões internas passam a ser respondidas no envolvimento
social.
David Viscott, em seu livro “A linguagem dos sentimentos”, diz o
seguinte a esse respeito:
" É doloroso você não ser o melhor de si mesmo. Para tal, é preciso
tornar-se honesto com os seus sentimentos. Abandonar a expectativa de
ser perfeito e ocultar o que se sente... Porque o que você sente é
você." (1982, p.117)
O autor aponta, em outro momento, a importância da ação de cada
pessoa:
"Cada um de nós é o arquiteto de seu próprio futuro... Ninguém pode
criar vida para nós mesmos. Muitos podem apontar caminhos, ajudar a
definir as metas, mas o trabalho, a responsabilidade e a alegria são
só nossas." (Viscott, 1982, p.67, 68)
A autora deste artigo entende que, por um lado, a responsabilidade é
do indivíduo, mas, por outro, depende também da presença de condições
sociais em que a pessoa possa engajar-se. A capacidade de sublimar, de
mudar os parceiros da história pessoal, sair do espaço privado e
entrar no social, trabalhando as questões surgidas no espaço privado,
confrontando-as, desconstruindo identidades que não são mais
sustentáveis pelo indivíduo e reconstruindo-as no espaço social,
principalmente no trabalho, em que se passa a maior parte do tempo,
depende de situações sociais em que seja viável o envolvimento do
indivíduo como co-produtor. O espaço social, como o trabalho, por
exemplo, deve oferecer condições, ocasiões para o sujeito desenvolver
suas questões internas, suas habilidades e realizações, e reconstruir
sua história. As organizações podem beneficiar-se da força intensa (a
tão desejada motivação) que nasce da mobilização dos processos
psíquicos inconscientes de cada trabalhador. Difícil e desafiante é
conciliar os objetivos organizacionais, os modelos de produção e de
gestão de pessoas com o inconsciente dos trabalhadores.
Segundo Chanlat (1993, p.159)," ... na impossibilidade de elaborar nas
organizações essas condições favoráveis, o sujeito não pode beneficiar-
se do trabalho para dominar seu sofrimento e transformá-lo em
criatividade." Em conseqüência, ele não se engaja no trabalho como
poderia e certamente, como a organização gostaria.
O mesmo processo se dá em qualquer modelo de organização social: na
família, nas relações amorosas, na escola e universidade, no governo,
nos grupos religiosos e nos outros agrupamentos sociais. Existe uma
educação que, ao mesmo tempo, possibilita e cria vários obstáculos ao
posicionamento dos homens com maior maturidade, confrontando suas
questões e buscando co-responsabilidade na resolução de problemas
vividos. O modelo de funcionamento das organizações sociais estimula,
às vezes, a integração e, muitas vezes, a fragmentação do imaginário
humano. Por outro lado, quem produz as organizações sociais é o
próprio ser humano integrado e, simultaneamente, fragmentado em seu
imaginário. Daí, ser de extrema importância a forma como se
administram as comunicações sociais na escola, nas famílias, nas
universidades, no governo, na mídia em geral e nas empresas. É
preciso, pois, repensar os modelos de gestão de comunicação e de
produção de subjetividades.
A saída aqui proposta à integração do imaginário encontra-se no
conhecimento de si mesmo e do outro, no confronto de pensamentos e
emoções e na criação de espaços públicos que possibilitem a construção
em conjunto das organizações sociais, e não apenas na reprodução de
modelos arcaicos. É importante repensar a comunicação como um processo
de diálogo e de criação de um "espaço público" entre as pessoas.
BIBLIOGRAFIA
CHANLAT, Jean-François. O Indivíduo na Organização: dimensões
esquecidas. S.P., Atlas, 1993.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional. R.J., Objetiva, 1995.
LAPIERRE, Laurent. Imaginário e Liderança. S.P., Atlas, 1995.
LEMOS, Paulo. Educação Afetiva. S.P., Lemos, 1993.
MEININGER, Jut. O Sucesso através da Análise Transacional. R.J.,
Artenova, 1974.
OLIVEIRA, Marco Antônio G. Análise Transacional na Empresa. S.P.,
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RAPPAPORT, Clara Regina. Teorias do Desenvolvimento. V.1. S.P.,
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_______________Os Papéis que vivemos na Vida. R.J., Artenova, 1976.
VISCOTT, David. A Linguagem dos Sentimentos. S.P., Summus, 1982.
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WEIL, Pierre. A Arte de Viver em Paz. S.P.,Gente, 1993.