Caso Santa Comba
Dão
PJ defende-se negando
coacção física ao ex-GNR acusado
Os elementos da PJ
negaram as acusações de coacção física que lhes foram imputadas, frisando que
António Costa confessou os crimes em conversa com o sub-director nacional
adjunto, Almeida Rodrigues
A terceira sessão
do julgamento do ex-GNR de Santa Comba Dão, alegado autor da morte de três
jovens, decorreu hoje no tribunal da Figueira da Foz com a audição de
responsáveis de Polícia Judiciária (PJ) de Coimbra.
Ao tribunal os elementos da PJ que
participaram na investigação do caso negaram as acusações de coacção física que
lhes foram imputadas pelo arguido na primeira sessão, frisando que este
confessou os crimes em conversa com o sub-director nacional adjunto, Almeida
Rodrigues.
A confissão, para além das provas
recolhidas, levaram o responsável da PJ, que presta serviço na directoria de
Coimbra, a considerar não ter duvidas de que o ex-cabo António Costa praticou os
crimes.
«Havia uma série de
pequenos indícios, provas circunstanciais, a prova faz-se de pequenos nadas.
Congregando esses pequenos nadas não há dúvida nenhuma que o autor do crime é
este homem» disse hoje Almeida Rodrigues.
Sobre a forma como ocorreu a confissão
de António Costa, o sub-director nacional adjunto da PJ revelou que o ex-GNR foi
primeiro inquirido por dois inspectores e só veio a confessar o crime depois de
levado à sua presença.
«Tem de saber como quer
ser recordado, alguém que mata sem razão ou que tem uma falha e comete o
crime» afirmou Almeida Rodrigues, citando o que disse a António Costa.
Segundo o depoimento que prestou, o
militar reformado ter-lhe-à respondido querer ser recordado «como um
homem bom que teve uma quebra», acabando por confessar ter matado as
três jovens adolescentes.
Confrontado com a acusação proferida
pelo arguido, na primeira sessão, em que este acusa os inspectores da PJ o terem
ameaçado fisicamente pelos inspectores que primeiro o interrogaram e a quem diz
ter confessado o crime, Almeida Rodrigues frisou que o ex-militar «não
se queixou de nada».
«A PJ respeita em
absoluto os direitos dos arguidos. [António Costa] Foi tratado com toda a
deferência e sabe-o. Tivemos todos os cuidados na obtenção de prova, partimos do
princípio de que não ia confessar. A confissão era coisa que não
esperávamos», sublinhou Almeida Rodrigues.
Disse ainda que o ex-militar
«chorou sem lágrimas», durante meio minuto, um tipo de choro
que o responsável da PJ classificou de «fingido».
No depoimento, Almeida Rodrigues
aludiu a diversos aspectos da investigação, incluindo as buscas domiciliárias,
análises periciais e escutas telefónicas, que levaram à detenção do antigo
militar da GNR de Santa Comba Dão.
Referiu ainda as reconstituições
feitas pelas autoridades, referindo que «tudo o que está no processo foi
dito pelo arguido».
«Ele é que indicou os
locais e a forma como cometeu os crimes. O corpo de Joana [uma das três jovens]
só foi descoberto graças às indicações que o arguido nos prestou»,
esclareceu.
Questionado sobre as motivações dos
alegados crimes, disse que elas se coadunam «com as de índole sexual,
mas também com a presunção do prestígio social» do ex-GNR.
Classificou António Costa como
«um homem inteligente», que possui «consciência daquilo
que fez». «Avança sempre explicações, por mais inverosímeis que
sejam. Isso a nós não nos surpreendeu, só credibiliza a investigação»,
disse Almeida Rodrigues.
O responsável da PJ de Coimbra
sublinhou ainda que os elementos recolhidos apontavam para o perfil de um
assassino em série, nomeadamente a periodicidade dos crimes - cerca de seis
meses entre cada um - três ou mais vítimas e alguém que guarda um objecto
pertencente às vítimas.
Disse que António Costa possuía uma
caneta de Isabel Isidoro e que foi o ex-militar que explicou onde esse objecto
se encontrava.
Questionado pela advogada de defesa
Almeida Rodrigues negou a hipótese de António Costa possuir um cúmplice.
«Não é crime que necessite de preparação, não contempla cúmplices. São
jovens que conhece desde criança e que têm confiança nele», afirmou.
De entre as várias hipóteses avançadas
nos raciocínios de investigação, Almeida Rodrigues apontou o local onde o
ex-cabo reside, sobranceiro ao caminho onde foram encontrados indícios.
«Se alguém quisesse praticar um crime ali seria difícil porque ali mora
um GNR. Difícil para outrem, mas não para ele próprio» frisou.
A sessão de hoje teve início
pelas 15h e terminou mais de cinco horas depois, com a audição do
inspector-chefe Domingues, presente no primeiro inquérito a António Costa.
Domingues negou qualquer coacção
física ao arguido, recusando, igualmente, que António Costa tenha pedido a
presença de um advogado. «É mentira, não aconteceu nada disso. O
ambiente era completamente pacífico, tanto que ele não confessou [os crimes] a
mim», frisou.
Adiantou que foram lidos os direitos
de António Costa e, perante a insistência do procurador do Ministério Público,
que quis saber se o inspector se enervou durante o interrogatório, voltou a
recusar ter existido qualquer tipo de violência sobre o militar reformado.
«Não, nem pensar nisso, não houve um mínimo de violência»
disse.
Também presente no primeiro
interrogatório a António Costa, o inspector Sineiro disse que leu os direitos e
constituiu António Costa arguido, negando, igualmente, qualquer agressão ao
ex-GNR.
Num dia em que a sala de audiências
voltou a encher, com a presença de cerca de 20 advogados estagiários que
assistiram à sessão, para além de familiares das vítimas e jornalistas, no
exterior só a presença dos carros de directos das televisões denunciavam o
mediático julgamento.
Ao início da tarde, à chegada do
arguido, registou-se um incidente com um familiar de Mariana, uma das três
jovens assassinadas, que apelidou António Costa de «assassino»,
sendo afastado do local pela PSP.
A próxima sessão está agendada para as
10h de 20 de Junho, quarta-feira, um dia após o arguido ser sujeito, no
Instituto de Medicina Legal de Coimbra, a nova perícia psiquiátrica determinada
pelo tribunal.
António Costa, 53 anos, responde por
10 crimes, três de homicídio qualificado, três crimes de ocultação e um de
profanação de cadáver, dois de coacção sexual na forma tentada e um de denúncia
caluniosa, incorrendo na pena máxima de 25 anos, em cúmulo jurídico.
Lusa/SOL