Leigos e mulheres à frente de paróquias: Igreja Católica alemã ensaia novos modelos de liderança

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Jorge Mayer

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Jun 24, 2020, 5:51:06 AM6/24/20
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https://setemargens.com/leigos-e-mulheres-a-frente-de-paroquias-igreja-catolica-alema-ensaia-novos-modelos-de-lideranca/
Joaquim Nunes, em Offenbach (Alemanha) | 21 Jun 20

“Que formato necessita a Igreja para estar capaz de enfrentar o
futuro? Como responder às mudanças profundas que acontecem na
sociedade, na pastoral e nos campos profissionais dentro da Igreja, de
forma a que a Igreja possa responder aos desafios do nosso tempo?”

Com esta introdução, a diocese de Münster, uma das maiores da
Alemanha, acaba de apresentar um documento sobre o tema “Liderança e
responsabilidade na Igreja”. Trata-se de uma brochura destinada a
provocar debate e reflexão a todos os níveis diocesanos. Apresentam-se
vários modelos de liderança para as comunidades paroquiais, como
alternativas ao modelo tradicional de um padre/pároco por paróquia.

Segundo o documento, este modelo tradicional não é praticável, por
falta de recursos humanos (padres), nem é desejável numa Igreja que,
desde o Concílio Vaticano II, não se cansa de sublinhar a
responsabilidade conjunta de todos os baptizados. E também não tem
futuro numa sociedade que cada vez mais tem dificuldades em perceber,
por exemplo, a exclusão das mulheres dos ministérios ordenados da
Igreja ou a falta de participação democrática de todos os membros ao
nível das decisões que a todos dizem respeito. “A liderança na Igreja
tem muitos rostos”, podia bem ser o título deste documento publicado
neste mês de Junho.

Entre esses rostos, entre os diferentes modelos possíveis, está a
possibilidade de a responsabilidade pela paróquia do futuro ser
entregue a um leigo, homem ou mulher, possibilidade aliás já prevista
no cânon 517 §2 do Código de Direito Canónico.

Münster está a reflectir, mas outras dioceses já o concretizaram. Na
diocese de Osnabrueck, vizinha de Münster, uma mulher orienta duas
paróquias em Bad Iburg. Trata-se, neste caso concreto, de uma mulher,
leiga, com estudos de teologia, a assumir a responsabilidade
correspondente à do pároco.

Mulheres em cargos directivos nas dioceses alemãs é algo que vem de há
algum tempo e deixaram de ser casos “exóticos” ou raros. Há várias
cúrias diocesanas que incluem mulheres. A diocese de Limburgo tem uma
mulher à frente da cúria da pastoral diocesana, responsável directa
por vários secretariados. A diocese de Mainz tem também uma mulher no
grupo de pessoas que todas as semanas se reúne com o bispo para, em
conjunto, tomar decisões e ditar directivas para a diocese. Segundo
um estudo da Conferência Episcopal Alemã, já em 2018, cerca de 19% dos
responsáveis diocesanos – ao mais alto nível, isto é, membros das
cúrias diocesanas – eram mulheres (contra 42% de homens leigos e 39%
de clérigos). De então para cá, a percentagem de mulheres deve ter
aumentado. Já nos quadros intermédios (responsabilidade por
secretariados ou institutos diocesanos) a percentagem de mulheres
atingia, em 2018, os 23%.

Apesar disso, os movimentos de mulheres católicas alemãs não se dão
por satisfeitos. Aquando da preparação do debate sinodal em curso,
designado “Caminho Sinodal”, iniciado no Advento de 2019 e cuja
primeira assembleia geral teve lugar em Frankfurt em finais de Janeiro
passado, a questão do lugar das mulheres na Igreja foi admitida à
última hora como “fórum” (quatro no conjunto), sob pressão dos grupos
de mulheres e das suas delegadas ao Comité Central dos Católicos
Alemães. Nada de relevante acontece na Igreja alemã – como seja uma
assembleia plenária da Conferência Episcopal ou uma jornada nacional –
que as mulheres não se mobilizem para manifestar o seu protesto contra
a exclusão das mulheres dos ministérios ordenados.

O presidente-cessante da Conferência Episcopal, cardeal Reinhard Marx,
levantou mesmo a possibilidade de colocar uma mulher como
vigário-geral, num duo em conjunto com um padre. O cardeal Marx
defende claramente a necessidade de colocar mais mulheres nas
instâncias de liderança da Igreja. Num relatório apresentado ao
Conselho dos Cardeais, o órgão de consulta do Papa do qual é membro,
Marx afirmava que “mulheres na liderança da Igreja dão um um
contributo decisivo para a superação de círculos clericalistas
fechados”, círculos esses que seriam meio propício para fenómenos como
a violência e os abusos sexuais sobre menores. “Para que acreditem em
nós como Igreja, e como bispo desta Igreja, temos de tentar tudo para
conseguir mais mulheres para tarefas e instâncias directivas”,
afirmava Marx perante o Conselho de Cardeais.

O sucessor de Marx na presidência da Conferência Episcopal Alemã,
Georg Bätzing, bispo de Limburgo, considerado um moderado dentro da
conferência, segue, no entanto, a mesma linha reformadora. Interrogado
sobre a questão das mulheres na Igreja, afirmava: “Como bispo tenho de
verificar que a exclusão das mulheres dos ministérios ordenados é
vista pela sociedade como uma injustiça e como uma postura nada
adaptada ao nosso tempo”. No entanto, numa entrevista recente ao
Kölner Stadtanzeige, Bätzing recuava, afirmando que exigir igualdade
entre homens e mulheres dentro da Igreja não implica necessariamente
defender a ordenação das mulheres. A crítica a esta posição
conciliadora não se fez esperar. Um grupo de mulheres do movimento
Maria 2.0, da diocese de Hildesheim, numa carta que lhe dirigiu,
protestava que a igualdade não se pode fragmentar. Ou se trata de
igualdade em tudo ou não é igualdade.

O tema do lugar das mulheres na Igreja é, na Alemanha, um tema de
actualidade permanente. A vizinhança das Igrejas luteranas que, como é
sabido, têm mulheres como pastores e como bispos, não deixará de ter a
sua influência. Mas, mais que a experiência ecuménica, é decisiva a
evolução no seio da própria Igreja Católica na Alemanha e na teologia.
E aqui há que referir o peso das faculdades de teologia, com um número
crescente de mulheres catedráticas, bem como a percentagem maioritária
de mulheres entre os estudantes de teologia. Estudantes de teologia
que, uma vez formadas, têm acesso não só a aulas de religião e moral,
mas aos secretariados diocesanos e capelanias, bem como aos lugares de
assistente pastoral.

Na sua maioria, são as mulheres que coordenam de facto as actividades
e iniciativas diocesanas. E aí sim está a grande força das mulheres, o
seu lobby, na Igreja da Alemanha. A questão da ordenação das mulheres
é uma entre muitas outras. A presença de facto das mulheres na
liderança das comunidades – mulheres-pároco – já é uma realidade, um
“facto consumado”, um passo em frente neste tema da igualdade dentro
da Igreja, tanto ou mais importante que a questão da ordenação.
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