Saudações!
Fique tranquilo(a)! Este não é mais um email com dados e foto de uma
criança desaparecida. Criança desaparecida é um caso sério, mas
sabemos que muitos emails com este assunto são maliciosos.
Escrevi a crônica CRIANÇA DESAPARECIDA sem o propósito de apelar e
explorar o tema, mas apenas para aflorar meus sentimentos sobre este
drama comovente.
No blog (
http://hcaetano.blogspot.com/2010/12/crianca-desaparecida.html
) postei no fim da crônica dois links úteis. Um, é o site oficial da
Presidência da República sobre pessoas desaparecidas, com várias
informações e estatísticas esclarecedoras. Outro link é o contrário,
ou seja, sobre crianças NÃO desaparecidas, com muitas carinhas que
você vê nos emails que rolam pela net. Vale a pena dar uma olhada.
Gostaria de saber qual é sua atitude ao receber um email sobre uma
pessoa desaparecida. Por isso, publiquei no blog uma pesquisa
perguntando sobre isso. Num clique você participa e fica sabendo o que
os leitores fazem tambem.
Espero que goste.
Até a próxima, se Deus quiser.
Heron Caetano
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CRIANÇA DESAPARECIDA
Aliviei a pressão do pé no acelerador do carro e busquei a carteira de
dinheiro, torcendo um pouco o nariz e a boca para o mesmo lado. Era
mais um pedágio à frente. Não me incomodei por isso, pois o pensamento
fixava-se em outro fato: na volta, o acento vazio naquele momento
estaria ocupado por minha esposa. Os três meses dela fora de casa e
dentro de hospitais estavam terminando, trazendo-me a sensação de fim
de inverno e início de primavera.
No pedágio, a mão que pegou meu dinheiro, devolveu-me o recibo que
teria como destino certo um lixo. Ao levá-lo ao bolso, num relance vi
no verso dele rostos. Como vento, aquelas imagens sopraram o tédio e a
ansiedade da viagem. Tratava-se de fotos de crianças desaparecidas.
Imediatamente pensei se elas estariam muito diferentes naquele dia.
Haveria nos rostinhos marcas no lugar do brilho rosado, ou expressões
de dor ou angústia?
A cada pedágio, outras fotos ajuntavam-se às que já estavam bem
guardadas no bolso. Reconhecer um rosto daqueles em alguém um dia
seria muita pretensão minha, pois até da minha imagem no espelho
esqueço num piscar de olho. Conclui que aquelas fotos, como fogo em
capim seco, logo se apagariam da minha mente e não seriam muito úteis.
Entretanto, não fui capaz de desfazer-me delas. Havia uma ternura
cativante naqueles rostinhos.
Recentemente, minha filha pediu-me fotos dela com a família para um
trabalho de escola. Rapidamente saquei algumas de uns porta-retratos.
Ao deixá-las numa escrivaninha, notei perto delas os recibos de
pedágio com as fotos das crianças desaparecidas. Como aqueles porta-
retratos, fiquei vazio ao pensar nos pais daquelas crianças. Eles,
como eu, sacaram das molduras ou albuns as fotos de um filho. A
diferença é que não foi para entregar à própria criança, mas para a
polícia ou algum orgão da imprensa.
E depois? Como reorganizar a vida e responder perguntas do tipo
quantos membros tem a família? Enfrentar a rotina de olhar a cama do
filho sempre arrumada, ou por a mesa com um prato a menos. A vida
segue, mas segue como um salto em queda livre, ou como um pesado sonho
onde todo esforço para acordar é inútil. Imagino que quando os
recursos de reencontrar um filho esgotam-se, viver torna os dias como
um oceano sem horizonte. A terra desejada só se vê por sonhos. Ainda
mais quando se pensa que a criança pode estar viva, e perambulando
como um fantasma, que nem o nome ou identidade consegue comprovar.
Nesta tormenta, somente um salva-vidas sustenta a espera: um salva-
vidas chamado esperança, loucura para uns, salvação para muitos.
Heron Caetano
www.hcaetano.blogspot.com
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