“Masculinidade na história: a construção cultural da diferença entre os sexos”

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Eliana Guimarães (Psicóloga)

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Nov 12, 2008, 1:23:29 PM11/12/08
to Midiateca: Eliana Guimarães (Psicóloga)


“Masculinidade na história: a construção cultural da diferença entre
os sexos”1





Sergio Gomes da Silva*

Endereço para correspondência






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RESUMO

Nos últimos anos, a discussão em torno da identidade do homem
contemporâneo sugere que há uma verdadeira crise da masculinidade.
Assim, procurando seguir o fio condutor através da vertente histórica
da sexualidade, objetivamos neste trabalho verificar como o conceito
de sexualidade e gênero perpassaram a construção cultural da diferença
entre os sexos, e quais implicações teve para a chamada “crise da
identidade masculina” contemporânea.

Palavras-chave: Masculinidade, História da sexualidade, Gênero.


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ABSTRACT

In the last years, the discussion on contemporary man identity
suggests a real crisis of the masculinity. Thus, through the history
of sexuality resources, we aim in this work to verify how the cultural
construction of the difference between sexs built the sexuality and
gender concept, and which implications had for contemporary “crisis of
male identity “.

Keywords: Masculinity, History of sexuality, Gender.


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Nos últimos anos, o debate em torno da identidade masculina tem
apontado para uma verdadeira crise da masculinidade do homem
contemporâneo. O homem estaria sendo colocado em “xeque” porque
estaria perdendo a noção de sua própria identidade, passando a buscar
uma melhor descrição de si. Este fato, conjuraria um certo mal-estar2
semelhante àquele provocado pelo estado de decadência masculina no
final do século passado, conforme descreve Badinter (1993), Schowalter
(1993) e Ceccarelli (1997). Hoje, assim como ontem, a discussão em
torno da diferença entre os sexos conformaria um das características
da crise da masculinidade a que nos referimos.3

Porém, esta discussão não é tão recente assim. Podemos encontrar ecos
dela desde o período vitoriano, conforme atestam os trabalhos de
Foucault (1986), Costa (1995), Gay (1995), Almeida (1995), Badinter
(1986, 1993), Spencer (1996), Birman (1997), entre outros.

Da teoria do monismo e dualismo sexual, passando pelo culto à
masculinidade e finalmente chegando aos movimentos de minorias sociais
da década de 60 até hoje, tornou-se comum questionar as diferenças
entre homens e mulheres, baseando em uma hegemonia sexista e de gênero.
4

Vejamos, então, como o conceito de sexualidade e principalmente de
gênero perpassaram a construção cultural da diferença entre os sexos,
e quais implicações esta teve para a chamada “crise da identidade
masculina” contemporânea.



A diferença entre os sexos

Até o século XVIII, não era possível encontrar um modelo de
sexualidade humana conforme entendemos hoje. Foucault (1986) vai
ressaltar que o próprio termo sexualidade é um termo surgido no século
XIX, portanto pertencente às sociedades modernas e pós-modernas.

Sem possuir um vocabulário que desse conta da sexualidade de homens e
mulheres, o que vai se estabelecer são normas da diferença sexual
entre ambos. A concepção dominante até então era a do one-sex-model ou
monismo sexual. “No one-sex-model, que dominou o pensamento anatômico
por dois milênios, a mulher era entendida como sendo um homem
invertido. O útero era o escroto feminino, os ovários eram os
testículos, a vulva um prepúcio e a vagina era um pênis” (Laqueur,
1989, citado por Costa, 1995, p. 100).

O modelo de perfeição estava representado na anatomia masculina, onde
a regra fálica5, distinguia perfeitamente o domínio de superioridade e
inferioridade masculina e feminina respectivamente. Concebida como um
homem invertido e inferior, a mulher será um sujeito “menos
desenvolvido” na escala da perfeição metafísica.6

Na tentativa de manter e estabelecer as diferenças entre os sexos,
outras teorias também serão construídas, conforme apontam os achados
de Costa (1995), Badinter (1996) e Almeida (1996). Porém, a narrativa
mantém a diferença inferior da natureza anátomo-fisiológica da mulher.

Com o modelo de perfeição do corpo do macho, todas as outras
características dependerão dessa forma. A relação entre reprodução,
sexo e orgasmo todas serão seguidas conforme o modelo masculino.

Foi apenas na passagem do século XVIII para o século XIX que as
sensíveis mudanças passariam a ocorrer, como a queda do conceito de
unicidade e perfeição do corpo masculino para o two-sex-model (Birman,
1997; Costa, 1995; Badinter, 1993; Almeida , 1995).

Se a diferença entre os gêneros anteriormente voltava-se para a
relação anátomo-fisiológica, com o two-sex-model, “o sexo político-
ideológico vai ordenar a oposição e a descontinuidade sexuais do
corpo” (...) justificando e impondo “diferenças morais aos
comportamentos femininos e masculinos, de acordo com as exigências da
sociedade burguesa, capitalista, individualista, nacionalista,
imperialista e colonialista implantada nos países europeus” (Costa,
1995, p. 110-111).

De homem invertido, a mulher passa a ser o inverso do homem, ou, sua
forma complementar. Apesar disto, as conseqüências morais dela
advinda, manteriam ainda a inferioridade da mulher no conflito entre
as esferas pública e privada, no conceito neoplatônico científico e
religioso do mundo e na importância da nova ordem político-econômica
do novo estado burguês (Costa, 1995).

Parker (1991) enfatiza este pensamento, ao reconhecer que “as
atividades do homem eram dirigidas para o mundo social mais amplo da
economia, política e interações sociais, além do âmbito da família,
enquanto os de sua mulher eram rigidamente restringidos, limitavam-se
ao mundo doméstico da própria família” (p. 59).

Por outro lado, a bissexualização originária dos sexos também
ressaltou o domínio masculino sob o feminino, sobretudo referindo-se a
inferioridade da mulher enquanto “fragilidade” do corpo (ossos e
nervos) e posteriormente quanto ao prazer erótico. A mulher seria mais
frágil, desprovida de calor vital e sofreria de menos privilégios que
os homens. A nova concepção da mulher, portanto, havia mudado, porém,
isto não implicaria na saída do patamar de inferioridade em que
costumeiramente fora colocada. A mudança de concepção veio apenas
reiterar a supremacia masculina, e não levar a mulher a um patamar de
maior prestígio.

Com a chegada do século XIX o culto à masculinidade vai ser uma
decorrência direta desta mudança da concepção biológica para a
política, econômica e social, conforme afirmará Laqueur (1991, citado
por Costa, 1995): “Primeiro veio a reprodução das desigualdades
sociais e políticas entre homens e mulheres, justificada pela norma
natural do sexo. Em seguida, o que era efeito tornou-se causa. A
diferença dos sexos passou a fundar a diferença de gêneros masculino e
feminino que, de fato, historicamente a antecedera. O sexo autonomizou-
se e ganhou o estatuto de fato originário. Revolucionários, burgueses,
filósofos, moralistas, socialistas, sufragistas e feministas, todos
estavam de acordo em especificar as qualidades morais, intelectuais e
sociais dos humanos, partindo-se da diferença sexual entre homens e
mulheres” (p. 128).

Seguidamente, a imagem de “homem invertido” da mulher vai se colar ao
próprio homem, demarcando o estatuto de anormalidade frente as
subjetividades sexuais masculinas. O homem agora passaria pela
irremediável possibilidade de ser um “invertido sexual”7, e por
conseqüência, passível de cura, já que a inversão era tida como
“doença” na escala evolutiva humana8. Segundo Foucault (1986),
“sexualidades periféricas provocam a incorporação das perversões e
nova especificação dos indivíduos (itálicos do autor) (...) O
homossexual do século XIX torna-se um personagem (...) É necessário
não esquecer que a categoria psicológica, psiquiátrica e médica da
homossexualidade constitui-se no dia em que foi categorizada menos
como um tipo de relação sexual do que como uma certa qualidade de
sensibilidade sexual, uma certa maneira de inverter, em si mesmo, o
masculino e o feminino” (p. 43).

A partir da inferioridade “social” e “política” da “fragilidade” do
sexo dos “invertidos sexuais” e da mulher, a feminilidade passará a
atormentar o imaginário social do homem burguês. Algo precisava ser
feito para que esse estado de decadência não fosse tomado como norma
social. A partir desse instante, dar-se-á o culto à masculinidade no
século XIX.



O Culto à Masculinidade

A discussão sobre gêneros perpassou o campo fisiológico e chegou aos
ditames das regras e papéis sócio e culturalmente estabelecidos pela
sociedade burguesa do século XIX.9

A Revolução Francesa primeiramente, que apregoava os ideais de
liberdade, igualdade e fraternidade, e posteriormente a Revolução
Industrial e as conseqüentes guerras mundiais que se sucederam,
trouxeram uma desordem no papel do homem burguês, que tentava se
reconstruir, fazendo com que se consolidasse uma masculinidade e uma
virilidade hegemônica comum a todos os homens (Gay, 1995; Mosse, 1998;
Badinter, 1993; Almeida, 1995).

Sob a ameaça de uma feminilidade inerente a alguns homens, decorrente
do medo de tornarem-se homossexuais10, e diante da obrigatoriedade de
por a prova o seu sexo forte, os homens tiveram que cultivar mais do
que nunca a sua masculinidade e a sua virilidade, caracterizando
também a primeira crise da identidade masculina.

Badinter (1993) pontuará a crise da identidade masculina, cujos ecos
chegam até nós, através de países de civilização refinada, ou seja,
“(...) onde as mulheres desfrutam de uma liberdade maior que em outros
lugares; exprimem a necessidade de mudança dos valores dominantes e
são consecutivas a perturbações ideológicas, econômicas ou sociais.
(...) Nos séculos XVII e XVIII, a crise só concerne às classes
dominantes, ou seja, à aristocracia e a burguesia urbana” (p. 11).
Dentro desta ótica, a Europa e os Estados Unidos aí estariam
incluídos. Não é de admirar que o nascimento dos gender’s studies11,
tenham florescido justamente nesses países.12

Gay (1995) em seu Cultivo do Ódio, vai verificar uma estreita ligação
entre a irracionalidade do ódio ao culto à masculinidade e ao seu
respectivo contraste ... a feminilidade.

A preocupação com uma possível feminilização por parte de alguns
homens, fizeram com que investissem e construíssem para si uma série
de papéis e traços representativos da sua condição “masculina”, de
forma que descrevesse melhor o atual homem vitoriano, em contraste com
o seu oposto, a mulher, e mais inadvertidamente, a seu inverso , o
homossexual.

Da mesma forma como alguns homens costumam se descrever hoje, “ser
homem” no século XIX significava “não ser mulher”, e sobre todas as
hipóteses jamais ser homossexual. A identidade sexual e de gênero do
homem vitoriano, estava intrinsecamente ligada à representação do seu
papel na sociedade. Os traços que os descreviam, voltavam-se para a
forma de se vestir, a forma de andar, a maneira de se comportar, a
entonação de voz, etc., assim como também era ressaltado a forma
física, a musculatura, os contornos do corpo masculino, a elegância, o
vigor físico e a beleza, e por fim, as qualidades psicológicas do
homem como a agilidade, a coragem, a distinção, a bravura, o heroísmo,
conforme as descrições pontuadas por Gay (1995). A sociedade
masculinista burguesa, dado essa premissa, construía, assim, a nova
imagem de homem, e como conseqüência vieram as duras provas pelas
quais o homem deveria enfrentar, como as lutas, como um dos
“componentes do comportamento masculino”.

Exemplos de personagens másculos ecoavam através da arte vitoriana,
representada sobretudo na literatura, pintura e escultura da época.
Nos círculos de amizade, ressaltavam-se com eloqüência, quem
representava o mais perfeito ideal de beleza masculina, bem como o
ideal de virilidade.

Se a possibilidade de feminilização era mal-vista para os homens
vitorianos, a masculinização também o era para as mulheres.
Masculinidade e feminilidade, até certo ponto, eram cultuadas, ora
mais para uns, ora mais para outros no século XIX. Homens e mulheres
deveriam restringir-se ao seu papel social de acordo com a sua
identidade biológica, de macho e fêmea, e por conseguinte, sua escolha
afetiva e sexual deveria voltar-se para o sexo oposto ao seu. A norma
desviante era totalmente repelida e punida. Segundo alguns autores
tais como Showalter (1993), Mosse (1998) e Badinter (1993), seriam
estes os marcos que pontuaram o estado da decadência masculina,
sobretudo após a noção de bissexualidade introduzida por Freud.

Por outro lado, Freud reforçou no imaginário social burguês, a idéia
de uma atividade e uma passividade hegemônica no homem e na mulher
(Gay, 1995), frente a sua sexualidade. Observamos isso na maioria dos
seus trabalhos, que tratam da sexualidade dos adultos e das crianças.
13

Enfim, com a noção de bissexualidade e com o crescente avanço dos
movimentos feministas que já nesta época começavam a tomar forma,
sobretudo na Europa, alguns autores (Nolasco, 1993, 1995; Badinter,
1986, 1993) concordam que isto traria como conseqüência, a crise da
masculinidade.

“A busca das mulheres por igualdade e independência, especialmente
forte na Inglaterra, representou o desafio mais efetivo à oposição
social dos homens. Esse desafio incluía uma crítica da sexualidade
masculina, centrada no duplo padrão de comportamento moral que se
esperava de homens e mulheres” (Mosse, 1998, p. 293).

A redefinição da masculinidade fornecida pela decadência e
representada pelos homossexuais, encontrava ancoradouro apenas nos
padrões estereotipados de papéis sociais tão bem sublinhados por Gay
(1995) e Mosse (1998), ao retomarem os valores sociais e culturais
vigentes da época.

“O ideal masculino era um bastão erigido contra a decadência;
representava em palavras, em pinturas e em pedra um ideal de
virilidade casta, o qual penetrou profundamente na consciência
burguesa.” E complementa: “a masculinidade foi a rocha sobre a qual a
sociedade burguesa construiu boa parte de sua auto-imagem, mas a
imagem idealizada da masculinidade parece igualmente para a evolução
da chamada sexualidade anormal, em grande parte, denominada pela
contra-imagem que a fazia representar” (Mosse, 1998, p. 304 ).

Com a saída das mulheres do espaço privado para o público, como
decorrente das duas guerras mundiais, da industrialização e do
movimento feminista que ora tentava se firmar, o resultado foi uma
verdadeira avalanche de pesquisas, discussões e redefinições de papéis
sociais cujo o gênero foi tomado como ponto de partida para a
discussão, e herdeiro dos gender’s studies.

Na medida em que o movimento feminista propunha uma rediscussão acerca
dos novos papéis sociais estabelecidos pela norma sexual e moral
burguesa, tanto para homens quanto para mulheres, e na medida em que
esta discussão passou a ser tomada sob o ponto de vista feminino,
passou-se a ficar mais delimitado e fortalecido a representação da
mulher enquanto “ser social”.

Inaugurava-se, portanto os estudos sobre gênero (gender’s studies),
onde os estudos sobre homens foi um reflexo diretamente decorrido do
avanço dado pelas mulheres na conquista de uma cidadania e de seus
direitos, na ordem pública e privada, na ordem moral e sexual, e que
passaram a propor novamente, uma nova forma de ver o homem, agora,
bastante diferente daquela em que os vitorianos apregoavam.

De fato, como decorrente do aparecimento dos estudos de gênero
masculino na Europa e Estados Unidos, os homens passariam a
reivindicar uma nova qualidade no espaço social, redefinindo a si
mesmo, não mais como um “macho” inveterado, onde sua virilidade
estaria intocada. O novo homem agora admitia sua fraqueza, sua
fragilidade; o corpo já não servia para impor uma condição masculina.
A sensibilidade feminina também passaria a fazer parte das novas
subjetividades masculinas. A forma de vestir, de falar, de se
comportar, já não mais se sustentariam por si só. Até mesmo uma
possível quantidade de feminilidade já passava a ser admitida pelos
homens. Mas nem sempre, esse novo conjunto de características
masculinas contemporâneas, conseguiu dizer da verdadeira identidade
masculina. Ela não conseguiria descrever a todos os homens,
promovendo, com isso, a atual crise de identidade masculina.



Considerações Finais

As nossas identidades (de gênero e sexual) são conflitivas, a medidas
que não são passíveis de escolha. Se estas são muito mais uma
conseqüência direta dos reforços dados pelo processo de socialização,
bem como os conflitos se tornam mais evidentes quando não sabemos mais
nos descrever face às nossas escolhas afetivas e sexuais (independente
do sexo biológico que tenhamos), a discussão, e a recente produção em
torno da mencionada crise da masculinidade, faz apenas aumentar essa
“torre de babel” em que muitos homens hoje se encontram. Há de se
procurar uma saída, talvez aquela em que promova menos conflitos
identitários, e que não corrobore com uma masculinidade hegemônica.

Se a própria história mostra a pluralidade das descrições identitárias
para o homem vitoriano, o mesmo não poderia ser diferente para o homem
contemporâneo.

Com a diversidade de culturas, crenças e a pluralidade de identidades
psicológicas, sociais, de gênero e sexuais na contemporaneidade, é
simplesmente impossível conceber uma hegemonia frente às nossas
identidades, porque elas não são fixas, imutáveis, pelo contrário,
elas estão constantemente sofrendo mudanças, e a cada década, podemos
perceber que cada vez mais a cultura, os modos de vida, de se
comportar, de ser e de estar, vão se alterando, adequando-se às
exigências do próprio tempo.

Há de se pensar para que serve o recurso histórico, quando a ele
recorremos no estudo da nossa sexualidade, das relações sexuais e de
gênero? Serve para mostrar a diversidade/pluralidade de identidades,
por exemplo, masculinas, ao longo da própria história, e aprender com
estas experiências anteriores para que não se cometa os mesmos erros
no futuro. Também há de se pensar que enquanto não nos libertarmos de
conceitos tautológicos e reducionistas, como identidades de gênero
(masculinidade e feminilidade) ou identidades sexuais
(heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade), ou seja,
enquanto não aprendermos a respeitar as nossas singularidades,
construídas através da diversidade histórica, social e cultural em que
vivemos, enquanto não nos respeitarmos enquanto sujeitos, não
conseguiremos respeitar também nossas construções singulares e
identitárias, indiferente se sejamos homens ou mulheres, independente
das nossas particularidades anatômicas, independente dos nossos
desejos afetivos e sexuais, independente, até mesmo, do papel social
que exercemos no nosso dia a dia.

Talvez, essa seja uma saída mais justa, mais ética, mais humana, para
não infringirmos no indivíduo, qualquer espécie de sofrimento psíquico
ou àqueles que ousaram ir contra às regras impostas pela cultura e
pelos processos de socialização, aprendidos ao longo do tempo. Para
não infringirmos sofrimento psíquico aqueles que ousaram questionar os
limites de suas prisões identitárias.



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Endereço para correspondência
Sergio Gomes da Silva
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58015-700 João Pessoa-PB
Tel.: +55-83 981-8865
E-mail: sergio...@uol.com.br

Recebido em 20/04/99
Aprovado em 02/10/99





* Psicólogo graduado pela UFPB. Especialista em Sexualidade Humana,
pelo Centro de Educação, UFPB.
1 -Este artigo é uma ligeira modificação do terceiro capítulo do meu
trabalho de Pós-Graduação Lato Senso (Especialização em Sexualidade
Humana), pelo Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba,
Campus I, 1998.
2 -O sentido que damos para o mal-estar é semelhante àquele referido
por Freud (1930[1929]), na forma conferida Figueiredo (1998), ou seja,
“um estado crônico mas tolerável de desprazer, intrínseco à
constituição do psiquismo e uma condição básica para a procura pelo
homem das felicidades possíveis” (p. 01). O estado de desprazer, de
insatisfação psíquica é o que guiará, no nosso entendimento, a atual
crise da masculinidade. Fala-se, e muito, do verdadeiro significado do
que é ser homem na contemporaneidade, talvez, como resultado de sua
inserção na cultura a qual pertence, onde, por conseguinte, precisa
moldar-se (sustentando ou criticando, aderindo ou rejeitando, se
integrando ou se afastando, obedecendo ou resistindo) às regras
impostas pela cultura e definidas como normas, conformando
características, comportamentos e papéis que não necessariamente sejam
aqueles que condizem com aquilo que ele almeja para si enquanto traços
identificatórios.
3- Para uma melhor compreensão da crise da masculinidade, veja Dorais
(1994a, 1994b), Nolasco (1995a, 1995b) e Badinter (1993).
4 - O emprego do termo hegemonia sexista, refere-se, assim, à
identidade sexual, conforme aprendemos a descrevê-la, ou seja, hetero,
homo ou bissexual, apesar de haver, nos dias atuais, uma certa
pluralidade de identidades sexuais como o(a) transexual, o travestismo
e até mesmo o drag-queen e a drag-king, figurariam como identidades
sexuais possíveis. O emprego do termo hegemonia do gênero, refere-se a
própria identidade de gênero, conforme aprendemos a definí-la.
Entendemos identidade de gênero como o conjunto de traços construídos
na esfera social e cultural por uma dada sociedade, que definem
consequentemente, quais os gestos, os comportamentos, as atitudes, os
modos de se vestir, falar e agir, de forma semelhante para homens e
mulheres. As identidades de gênero tendem a estar em consonância com o
sexo biológico do sujeito, porém, não são estruturas fixas, encerradas
em si mesmas; pelo contrário, podem e estão continuamente se
renovando, em ebulição e a cada momento podem ser novamente moldadas
de outras formas. Elas também são impostas pelo processo de
socialização, que impede construções singulares, moldando
subjetividades comuns a todos os indivíduos. Apesar de não ser uma
condição para a formação das identidades sexuais, elas estão
intimamente ligadas a escolha afetiva e sexual do sujeito. Nós podemos
encontrar sujeitos masculinos ou femininos (identidades de gênero),
que não necessariamente pertencem ao seu sexo biológico, e que podem
fazer uma escolha afetiva e sexual do sexo oposto ao seu. Um programa
de televisão (SBT - Repórter - 1998) pode ilustrar nossos argumentos,
ao mostrar um casal bastante incomum para os padrões normativos de
nossa sociedade. O sujeito “biologicamente masculino” trata-se de um
travesti (possuindo traços, atitudes e comportamentos femininos -
portanto, do gênero feminino). O sujeito “biologicamente feminino”
trata-se de uma homossexual feminina (lésbica) e comporta-se como um
homem (possuindo traços, atitudes e comportamentos masculinos -
portanto, do gênero masculino).
5 -É interessante notar que a psicanálise, herdeira do pensamento
sexista do século XIX, vai se utilizar deste pensamento para construir
sua teoria da sexualidade. Apesar de Freud destacar a importância da
presença ou ausência do pênis no menino, ou o seu correspondente, o
clitóris na menina, a anatomia não é a única condição necessária para
a aquisição de uma masculinidade e de uma feminilidade, mas deve-se
sublinhar sua importância, sobretudo na aquisição de uma identidade
sexual em ambos os sexos, dado que, é a castração que introduz a
menina no complexo de Édipo, e que o finda no menino. Remetemos o
leitor a Freud nos seguintes textos: Três Ensaios Sobre a Teoria da
Sexualidade (1905); Sobre as Teorias Sexuais das Crianças (1907); A
organização genital infantil (uma interpolação na teoria da
sexualidade) (1923); A dissolução do complexo de Édipo (1924); Algumas
conseqüências psíquicas da distinção anatômica entre os sexos (1925);
Sexualidade Feminina (1931); Novas Conferências Introdutórias Sobre
Psicanálise – Conferência XXXIII - Feminilidade (1933[1932]). Rio de
Janeiro: Imago. Ed. Standart Brasileira, Obras Completas.
6 -A semelhança do pênis na mulher, será dada pelos achados de
Renaldus Colombo, em 1559, ao “descobrir” o clitóris na mulher, e
compará-lo a um pênis menos desenvolvido. Este será também o princípio
básico dos achados freudianos na distinção anatômica da diferença
entre os sexos. Conforme Costa, 1995.
7 - Os “invertidos sexuais” era o nome dado ao que hoje denominamos
homossexuais pela medicina oitocentista. As discussões de Costa (1992,
1995) nos dias atuais, tem contribuído para diminuição do “ideário
preconceituoso” em relação ao homoerotismo.
8 -O escritor e teatrólogo inglês Oscar Wilde foi um bom exemplo desse
período. Levado à julgamento pelo crime de “perversão sexual”, por
manter um relacionamento com um jovem, foi condenado a dois anos de
prisão com trabalhos forçados por crime de pederastia e sodomia. A bem
pouco tempo, a Inglaterra reconheceu seu erro, e bem mais
recentemente, diminuiu de 18 para 16 anos a legalização das práticas
sexuais entre pessoas do mesmo sexo.
9 -Compreendemos papéis sociais como “padrões ou regras arbitrárias
que uma sociedade estabelece para seus membros e que definem seus
comportamentos, suas roupas, seus modos de se relacionar ou de se
portar (...) através do aprendizado de papéis, cada um/a deveria
conhecer o que é ser considerado adequado (e inadequado) para um homem
ou para uma mulher numa determinada sociedade, e responder a essas
expectativas.” Conforme Louro, 1997, p. 24.
10 -.Vale lembrar que a imagem do homossexual masculino na Europa
oitocentista estava muito ligado à imagem feminina, dado que o “tipo
homossexual” da época era afeminado, sendo possível, portanto, uma
certa quantidade de feminilidade “atingir” os homens.
11 -Os men’s e women’s studies foram decorrentes do movimento
feminista, como forma de compreender as diferenças entre homens e
mulheres. Se por um lado, os women’s studies passaram a procurar uma
definição do papel feminino mais condizente com a sua importância na
sociedade na segunda metade deste século, por outro, os men’s studies
passaram a rediscutir a masculinidade, procurando criar um papel
masculino que melhor descrevesse o novo modelo que se redefinia na
contemporaneidade.
12 -Diferentemente de Badinter, Veloso (1996) vai reportar-se a um
trabalho comunitário desenvolvido numa cidade metropolitana do
Nordeste do Brasil - Recife - nos dias atuais, junto a um grupo de
homens de classe média baixa e baixa, sob sua coordenação. Estes
homens reúnem-se para discutir o significado de “ser homem” na
contemporaneidade, e discordam quanto ao ideário machista e
masculinista nordestino, construído sobre a égide do patriarcalismo e
suas concepções acerca do sentido de “ser homem” nos dias atuais.
Retomando o pensamento de Badinter (1993) “se a masculinidade se
ensina e se constrói, não há dúvida de que ela pode mudar. No século
XVIII, um homem digno deste nome podia chorar em público e ter
vertigens; no final do século XIX, não o pode mais, sob pena de
comprometer sua dignidade masculina. O que se construiu pode,
portanto, ser demolido para ser novamente construído” (p. 29),
sobretudo após o culto da masculinidade.
13. Veja nota nº 05.


http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S1414-98932000000300003&lng=pt&nrm=iso&tlng=
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