IDENTIDADE E EXCLUSÃO SOCIAL

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Eliana Guimarães (Psicóloga)

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Nov 7, 2008, 7:24:08 AM11/7/08
to Midiateca: Eliana Guimarães (Psicóloga)
IDENTIDADE E EXCLUSÃO SOCIAL

INTRODUÇÃO

A identidade é apreendida, através das representações de si em
resposta à pergunta ‘Quem és’. Esta representação é resultado de uma
articulação entre a identidade pressuposta, da ação do individuo e das
relações nas quais está envolvido concretamente. Ela é o
reconhecimento de que um indivíduo é o próprio do que se trata, e
também é unir, confundir a outros iguais. É do contexto histórico e
social em que o homem está inserido, que decorrem as possibilidades e
impossibilidades, os modos e alternativas de sua identidade. Neste
contexto também, constatamos o fenômeno de exclusão social que está
ligado às relações de dominação e exploração que definem o mundo
capitalista. Conhecer o processo social ligado a identidade e o
fenômeno da exclusão e suas formas de manifestação, é preciso para que
o psicólogo em sua atuação contribua com o processo de inclusão social
dos indivíduos na sociedade. Portanto, serão expostas algumas
informações sobre estes temas.


1. IDENTIDADE


O autor afirma que nossa identidade se mostra como a descrição de uma
personagem, cuja vida, aparece numa narrativa. A identidade de uma
personagem constitui a de outra e vice-versa, como também a identidade
dos personagens constitui a do autor, e este se oculta por trás da
personagem. Somos ocultação e revelação. Nós nos identificamos com
nosso nome. Nosso primeiro nome (prenome) nos diferencia de nossos
familiares, enquanto o último (sobrenome) nos iguala a eles. Diferença
e igualdade é uma primeira noção de identidade. O conhecimento de si é
dado pelo reconhecimento recíproco dos indivíduos identificados
através de um determinado grupo social que existe objetivamente. A
identidade é constituída pelos diversos grupos de que fazemos parte. É
pelo agir, pelo fazer que alguém se torna algo: nós somos nossas
ações, nós nos fazemos pela prática. A identidade pressuposta é
reposta, é vista como dada. Eu como ser social sou um ser-posto. A
posição de mim me identifica, discriminando-me como dotado de certos
atributos que me dão uma identidade considerada formalmente como
atemporal. Cada posição minha me determina, fazendo com que minha
existência concreta seja a unidade da multiplicidade que se realiza
pelo desenvolvimento dessas determinações. Em cada momento de minha
existência, embora eu seja uma totalidade, manifesta-se uma parte de
mim como desdobramento das múltiplas determinações a que estou
sujeito. Eu compareço frente aos outros como representante de mim. As
identidades, no seu conjunto, refletem a estrutura social, ao mesmo
tempo que reagem sobre ela conservando-a ou a transformando. Meu
comparecimento frente a outrem envolve representação num tríplice
sentido: eu represento enquanto estou sendo o representante de mim; eu
represento enquanto desempenho papéis; eu represento enquanto reponho
no presente o que tenho sido, enquanto reitero a apresentação de mim.
Só posso comparecer no mundo frente a outrem efetivamente como
representante do meu ser real quando ocorrer a negação da negação,
entendida como deixar de presentificar uma apresentação de mim que foi
cristalizada em momentos anteriores – deixar de repor uma identidade
pressuposta – ser movimento, ser processo, ou, para utilizar uma
palavra mais sugestiva se bem que polemica, ser metamorfose. O “ser
ser o que é” implica o seu desenvolvimento concreto: a superação
dialética da contradição que opõe Um e Outro fazendo devir um outro
que é o Um que contém ambos. O homem é homem como uma afirmação da
materialidade da contínua e progressiva hominização do homem. Não é
possível dissociar o estudo da identidade do individuo do da
sociedade. É do contexto histórico e social em que o homem vive que
decorrem suas determinações, e conseqüentemente, emergem as
possibilidades ou impossibilidades, os modos e as alternativas de
identidade. A tendência geral do capitalismo é constituir o homem como
mero suporte do capital, que o determina, negando-o enquanto homem, já
que se torna algo coisificado (trabalhador-mercadoria e não trabalha
autonomamente; capitalista-propriedade do capital e não proprietário
das coisas). O verdadeiro problema de identidade do homem moderno: a
cisão entre o individuo e a sociedade, que faz com que cada individuo
não reconheça o outro como ser humano e conseqüentemente, não se
reconheça a si próprio como humano. A questão da identidade nos remete
necessariamente a um projeto político. Trata-se de considerar a
superação dialética desse dualismo (homem só como subjetividade versus
homem só objetividade) pela práxis. Trata-se de engajar em projetos de
coexistência humana que possibilitem um sentido da história como
realização de um futuro a ser feito com os outros. Projetos que possam
tender, convergir ou concorrer para a transformação real de nossas
condições de existência, de modo que o verdadeiro sujeito humano venha
a existência, e estes, devem ser feitos coletivamente e de forma
democrática (entendida aqui como forma racional). O que pode impedir
este engajamento consciente num projeto político, é ter uma atitude,
de um lado intelectual, frente à questão da relação do individuo e
sociedade, semelhante àquela que nos leva a discutir quem nasceu
primeiro, o ovo ou a galinha, e ter uma concepção de identidade como
permanência, como estabilidade; patologizando a crise e a contradição,
a mudança e a transformação. Assim estancamos o movimento,
escamoteamos a contradição, impedimos a superação dialética.
Identidade é movimento, é desenvolvimento do concreto, é metamorfose.
É sermos o Um e um Outro, para que cheguemos a ser Um numa infindável
transformação.

2. OS PROCESSOS PSICOSSOCIAIS DA EXCLUSÃO

A exclusão induz sempre uma organização específica de relações
interpessoais ou intergrupos, de alguma forma material ou simbólica
através da qual ela se traduz: no caso da segregação, através de um
afastamento, da manutenção de uma distância tipológica; no caso da
marginalização, através da manutenção do individuo à parte de um
grupo, de uma instituição ou corpo social; no caso da discriminação,
através do fechamento do acesso a certos bens ou recursos, certos
papéis ou status, ou através de um fechamento diferencial ou negativo.
A psicologia social procura focalizar as dimensões ideais e simbólicas
e os processos psicológicos e cognitivos que se articulam aos
fundamentos materiais dessas relações. Procura abordar estas dimensões
e processos, considerando o espaço de interação entre pessoas ou
grupos, no seio do qual elas se constroem e funcionam. Ela tenta
compreender de que maneira as pessoas ou grupos que são objetos de uma
distinção são construídos como uma categoria à parte. A interrogação
dos psicólogos sociais sobre exclusão foi suscitada, desde o período
entre as duas guerras, pela ascensão do fascismo, e depois pelas
execuções nazistas na Europa e pela exacerbação das defesas contra a
imigração e os conflitos raciais nos Estados Unidos. Centralizada
inicialmente nas relações raciais, ela se estendeu às relações
estabelecidas no espaço social e político, em um continuum indo do
conflito à cooperação, entre grupos de toda espécie, diferenciados
segundo critérios de atividade ou te pertencimento social, nacional,
cultural, etc. A produção seria a própria ação grupal, que se dá pela
participação de todos, seja em torno de uma tarefa, seja visando um
objetivo comum. Seria o processo de produção do grupo se organizar,
assumir papeis, realizar tarefas. A atenção dirige-se, primeiramente,
aos comportamentos hostis que dão à exclusão manifestações extremas,
sendo as primeiras delas os linchamentos e os “pogroms”. Desde antes
da 2ª guerra Mundial, a teoria da frustação-agressão (Dollarde et al,
1939), inspirada na teoria freudiana, acentua a existência de
motivações hostis que podem ser ativadas por uma situação de
frustração. Quando a tendência agressiva não pode ser descarregada
diretamente sobre a causa da frustração, porque ela é ou muito
poderosa ou mal identificada, ela seria deslocada para alvos mais
acessíveis ou frágeis. O fenômeno de deslocamento sobre um “bode
expiatório” (Bettelheim e Sanowitz, 1964) nem sempre faz aparecer
comportamentos abertamente agressivos, mas mesclados de atitudes
depreciativas, sob a forma de preconceitos e de estereótipos
negativos. Esse caso foi estudado por Milgran (1974) que interrogando-
se sobre a concordância dos alemães face às sevícias infligidas aos
judeus, realizou uma experiência, vulgarizada publicamente pelo filme
L comme Ícare de Verneuil. Nessa experiência ele coloca em evidência a
força do poder e a submissão à autoridade. Basta para prejudicar o
outro que a ordem emane de uma posição de poder. Nos contextos sociais
onde dominam valores e crenças que favorecem o desprezo das vítimas,
porque elas são vitimas maltratadas, exploradas, poder ser difícil
adotar uma posição contraria por temor de nos encontrarmos em uma
situação incômoda em relação ao grupo ao qual pertencemos. Um grupo de
pesquisadores pertencendo à escola de Frankfurt (Adorno, Frankel-
Brunswick, Levinson e Sanford, 1950) com a teoria da personalidade
autoritária, associam a ideologia e a personalidade para dar conta das
tomadas de posições racistas e antidemocráticas. Eles postulam crenças
que, à primeira vista, parecem sem relação, são ligadas por uma
relação psicodinâmica. Assim atitudes políticas e econômicas do tipo
conservador (respeito ao status quo e resistência à mudança), o
etnocentrismo, caracterizado por uma tendência rígida a aceitar
aqueles que são diferentes, fazem parte do anti-semitismo e dos
fatores de personalidade que definem o autoritarismo. A tendência
antidemocrática modelada por uma educação familiar autoritária,
determina uma disposição de espírito geral: convencionalismo e desejo
de punir aqueles que vão contra os valores convencionais (agressão
autoritária), respeito pela força, desprezo pela fraqueza,
intolerância á ambigüidade, recusa da introspecção e da imaginação,
repressão e projeção nos bodes expiatórios de sentimentos negativos,
rejeição do diferente, etc. Os modelos psicodinâmicos que acabamos de
examinar fazem intervir dois mediadores importantes da exclusão, os
preconceitos e os estereótipos. Estas designam os processos mentais
pelos quais se operam a descrição e o julgamento das pessoas ou de
grupos, que são caracterizados por pertencer a uma categoria social ou
pelo fato de apresentar um ou mias atributos próprios a esta
categoria. O preconceito é um julgamento positivo ou negativo,
formulado sem exame prévio a propósito de uma pessoa ou de uma coisa e
que, assim, compreende vieses e esferas específicas. Na linguagem
cognitivista do tratamento da informação, os estereótipos são esquemas
que concernem especificamente os atributos pessoais que caracterizam
os membros de um determinado grupo ou de uma categoria social dada.
Eles são considerados como resultantes de processos de simplificação
próprios ao pensamento do senso comum. Na literatura
psicossociológica, o termo categorização tem dois sentidos. Aquele da
classificação em uma divisão social: colocamos as pessoas em uma
categoria dada, por exemplo, homens e mulheres, jovens e velhos, etc.
aquele da atribuição de uma característica a alguém, caso este que
podemos relacionar com a estigmação ou estereotipo. Existe, é claro,
uma relação entre estes dois sentido: imputar uma característica a um
conjunto de objetos pode servir para constituí-lo em uma classe
definida pela divisão desta característica; haveria uma tendência para
selecionar e interpretar as informações de que dispomos sobre os
indivíduos e os grupos de maneira congruente com o que nós pensamos da
categoria na qual nós as colocamos. A categorização segmenta o meio
social em classes cujos membros são considerados como equivalentes em
razão de características, ações e intenções comuns. A imagem que temos
de nós próprios encontra-se assim ligada àquela que temos de nosso
grupo, o que nos conduz a defendermos os valores dele. Preconceitos e
estereótipos se alimentam do discurso social e de sua retórica
(Billig, 1987) para servir às forças de poder na regulação das
relações entre os grupos que se confrontam em situações sociais e
políticas concretas.

3. PRESSUPOSTOS PSICOSSOCIAIS DA EXCLUSÃO:

COMPETITIVIDADE E CULPABILIZAÇÃO


As relações de dominação e exploração são as que definem o mundo
capitalista. A sociedade e o mundo do trabalho estão se estruturando a
partir de mecanismos que impossibilitam, por principio, o acesso de
grande parte das pessoas ao mundo do trabalho. A isso se chama
exclusão.
O progresso e o desenvolvimento só são possíveis através da
competitividade. A competitividade exige a exclusão de alguns e o
privilegiamento de outros, para que sejam estabelecidos parâmetros de
oposição que vão forçar as pessoas, na competição, a ter de lutar para
não serem rejeitas e excluídas. As pessoas são individualmente
responsabilizadas, por uma situação econômica adversa e injusta. A
modernidade confinou-nos numa ética individualista, uma microética que
nos impede de pedir, ou sequer pensar, responsabilidades globais, como
é o caso da exclusão de milhões. A posição “cientifica” mostra
desconfiança com respeito ao conhecimento espontâneo das pessoas
comuns. O conhecimento cientifico dissipa a ignorância, fantasiada com
os erros de um conhecimento não-cientifico, através da comunicação e
da educação. Desse modo, seu objetivo e transformar as pessoas numa
multidão de cientistas. Com outras palavras, ainda segundo eles,
quando a ciência se espalhar pela arena social, ela se transformara em
algo poluído e degradado, porque as pessoas serão incapazes de
assimilá-la.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização da leitura destes textos proporcionou a aquisição de
conhecimentos importantes a respeito de como ocorre o fenômeno de
exclusão social e também, como é a questão da identidade e sua relação
com o contexto social onde o indivíduo está inserido. Este trabalho
contribui para a reflexão de como deve ser a atuação do profissional
de psicologia diante do fenômeno de exclusão social tão visível em
nossa sociedade, permitindo buscar formas de intervenção para que se
estabeleça a inclusão social dos indivíduos em todas as esferas
sociais. Portanto, conclui-se que é preciso conhecer e reconhecer os
rumos dos acontecimentos para apreender deles as lições para a ação e
podermos optar e tomar como ponto de apoio àqueles que contribuem
efetivamente para o avanço da luta de classes na perspectiva de
superar o modo do capital organizar a vida, que está acentuando e
acelerando o processo de degeneração, desagregação e destruição das
forças produtivas – o homem, a natureza e o trabalho.


5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. CIAMPA, A. C. - Identidade. In Lane, S.M.T. Psicologia social: o
homem em movimento, pp. 58-75.
2. JODELET, D. - Os Processos Psicossociais da Exclusão. In: Sawaia,
B. (org.) As Artimanhas da Exclusão, pp. 53-155.
3. GUARESCHI, P. A. - Pressupostos Psicossociais da Exclusão:
Competitividade e Culpabilização. In: Sawaia, B. (org.) As Artimanhas
da Exclusão, pp. 141-156.


Mirim Lopes
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