Barcelos
Advogada acusada
de legalizar 300 irregulares pede instrução do processo
A advogada acusada
de legalizar irregularmente 300 imigrantes pediu a abertura da instrução do
processo, alegando a incompetência territorial do juiz de Instrução Criminal do
Porto.
Fonte judicial
disse à agência Lusa que Elisabete Chaves, que está presa preventivamente há um
ano, sustenta, ainda, que a incompetência territorial implica a nulidade das
ordens e autorizações dadas para escutas telefónicas.
Na contestação à acusação, subscrita
pelo advogado Artur Marques, a arguida argumenta que os alegados crimes foram
cometidos na Comarca de Braga, daí resultando que era o Juiz de Instrução de
Braga quem detinha competência territorial para «exercer as funções
jurisdicionais relativas ao inquérito».
Elisabete Chaves está acusada - num
processo que envolve mais 14 arguidos - da prática de um total 658 crimes: um de
associação de auxílio à imigração ilegal, um de angariação de mão-de-obra
ilegal, 198 de auxílio à imigração ilegal, 198 de falsificação, 198 de
falsificação de documento autêntico, 34 de corrupção activa, 18 de lenocínio,
sete de tráfico de influências, quatro de burla e um de descaminho.
A maioria dos restantes arguidos
requereu, também, a instrução do processo.
Elisabete Chaves defende que
«sendo o Juiz de Instrução Criminal do Porto incompetente, todos os
despachos que autorizaram a intercepção e gravação de chamadas telefónicas, são
nulos».
Acresce que - diz - face ao teor da
acusação «ficou sem saber qual a forma de participação nos crimes que
lhe é imputada, e, depois, quais os crimes concretos por que vem
incriminada».
Ficou - assinala - «sem saber
se lhe é atribuída a autoria ou a mera cumplicidade, se a acusação considera os
crimes consumados ou apenas tentados e ainda se lhos imputa em concurso real ou
aparente».
Quanto à segunda, a acusação, no
mínimo, não identifica quais os crimes de angariação de mão-de-obra ilegal e de
extorsão que lhe imputa.
A arguida argumenta, ainda, que
«como o TIC do Porto, não é competente para a prática dos actos de
conteúdo jurisdicional durante o inquérito, também não é competente para dirigir
a instrução».
Contrapõe, por outro lado, e no que
toca à acusação por quatro crimes de burla que «o procedimento criminal
pelo crime de burla depende de queixa».
Ora, acentua, «nenhuma das
supostas vítimas daqueles crimes apresentou queixa contra a Arguida no prazo
legal de seis meses».
A defesa contesta, também, uma suposta
violação do princípio da não-retroactividade da lei penal e o que classifica
de «irrelevância penal do auxílio à permanência ilegal de
estrangeiros».
A arguida está acusada da prática de
198 crimes de auxílio à imigração ilegal mas - observa a defesa - «a
acusação não descreve um único acto que consubstancie a entrada ilegal (muito
menos o auxílio a essa entrada) no território nacional de qualquer dos cidadãos
estrangeiros relacionados com os crimes imputados aos
arguidos».
Tratar-se-ia, assim, de crimes de
permanência ilegal, que apenas constam da lei a partir de 2003, quando os factos
remontam a 2001.
O último argumento da advogada é o da
«extinção do procedimento criminal por prescrição», dado que,
na data em que cada um dos arguidos foi constituído como tal, «já haviam
decorrido muito mais de cinco anos sobre muitos dos
factos».
Para além da advogada, o DIAP/Porto
acusou o funcionário administrativo do SEF, José Alberto Bessa de 206 crimes, e
os inspectores do mesmo organismo, Jaime Manuel Oliveira e Isilda Matos Mendes,
respectivamente de 50 e de 226 crimes.
O inspector da Inspecção de Trabalho,
Joaquim Costa e Silva, é acusado de nove crimes, havendo, ainda, um outro
inspector do SEF, um advogado, os pais da principal arguida e seis empresários
envolvidos no caso.
Entre os imigrantes que terá
conseguido regularizar ilegalmente estão aproximadamente cem oriundos de países
árabes, incluindo alguns considerados «origens de risco» em
termos de segurança nacional, como o Paquistão, o Bangladesh e a
Argélia.
A arguida está em prisão preventiva
desde 6 de Abril de 2006, regime a que estão também sujeitos o funcionário
administrativo e o inspector Jaime Oliveira.
Os investigadores concluíram que a
advogada começou por ganhar a confiança da arguida Isilda, que chefiava a
delegação de Braga do SEF, tendo-se depois voltado para a Direcção regional do
organismo no Porto, através do inspector Jaime e do funcionário
Bessa.
Seria o primeiro com quem lidava mais
directamente e que lhe facilitava a legalização de imigrantes com recurso a
contratos de trabalho fictícios e outros esquemas, como os chamados casamentos
brancos.
A advogada terá recorrido a 13
empresas, quer da família quer de amigos e outros conhecidos, tendo, também,
usado a figura da «empregada doméstica».
Os investigadores determinaram que a
advogada cobrava 2.500 a três mil euros por cada imigrante legalizado - entrado
em Portugal sem visto de trabalho.
Dava, também, prendas a alguns dos
principais arguidos, nomeadamente aos do SEF e ao inspector do
Trabalho.
Terá chegado a conseguir legalizar,
entre outros, imigrantes que já haviam sido expulsos por ordem
judicial.
Entre 2001 e 2006, ter-se-á também
aproveitado ainda das legalizações extraordinárias decididas pelo Governo
português para conceder autorizações de permanência a pessoas que não se
encontravam dentro dos parâmetros legais - nomeadamente por não terem chegado a
Portugal nos períodos previstos nos respectivos diplomas legais.
A investigação das delegações do Porto
e de Braga do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras resultou ainda na apreensão
de cerca de 200 mil euros.
O dinheiro foi encontrado numa das
residências da família da advogada de Barcelos, em sacos escondidos em várias
salas.
Durante a Operação Ícaro, foram ainda
apreendidas duas viaturas de alta cilindrada, uma delas um Porsche, vários
documentos, um revólver e respectivas munições, nove computadores e abundante
documentação com relevância probatória, tendo sido congeladas várias contas
bancárias, uma delas, da jurista, com 126 mil euros.
Os detidos são indiciados pelos crimes
de auxílio à imigração ilegal, corrupção, violação de segredo por funcionário,
favorecimento pessoal e falsificação de documentos.
Lusa /
SOL