Compreendendo as Cordas: Um Olhar Analógico sobre os Três Modos da Natureza Material

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Thiago Costa Braga

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Sep 28, 2023, 1:19:02 PM9/28/23
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Compreendendo as Cordas: Um Olhar Analógico sobre os Três Modos da Natureza Material

 

 

Satyaraja Dasa


Gostamos de pensar que estamos no controle, mas estamos amarrados pela natureza material.

 

Os três modos da natureza material são forças sutis que influenciam todos os aspectos de nossa existência física, mental e emocional. O termo sânscrito para essas forças é guna, literalmente “cordão”, “corda” ou “qualidade”. Os modos nos puxam em várias direções, tanto no plano bruto, físico, quanto no plano sutil e psicológico.

 

Aprendi recentemente que, embora existam centenas de variedades de nós, existem três categorias abrangentes – nós de laço, curvas e engates. E embora eu não tenha ideia de como esses nós diferentes são usados, ou mesmo como eles são, fiquei fascinado ao descobrir que existem três deles, já que isso se correlaciona com o número de modos descritos nos textos em sânscrito. Os modos são cordas com nós que nos mantêm presos de várias maneiras – presos ao mundo material, é claro.

 

Além de “corda”, a palavra “modo” também é apropriada ao traduzir guna para o português. A palavra vem do latim modus, que significa “medida”. Isso se correlaciona com o sânscrito maya, definido por Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura como “aquilo que é mensurável”, ou seja, o mundo material e tudo o que existe nele.

 

Em sankhya, a clássica escola de pensamento indiano que procura entender a realidade, separando seus componentes em purusha (consciência) e prakriti (o reino da matéria), os modos são revelados como sattva (leveza, equilíbrio, bondade), rajas (paixão, movimento, apego), e tamas (escuridão, inércia, letargia).

 

Encontramos em um antigo texto védico (Svetasvatara Upanishad 4.5) que os modos são parte da energia de Deus e podem ser representados como três cores: branco para sattva, vermelho para rajas, e preto para tamas. Esse mesmo verso nos diz que prakriti, a natureza material, é não diferente do Supremo e que, consequentemente, os modos, que fazem parte da prakriti, são também não-diferentes dEle – assim como a energia é não-diferente de sua fonte energética.

 

Obviamente, com base no verso acima, Srila Prabhupada, ao longo de seus livros, também correlaciona o branco (ou às vezes amarelo) com sattva, vermelho com rajas, e preto (às vezes azul) com tamas, elaborando sobre como os modos tendem a influenciar as pessoas. Novamente, cores claras estão associadas com bondade e pureza, vermelho com paixão e desejo, e cores mais escuras com preguiça e ignorância. No verso upanishádico, as cores branco, vermelho e preto são usadas simbolicamente para elucidar os modos em termos de cores de uma maneira geral. Entretanto, se quiséssemos ilustrar a infinita variedade de tons que poderiam surgir da mistura de tais cores, seria mais preciso usar as cores primárias (amarelo, vermelho e azul), como faz Prabhupada. Isso é verdade porque o branco nos daria apenas versões mais claras de vermelho e preto, enquanto as cores primárias podem produzir uma variedade infinita. Ao alinhar os modos com essa verdade tricromática das cores primárias, aprendemos muito sobre como os modos interagem dentro do mundo material.

 

Os três modos estão sempre misturados entre si, assim como as cores raramente existem em um estado desvinculado. A combinação de três vezes três, Prabhupada nos recorda, inicialmente permite nove misturas diferentes, e quando combinadas novamente, oitenta e uma misturas, e assim por diante. Em outras palavras, os modos nunca existem independentemente uns dos outros, e, como consequência, todos os seres vivos manifestam-se como uma combinação de bondade, paixão e ignorância, mesmo que um modo predomine na vida de uma pessoa. Isso ditará quem eles são, o que gostam e a vocação à qual estão inclinados.

 

A noção da mistura de cores, ou seja, a interação de diversos modos, também nos leva de volta à metáfora da “corda”, mas com uma determinada torção: É preciso lembrar que uma corda é, na verdade, uma combinação de fios, uma mistura de fios menores compondo um cabo trançado.

 

Aprendendo Através da Analogia

 

O conhecimento dos modos pode ser alcançado através do estudo das inúmeras maneiras pelas quais as palavras-chave – sattvarajastamas – são interpretadas. Por exemplo, o estudioso da Bhagavad-gita Graham Schweig (Garuda Dasa) sugere que sattvarajastamas podem ser entendidas como autodoadora, egoísta e autodestrutiva, respectivamente, ou, em termos de consciência: conscientes, subconscientes e inconscientes. Embora ele não desenvolva, tais reflexões sobre as três palavras-chave nos dão dicas úteis sobre o que elas representam.

 

A correlação mais reveladora do professor Schweig, entretanto, é quando ele escreve que os modos são comparáveis a objetos que são transparentes, translúcidos e opacos. Deixe-me explicar isso mais detalhadamente.

 

Se considerarmos vários exemplos de fenômenos transparentes, tais como ar, água e vidro transparente, observaremos que a luz passa diretamente através deles, geralmente com o mínimo de adulteração ou obstrução. E a luz colorida passando por algo transparente (e não colorida) manterá sua cor. É assim que acontece com sattva-guna. Uma pessoa predominantemente nesse modo refletirá a natureza da alma, mesmo que essa natureza ainda seja filtrada através do condicionamento material. Tal pessoa é clara, leve e harmoniosa com a realidade última e tende a ser feliz e atenta. Deve-se notar, porém, que o modo da bondade não é a transcendência, de maneira que sua qualidade transparente é sempre comprometida em um grau ou outro. Mesmo uma janela totalmente transparente naturalmente inclui um elemento sutil de distorção. Essa limitação da bondade em termos de transparência é um assunto ao qual voltaremos mais tarde.

 

Em relação a rajas: Alguns plásticos e vidros foscos, entre outros objetos, são translúcidos. Quando a luz brilha através desses materiais, ela é restringida. Isso desqualifica a percepção precisa, pois os objetos translúcidos são apenas parcialmente transparentes, bloqueando alguns raios ultravioleta. Podemos comparar isso com rajas. Uma pessoa condicionada por esse modo será tão consumida pela ansiedade, pelo desejo e pela necessidade de uma ação imediata que a verdade autoevidente muitas vezes é perdida, com sua visão enevoada pela paixão. A palavra rajas, literalmente, significa “pó” ou “fumaça”, ambos os quais inibem a luz, mas não totalmente: apenas a colorem. Isso é semelhante à translucidez: na proporção que uma alma condicionada é “empoeirada” com desejos e interesses egoístas, ela se torna incapaz de ver sua verdadeira natureza.

 

Objetos opacos bloqueiam a luz, já que não conseguem transmitir energia radiante. Isso inclui materiais como tijolos, madeira, pedra, papelão e metais, que refratam ou repelem a luz, fazendo-a ir em outra direção completamente diferente. Isso se assemelha a tamas, uma qualidade que cobre a alma de tal forma que sua natureza original se torna totalmente obscurecida. A alma é eterna, consciente e bem-aventurada, ao passo que a entidade condicionada por tamo-guna fica envolvida em atos temporários, ignorantes e dolorosos que perpetuam o ciclo de nascimentos e mortes.

 

Outras analogias nos ajudam a entender os modos. Por exemplo, considere os três estados da matéria – sólido, líquido e gasoso – particularmente quando aplicados à água. Tamas pode ser visto como gelo – sem movimento, duro, como uma rocha. Poderia facilmente ser visto como energia congelada, incapaz de exibir seu fluxo natural. Rajas, por outro lado, é como a aurora do processo de fusão, onde as coisas começam a se mover rapidamente, talvez muito rápido, à medida que a água começa a pingar em todas as direções. Em contraste, sattva é como o vapor, que pode ser canalizado para resultados positivos. Quando a água se torna gasosa, ela pode ser usada por motores a vapor. De fato, tais motores desempenharam um papel central na Revolução Industrial e hoje geram mais de setenta e cinco por cento da eletricidade do mundo. Similarmente, uma pessoa em sattva-guna não é dura e imóvel como uma rocha ou selvagem e descontrolada como um riacho não dominado. Em vez disso, acalmou suas paixões e é capaz de controlar suas ações a serviço de Deus e da humanidade.

 

Essas analogias não pretendem ser precisas; elas são meramente indicadores úteis, ajudando na nossa compreensão dos modos.

 

Conhecimento das Escrituras

 

Para realmente entender esse assunto, convém estudar as escrituras, particularmente a Bhagavad-gita (capítulos 14, 17 e 18) e o Srimad-Bhagavatam (Canto 11, capítulo 25). O Senhor Krishna mencione pela primeira vez os modos no segundo capítulo da Bhagavad-gita, e posteriormente os analisa sistematicamente em quase uma centena de seus setecentos versos. Resumidamente, a Gita nos ensina que Deus, como o criador dos modos, está naturalmente acima deles (7.13), enquanto ligam a alma comum ao corpo através do condicionamento (14.5). Entretanto, uma vez que entendemos como funcionam os modos e descobrimos o que está além deles, podemos nos libertar do condicionamento material e nos dedicar puramente ao serviço de Deus. (14.19)

 

Krishna explica os modos em vários contextos, incluindo como eles se aplicam à fé, à alimentação, ao sacrifício, à austeridade, ao conhecimento e à ação. Em geral, Ele diz que desenvolvemos hábitos de acordo com os tipos de atividade que favorecemos, seja “boa”, “apaixonada” ou “ignorante”. Isso influencia nossa escolha em amigos, música, comida, trabalho, e assim por diante, e quanto mais fazemos tais escolhas, menos liberdade temos para fazer outras novas (13.22) – já que a cada ato criamos impressões profundamente incorporadas em nossa consciência. Assim, nossas escolhas modais afetam nossa percepção geral da realidade, na qual estamos presos até termos a boa sorte e a boa inteligência para aceitarmos ser guiados por uma alma liberada. Só então nos libertamos gradualmente de nossas respostas condicionadas ao mundo e aprendemos a transcender os modos da natureza material.

 

Todas essas informações são elaboradas na Uddhava-gita, que consta no Srimad-Bhagavatam. Alguns versos devem ser suficientes:

 

Meu caro Uddhava, a combinação de todos os três modos está presente na mentalidade do “eu” e do “meu”. As transações comuns deste mundo, que são realizadas através da ação da mente, dos objetos de percepção, dos sentidos e dos ares vitais do corpo físico, também se baseiam na combinação dos modos. (11.25.6)

 

Ó gentil Uddhava, todas essas diferentes fases da vida condicionada surgem do trabalho nascido dos modos da natureza material. A entidade viva que conquista estes modos, manifestada a partir da mente, pode dedicar-se a Mim pelo processo do serviço devocional e, desse maneira, alcançar amor puro por Mim. (11.25.32)

 

Um sábio, livre de qualquer associação material e livre de confusão, deve dominar seus sentidos e adorar-Me. Ele deve conquistar os modos da paixão e ignorância, ocupando-se apenas com o que se situa no modo da bondade. (11.25.34)

 

Então, estando fixo em serviço devocional, o sábio também deve conquistar o modo material da bondade pela indiferença em relação aos modos. Assim pacificada dentro de sua mente, a alma espiritual, livre dos modos da natureza, abandona a própria causa de sua vida condicionada e chega a Mim. (11.25.35)

 

Este último verso é essencial para a compreensão dos modos. Muitas vezes se supõe que, ao se alcançar uma vida de “bondade”, que proporciona felicidade, conhecimento e paz de espírito, a pessoa “chegou”, por assim dizer, alcançando algum tipo de perfeição culminante no caminho espiritual. Mas esse simplesmente não é o caso. Ações impulsionadas por sattva, um aspecto da natureza material, causam reações materiais, ou karma. Assim, por seus próprios atos de bondade, mesmo as pessoas boas inadvertidamente se prendem ao mundo da matéria.

 

Isso não quer dizer que os atos de bondade devem ser abandonados, mas sim que devem ser incrementados por atos transcendentais – atos de serviço devocional ao Senhor e a Seus devotos. O serviço devocional transcende a bondade, a paixão e a ignorância e, dessa forma, liberta a pessoa do mundo material. Como Prabhupada escreveu em uma carta (28 de fevereiro de 1972): “Na verdade, [a bondade] não é a etapa final – deve-se ir mais além, chegando até suddha-sattva [pura bondade]. No modo material da bondade, às vezes há traços dos modos de paixão e ignorância, mas, na etapa de suddha-sattva, há apenas amor puro por Deus ou o modo da bondade pura; essa é a diferença.”

 

Previamente, fiz referência a uma analogia envolvendo transparência, translucidez e opacidade, mencionando como sattva-guna se correlaciona com uma visão clara. Entretanto, observei também que, em última análise, tal clareza é sempre comprometida, causando formas sutis de representações errôneas. Prabhupada frequentemente se referia a um mestre espiritual autêntico como um meio transparente entre o discípulo e a Verdade Absoluta. Em outras palavras, pode-se realmente ver a verdade pela graça de um professor espiritual legítimo que atua como uma lente clareadora para o aspirante espiritual sincero. Essa visão não é obtida apenas através de uma ação no modo da bondade. A submissão aos pés de um mestre, dizem os textos védicos, permite uma visão totalmente esclarecida, proporcionando uma percepção direta da verdade.

 

Os Modos Espirituais

 

Os filósofos há muito se referem aos três modos da natureza material como “a trindade de sankhya”, já que eles formam a base de todas as coisas materiais. Em contraste, sac-cid-ananda é conhecida como “a trindade do vedanta”, ou a própria substância do mundo espiritual. É para essa última trindade que agora vamos dirigir nossa atenção.

 

Sac-cid-ananda refere-se à eternidade, cognição e bem-aventurança, que se manifestam apenas em vishuddha-sattva, ou além dos modos da natureza material. Uma vez que a energia material de Krishna (bahiranga-shakti) é um fac-símile ou um reflexo pervertido da energia espiritual (antaranga-shakti), há uma correlação entre eles, como mencionado no comentário de Srila Prabhupada do Chaitanya-charitamrita (Adi 4.62, Significado): “Cada uma das três divisões da potência interna – as energias sandhini [sat], samvit [cit] e hladini [ananda] – influencia uma das potências externas pelas quais as almas condicionadas são conduzidas. Tal influência manifesta os três modos qualitativos de natureza material, provando definitivamente que as entidades vivas, a potência marginal, são eternamente servas do Senhor e, portanto, são controladas ou pela potência interna ou externa.”

 

Tal como se afirmou anteriormente, o objetivo é nos lembrar que, de acordo com a Bhagavad-gita (15.1), o mundo que vemos diante de nós é como uma figueira-de-bengala de cabeça para baixo. Srila Prabhupada escreve em seu comentário sobre esse verso:

 

Esta árvore, sendo o reflexo da árvore real, é uma réplica exata. Tudo está lá no mundo espiritual. Os impersonalistas tomam Brahman como a raiz desta árvore material, e, a partir da raiz, de acordo com a filosofia sankhya, vêm prakriti, purusha, depois os três gunas, depois os cinco elementos grosseiros (pancha-maha-bhuta), então os dez sentidos (dashendriya), mente etc. Desta forma, eles dividem todo o mundo material em vinte e quatro elementos. Se o Brahman é o centro de todas as manifestações, então este mundo material é uma manifestação do centro em 180 graus, e os outros 180 graus constituem o mundo espiritual. O mundo material é o reflexo pervertido, de modo que o mundo espiritual deve ter a mesma variedade, mas em realidade.

 

Isso explica como os três modos da natureza material provêm de elementos similares que existem na transcendência. Mas enquanto fenômenos como a eternidade, cognição e bem-aventurança não têm déficits, representando plenamente Deus e o mundo espiritual sem adulteração, os três modos da natureza material são atravessados com problemas para a alma condicionada.

 

Como esta manifestação é material, ela é temporária. Um reflexo é temporário, pois ora é visto, ora não é visto. Mas a origem de onde o reflexo é refletido é eterna. O reflexo material da árvore verdadeira tem que ser cortado. Quando se diz que uma pessoa conhece os Vedas, assume-se que ela sabe como cortar o apego a este mundo material. Se alguém conhece esse processo, ele realmente conhece os Vedas... O propósito dos Vedas, conforme revelado pela própria Personalidade de Deus, é cortar esta árvore refletida e alcançar a verdadeira árvore do mundo espiritual. (Bhagavad-gita 15.1, Significado)

 

Ao aprender como transcender os três modos da natureza material através do processo da consciência de Krishna, a pessoa se torna o seguidor perfeito dos Vedas e atinge a dimensão espiritual.

 

Tradução de Krishnakanta Gopalini Devi Dasi. Revisão de Bhagavan Dasa. Sobre o autor: Satyaraja Dasa, discípulo de Srila Prabhupada, é editor associado da Volta ao Supremo internacional e editor fundador do Jornal de Estudos Vaishnava. Já escreveu mais de trinta livros sobre a consciência Krishna e reside próximo à cidade de Nova Iorque.

 


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