Os 216 participantes da XIX Assembleia da Cáritas
Brasileira, vindos das 182 entidades-membro, dos seus 12 Regionais, da
Diretoria, do Secretariado Nacional e dos Bispos referenciais, bem como os
representantes do Secretariado Latinoamericano e Caribenho de Cáritas
(SELACC) e da Cáritas do Haiti, desejam partilhar a riqueza da reflexão
crítica e os novos compromissos com seus milhares de agentes pastorais,
pastorais sociais e entidades parceiras e com todas as pessoas
comprometidas na luta em favor de um mundo sem fome e sem pobreza.
À luz da prática das primeiras comunidades
cristãs, aprofundamos a reflexão iniciada nas bases sobre a realidade da
fome e pobreza no Brasil e no mundo. E isso nos comprometeu com
a campanha mundial da Caritas
Internationalis: "Uma Família Humana - alimento para todos".
Mesmo reconhecendo alguns avanços com conquistas
de políticas e programas públicos na vida de milhares de pessoas que se
encontravam na pobreza extrema no Brasil,
não estamos satisfeitos com a realidade existente em nosso
país e no mundo. Como não indignar-se frente à morte precoce de dez mil
crianças por desnutrição profunda a cada dia no mundo? Como não sentir a
dor das 870 milhões de pessoas que passam fome? A existência de uma única
pessoa com a vida ameaçada pela fome coloca em julgamento a qualidade ética
da humanidade: estará contaminada pela globalização da indiferença, como
questiona o papa Francisco?
A fome existente não é algo natural. É fruto da concentração
da propriedade da terra, da riqueza gerada e da renda em mãos de uma
minoria cada dia menor e que usa seu poder para concentrar ainda mais. É
fruto também da submissão dos governantes das nações aos interesses dessa
minoria em nome de um progresso que só destina migalhas para os direitos
das pessoas.
Sendo a pobreza causada pela concentração da
riqueza, ela somente será superada com uma profunda transformação
estrutural da sociedade e com a distribuição dessa riqueza com critérios de
justiça e de igualdade em relação ao direito à vida na Terra.
Para a Cáritas, não basta conhecer o número dos
empobrecidos. Cada empobrecido é um ser humano, uma pessoa, com nome, que
se encontra em situações concretas de vida e que não tem reconhecidos e
garantidos muitos de seus direitos. São pessoas que amam, agem, resistem e
são e querem ser protagonistas das lutas por seus direitos. Isso foi
destacado na assembleia especialmente em relação aos povos indígenas, às
comunidades quilombolas e tradicionais, aos agricultores familiares, às
mulheres, às crianças e jovens, ao povo da rua, ao povo irmão do Haiti.
A superação da pobreza não pode ser medida apenas
com critérios econômicos, como fazem o Banco Mundial, a ONU e o próprio
governo brasileiro. Ter renda igual ou pouco maior do que um dólar por dia
não garante que as pessoas vivam com dignidade. Em relação à alimentação, é
tão básico esse direito que deve ser normal que não faltem alimentos
saudáveis e nutritivos nas mesas de todos os seres humanos.
Mas pessoas não vivem só de alimentos. Elas têm
direito a viver num território com proteção social. Trata-se de um espaço
urbano ou rural em que sua vida esteja protegida com infraestruturas
públicas e serviços sociais de boa qualidade. Elas têm direito político de
iniciativas autônomas e de exigir participação na formulação e na execução
de políticas que garantam os seus direitos, a distribuição da riqueza e da
renda e o destino justo dos recursos públicos.
O mestre Jesus de Nazaré foi taxativo: não se pode servir a Deus e ao dinheiro (Lc
16,13). Por isso, para amar
como Ele amou, é preciso aproximar-se das pessoas empobrecidas e
solidarizar-se com suas lutas, e, ao mesmo tempo, proclamar que a pobreza e
a fome ofendem a imagem de Deus, que é a pessoa humana. Os empobrecidos,
mulheres e homens, são os protagonistas do Reino de Deus, no combate à
injustiça, à desigualdade, à concentração de riqueza e de poder, à
indiferença; e na construção de sociedades humanas onde haja vida em
abundância para todas as pessoas, realizando a inspiração do bem viver das
comunidades cristãs originárias, pois nelas não havia necessitados porque tudo era colocado em comum.
Unida à Caritas
Internationalis, a Cáritas Brasileira empenhar-se-á ainda mais
em práticas que sejam sementes do Reino. Articulando melhor as iniciativas
de economia solidária, de convivência com o semiárido e com os demais
biomas, de comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais, de práticas
agroecológicas, de cultura popular, de espiritualidade libertadora, ela
procurará contribuir para que os empobrecidos usem de forma mais eficaz sua
cidadania para avançar na conquista de melhores condições de vida e na
construção de sociedades de convivência cuidadosa e harmônica entre seres
humanos e com a Mãe de toda a vida, a Terra.
Contamos com a bênção de Deus e com o exemplo da
esperança e profecia presentes no Magnificat de Maria,
Mãe de Jesus e de todas as pessoas, para colocar em prática o que
assumimos.
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