Olá, Pessoal!
Venho acompanhando a discussão sobre a política de preços do Delphi e, mesmo considerando o assunto complexo demais para ser tratado em poucas palavras, decidi me manifestar.
A Embarcadero é uma empresa com fins lucrativos. O objetivo de empresas com fins lucrativos é o lucro. Há diferentes maneiras de obter lucro quando se vende sistemas para computador, e isso envolve diversas questões. Normalmente as empresas começam usando estratégias para crescer conquistando mercado, clientes. Quanto mais clientes, em tese, mais seguro é o negócio, especialmente no início.
Comecei com o Delphi 2, em setembro de 1996. Precisava desenvolver para Windows e, como recém tinha sido lançado o Windows 95, ter uma ferramenta que permitisse criar aplicativos nativos em 32 bits passava a ser importante, mas especialmente se com essa possibilidade se mantivesse a de manter a produção na plataforma de 16 bits (Windows 3.?). Com isso o Delphi era uma ótima opção, pois na compra do Delphi 2 (32 bits), vinha o Delphi 1 (16 bits). Lembro que paguei um valor baixo pelo Delphi 2 em comparação aos valores praticados atualmente (paguei R$ 450,00 pela versão Delphi Developer 2.0 Upgrade - numa promoção estavam oferecendo a versão upgrade para novos usuários, foi o que faltava para minha decisão pela compra - e o valor da versão full era perto de R$ 700,00).
Nessa época o Delphi cresceu muito, e muito rápido. Havia poucas opções (o "concorrente" mais próximo era o MS Access, que apesar de ser programável em Basic, bastante popular em função das soluções antecessoras para desenvolvimento de aplicativos comerciais "não visuais" para PCs, Basic, dBase e Clipper, não gerava executáveis), mas a meu ver o preço influenciou bastante nesse crescimento, pois era próximo do preço da licença do Access e de outros concorrentes menos populares. E além disso era tinha por trás a Borland, do dBase, adquirido por ela em 1991 da Ashton-Tate, juntamente com o InterBase.
E tudo correu bem... Todos conhecem a produtividade trazida pelo Delphi aos desenvolvedores e comecei a criar aplicativos comerciais para diversas áreas, pois poucas pessoas programavam para Windows na época. Em agosto de 1998 fiz o upgrade para o Delphi 4 Professional, uma IDE mais madura, estável e produtiva, possibilidade de desenvolvimento em camadas e para web lançado na versão 3. Paguei R$ 300,00 pelo upgrade, se não me engano, também aproveitando alguma promoção. Em agosto de 2001 atualizei para o Delphi 6 Professional, por R$ 576,00. Lembro que uma das minhas motivações foi o Kylix, que acabei nunca utilizando, pois não tinha mercado comercial para o Linux entre as empresas do porte em que eu estava focado. Aliás, abrindo um parêntese, até hoje nunca me senti pressionado a desenvolver qualquer aplicativo desktop para Linux. O mesmo ocorrendo em relação ao .NET. Além do Kylix, ADO, XML e Webservices também chamaram muito a minha atenção e me ajudaram a decidir pelo upgrade na ocasião.
E foi no Delphi 6 que criei a maior parte dos aplicativos que rodam até hoje na maioria dos meus clientes. O engraçado é que dizem que as boas versões do Delphi são as ímpares, e sempre esperei o amadurecimento das novidades lançadas nas versões ímpares para comprar a versão seguinte, e não tenho do que reclamar. Falavam muito do Delphi 7, que seria "a última versão para desenvolvimento Win32", por isso, quando foi lançado o Delphi 8 for .NET, fiz também o upgrade para a versão Professional, pois vinha junto o Delphi 7. Paguei R$ 907,00 em fevereiro de 2004. Fiz alguns testes com o Delphi 8, iniciei a migração de alguns aplicativos para o Delphi 7, mas pela ausência de demanda por .NET, e pela incompatibilidade de alguns componentes de terceiros que eu usava no Delphi 6 com a versão 7, acabei não usando nenhum dos dois. Nunca senti falta. O Delphi 7 é um pouco mais "bonitinho" que o Delphi 7, mas funcionalmente as duas versões são muito parecidas.
Depois disso, Delphi 2005, com muitas reclamações sobre performance e estabilidade dos usuários e a possibilidade de uso do C# na mesma IDE, 2006 (Developer Studio), 2007 (já RAD Studio), 2008, e nada me chamou a atenção o suficiente para justificar um upgrade. O .NET, que no início diziam que passaria a ser a única opção no Windows Vista, mas que não rodava no Windows 98 e rodava mal no XP, continuava a ser uma opção mais usada para aplicações web, essas sim, se tornando cada vez mais populares durante esse período, mas mais entre empresas de médio e grande porte. Meus clientes não tinham necessidade de processamento distribuído ou armazenamento remoto, por isso o Delphi 6 continuava a ser uma opção tão boa quando o mais novo Delphi da era 200X.
Na versão 2009 veio junto a compatibilidade com o Windows Vista (Win32), novos componentes, transparência, ..., o que me interessou. Muita gente começa a usar o Vista, e agora ainda mais o 7, e poder usar recursos próprios dessas versões (ainda em Win32) passa a ser interessante. Fiz o upgrade em junho de 2009 por R$ 838,00 e já tenho aplicações migradas para essa versão.
Outro motivador para um upgrade atualmente poderia ser o desenvolvimento de aplicações 64 bits, sendo que já passo a olhar o .NET com outros olhos, primeiro devido à forma como o Delphi está vinculado à framework nas versões atuais, mas também por eliminar a preocupação com a plataforma de 32 ou 64 bits, já que o .NET se encarregaria de otimizar a aplicação em função disso. Também considero o avanço do Windows 7 nos desktops e a possibilidade de utilizar uma mesma plataforma, especialmente das regras de negócio, para a web.
Paralelamente a isso, crescem as linguagens interpretadas (eu destacaria Ruby, especialmente em função do Rails, e Phyton, especialmente em função da sua adoção pelo Google) e se consolida cada vez mais o Java, especialmente na empresas de médio e grande porte. Não podemos esquecer também do PHP. O poder de processamento das máquina atuais diminui bastante a preocupação com a diferença de performance das linguagens interpretadas e do próprio java em relação às aplicações "nativas". E além do mais a maioria delas conta com IDEs visuais como Eclipse, NetBeans, RadRails, dentre outras, disponíveis sem custo, e em muitos casos, multiplataforma.
Escrever código que funcione em qualquer plataforma é sempre uma vantagem, e juntando a isso o termo "Open Source", ligado diretamente ao que muitos interpretam como "custo zero" e, ainda mais importante, ao fator "comunidade de desenvolvedores", o investimento em ferramentas de desenvolvimento pagas começa a ser cada vez mais pensado, avaliado e postergado. Ainda mais com opções como Adobe Flash (antigo Flex), Google Gears, JavaFX (swing) e até mesmo Silverlight, que já trazem a web para o desktop, permitindo o aproveitamento não só das regras de negócios como também da interface web para o uso "desconectado".
Se bem que o mundo está marchando acelerado para o mundo "conectado". Conectado e móvel, eu diria. Nesse caso além dessas plataformas ainda há opções como ZK Framework, que também já permite levar os aplicativos para os smartphones, incluindo aí o iPhone e especialmente o Android, onde se desenvolve em java.
Comprei há duas semanas um pequeno Android, o X10 mini da Sony Ericsson. O mais barato disponível no Brasil, suficiente para minhas ambições iniciais como usuário e também como desenvolvedor. Como sempre, li muito a respeito dele antes de decidir comprar, e me surpreendi positivamente. O aparelho é pequeno mesmo, e muito prático, e tem muita coisa disponível para Android. Eu já tive alguns Palm, inclusive o Treo 600, por isso a tela sensível ao toque não é novidade para mim, mas a maneira como se interage com ela atualmente é bem mais produtiva. E eu penso que é justamente nisso que reside um dos nossos desafios, já que programadores, via de regra, não são bons designers. O desafio levar a produtividade da interação pelo toque aos nossos aplicativos pode ser mais um degrau a ser galgado para se manter competitivo em um mercado cada vez mais heterogêneo.
Me considero em um estágio importante da humanidade, e também do mundo dos desenvolvedores. Tenho absorvido muita informação sobre o que está acontecendo nos últimos anos e ainda não estou decidido sobre as melhores opções para as novas necessidades do mercado. Simpatizo com o Ruby on Rails e sua abordagem ao MVC. Mais do que isso, simpatizo com algumas pessoas que o utilizam e acompanho suas manifestações. Conheço um pouco sobre Phyton e Java e suas opções MVC. No desenvolvimento, considero a orientação a objetos essencial, assim como produtividade e reutilização de código. Mas também acho fundamental a camada de apresentação, que deve ser prática e funcional, sem deixar de ser atraente e bem acabada. Para ter isso hoje, sem a limitação da plataforma Windows e do mundo "desconectado", somos obrigados a dominar diferentes tecnologias, o que complica um pouco o processo de mudança. Mas a mudança está ocorrendo. Sei de desenvolvedores Delphi que usam C#, Ruby, Java, ..., e com isso vem à tona um complicador nessa luta em que está inserida a Embarcadero com o Delphi, a de fornecer uma ferramenta de desenvolvimento que já não atende a todas as necessidades dos clientes dos desenvolvedores, que continuam pagando pelo Delphi, mas que estão em contato com opções cada vez mais maduras. Talvez isso ajude um pouco a explicar o motivo do valor do upgrade da versão Professional ter praticamente duplicado em comparação com 1996. Menos consumidores individuais exigem um valor maior para manter o nível de faturamento.
Não conheço opção para o desenvolvimento Windows que se compare ao Delphi. E somando tudo o que investi de 1996 até hoje em Delphi, R$ 3.071,00, somam irrisórios R$ 220,00 por ano, menos de R$ 20,00 por mês. Em contrapartida, minha vida foi sustentada pelas aplicações que criei com o Delphi desde então. Por outro lado, como alguém mencionou nessa discussão, não estamos habituados a fazer "caridade", e assim como a Embarcadero, matamos um leão por dia para manter nossos produtos atraentes o suficiente para conquistar novos clientes ou para manter os que já conquistamos e que por força gerencial ou legal, continuam precisando dos nossos serviços para manter tudo funcionando a contento. Justo ou não, estamos numa economia capitalista, e é assim que funciona.
Um abraço,
Jair