[Logica-l] terminologia , anglicismos e língua portuguesa

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Hermogenes Hebert Pereira Oliveira

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Nov 6, 2011, 7:46:24 AM11/6/11
to logi...@dimap.ufrn.br
Olá, colegas.

João Marcos está certo. E digo mais. Não importa se o uso vem sendo
consagrado desde 1900 por alguns pesquisadores e estudantes,
principalmente se esses são da área de ciências exatas. Admitamos: a
maior parte de nós são simplesmente uns trogloditas quando se trata de
língua portuguesa. Tomem como exemplo o colega que escreveu "zero
premissas" quando qualquer falante competente do português, no gozo
perfeito de suas faculdades mentais, escreveria "nenhuma premissa". O
colega que cito, por favor, não tome ofensa: eu mesmo já disse
barbaridades piores inúmeras vezes.

São diversas as causas da nossa imperícia com a língua materna, mas
creio que o anglicismo e a falta de uma consolidada tradição de
tradução de textos técnicos são as principais. De fato, o desrespeito
do brasileiro pela língua portuguesa é espantoso. Observem que os
colegas disseram que é incorreto se traduzir "provable" por
"provável", _porque esta palavra já está reservada como tradução de
"probable"_! Absolutamente, *não* é essa a razão, caros colegas. A
razão é que, _em língua portuguesa_, nós usamos "provável" com o
sentido presente em frases como "É provável que eu não compareça à
aula amanhã".

Discussões como a levantada pelo João Marcos muitas vezes terminam em
debates um tanto infrutíferos entre "anglicistas" e "puristas"
lusófonos. Eu tendo a ser um purista. Permitam-me explicar as minhas
razões.

Não se trata apenas de um purismo ou cuidado excessivo com a língua
portuguesa, como se quisesse protegê-la contra a inevitável influência
de outras línguas. Afinal, esse processo ocorreu, em diversos graus,
com todas as línguas modernas. O ponto é que o respeito aos usos,
significados, vocabulário, enfim, à língua portuguesa, além de
politicamente correto, oferece vantagens, principalmente vantagens
didáticas. Se usarmos de um pouco mais de sofisticação no uso na
nossa língua ao traduzir e escolher o vocabulário concernente à nossa
área, poderíamos evitar uma porção de termos técnicos e tornar nosso
discurso mais acessível a leigos e iniciantes. Por exemplo, a um
leigo que não conheça absolutamente nada de informática, os termos
"programa de computador" ou "aplicativo", ainda que ambíguos,
certamente expressam mais do significado pretendido do que o
estrangeirismo "software", que não expressa absolutamente nada a esse
suposto falante exclusivo do português. O mesmo ocorre com o
controverso "circuitaria" em relação a "hardware". Contudo, os
estrangeirismos "software" e "hardware" já se encontram tão difundidos
(ao ponto de que se alguém conhece o significado de "computador" já
sabe o que significa "software" e "hardware") que o uso de
"logiciário" e "circuitaria" em substituição daqueles está destinado a
causar mais confusão do que esclarecimento.

Me parece que o estabelecimento de uma terminologia comum para uso e
tradução é uma tarefa importante que vem sendo negligenciada por nós.
Na área de lógica, temos diversos termos que mereceriam mais atenção e
talvez revisão por parte da comunidade. Dispensamos muito pouco
esforço nessa tarefa e acabamos por simplesmente "traduzir" ou
"incorporar" descuidadamente termos que encontramos na literatura
técnica em língua estrangeira e as forçamos goela a baixo em nossos
estudantes. Quando leciono lógica me sinto um bobalhão ao usar certos
termos técnicos consagrados da prática brasileira no ensino dessa
disciplina. Felizmente, ou infelizmente, nossos estudantes são uns
cordeirinhos que aceitam ter suas intuições linguísticas trucidadas em
nome do conhecimento acadêmico (essa frase ficou meio dramática
demais, mas não sei como substituí-la). De fato, estamos tão
acostumados com o vocabulário técnico de nossa área que sequer
percebemos o quanto dele é inadequado.

Recentemente, vi num livro didático de lógica bem antigo o termo
"condições de veracidade". Pensei, "que esquisito!". Contudo, alguns
minutos depois fiz o esforço de me livrar, temporariamente, do meu
"treinamento lógico" e me coloquei no lugar de um leigo ou iniciante.
Notei que "condições de veracidade" é talvez mais adequado e
compreensível que "condições de verdade", além de ser mais natural em
termos de língua portuguesa. A tendência mais forte, ao falante de
língua portuguesa, é entender "condições de verdade" no sentido de
"condições verídicas", algo como o oposto de "condições de mentira".
Por outro lado, "veracidade" parece compartilhar, em boa parte do seu
uso, do sentido pretendido: por exemplo, quando se diz "Vamos
verificar a veracidade dessa alegação". Nas minhas experiências, ao
explicar, não em sala de aula, mas em explicações particulares a
iniciantes, o termo "condições de veracidade" parece suscitar menos
estranhamento do que "condições de verdade". Obviamente, o uso de
termos mais apropriados (porém menos difundidos) no ensino talvez faça
um desfavor àqueles que terão de lidar com literatura técnica da área
posteriormente. Nesse sentido, talvez seja mais piedoso extirpá-los o
mais cedo possível de suas intuições linguísticas do que deixá-los
para se debaterem sozinhos com a literatura mais tarde.

Futuramente, podemos evitar muitos desses dilemas se abandonarmos o
amadorismo na escolha de nossa terminologia, tanto para tradução como
para uso didático. Como primeiro passo em direção a esse objetivo,
sugiro a seguinte terminologia com a relação ao nosso debate presente.

Demonstração: Termo que se refere àquilo que oferecemos para
estabelecer um teorema. De modo mais geral pode também ser usado para
se referir a demonstrações codificadas num sistema formal genérico.

Derivação: Demonstração codificada num sistema formal específico a
partir de nenhuma premissa.

Dedução: Demonstração codificada num sistema formal específico,
possivelmente a partir de premissas.

O que acham?

--
Hermógenes Hebert Pereira Oliveira



Valeria de Paiva

unread,
Nov 6, 2011, 12:27:36 PM11/6/11
to Fernando Naufel do Amaral, logi...@dimap.ufrn.br, Hermogenes Hebert Pereira Oliveira
alo,
acho que quero dar uma ultima palpitada nessa conversa...

Eu concordo com a Elaine que quem usa no dia a dia e precisa de tem
mais cacife pra resolver que nomes usar pras as coisas.

Eu concordo com o Fernando que lingua 'e o que acontece nas salas de
aula, nas conversas e nas salas da gente que ta' trabalhando com o
assunto e nao o que qq autoridade decreta, seja ela a ABL, a SBL, or a
SBC....

Eu concordo com o Joao Marcos que conversas sobre a linguagem que a
gente usa e porque a gente usa a linguqguem que usa sao muito
importantes. Mas acho que essa ja' aconteceu, ja' foi. Teoria da Prova
fica, pois quem faz no Brasil, chama assim. do mesmo jeito que por
mais que alguem reclame ninguem vai deixar de falar computador,
software e etc.

abs
Valeria

2011/11/6 Fernando Naufel do Amaral <fna...@gmail.com>:
> Olá, Hermogenes e lista,
>
>
> Muito interessante, sua msg. Vou tentar ser breve e pontual nos meus
> comentários. E resumir, em algumas frases, no final desta msg, o que
> eu acho que é a verdadeira causa do problema.
>
>
> 2011/11/6 Hermogenes Hebert Pereira Oliveira <hhe...@posgrad.ufg.br>:
>> Olá, colegas.
>>
>> João Marcos está certo.  E digo mais.  Não importa se o uso vem sendo
>> consagrado desde 1900 por alguns pesquisadores e estudantes,
>> principalmente se esses são da área de ciências exatas.  Admitamos: a
>> maior parte de nós são simplesmente uns trogloditas quando se trata de
>> língua portuguesa.  Tomem como exemplo o colega que escreveu "zero
>> premissas" quando qualquer falante competente do português, no gozo
>> perfeito de suas faculdades mentais, escreveria "nenhuma premissa".  O
>> colega que cito, por favor, não tome ofensa: eu mesmo já disse
>> barbaridades piores inúmeras vezes.
>
>  Eu escrevi "zero premissas". Não "tomo ofensa" (tradução literal de
>  "take offense", que não se usa em português?), mas não acho que eu
>  seja um falante incompetente.
>
>  Aliás, qual o problema em falar "zero premissas"?
>
>  Quanto às minhas faculdades mentais, percebo que vc é um daqueles
>  preconceituosos que acham que ser bom orador equivale a ter bom
>  senso e razão. Técnicas de oratória foram desenvolvidas pensando em
>  gente como vc.
>
>  Por favor, não se ofenda.
>
>
>> São diversas as causas da nossa imperícia com a língua materna, mas
>> creio que o anglicismo e a falta de uma consolidada tradição de
>> tradução de textos técnicos são as principais.  De fato, o desrespeito
>> do brasileiro pela língua portuguesa é espantoso.  Observem que os
>> colegas disseram que é incorreto se traduzir "provable" por
>> "provável", _porque esta palavra já está reservada como tradução de
>> "probable"!  Absolutamente, *não* é essa a razão, caros colegas.  A
>> razão é que, em língua portuguesa, nós usamos "provável" com o
>> sentido presente em frases como "É provável que eu não compareça à
>> aula amanhã".
>
>  Sim, nada impede que "provável" tenha dois (ou mais) sentidos. Mas,
>  em uso corrente, só tem um ("algo com grande probabilidade de
>  ocorrer").
>
>  Quando vc fala em "imperícia", vc está partindo do pressuposto de
>  que há uma maneira correta (em termos absolutos) de usar a língua.
>
>  Daí, a pergunta inevitável: quem decide qual é a maneira correta? A
>  ABL? O governo? No nosso caso, a SBL?
>
>  Engraçado: isto não lembra a controvérsia platonismo X formalismo X
>  intuicionismo na fundamentação da matemática?
>
>  O idioma existe platonicamente, independente de nós, ou é definido
>  por um conjunto de regras formais totalmente arbitrárias, ou é um
>  conjunto de construções mentais?
>
>  Acho que estamos sendo amadores também nesta discussão. Lógica,
>  linguística e filosofia têm uma interseção altamente técnica e
>  interessante, mas esta não é a minha área. É a sua?
>
>  Chamemos os linguistas, os filólogos, os etimólogos, os filósofos da
>  linguagem. Chamemos Schopenhauer, Wittgenstein, Searle, Chomsky e
>  outros que entendem mesmo do assunto.
>
>  (Mas não chamemos os políticos nem os editores, por favor! Nem
>  amadores com essa compulsão obsessiva para definir regras!)
>
>
>> Discussões como a levantada pelo João Marcos muitas vezes terminam em
>> debates um tanto infrutíferos entre "anglicistas" e "puristas"
>> lusófonos.  Eu tendo a ser um purista.  Permitam-me explicar as minhas
>> razões.
>
>  OK.

Fernando Naufel do Amaral

unread,
Nov 6, 2011, 11:13:07 AM11/6/11
to Hermogenes Hebert Pereira Oliveira, logi...@dimap.ufrn.br
Olá, Hermogenes e lista,


Muito interessante, sua msg. Vou tentar ser breve e pontual nos meus
comentários. E resumir, em algumas frases, no final desta msg, o que
eu acho que é a verdadeira causa do problema.


2011/11/6 Hermogenes Hebert Pereira Oliveira <hhe...@posgrad.ufg.br>:
> Olá, colegas.
>
> João Marcos está certo.  E digo mais.  Não importa se o uso vem sendo
> consagrado desde 1900 por alguns pesquisadores e estudantes,
> principalmente se esses são da área de ciências exatas.  Admitamos: a
> maior parte de nós são simplesmente uns trogloditas quando se trata de
> língua portuguesa.  Tomem como exemplo o colega que escreveu "zero
> premissas" quando qualquer falante competente do português, no gozo
> perfeito de suas faculdades mentais, escreveria "nenhuma premissa".  O
> colega que cito, por favor, não tome ofensa: eu mesmo já disse
> barbaridades piores inúmeras vezes.

Eu escrevi "zero premissas". Não "tomo ofensa" (tradução literal de
"take offense", que não se usa em português?), mas não acho que eu
seja um falante incompetente.

Aliás, qual o problema em falar "zero premissas"?

Quanto às minhas faculdades mentais, percebo que vc é um daqueles
preconceituosos que acham que ser bom orador equivale a ter bom
senso e razão. Técnicas de oratória foram desenvolvidas pensando em
gente como vc.

Por favor, não se ofenda.


> São diversas as causas da nossa imperícia com a língua materna, mas
> creio que o anglicismo e a falta de uma consolidada tradição de
> tradução de textos técnicos são as principais.  De fato, o desrespeito
> do brasileiro pela língua portuguesa é espantoso.  Observem que os
> colegas disseram que é incorreto se traduzir "provable" por
> "provável", _porque esta palavra já está reservada como tradução de
> "probable"!  Absolutamente, *não* é essa a razão, caros colegas.  A
> razão é que, em língua portuguesa, nós usamos "provável" com o
> sentido presente em frases como "É provável que eu não compareça à
> aula amanhã".

Sim, nada impede que "provável" tenha dois (ou mais) sentidos. Mas,
em uso corrente, só tem um ("algo com grande probabilidade de
ocorrer").

Quando vc fala em "imperícia", vc está partindo do pressuposto de
que há uma maneira correta (em termos absolutos) de usar a língua.

Daí, a pergunta inevitável: quem decide qual é a maneira correta? A
ABL? O governo? No nosso caso, a SBL?

Engraçado: isto não lembra a controvérsia platonismo X formalismo X
intuicionismo na fundamentação da matemática?

O idioma existe platonicamente, independente de nós, ou é definido
por um conjunto de regras formais totalmente arbitrárias, ou é um
conjunto de construções mentais?

Acho que estamos sendo amadores também nesta discussão. Lógica,
linguística e filosofia têm uma interseção altamente técnica e
interessante, mas esta não é a minha área. É a sua?

Chamemos os linguistas, os filólogos, os etimólogos, os filósofos da
linguagem. Chamemos Schopenhauer, Wittgenstein, Searle, Chomsky e
outros que entendem mesmo do assunto.

(Mas não chamemos os políticos nem os editores, por favor! Nem
amadores com essa compulsão obsessiva para definir regras!)


> Discussões como a levantada pelo João Marcos muitas vezes terminam em
> debates um tanto infrutíferos entre "anglicistas" e "puristas"
> lusófonos.  Eu tendo a ser um purista.  Permitam-me explicar as minhas
> razões.

OK.

Eduardo Ochs

unread,
Nov 6, 2011, 1:50:11 PM11/6/11
to Fernando Naufel do Amaral, logi...@dimap.ufrn.br
2011/11/6 Fernando Naufel do Amaral <fna...@gmail.com>
> Mas, para mim, a causa principal do nosso "amadorismo" no uso de
> termos lógicos em português é a seguinte:
>
> A maior parte da lógica de verdade (artigos para conferências
> ou periódicos, relatórios, capítulos de livros, etc.) escrita
> por lógicos brasileiros em seu dia-a-dia É ESCRITA,
> ORIGINALMENTE, EM INGLÊS! Depois, se houver necessidade,
> traduz-se para o português, mas nunca se tem muito tempo (ou
> conhecimento linguístico) para dedicar à tarefa.
>
> Então, para testar este meu palpite, eu pergunto: quantos de vcs fazem
> lógica originalmente em português? E quantos de vcs fazem rascunhos,
> anotações e esboços de artigos em inglês (sabendo que o produto vai
> acabar sendo publicado nesse idioma mesmo)?
>
> E mais: quantos de vcs lêem mais livros de lógica em português do que
> em inglês?

É pra responder a enquete publicamente?

Eu quase só leio livros de lógica, matemática, teoria da computação,
informática, etc, em inglês; os meus rascunhos são em inglês, às vezes
com alguns trechos em português; praticamente tudo que eu "publico" em
lógica, matemática, computação, etc, etc - e aqui estou usando
"publico" no sentido amplo, incluindo e-mails e programas bagunçados
que eu disponibilizo na minha página - é em inglês, pra todo mundo
conseguir ler.

E quando eu escrevo algo em português - tipicamente material que tem
que poder ser lido facilmente por alunos de primeiros períodos - eu
tomo o cuidado de usar uma linguagem que deixe claro que a
terminologia que estamos usando é SEMPRE temporária, que estamos
sempre improvisando um pouco e tentando encontrar a terminologia mais
clara possível, mas que não podemos gastar horas em cima de cada
palavra... Se alguma palavra dá margem a dúvidas é porque faltam
definições - escritas em "math mode" -, explicações em português,
exemplos e figuras...

Agora vou comentar uma frase da mensagem do Hermogenes:

2011/11/6 Hermogenes Hebert Pereira Oliveira <hhe...@posgrad.ufg.br>:
> De fato, o desrespeito do brasileiro pela língua portuguesa é
> espantoso.

O desrespeito do brasileiro por MILHARES DE COISAS é espantoso, e a
minha posição (minha, pessoal) quanto a isto é a seguinte. Se eu for
gastar energia demais tentando consertar a relação dos meus vizinhos
com a língua portuguesa vai me sobrar muito menos energia pra eu
tentar consertar outras coisas que eu considero urgentes...

[[]]s da ilha dos zumbis,
Eduardo Ochs
eduar...@gmail.com
http://angg.twu.net/

Hermogenes Hebert Pereira Oliveira

unread,
Nov 6, 2011, 12:35:56 PM11/6/11
to Fernando Naufel do Amaral, logi...@dimap.ufrn.br
Em 06 de novembro de 2011, Fernando Naufel do Amaral escreveu:
> Eu escrevi "zero premissas". Não "tomo ofensa" (tradução literal de
> "take offense", que não se usa em português?), mas não acho que eu
> seja um falante incompetente.
>
> Aliás, qual o problema em falar "zero premissas"?
>
> Quanto às minhas faculdades mentais, percebo que vc é um daqueles
> preconceituosos que acham que ser bom orador equivale a ter bom
> senso e razão. Técnicas de oratória foram desenvolvidas pensando em
> gente como vc.
>
> Por favor, não se ofenda.

Eu não me ofendo. E peço desculpas publicamente, pois aparentemente
ofendi você, Fernando. Sei que isso não consola muito a pessoa
ofendida, mas permita-me explicar o que aconteceu. Minha intenção não
era, de maneira alguma, fazer comentários pessoais a seu respeito.
Afinal, sequer o conheço pessoamente. Em particular, não pretendia
dizer que você é um falante incompetente da língua portuguesa ou
mesmo sugerir qualquer coisa a respeito das suas faculdades mentais.
Meu objetivo era apenas fazer uma caricatura de certas práticas, das
quais eu mesmo sou culpado, como disse. Displincentemente, assumi um
tom que seria apropriado caso estivesse conversando com amigos, mas
que mostrou-se terrivelmente infeliz numa mensagem a uma lista de
discussão cuja maioria dos membros não me conhece pessoalmente.
Relendo agora minha mensagem, percebo que ela pode ser tomada de
maneira bastante ofensiva e desrespeitosa. Confesso que estou
envergonhado. Permita-me ainda dizer que não me considero bom orador
e que a arrogância que pode ser lida em minha mensagem é apenas
aparente. Enfim, sei que aquilo que escrevi autoriza-o a adotar a
pior das imagens sobre a minha pessoa. Ainda assim, peço que aceite
meu pedido de desculpas.

> Sim, nada impede que "provável" tenha dois (ou mais) sentidos. Mas,
> em uso corrente, só tem um ("algo com grande probabilidade de
> ocorrer").
>
> Quando vc fala em "imperícia", vc está partindo do pressuposto de
> que há uma maneira correta (em termos absolutos) de usar a língua.

Não creio que seja necessário um critério _absoluto_. Penso que,
certamente, temos uma noção de bom uso e mau uso da língua. O que
pretendia apontar era somente o fato de que tratamos o bom uso da
língua com uma certa displincência e que poderíamos melhorar nesse
quesito. Observem que uso a primeira pessoa do plural. Portanto, isso
não é uma acusação ou julgamento pessoal a respeito desse ou daquele
colega, mas um convite coletivo a pensarmos sobre o assunto.

> Daí, a pergunta inevitável: quem decide qual é a maneira correta? A
> ABL? O governo? No nosso caso, a SBL?
>
> Engraçado: isto não lembra a controvérsia platonismo X formalismo X
> intuicionismo na fundamentação da matemática?
>
> O idioma existe platonicamente, independente de nós, ou é definido
> por um conjunto de regras formais totalmente arbitrárias, ou é um
> conjunto de construções mentais?
>
> Acho que estamos sendo amadores também nesta discussão. Lógica,
> linguística e filosofia têm uma interseção altamente técnica e
> interessante, mas esta não é a minha área. É a sua?

Não, não é a minha área. Como pode observar, o amadorismo também é da
minha parte.

> Eu acho que existem dois registros: o técnico e o semitécnico.
>
> No registro técnico, é necessário oferecer definições precisas dos
> termos usados. Se as definições não forem de conhecimento comum,
> devemos incluí-las no texto (e.g., em um artigo técnico), e aí não
> há qualquer dúvida quanto aos significados.
>
> No registro semitécnico, vale usar termos ambíguos ou imprecisos,
> tornando seus significados pretendidos mais ou menos claros através
> do texto, não necessariamente através de definições.
>
> De forma alguma a definição de uma terminologia em uma área de
> atuação é uma questão simples. O pessoal da Medicina e da Biologia
> vem atacando esse problema há décadas, com padrões, vocabulários,
> ontologias formais, e outras técnicas e ferramentas. E ainda não
> chegaram a um consenso.
>
> Mas, para mim, a causa principal do nosso "amadorismo" no uso de
> termos lógicos em português é a seguinte:
>
> A maior parte da lógica de verdade (artigos para conferências ou
> periódicos, relatórios, capítulos de livros, etc.) escrita por
> lógicos brasileiros em seu dia-a-dia É ESCRITA, ORIGINALMENTE,
> EM INGLÊS! Depois, se houver necessidade, traduz-se para o
> português, mas nunca se tem muito tempo (ou conhecimento
> linguístico) para dedicar à tarefa.
>
> Então, para testar este meu palpite, eu pergunto: quantos de vcs
> fazem lógica originalmente em português? E quantos de vcs fazem
> rascunhos, anotações e esboços de artigos em inglês (sabendo que o
> produto vai acabar sendo publicado nesse idioma mesmo)?
>
> E mais: quantos de vcs lêem mais livros de lógica em português do
> que em inglês?
>
> Admitamos: a terminologia de lógica que usamos mentalmente está toda
> em inglês! A tradução para português é um "afterthought".
>
> Dever de casa para os puristas: achar uma boa tradução para
> "afterthought".

Concordo contigo. E creio que, assim como os colegas da Medicina
devíamos nos preocupar com esse problema. Eu não tenho as soluções.
Mas creio que podemos melhorar as coisas se, em vez de ignorarmos
o problema, engajarmos na solução dele.

Fernando Naufel do Amaral

unread,
Nov 7, 2011, 8:08:33 AM11/7/11
to hhe...@posgrad.ufg.br, logi...@dimap.ufrn.br
Caro Hermogenes,


Sem ressentimentos. Discussões acaloradas são melhores do que nenhuma
discussão (senão, é melhor mudar o nome desta lista...).

É normal que, sem nos conhecermos, tenhamos a tendência de tratar as
pessoas desta lista como representantes de grupos estereotipados (os
"puristas", os "descuidados com o idioma", os "chatos", os
"patrulhadores", os "gurus", etc.).

Mas vc tem razão: salvo algumas exceções, os participantes desta lista
não se conhecem o suficiente para emitir qualquer julgamento pessoal
uns sobre os outros.

Por outro lado, a história da internet está cheia de "flamewars" que,
em retrospecto, ajudaram a esclarecer e resolver diversos assuntos
polêmicos. Em computação, temos o exemplo de Torvalds e Tanenbaum na
época do surgimento do Linux.

Precisamos nos acostumar com isso e parar de nos escandalizarmos toda
vez que alguém emite opiniões de forma mais enfática ou agressiva.
Senão, caímos na esterilidade do discurso PC.

Se fui ofensivo com vc, peço desculpas tbém. E as discussões continuam.

Eu teria mais contribuições sobre o assunto, mas não tenho mais tempo
para dedicar a isto (pelo menos não por enquanto), e parece que este
tipo de conversa incomoda pessoas da lista, como o Carnielli indicou
em mensagem recente.


Um abraço,

Fernando Náufel, D.Sc.
fna...@gmail.com
http://fnaufel.wordpress.com
http://www.uff.br/llarc

Professor Adjunto
(~Professor Doctor
see http://en.wikipedia.org/wiki/Professor#Brazil_and_Portugal)
LLaRC - Laboratório de Lógica e Representação do Conhecimento
RFM - Depto. de Física e Matemática
PURO - Pólo Universitário de Rio das Ostras
UFF - Universidade Federal Fluminense
Brazil
--




2011/11/6 Hermogenes Hebert Pereira Oliveira <hhe...@posgrad.ufg.br>:
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