ROSA DA FONSECA
Partiu Rosa da Fonseca em meio a invernada
E como estava seu coração: opresso ou aliviado?
Sorveu chuvas de bênçãos ou borrascas inarráveis?
Valeu a luta desigual, bruta, tamanha,
Se os adversários sem ética, sem pudor, sem dignidade?
O pequenino que sem arrimo, ao vento, ao frio,
Com estômago encolhido e fome medonha que devasta,
Sem esperança, com o nada que desespera e causa estragos
Teve ciência que lutavas pela dignidade que a ele fora negada?
Alguém se fez agradecido por ter tido brava companheira,
Que destemida enfrentou barreiras terríficas
E empunhou bandeiras por causas humanísticas?
O mundo reconheceu teu martírio gigantesco
Em prol da democracia, legalidade e fraternidade?
Quando décadas vencidas, as baionetas foram destruídas?
Ressoam altissonantes passos em marcha por solidariedade e amorosidade
Ou ainda os canhões enferrujados calam os cânticos de liberdade?
Como o cheiro putrefato de morte, o estrondoso berro de ódio
Ainda espalhados por delinquentes fardados
Sem compromissos com a honra e a pátria amada?
Consta paz em tua alma, no semblante, aparentas calma?
A luta empreendida foi legítima, vivenciei aquele tempo de desditas,
E tive silenciosa empatia pelos românticos estudantes,
Mártires destinados às feras humanas,
Que sequer te permitiram
Dialogar com veemência ou justificar-te
Perante os tribunais das inquisições malsãs.
Tua dor dilacerante e teus gritos retumbantes foram escutados
Por Anjos que benevolentemente te anestesiaram?
Teus verdugos impiedosos e desumanos te assolaram com infâmias
E humilharam e envergonharam tua integridade,
O que jamais deveria suceder com qualquer ser humano!
Sendo Rosa, os espinhos se tornaram escudos protetores
De males ainda maiores dos inimigos atrozes.
Os cretinos fascistas e impiedosos tentaram,
Mas não conseguiram aquebrantar tua essência.
Vale a pena lutar por grandes causas,
Ainda que almas pequenas
Tudo arrasem com furor e insanidades.
Como está teu ânimo considerado o novo estado?
Perdoaste os tiranos que te degradaram?
Mentores te levaram para sítios paradisíacos?
As mentiras, as hipocrisias e as repressões absurdas
Fazem parte de um pretérito arrogante e bruto,
Destituído de previdência, inteligência e honorabilidade.
Verdugos que se consideram justos e honoríficos defensores pátrios,
Nada mais são que boçais, canalhas
E só não merecedores de desprezo total porque,
Em sendo filhos do Altíssimo,
Ainda que momentaneamente a serviço da malignidade,
Têm chances de no porvir se redimirem das atrocidades
Que praticaram contra o irmão em prova terrestre.
Jamais descansa, Rosa, em berço esplêndido:
Teu espírito aventureiro não combina com ociosidade.
Onde estiveres continua o bom combate por igualdade e liberdade.
O viver não é só busca de prazer e alegrias efêmeras,
Quais os hedonistas e os ditadores supõem ser,
Mas vibração e transfusão de energias benignas
Que trazem esperança, confiança e consciência tranquila,
E estas tiveste em abundância e as ofertaste profusamente.
Mesmo que um dia apenas não tenhas passado
Sem que lembranças amaras te atormentassem,
Configurou-se desafiadora, valorosa e triunfadora
As lutas empreendidas e teres vivido existência condigna.
Os covardes suportam vivências mornas e sórdidas,
E por temor ou ambição de galgar postos que sua competência não comporta,
Contribuem para que o mal se instale no seio da sociedade.
Serena, pessoa digna, tuas batalhas não foram em vão.
Foste sacrificada porque te empenhaste para que triunfasse a honradez,
E quantos não carregam louros de vitórias inglórias
Obtidas com derramamento de sangue inocente?
Avança, vence, habilita-te a novos conceitos:
A aristocracia, tendente ao absolutismo,
Precisa ser convencida do respeito humano
Ou sua desumanidade, avareza e egoísmo serem vencidas,
Porque inúmeras dores e desgostos têm produzido.
Nem tudo perdido, no entanto:
Os paracletos a postos para a construção de nova realidade
Centrada em justiça social e longanimidade.
Ampara-te neles e serás regiamente recompensada.
José Periandro Marques