
O
FUNDO DO POÇO Jorge
Linhaça
A
única vantagem de se chegar ao fundo do poço é que ao olharmos para cima
encontramos a luz, ainda que longínqua e tênue, indicando o caminho para
nossa salvação. É
bem verdade que alguns insistem em escarvar o fundo do poço com suas
próprias mãos, procurando aprofundar-se na escuridão. Também
é verdade que a luz vinda do alto pode incomodar os olhos acostumados ás
trevas ou à penumbra do seu habitáculo presente. Sair
do fundo do poço já são outros quinhentos. Por certo o esforço pode ser
tamanho que muitos cheguem a desistir da empreitada ou se acomodem
esperando que alguém de passagem propicie os meios para que eles possam
escapar da armadilha. Outros
procurarão engenhosamente criar pontos de apoio para uma escalada ,
abrindo sulcos nas paredes do poço , por onde possam impulsionar-se com os
pés e as mãos rumo à saída. Tudo
isso depende da fé de cada um. De acreditar que o é possível ( ou não)
voltar á superfície. Claro
que existem poços mais apertados e outros mais largos, alguns tão
estreitos que podem tolher nossos movimentos de tal forma que só nos reste
mesmo o pedido de socorro e a esperança de que sejamos ouvidos e/ou
encontrados por alguém cuja caridade nos permita o resgate. Ao
longo de nossas vidas, deparamo-nos com poços semeados ao longo do
caminho, por vezes estamos dentro deles e outras vezes do lado de fora
atuando como salvadores dos que ali se encontram. Quanto maior a
profundidade do poço mais difícil o trabalho. Via
de regra, a primeira coisa a fazer para tirar alguém do poço é elevar seu
moral, alimentá-lo e aquecê-lo na medida do possível. Alguns
ao despencar nos poços sofrem ferimentos em seus membros, tornando-se, ao
menos temporariamente incapazes de sair dali por sua própria
conta. Ninguém
sai do poço sem o desejar, por mais que outros procurem
resgatá-lo. Para
alguns, o fundo do poço é um momento de repensar seus valores, pode ser um
renascer para a vida e /ou a espiritualidade. Para outros é o auge do
desespero e da revolta contra Deus do e seus semelhantes. Alguns
resgates são bem mais fáceis que outros, pois existe quem procure
diligentemente pelo acidentado, em outros casos tudo vai depender da sorte
e da fé do indivíduo no fundo do poço, pois não há ninguém realmente
procurando por ele. Os
fatos físicos acima descritos tem toda uma semelhança patente com
situações sociais, espirituais ou emocionais, o que já é bastante
utilizado quando dizemos que “Fulano chegou ao fundo do poço”. Por
vezes a equipe de resgate nem mesmo é acionada porque algumas pessoas são
“invisíveis” aos olhos dos demais, não se destacam em nenhuma atividade,
talvez não tenham carisma, talvez sejam comuns demais ou talvez nos
pareçam não merecedoras de nossa atenção ou preocupação. Quantas
pessoas não estão ansiosas por uma visita, uma palavra amiga ou um simples
telefonema, que pode fazer toda a diferença e um momento
atribulado? Quantas
pessoas permanecem no poço da miséria material, espiritual, emocional ou
física sem que ninguém lhes ajude a olhar para cima e ver a luz no alto do
poço, ou se preferirem, no fim do túnel? Claro
que andamos ocupados demais com nossos problemas para vestirmos uma capa
de super-heróis e “salvar a humanidade em perigo”. No entanto não é isso
que se espera de nós . Não
precisamos ajudar o mundo inteiro, mas podemos ajudar uma pessoa ou
pequeno grupo de pessoas a encontrar alguma esperança. Quão
grande valor não terá esse simples sacrifício pessoal de algumas horas de
nossas vidas? Raramente
saberemos o verdadeiro impacto que podemos ter na vida das pessoas e sua
repercussão ao longo dos anos. A verdade é que ao fazermos a nossa parte,
podemos saber quantas sementes existem dentro de nossa mação de boas
ações, por assim dizer, no entanto jamais saberemos quantas maçãs existem
dentro de cada semente plantada. Cada
semente pode ou não desenvolver-se e frutificar, no entanto, aquelas que
frutificarem gerarão outras maçãs que darão suas sementes, num ciclo que
pode se repetir em proporção geométrica. Então,
estamos preparados para olhar com mais atenção para os poços á nossa
volta? Tomara
que sim.
Salvador,
22 de abril de
2014. |