Crônica: A MULA E O SEMÁFORO

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hcaetano

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Oct 27, 2011, 8:58:12 PM10/27/11
to Crônicas de 2 minutos
Saudações!

A crônica deste mês é aspirante ao mundo das fábulas ou parábolas.
Talvez você identifique situações já vividas ou alguem que pareça ter
saído dela.
Animal e objeto encarnam peculiaridades de gente como a gente.

Leia aqui ou no blog "A MULA E O SEMÁFORO". O link para o blog é
http://hcaetano.blogspot.com/2011/10/ambicao-e-semaforo.html

Espero por seu comentário no blog ou respondendo esta mensagem.

Obrigado e boa leitura.
Heron Caetano

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A MULA E O SEMÁFORO

Tudo começou com a mudança do sítio para a cidade de Onésimo e sua
mula Ambição. A saída do campo para a vida urbana é fácil de entender,
mas uma mula com nome Ambição carece de explicação: Onésimo,
proprietário do quadrúpede, na infância impressionou-se com a história
do ambicioso profeta Balaão, que desprezou o conselho de Deus. O
profeta só se deu conta de sua asneira quando, por uma ação divina,
sua mula exortou-lhe com voz humana. Onésimo, assim que ganhou de seu
pai o pequeno animal, não teve dúvida na escolha do nome: batizou-a de
Ambição, a fim de lembrar-se de que ambição e burrice refletem-se num
espelho.

No caminho para cidade, Ambição trotava sem pressa de deixar a vida do
campo. Entretanto, o ritmo da cidade era como o de um remanso. Porém,
um certo dia, a rotina da cidadela mudou - um dos cruzamentos centrais
ganhou a atenção dos moradores. Ambição observava os olhares humanos
ao alto e dedos apontando para grandes luzes multicores, que, feito
faróis ficavam suspensas no ar por um esbelto poste: Um semáforo era a
mais nova aquisição e sensação do município.

Entre os curiosos, Ambição ouviu uma voz mais empolgada: “Olhem, é
igual ao da cidade grande!”. Ela nem se deu conta do que ouvia, mas
estava sendo testemunha de uma profecia. Envolvida pela novidade e
frenesi dos humanos, a admiração de Ambição pelo semáforo tornou-se um
caso de paixão não correspondida. Semáforo, em sua glória, passava os
dias dado ao orgulho e irreverência controlando o ritmo dos veículos e
pedestres. Onésimo, ignorando tal paixão, estranhava a teimosia de
Ambição em passar naquele cruzamento, apesar de ser alvo do desprezo
de Semáforo.

Sem pedir licença, o progresso entrou na vida daquela comunidade,
cumprindo a profecia de tornar-se cidade grande. Onésimo e Ambição
retornaram à vida campestre. Os carros modernizaram-se e multiplicaram-
se, porém a admiração e respeito ao semáforo minguaram. Semáforo
sentia-se desprezado pelos motoristas que aproveitavam sua distinta
luz vermelha para arrumar cabelos, retocar maquiagem, falar ao celular
ou paquerar. Seu rico amarelo cansou de pedir atenção. O verde, por
mais justo que julgasse ser, chateava-se ao ver caras e bocas
insatisfeitas com seu tempo.

Semáforo, apesar da vida agitada sob seus olhos multicores, acumulava
um sentimento de culpa ao ver seu vermelho atrair assaltantes e
pedintes, além de serviços não solicitados que mais constrangiam do
que serviam aos motoristas. Num dia de muito sol, Semáforo teve um
breve delírio, e viu entre os carros um par de olhos de mula fitando-o
ao alto. Lembrou-se do olhar apaixonado de Ambição, e do tempo e valor
recebido da humilde admiradora. Enquanto a visão se apagava, acendia
em Semáforo uma certeza: a de que ele não passava de um burro.

Heron Caetano
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