Um elogio aos cães-guia.

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Lucas de Abreu Maia

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Dec 7, 2024, 9:41:59 AM12/7/24
to caes-guia
Amigos,

Começo pelo óbvio: a experiência que narro abaixo é minha. Obviamente, diferentes pessoas têm experiências diversas e não quero dizer, claro, que o que descrevo a seguir se aplique a todas as pessoas cegas.

Feito o disclaimer, vamos a história:: ontem tive de sair de bengala. Veja que meu uso da bengala sequer tá tão enferrujado. Neste ano, refiz o treinamento de mobilidade com a bengala apenas para o caso de uma emergência. É que a fila para aquisição de um novo cão-guia aqui no Reino Unido demora atualmente coisa de dois anos e tenho de me preparar para todas as eventualidades. Ontem foi uma dessas eventualidades – não se preocupem, Arya está ótima. Apenas aconteceu que ontem tive de sair sem ela para fazer um trajeto conhecidíssimo, que faço todos os dias.

E, meu deus, que suplício! Primeiramente, acho a experiência da bengala profundamente desagradável. Fico muito superestimulado pelo excesso de informação que vem dela: cada reentrância no piso; os postes, caixas de correio e outros obstáculos no meio da calçada que eu nunca sequer soubera que estavam ali porque o cão simplesmente deles desvia sem que eu perceba. Entendo que muitos bengaleiros, ao ser guiados por um cão, sintam justamente falta dessas informações. Eu, não. Adoro ser levado pelo cão enquanto meus pensamentos vagueiam.

Tudo isso é um sinal de independência do cão – as milhares de minúsculas decisões que toma durante o trajeto sem que o usuário sequer perceba. Há outros casos, porém, em que as decisões do cão-guia são mais óbvias. Ontem choveu em Bristol. Estamos na Inglaterra, claro. Com Arya, as poças só me incomodam se tiver chovido muitíssimo e não houver como delas desviar. Com a bengala, eu pareci pisar em todas as poças que já se acumularam ao longo dos quatro bilhões e meio de anos na história do planeta terra.

Outro exemplo: o ônibus chega no ponto. Arya, de forma fluida, me leva para a porta. Com a bengala, tenho de ficar tateando em busca da entrada. Do mesmo modo, quando cheguei ao trabalho: Arya simplesmente me levaria a porta. Com a bengala, tenho de tatear em busca dela.

Mas o mais irritante foi a condescendência com que os outros me trataram durante o percurso. Como disse, este é um caminho que faço todos os dias. Não me lembro de jamais ter sido oferecido ajuda ao longo dele. Adoro isso, porque de fato, nesse trajeto, não preciso de ajuda. Ontem, não tinha dado um minuto desde que saí de casa e um senhor veio perguntar se eu precisava de ajuda para atravessar a rua. Detalhe importante: ele me perguntou isso no meio da rua que eu já estava atravessando. O querido ainda ficou na minha frente, bloqueando o caminho, em vez de me deixar chegar à calçada. Outro exemplo: aqui, na Inglaterra, cães de estimação são permitidos no transporte público, o que acho ótimo, afinal, todo mundo precisa levar seus cães ao veterinário, tenham os donos carro ou não. Pois bem. Havia, no ônibus, um cão muito do mal-educado. O bicho não parava quieto. A dona dele, que nunca deve ter me visto na vida e que certamente não sabe nada sobre mim, teve a pachorra de me dizer que eu também precisava de um cão guia e que o fanfarrão do cão dela seria um ótimo guia. Tive de morder minha língua para não responder: querida, eu já tenho um cão-guia que, aliás, sabe se portar em público, diferentemente do seu.

Enfim, amigos, o propósito deste e-mail é só fazer uma ode aos cães-guia. Minha experiência com a bengala só revela o quão geniais são esses bichos e me fez apreciar ainda mais a dificuldade e o estresse envolvidos no trabalho deles.

Um abraço,
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

M. Regina M. de Carvalho e Silva

unread,
Dec 7, 2024, 10:00:16 AM12/7/24
to caes...@googlegroups.com

Oi, Lucas,

 

Como eu te entendo e como sinto dalta de um cão e olha que faz tempo que quero, mas não consigo voltar a ter um. O que mais me faz sentir falta é a integração social. Alguns oferecem ajuda, o que, quase sempre, não precisaríamos,  mas, na maior parte das vezes, ignoram-nos, largam-nos em um canto qualquer e vão às suas vidas! Meu Deus, como sinto falta de um guia!de qualquer cão, mas de um guia é uma falta que faz doer fisicamente.

Abraço para você e carinho para suas meninas,

 

Regina.

M. Regina M. de Carvalho e Silva

sm...@uol.com.br

--

---
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Lucas de Abreu Maia

unread,
Dec 7, 2024, 3:57:29 PM12/7/24
to caes...@googlegroups.com
Oi, Regina:

Sinto muito que você não consiga ter um cão neste momento. Cachorro é, simplesmente, tudo de bom, mesmo.
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

M. Regina M. de Carvalho e Silva

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Dec 7, 2024, 5:03:05 PM12/7/24
to caes...@googlegroups.com

é a vida, Lucas... paciência!

 

 

Regina.

M.Regina M. de Carvalho e Silva

rpmel...@uol.com.br

Mariana Rocha

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Jan 20, 2025, 2:13:56 PMJan 20
to caes...@googlegroups.com

Olá, Lucas!

 

O que tu escreves abaixo corresponde ao que eu sinto: o cão permite-nos uma deslocação segura e supertranquila.

 

Porém, deixa-me dizer-te que eu redescobri as vantagens da bengala! Eu que nunca gostei de andar de bengala (e claro que ainda não gosto, mas enfim). A minha June está com 10 anos e 8 meses e noto maior lentidão nas deslocações, especialmente após algum tempo de trajeto. Ora, até para me habituar a tempos sem cão-guia que possam vir e também para habituar a June a uma nova vida (coisa que não fiz com o Júnior), , comecei a deixá-la de quando em vez, por períodos curtos de tempo.

 

E quais são as vantagens? Não ter que me preocupar se o cão está ao sol, se está à chuva, se precisa de fazer mais um xixi ou cocó, de esperar que cheire mais um bocadinho aqui ou ali (agora, pede mais para ir aos jardins, provavelmente porque eu deixo, lol). E nem sequer ter qualquer stress com Ubers e afins, porque já não tenho paciência para tanta estupidez! E isto também sabe bem.

 

Mas, lá está, logo a seguir lembramo-nos da falta que faz um bichinho sempre bem-disposto junto de nós, de como as ruas, afinal, estão cheias de obstáculos e pisos irregulares, de como é difícil encontrar uma porta para a qual não temos grandes ou nenhumas referências, etc..

 

Feliz Ano Novo para todos, cães incluídos!

 

Mariana Rocha

--

Lucas de Abreu Maia

unread,
Jan 21, 2025, 5:49:47 AMJan 21
to caes...@googlegroups.com
Mariana,

Entendo o que você quer dizer, claro. Cuidar de um cão é exaustivo, como o é cuidar de qualquer coisa viva. Mas, para mim, vale muito a pena.

Abraços,
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

Ana Bacelo

unread,
Jan 26, 2025, 3:16:36 PMJan 26
to caes...@googlegroups.com, caes...@googlegroups.com

"mariana,

"a June pode"realmente querer"ir mais vezes ao"jardim porque tu permites qke ""isso aconteça,"mas também pode ter a ver com a própria da idade, e as necessidades qke ""também"vão mudando.

"acho excelente que a habitues a estar mais tempo sozinha, mesmo que, queira Deus, a reforma ainda esteja muito longe, a coisa assim torna-se mais"tranquila.

"anita

."" "
     

No dia 20 de jan. de 2025, às 7:13 PM, Mariana Rocha <mariana...@gmail.com> escreveu:



Ana Bacelo

unread,
Jan 26, 2025, 3:19:57 PMJan 26
to caes...@googlegroups.com, caes...@googlegroups.com

Lucas,

Concordo plenamente, mesmo nesta fase que não está a ser a melhor na minha vida e da Abbinha.

Como alguns saberão, em "abril passado a "abba foi pisada, e a sua cauda ficou com 2 vértebras partidas. "mais"tarde, talvez por a cauda estar num ângulo estranho, foi trilhada na beira de um"armário entre este e o chão e fez uma pequena"ferida. "com"o"andar da carruagem percebemos que a"fratura cicatrizou mal e"no fim de contas em"Julho tivemos que fazer amputação parcial.
A situação não está ainda ultrapassada, ainda ontem vi que voltou a abrir uma ferida mínima, junto à zona que"ainda tem pouco pêlo, que noutra altura teria pouca importância"kas"já me pôs de sobreaviso. "a minha"cadela"passa parte da sua vida de açaime, e agora que estávamos a aliviar, acontece isto.
"ficou ela muito traumatizada, e acho que eu também.

"ainda assim, e apesar do drama em que isto se tornou, e dos constrangimentos"que nos tem trazido, "abba continua"a"ser a minha cadela.guia, que"já me deu, e dá, muitas alegrias. "neste momento pode"ter"algumas limitações,e não vou negar que às vezes evito ir a certos sítios, como transportes skperlotados"ou áreas onde haja probabilidade grande de a"pisarem, porque já lhe chegou.
"mas continua"a merecer a pena"cada dia qke ""estamos juntas,"não só pelo que fizemos e fazemos enquanto dupla, mas pelo que somos enquanto dona e cão.

Uma festa a essas toas duas cachorras.

"anita
 
 , 
.        "
  b

No dia 21 de jan. de 2025, às 10:49 AM, Lucas de Abreu Maia <labre...@gmail.com> escreveu:


Mariana,

Entendo o que você quer dizer, claro. Cuidar de um cão é exaustivo, como o é cuidar de qualquer coisa viva. Mas, para mim, vale muito a pena.

Abraços,
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

On Mon, 20 Jan 2025 at 19:13, Mariana Rocha <mariana...@gmail.com> wrote:

Ana Bacelo

unread,
Jan 26, 2025, 3:20:10 PMJan 26
to caes...@googlegroups.com, caes...@googlegroups.com

Ana Bacelo

unread,
Jan 26, 2025, 3:21:19 PMJan 26
to caes...@googlegroups.com, caes-guia

Lucas,

No reino unido de facto, a espera para substituição de cães-guia é muito grande.

Talvez por isso, e também porque muitas pessoas gostavam de ter o seu próprio cão, sem terem que depender de uma instituição, mais e mais cegos aí estão a"treinar os seus próprios cães.

Aliás, aí existe já uma associação, Adaa, a Assistance dogs acesssment acreditation, que certifica cães-guia selftrained, ou treinados privadamente. INCLUSIVAMENTE, parece que a ADAA está no bom caminho para ser"reconhecida pela aviação civil inglesa, para que os cegos e outros incapacitados desta vida possam voar com os seus cães mesmo que não estejam debaixo da asa da Adi ou IGDF.

Estas coisas enchem o meu coração de esperança num mundo melhor.

Quanto ao que dizes dos cães-guia, tudo verdade.

Aliás, mesmo quando ando por aí com a minha Abba, mesmo só de bengala, o que faço muitas vezes em trajetos conhecidos para ela ser simplesmente cão, cheirar aqui e acolá, etc, a atitude das pessoas é completamente diferente.
Quando saio sem a minha "aba, é como se tivesse deixado um bocadinho de mim para trás, consigo ir, vir e estar bem, mas não estou completa.

"anita
  
 
  

No dia 7 de dez. de 2024, às 2:42 PM, Lucas de Abreu Maia <labre...@gmail.com> escreveu:



alana...@sapo.pt

unread,
Jan 26, 2025, 4:38:01 PMJan 26
to caes...@googlegroups.com

Festinhas e as melhoras da “Abba”

Ana Rua

Mariana Rocha

unread,
Jan 27, 2025, 9:23:35 AMJan 27
to caes...@googlegroups.com

Ana,

 

Isso realmente está difícil. Desejo que rapidamente a Aba possa voltar a ter a sua qualidade de vida anterior. Beijinhos

 

Mariana Rocha

 


Enviada: 26 de janeiro de 2025 20:20
Para: caes...@googlegroups.com
Cc: caes...@googlegroups.com
Assunto: Re: Um elogio aos cães-guia.

 



Lucas,

Lucas de Abreu Maia

unread,
Jan 28, 2025, 5:59:43 AMJan 28
to caes...@googlegroups.com
Anita,

Me partiu o coração receber essas notícias da Abba. Espero que ela fique 100% recuperada o mais rapidamente possível.

Considero seriamente treinar meu próximo guia. Espero que a aposentadoria da Arya ainda esteja muitos anos no futuro, mas, se decidir por esse caminho, vou me planejar com anos de antecedência. Não sei se estarei numa posição profissional que me permita fazê-lo, mas é bom saber que há uma comunidade de cegos no Reino Unido que treina os próprios guias. Se tiver algum contato aqui, me passe, por favor? Gostaria de conversar com essas pessoas.

Um abraço,
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

Spencer Carnicelli Daltro de Miranda

unread,
Jan 28, 2025, 6:56:04 PMJan 28
to caes...@googlegroups.com

Anita, espero que a Abba se recupere prontamente e possa voltar à sua rotina habitual.

 

De: caes...@googlegroups.com <caes...@googlegroups.com> Em nome de Ana Bacelo
Enviada em: domingo, 26 de janeiro de 2025 17:20
Para: caes...@googlegroups.com
Cc: caes...@googlegroups.com
Assunto: Re: Um elogio aos cães-guia.

 



Lucas,

Ana Bacelo

unread,
Jan 29, 2025, 3:18:21 AMJan 29
to caes...@googlegroups.com, caes...@googlegroups.com
Amigos,

Muito obrigada pelo vosso carinho.

Anita e Abba


No dia 28 de jan. de 2025, às 11:56 PM, Spencer Carnicelli Daltro de Miranda <scd...@gmail.com> escreveu:



Ana Bacelo

unread,
Jan 29, 2025, 3:26:51 AMJan 29
to caes...@googlegroups.com, caes...@googlegroups.com
Lucas,

Há um senhor que faz parte da ADAA de nome Peter Gordon, não tenho o contacto dele mas, ;e não encontrares tento arranjar.

A ADAA, Assistance dogs acessment acreditation tem um site muito acessível.
Já andei por lá mas não sei se eles apenas fazem a acreditação ou também ajudam com o treino.

Há um grupo no facebook, do qual faço parte, de nome owner trained guide-dogs, a maioria das pessoas lá são dos EUA e do Reino Unido, mas também já lá vi alguém do brasil, de itália, México. De Portugal, infelizmente, penso que sou só eu que lá estou.
Mas as pessoas partilham lá experiências, conselhos...

Anita


No dia 28 de jan. de 2025, às 10:59 AM, Lucas de Abreu Maia <labre...@gmail.com> escreveu:



Lucas de Abreu Maia

unread,
Jan 29, 2025, 5:26:03 AMJan 29
to caes...@googlegroups.com
Obrigado pelas ótimas dicas, Anita. Beijinhos.
– Lucas de Abreu Maia, he/him/his
Lecturer (assistant professor) in Politics with Quantitative Research Methods
School of Sociology, Politics and International Studies
University of Bristol

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