A maioria dos alunos que cursam essa modalidade de ensino é constituída por pessoas com baixo poder aquisitivo
Por Lúcia Rodrigues
Um
em cada cinco estudantes universitários brasileiros está matriculado em
cursos de Educação a distância (EAD) no país. A nova modalidade
educacional surgiu no final da década de 1990, mas foi nos anos 2000 que
esse formato de curso ganhou projeção.
O número de vagas
oferecidas por empresas educacionais aumentou exponencialmente nesse
período. Em 2000 eram 5.287 alunos matriculados em graduações a
distância, em 2009 o total de universitários inscritos saltou para
838.125.
O último dado oficial sobre o número de alunos
matriculados nesse tipo de formato é o do Censo da Educação Superior de
2009. Mas a rapidez com que os cursos de educação a distância se
dinamizaram no país leva a crer que, hoje, a cifra já ultrapassou a casa
de um milhão de estudantes matriculados em graduações oferecidas nessa
modalidade.
Aparentemente democrática por ampliar o acesso à
educação superior para um maior número de estudantes, a medida embute,
na verdade, um forte componente ideológico. Cria no estudante a ilusão
de que a qualificação garantirá o exercício pleno da profissão
escolhida.
Mascara a ausência de políticas efetivas dos governos
federal e estaduais para suprir em quantidade satisfatória a falta de
vagas presenciais em instituições públicas do país. Escamoteia o
problema central e desencadeia outro seríssimo ao facilitar o
rebaixamento na qualidade do ensino dos cursos oferecidos a distância.
Na
verdade, o ensino a distância foi o formato encontrado pelos
governantes para diplomar pobres em massa e responder as metas
educacionais impostas por organismos internacionais como o Banco Mundial
e a Organização Mundial do Comércio, a OMC.
Por isso, a
garantia da qualidade dos cursos de graduação a distância não é a
preocupação central desses dirigentes. Ao invés de investirem
pesadamente na expansão de vagas em instituições públicas presenciais,
enaltecem o “caráter democrático” desse modelo educacional que permite a
um número expressivo de estudantes cursarem uma faculdade privada a
distância.
“Conseguiram grudar a ideia de que o ensino a
distância equivale à democratização do acesso. Além disso, rotulam quem
questiona esse tipo de curso, como retrógrado”, ressalta César Augusto
Minto, vice-presidente da Associação dos Docentes da Universidade de São
Paulo, a Adusp, e professor da Faculdade de Educação da USP, ao se
referir à postura dos dirigentes governamentais e dos donos das empresas
educacionais que disponibilizam graduações a distância. Segundo o
docente, é difícil se contrapor a essa façanha ideológica que vendeu a
ideia de que a democratização do ensino passa pela educação a distância.
Esses cursos foram introduzidos no país pelo governo Fernando
Henrique Cardoso. Mas a administração do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva manteve a iniciativa e a ampliou. Em 2002, eram 40.714
matrículas; em 2006, o número havia pulado para 207.206, dois anos
depois, em 2008, o total de estudantes matriculados chegou a 727.961.
Embora se saiba que a administração da presidente Dilma Rousseff deu
continuidade a essa medida, os números oficiais a respeito ainda não
foram publicizados.
Péssima qualidade
O Censo da
Educação Superior de 2009 aponta que, naquele ano, o Ministério da
Educação reconhecia 844 cursos de graduação a distância no país
distribuídos em 5.904 polos de apoio presencial. Duzentas e vinte e duas
instituições estavam credenciadas junto ao MEC para oferecer cursos de
Educação a distância. A maioria esmagadora dessas instituições é privada
e está concentrada nas regiões sul e sudeste.
Os críticos do
modelo consideram esse formato uma mina de ouro para os donos das
faculdades, que conseguem aumentar ainda mais seus lucros. “Esses cursos
têm forte teor mercadológico. Por isso, não se preocupam com a
qualidade do ensino. As empresas tinham esgotado a capacidade de ampliar
seus lucros e resolveram apostar nesse filão”, explica o dirigente da
Adusp.
Esse tipo de curso permite o barateamento das
mensalidades, porque consegue ampliar exponencialmente o número de
alunos matriculados por turma, além de reduzir o total de professores.
Os donos das faculdades também economizam com gastos de energia
elétrica, água e funcionários, porque não há um campus para os
estudantes frequentarem.
O curso é praticamente todo online. E o
aprendizado é mediado basicamente pelo computador. Não há um espaço
físico onde o estudante possa ir estudar, diariamente. A parte
presencial do curso exigida pelo Ministério da Educação também ocorre de
forma precária. Em algumas oportunidades definidas, o aluno se dirige a
um local, chamado de polo, que a instituição disponibiliza para esses
momentos presenciais. “Essa é uma forma capciosa, encontrada para dizer
que o aluno tem aulas presenciais”, frisa o professor César.
Na
atividade, o estudante continuará a não ter o contato direto com um
professor. O docente leciona simultaneamente para milhares de estudantes
espalhados em vários polos da instituição distribuídos pelo país, por
meio de uma televisão ou de um telão instalados em uma sala. A Unip
(Universidade Paulista), uma das maiores empresas privadas da área, tem
mais de 100 polos no país, só na capital paulista são 20 locais.
O
aluno não interage com o professor, só ouve as informações que são
disseminadas na tela. Quem o acompanha presencialmente é um tutor que,
na maioria dos casos, é aluno de pós-graduação, sem formação específica
na área disciplinar que está sendo abordada na tela. As tutorias
polivalentes respondem por várias matérias.
Os estudantes dos
cursos a distância não têm como verbalizar suas dúvidas ao professor,
nem mesmo intervir durante a explanação do docente. É o tutor quem faz a
intermediação por meio da triagem de perguntas encaminhadas por escrito
para o e-mail do professor que se encontra do outro lado da tela. Há
casos em que apenas uma pergunta por polo é encaminhada ao docente. Não
há tempo hábil para atender à demanda de questionamentos na hora. “O
processo pedagógico é todo truncado. Uma pessoa fala em uma
videoconferência, outra acompanha os alunos e outra fica responsável
pelos trabalhos. Não há nenhuma articulação entre os vários segmentos. É
uma situação de precariedade total, que só se justifica pela falta de
preocupação com a qualidade do ensino”, enfatiza o dirigente da Adusp.
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