[Logica-l] "provas" x "demonstrações", em Lógica

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Joao Marcos

unread,
Nov 5, 2011, 11:26:28 AM11/5/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
De uma mensagem recente enviada à lista:

> Na estrutura gramatical superficial, cientistas e juristas podem usar as
> mesmas palavras quando estão designando conceitos *muito* diferentes

Valeria de Paiva

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Nov 5, 2011, 5:08:24 PM11/5/11
to Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Joao MArcos,
vou me atrever (com trepidacao, 'e claro) a discordar de voce em
genero, numero e grau.

todo mundo que eu conheco desde 190- e-esqueci sempre falou de provas
em matematica, "a minha prova do teorema 'e mais bonita do que a sua",
"a prova do Halmos 'e mais simples do que a de fulano", etc..

eu nao sei porque tenho ou teria que usar "demonstracao" pra essas
construcoes e nao sei porque teria que falar de "teoria das
demonstracoes", em vez de "teoria da prova" quando estiver usando a
versao coletiva do nome. na verdade, eu uso as duas formas, quando
escrevendo em portugues, mas pro titulo da area de logica matematica
prefiro mesmo "Teoria da Prova".

abracos demonstrativos,
Valeria

2011/11/5 Joao Marcos <boto...@gmail.com>:
> De uma mensagem recente enviada à lista:
>
>> Na estrutura gramatical superficial, cientistas e juristas podem usar as
>> mesmas palavras quando estão designando conceitos *muito* diferentes.
> [...]
>> Há discussões muito finas do significado bastante delicado de
>> "prova" em matemática e lógica.
>
> "Provas" em matemática ou lógica são quando muito um nome que damos
> àqueles "testes" / "exames" / "avaliações" aos quais submetemos os
> nossos alunos...  Um exemplo é a promessa: "esta semana vocês farão
> uma prova surpresa!"
>
> Em matemática ou lógica o termo "proof" NÃO se traduz como "prova" a
> menos que estejamos dispostos a cometer um idiotismo (no sentido
> linguístico do termo) insustentável.  O que apresentamos para
> _justificar_ os nossos teoremas / conjecturas ou inferências em
> matemática ou lógica (com alguma sorte e competência) são
> **demonstrações** (e até o babel "portuges" do LaTeX sabe disso ---
> experimente compilar um \begin{proof}).
>
> Nas línguas latinas "demonstratio" se traduz como "démonstration"
> (fr), "demostración" (es), "dimostrazione" (it), "demonstraţie" (ro),
> "demostració" (ca), et coetera.  Da mesma forma, em português a _boa_
> tradução para este termo é o vocábulo "demonstração".
>
> É natural, assim, que "Proof Theory" se traduza de maneira castiça
> como "Théorie de la Démonstration", "Teoría de la Demostración",
> "Teoria della Dimostrazione", e assim por diante (com o "theoria"
> herdado do grego).  De maneira semelhante, imbuídos por uma
> preocupação mínima em não cometer graves atentados contra a nossa
> língua, deveríamos traduzir "Proof Theory" como "Teoria da
> Demonstração" ou, melhor ainda, como "Teoria das Demonstrações" (em
> analogia a "Set Theory" = "Teoria dos Conjuntos", "Model Theory" =
> "Teoria dos Modelos").
>
> Cometem um desserviço ao português e de certa forma até mesmo uma
> leviandade no que diz respeito ao estabelecimento de uma terminologia
> científica coerente no campo da lusofonia, sob o ponto de vista aqui
> ilustrado, os "proof-theorists" que falam em "provas" e "Teoria da
> Prova" --- teoria esta cujo objeto principal de estudo é a noção
> formal de "derivação". :-)
>
> A coisa fica ainda mais esquisita, vale insistir, quando a turma das
> "provas" se empenha a tratar e estudar a própria noção / predicado de
> "provabilidade" --- neologismo que representaria, é de se supor, uma
> propriedade de proposições "prováveis" (?).  É de desorientar qualquer
> um...  Tudo ficaria mais simples e reto, claro, se a terminologia
> adequada envolvendo a "demonstrabilidade" de proposições
> "demonstráveis" fosse uniformemente empregada!
>
> Ou pelos menos é essa a minha opinião --- que me parece apropriada até
> prova em contrário. :-D
> Joao Marcos
>
>
> PS: A propósito, o emprego do peculiar termo "teorético" parece
> completamente _desnecessário_, em português, quando temos disponível o
> termo "teórico" para o mesmo fim.
>
> --
> http://sequiturquodlibet.googlepages.com/
> _______________________________________________
> Logica-l mailing list
> Logi...@dimap.ufrn.br
> http://www.dimap.ufrn.br/cgi-bin/mailman/listinfo/logica-l
>



--
Valeria de Paiva
http://www.cs.bham.ac.uk/~vdp/
http://valeriadepaiva.org/www/

Fernando Naufel do Amaral

unread,
Nov 5, 2011, 6:22:05 PM11/5/11
to Valeria de Paiva, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Oi, João, Valéria e lista,


Perdoem-me por não me lembrar a fonte, mas posso jurar que já li, num
livro de Lógica, que uma prova é uma demonstração com zero premissas.

Na verdade, o livro era em inglês, e se referia a "proofs" e
"demonstrations".

Posso tentar procurar a fonte, mas se alguém já tiver esbarrado nesta
distinção, pode lembrar melhor do que eu.

Se houver uma distinção técnica entre "proof" e "demonstration" em
inglês, então precisaríamos de termos distintos em português tbém.

Concordo com a Valéria que "prova" é usado por lógicos lusófonos na
vida real.

E concordo com o João Marcos quanto ao problema com "proof",
"provable" e "provability". Por uma coincidência infeliz, "provável"
em português já está ocupado como tradução de "probable".

(Bacana mesmo é alemão, onde "provable" é "beweisbar", e "probable" é
"wahrscheinlich".)

E "teorético" é mesmo um anglicismo injustificável.

Sugestão de solução simples, partindo da premissa de que não dá para
proibir termos consagrados pelo uso: usar "prova" e "demonstração"
como sinônimos em português, explicitando, se necessário, a ausência
ou presença de premissas. Idem com "provabilidade" e
"demonstrabilidade". E, como adjetivo, usar só "demonstrável".


Um abraço,

Fernando Náufel, D.Sc.
fna...@gmail.com
http://fnaufel.wordpress.com
http://www.uff.br/llarc

Professor Adjunto
(~Professor Doctor
see http://en.wikipedia.org/wiki/Professor#Brazil_and_Portugal)
LLaRC - Laboratório de Lógica e Representação do Conhecimento
RFM - Depto. de Física e Matemática
PURO - Pólo Universitário de Rio das Ostras
UFF - Universidade Federal Fluminense
Brazil
--




2011/11/5 Valeria de Paiva <valeria...@gmail.com>:

Decio Krause

unread,
Nov 5, 2011, 6:25:18 PM11/5/11
to Fernando Naufel do Amaral, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Patrick Suppes diz mais ou menos o seguinte, precisava ver, mas não agora: uma "demonstração" tal como o matemático faz, é uma "prova" (dos lógicos) mas cheia de buracos, ou seja, ele não apresenta os detalhes mais evidentes (supostamente, claro).
D.
________________________________
Decio Krause
Departamento de Filosofia
Universidade Federal de Santa Catarina
88040-940 Florianópolis, SC -- Brasil
deciokrause[at]gmail.com
www.cfh.ufsc.br/~dkrause
________________________________
"He [God] will never choose among indiscernibles"
(G.W.Leibniz)
[But] He (God) would never choose among discernibles too. (M. Franciotti)

Valeria de Paiva

unread,
Nov 5, 2011, 6:31:08 PM11/5/11
to Fernando Naufel do Amaral, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
tem razao Fernando! e' claro, sem premissas 'e uma prova, com
premissas uma demonstracao.

mas 'e, sei que sou descuidada com a linguagem mesmo, dai a trepidacao...

obrigada por lembrar da diferenca,

abs
valeria

2011/11/5 Fernando Naufel do Amaral <fna...@gmail.com>:

Andrea Loparic

unread,
Nov 5, 2011, 6:56:49 PM11/5/11
to Decio Krause, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Ois,

Eu sempre vi e usei "prova"como sinônimo de "demonstração" e ambas
como *deduções* sem premissas hipotéticas - nesse sentido, por exemplo
é que temos a expressão "Teorema da Dedução" - e não da Demosntração.

Mas há um ponto em que acho que o João tem razão: a expressão "provável"
não é uma tradução feliz para "provable", por ser já uma tradução usual de
"probable"; e, apesar de "provabilidade" não significar "probability", também
não creio merecer ser inventada em português. Na minha opinião,"demonstrável"
e "demonstrabilidade" são ótimas traduções e devem poder ser adotadas;
não acho, no entanto, que seja o caso de descartar por essa razão o uso
consagrado de "prova" e "provar" nas ciências formais.

Abraços
Andrea

Valeria de Paiva

unread,
Nov 5, 2011, 7:12:46 PM11/5/11
to Andrea Loparic, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
ok, ok. e' verdade Andrea, deducoes sem premissas...

abs,
valeria

2011/11/5 Andrea Loparic <alop...@gmail.com>:

Elaine Pimentel

unread,
Nov 6, 2011, 9:45:44 AM11/6/11
to Valeria de Paiva, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Prezados,

Eu já, há muito tempo, dei minha opinião sobre essa terminologia. Vou
fazer coro à Valéria.

Em primeiro lugar, as palavras prova e demonstração existem em
português e, em matemática ou em lógica, possuem o mesmo significado.
Portanto, escolher entre "teoria da prova" ou "teoria da demonstração"
é uma pura questão de gosto.

Não acho que deveríamos seguir os espanhóis ou os franceses em nenhuma
tradução, não acredito que eles estão mais ou menos certos, ou nós
mais ou menos errados.

Eu sim, como "proof-theorist" vou continuar comentendo a leviandade e
o dis-serviço (como diz o João Marcos) de traduzir proof-theory como
teoria da prova. Por uma questão de (bom) gosto. Por exemplo, não acho
agradável aos ouvidos traduzir "proof objects" como objetos de
demonstação. E por aí vai.

Além do que, todos os profissionais brasileiros da área de teoria da
prova que conheço traduzem dessa forma. E tenho certeza que seus
alunos, e os alunos desses alunos vão chamar a área de teoria da
prova. Assim a notação fica por vez estabelecida e essa discussão
esquecida.

Quanto ao termo "provável", esse seria o único argumento convincente
para utilizar demonstração, mas nesse caso se troca por demonstrável e
pronto! Não sei por que tudo tem que ter a mesma raiz. Agora, vai
traduzir proof search, proof objects, proof systems, etc como
demons*etc. Vai ser um monstro de notação :) E, como escrevo esses
termos todos os dias, me dou ao direito de utilizar prova*etc e
pronto.

Abraços,

Elaine.

2011/11/5 Valeria de Paiva <valeria...@gmail.com>:
Elaine.
-------------------------------------------------
Elaine Pimentel  - DMat/UFMG

Address: Departamento de Matematica
     Universidade Federal de Minas Gerais
     Av Antonio Carlos, 6627 - C.P. 702
     Pampulha - CEP 30.161-970
     Belo Horizonte - Minas Gerais - Brazil
Phone:   55 31 3409-5970/3409-5994
Fax:       55 31 3409-5692
http://www.mat.ufmg.br/~elaine
-------------------------------------------------

Andrea Loparic

unread,
Nov 6, 2011, 12:46:21 PM11/6/11
to elaine....@gmail.com, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Concordo com a Elaine em gênero, número e gráu!
Abraço,
Andrea

Em 6 de novembro de 2011 12:45, Elaine Pimentel
<elaine....@gmail.com> escreveu:

Marcelo Finger

unread,
Nov 6, 2011, 3:40:14 PM11/6/11
to Elaine Pimentel, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Eu também apoio o liberallismo linguístico da Elaine!

[]s

Marcelo

2011/11/6 Elaine Pimentel <elaine....@gmail.com>
Marcelo Finger
Departamento de Ciencia da Computacao
Instituto de Matematica e Estatistica
Universidade de Sao Paulo
Rua do Matao, 1010
05508-090 Sao Paulo, SP Brazil
Tel: +55 11 3091-9688, 3091-6135, 3091-6134 (fax)
http://www.ime.usp.br/~mfinger

Julio Stern

unread,
Nov 7, 2011, 6:14:14 AM11/7/11
to Marcelo Finger, elaine....@gmail.com, boto...@gmail.com, logical logical


Caros Redistas: 


Vai ai uma provocacao sobre oq eh prova e demonstracao em matematica, na verdade, uma provocacao sobre oq EH Matematica. 


Do meu ponto de vista, demonstracao refere-se a uma argumentacao formal que mostra de forma altamente INTUITIVA por que certa afirmacao DEVE ser considerada verdadeira. 

Uma demonstracao tem carater GEOMETRICO. 


Uma Prova eh (originalmente) uma aritmetizacao da demonstracao geometrica. O desenvolvimento do sistemas axiomaticos permitem, com o passar do tempo, demonstracoes de carater puramente ALGEBRICO. 


Todavia, este processo de aritmetizacao nao nos leva a aceitar passivamente todas as verdades geradas pela maquininha algebrica...  Ao contrario este processo leva a uma constante revisao dos sistemas axiomaticos, um processo que Imre Lakatos denominou de - Prova e Refutacao. 

Obviamente, eh sempre possivel definir Logica como apenas e tao somente o uso de certas regras algebricas de deducao (Proof Theory) mas isto, na minha opiniao, esvasia prematuramente a discussao e, mais grave, retira a Logica do escopo da Filosofia.    


Acabo de publicar uma artguinho a respeito, 


- Constructive Verification, Empirical Induction, and Falibilist Deduction: A Threefold Contrast 


http://www.mdpi.com/2078-2489/2/4/635/


Um artigo correlato, traz uma critica aa nocao Tarskiana 
de verdade como correspondencia, que permeia muito da Logica contemporanea, vide 

- Symmetry, Invariance and Ontology in Physics and Statistics


http://www.mdpi.com/2073-8994/3/3/611/     


Ambos os artigos tem seccoes que focam fundamendos de Estatistica, mas eh perfeitamente possivel ler na diagonal (ou pular) as mesmas,  e se concentrar (ou ler apenas) as seccoes que focam os assuntos em tela. 

Convido-os aa leitura, pois gostaria imensamente de receber vossas criticas construtivas. 

Grato pela atencao, 
---Julio (Stern) 






----------------------------------------
> From: mfi...@ime.usp.br
> Date: Sun, 6 Nov 2011 18:40:14 -0200
> To: elaine....@gmail.com
> CC: boto...@gmail.com; logi...@dimap.ufrn.br
> Subject: Re: [Logica-l] "provas" x "demonstrações", em Lógica

Joao Marcos

unread,
Nov 9, 2011, 3:01:45 PM11/9/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
["Disclaimer":
esta mensagem representa apenas a minha _opinião_ (e a outra opinião
de que outra pessoa ela poderia representar?), que eu gostaria de
defender sem que ninguém se sentisse agredido com isto.]


PessoALL:

Sei que a maior parte das pessoas não vai se dar ao trabalho de ler
esta longa mensagem. Mas ficam registrados os argumentos --- quem
sabe ao menos encontrarão tolerantes e bem dispostos leitores futuros?

Agradeço as respostas enviadas, na lista ou em privado. Vou tentar
não ficar me alongando sobre o assunto em inúmeras réplicas, até
porque não sou tão presunçoso a ponto de imaginar que um quixote
sozinho possa mudar a terminologia de uma área --- supondo que ela já
esteja de fato "bem estabelecida no Brasil", como alguns parecem
acreditar. Acresço portanto apenas algumas breves clarificações sobre
o que eu disse anteriormente, e respondo alguns dos pontos principais
levantados pelos colegas.


(0) Não tenho dúvida de que é mais fácil não fazer nada, permanecer
acomodado ou até mesmo fingir que nunca ouvi falar do assunto do que
realmente rever sistematicamente, de caso pensado, algumas das nossas
práticas linguísticas. Se um caso de sucesso pode ser relatado,
contudo, posso eu próprio dizer que há vários anos abandonei a palavra
"prova" _em Lógica_, e hoje posso afirmar, com orgulho,que o vício
está inteiramente superado! (Como é que diz mesmo a "irmandade do
AA", neste tipo de situação?) ;-)

Quem trabalha em Ciência frequentemente se depara com dificuldades de
cunho linguístico, algumas das quais se desvanecem simplesmente ao
passarmos de uma língua natural para outra. O pessoal do Direito está
sempre se chateando com o fato de que as pessoas em português
confundem "right" e "Law" (ambas palavras que podem ser traduzidas
como "direito"), ou "legal" e "nice" (essa confusão só acontece no
Brasil, onde o primeiro termo é uma gíria conhecida). O pessoal da
Psiquiatria, por outro lado, precisa ter muito cuidado para não
confundir "consciência" (= "conscience") com "consciência" (=
"consciousness"). Por sorte (?) o primeiro termo (conscience!) está
relacionado com um estado de "consciência" (consciousness?) também
conhecido como "vigília". E por aí vai...

É claro que não estou sugerindo que o Português seria o "exemplo
paradigmático de pobreza linguística" (bom, o Português Científico é
de fato razoavelmente pobre, e a culpa disso é em parte nossa, como
tenho apontado). Em Inglês / Francês, por exemplo, também nos faz
falta muitas distinções importantes que para nós estão claras e são
fundamentais, a começar da diferença verbal entre "ser" e "estar"...
A "busca da língua perfeita" animou sempre bastante gente --- e o
Umberto Eco tem um belo livro a respeito.

Tenho, devo dizer, uma tese (hipótese?) de que muita "Má Filosofia"
[mais uma vez, a terminologia que uso aqui é obviamente
idiossincrática] tem como origem justamente algumas instâncias[*] de
pobreza linguística que levam as pessoas pensar que _isto_ é ^aquilo^
simplesmente por que as duas coisas são circunstancialmente chamadas
pelo mesmo nome, em um dado idioma... Mas não se preocupem, não vou
defender esta (hiper/hipo)tese aqui. Não agora. :-)


(1) Sobre a curiosa observação de que "não dá para proibir termos
consagrados pelo uso", esclareço: não propus _proibir_ nada, apenas
apontei o ^equívoco^ da escolha, "consagrada" ou não, de certos
termos, em campos específicos de estudo em que estes termos _precisam_
ser bem escolhidos / esclarecidos.

Em Computação, aliás, esse tipo de equívoco acontece o tempo todo,
justamente graças a uma certa leviandade daqueles que têm nas mãos o
poder de *decidir as coisas*. Foi assim que assistimos nos últimos
anos a introdução do termo "deletar" na língua brasileira, importado
do latim por uma via bastante oblíqua: a língua inglesa. Pior, graças
à Microsoft tivemos que aprender, por exemplo, que "gravar" se diz
"salvar" (to save), no Português 3.1. (A empresa Corel ainda tentou
enfrentar a onda, e insistiu longamente no "gravar", mas não adiantou
muito.) Distanciando-me do estritamente informático, já estou quase
me acostumando, também, com o fato de que o meu GPS quando ligado fica
"adquirindo satélites" (to acquire)... Sem contar aqueles barbarismos
(no sentido linguístico da palavra) dos brasileiros que ficaram muito
tempo fora do país, e que acabam dizendo (em "portanglês") que vão
"aplicar" para uma certa universidade, ou outras coisas do gênero. A
gente vai acrioulando a nossa língua, é natural. Longe de mim lutar
contra um princípio evolutivo ("liberal"?) tão básico.

Por sorte, no caso que aqui nos interessa, os termos "prova" e
"demonstração" estão ambos aí, dando sopa na nossa língua. E um deles
parece _mais adequado_ do que o outro, pelos motivos já apresentados,
para descrever em Bom Português o objeto de estudo principal da
Beweistheorie (que nasceu em Bom Alemão).

Não obstante, vale insistir que os cientistas têm mesmo o poder (e de
certa forma, também o dever) de _decidir coisas_ nas suas áreas, e em
particular eles *deveriam zelar* pelo estabelecimento de uma
^terminologia sã^, nas suas línguas nativas. Devagar e sem forçar ---
e sem vandalizar a Wikipédia, por exemplo. Basta querer! (estando
primeiro convencidos de que se trata de uma tarefa importante, claro)

Ah, e como há pouquíssima gente fazendo o que nós fazemos (Ciência, e
um tipo muito particular de Ciência, e às vezes apenas trabalhando em
uma sub-sub-área muito específica deste tipo particular de Ciência),
bastaria mudar o hábito linguístico de algumas poucas, muito poucas,
"autoridades", e ---zás-trás--- estabeleceríamos juntos uma nova
prática linguística em dois tempos! (Por acreditar neste tipo de
fantasia é que eu acho que vale a pena gastar tempo discutindo estas
coisas aqui.) Que pena que a maior parte dos cientistas, contudo,
prefira se furtar à responsabilidade que têm, queiram ou não, sobre
esta realidade, e se alhear a este tipo tão saudável de debate!


(2) O argumento da eufonia (do tipo "sempre usei a palavra 'prova',
que me soa bem, e não é agora que eu vou conseguir mudar este hábito")
me parece particularmente fraco. Se nos convencermos de que uma
mudança terminológica é bem justificada e bem-vinda, sem dúvida
faremos o _esforço_ necessário, paulatinamente, para estabelecê-la!
Testemunhem por exemplo o esforço que os biólogos evolucionistas tem
que fazer, cotidianamente, para se livrar do hábito linguístico
teleológico ---mais uma má contribuição histórica da
filosofia/teologia--- ao tratar das funções dos órgãos e organismos...

Digo mais. Se eu for usar apenas as palavras que me soam bem, vou
transformar metade da língua brasileira em "xodó", "cangote",
"cafuné", "pipoca" ou "bunda", e torná-la por conseguinte bastante
estrangeira no resto do mundo lusófono. De fato, estas são palavras
que me soam muitíssimo bem, e têm para mim conotações extremamente
positivas. Digo-as com imenso prazer. Infelizmente, elas são quase
sempre inadequadas como substitutas dos termos técnicos que eu preciso
usar na minha prática profissional...


(3) Não sei de onde exatamente teria saído a tal distinção entre
"demonstration" (que segundo vocês significaria "demonstração com
premissas") e "proof" (que significaria "demonstração sem premissas").
Não me parece de forma alguma consolidada na área, certamente não em
inglês... Em particular, não me surpreenderia receber (de novo, pois
de fato já aconteceu comigo) um teorema corrigido por um parecerista
anglófono, e que de maneira tão tipicamente anglófona protestasse
contra um termo latino _tão complicado e desnecessário_ como
"demonstration" e indicasse:
> technically, this is called "proof", my friend!
Em inglês, justamente de forma *oposta* ao que ocorre nas línguas
latinas, e na nossa língua em particular, "demonstration" é usado com
muito mais frequência justamente para a "apresentação de evidências",
por exemplo, em um tribunal... Mais um sinal, aliás, de que o termo
"prova" é uma má escolha, em português, quando o assunto matemática, e
principalmente lógica!

Agora, mesmo que eu não discordasse do que foi dito sobre a prática
linguística da linguagem anglo-matemática (what the h*** do I know
about it?), o argumento que foi apresentado sobre "demonstration"
consistindo em um "demonstração com premissas" ---da qual o caso sem
premissas ("proof") é obviamente um caso particular--- só parece
trazer _reforço_ à proposta de que "Proof Theory" é a teoria que
estuda justamente os primeiros objetos, mais gerais, que vocês mesmos
preferem chamar "demonstrations", e eu proponho chamar
"demonstrações"...


(4) Por fim, insisto que não propus "abandonarmos a palavra prova" ou
o seu uso (seja lá qual seja) em ciências formais. Só o que eu disse
é que no discreto ramo da lógica contemporânea conhecido como *Teoria
das Demonstrações* (que os matemáticos praticantes em geral ignoram
por completo, e da qual poucos sequer ouviram falar, e que certamente
ainda conta com pouquíssimas publicações realmente representativas na
nossa língua) precisamos de termos técnicos precisos e cuidadosamente
projetados/escolhidos, pois as "demonstrações", as proposições
"demonstráveis" e a própria noção de "demonstrabilidade" são seus
_objetos de estudo_! Eu em particular costumo dizer que
"demonstrações" são coisas muito amplas, e ensino meus alunos a
construir "derivações" em "sistemas formais" precisos, com
"formalismos dedutivos" escolhidos a dedo. Sim, e ao menos durante o
semestre em que eles estudam comigo ficam proibidos de usar a palavra
"prova" para outra coisa que não a "avaliação" na qual eles precisam
provar que aprenderam alguma coisa! ];-b Pior ainda: conforme
constatei recentemente, estes mesmos alunos saem das minhas aulas e
levam para casa o hábito de usar esta terminologia, e acham realmente
esquisito falar em "provas matemáticas"... Que estrago!

Não quero passar a impressão errada. O problema geral de *escolher
uma boa terminologia*, obviamente, também aparece em Inglês
Internacional, a atual língua franca da Ciência. Na área da Teoria
das Demonstrações, aprecio bastante, em particular, as escolhas feitas
pelo pessoal da "inferência profunda", que deixam claro por exemplo a
diferença entre _metodologias_, _formalismos_, _sistemas dedutivos_ e
_lógicas_ (http://alessio.guglielmi.name/res/cos/index.html) É mesmo
uma pena que na realidade que temos hoje ^percamos na tradução^ boa
parte desta sofisticação conceitual, por mera falta de cuidado ou
preguiça mental...

% % %

No começo do século XX, muitos textos chamavam "logística" o que nós
hoje não hesitamos em chamar "lógica". Leiam Couturat, leiam
Poincaré... Quem ainda usaria tal terminologia, hoje em dia?

Não faz muito tempo, na nossa área, as pessoas se digladiaram para
decidir como ficaria o nome em inglês do objeto de estudo da
revolucionária *Mengenlehre*. De Cantor a Von Neumann, a literatura
da época se escrevia majoritariamente em Bom Alemão. Em inglês a
palavra "collection" parecia demasiado geral para traduzir Menge, a
palavra "multiplicidade" parecia inadequada, as palavras "kind" e
"sort" pareciam contaminadas de significado filosófico indesejável, a
história do termo "class" foi bastante complexa e seu uso moderno
parecia não estar muito de acordo com o uso consagrado que a palavra
recebia na literatura escolástica latina, e por algum tempo a palavra
"aggregate" esteve ganhando por uma cabeça de vantagem. É ela que
aparece, por exemplo, na tradução que Jourdain publicou do texto de
Cantor em 1915. Sabemos hoje que "set" foi a terminologia vitoriosa,
por algum motivo ou por outro. Mas aparentemente não se encontram
"sets" no Principia Mathematica de Russell & Whitehead, ou mesmo nos
escritos lógico-históricos de Prior, de 1949, ou no Methods of Logic
de Quine, de 1950 (http://www.logicmuseum.com/cantor/Classes.htm).
Com a massa crítica relativamente recente de literatura anglófona
sobre o assunto, contudo, a terminologia finalmente foi clarificada e
fixada. (Curiosamente, a palavra "set" parece ter sido originalmente
importada para o inglês a partir de uma palavra francesa/franca
antiga, "sette" --- ou pelo menos li isso em um texto do Roger Jones.)

A nossa massa crítica em português é infelizmente reduzida, e
aparentemente composta de pesquisadores que antes preferem decretar a
"morte" da discussão do que levar seriamente em consideração a opinião
de seu oponente. E certamente há pouca concordância (e por que
deveria haver concordância universal sobre o que quer que seja?). Por
exemplo, o mesmo termo "truth-functional" que alguns chamam
"verofuncional" outros chamam "funcional-veritativo", o mesmo
"soundness" que aparece como "correção" outras vezes aparece como
"corretude", und so weiter. Haverá escolhas melhores do que outras,
nestes casos? Parece que um dia perguntaram ao Gödel, quando ele
tinha acabado de se mudar para os EUA, como ele traduziria o resultado
do seu "Unvollständigkeitssatz", e ele sugeriu "incompleteness". A
força da autoridade somada à força do hábito fez seu estrago, e até
hoje tratamos por "teoremas de incompletude" aqueles teoremas que
demonstram na verdade uma coisa muito mais geral, a saber a
*incompletabilidade* de teorias aritméticas!

É notável como muitas vezes aquilo que se traveste como uma questão de
mera _estipulação_ na verdade esconde antes de mais nada um trabalho
de ^esclarecimento conceitual^ --- e que por isso mesmo já me
pareceria importante. Talvez ainda permaneçamos alguns séculos
discutindo como traduzir _bem_ "Sinn" e "Bedeutung", ou "proof",
talvez por um bom motivo, talvez por pura teimosia. Talvez a
discussão sobre o assunto que levantei aqui morra aqui mesmo. Na
presente troca de mensagens, por exemplo, os especialistas que se
manifestaram em geral se mostraram reticentes ou extremamente
conservadores, e poucos outros participantes da lista de fato se deram
ao trabalho de opinar. Poucos _argumentos_ mais decisivos parecem ter
sido apresentados, ao final, até onde pude perceber.

% % %

O tema geral aqui é o estabelecimento de uma terminologia decente
("decente" em um sentido técnico bastante preciso) *em português*

Marcelo Finger

unread,
Nov 9, 2011, 4:32:24 PM11/9/11
to Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caros.

Pra botar lenha na fogueira, aí vai minha opinião "frequentista":

O termo que ficará consagrado é o que for mais usado. Independente do
mérito acadêmico-filosófico e das nuances técnicas.

"Teoria da Prova" tá ganhando de montão. A não ser que os teóricos
demonstracionistas façam algo, vão perder feio. E fazer algo não é
reclamar, é usar o termo Teoria da Demonstração e difundi-lo.

[]s

Marcelo

2011/11/9 Joao Marcos <boto...@gmail.com>

Daniel Durante

unread,
Nov 9, 2011, 6:14:11 PM11/9/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA, Joao Marcos
Caro João Marcos e colegas,

Não preciso repetir que admiro profundamente o seu compromisso com o
conhecimento e a sua imensa disposição em defender este compromisso. Só
posso me sentir um privilegiado em poder ser um seu interlocutor. Se
respondo ao seu e-mail, não é por implicância nem perseguição, mas por
respeito, porque compartilho com você o sentimento de importância que o
esclarecimento conceitual tem para a nossa disciplina.

Quanto ao assunto terminológico específico, faço três semibreves
comentários.

(1) Concordo que o esclarecimento conceitual deva sempre ser por nós
exercido. Concordo também que este esclarecimento envolva escolhas
vocabulares. Mas as escolhas vocabulares são tão importantes para o
esclarecimento conceitual quanto o direito é importante para a ética.
Certamente conhecer muito sobre direito será de algum benefício para
quem reflete sobre a ética, porque ali temos casos, exemplos,
aplicações, usos,... mas nenhum ponto jurídico resolverá qualquer
questão de ética. A ética é (ou pretende ser) anterior ao direito. O
mesmo ocorre com o vocabulário. Certamente ter um bom vocabulário,
conhecer e aplicar as definições e distinções de dicionário sobre as
palavras é benéfico para quem busca esclarecimento conceitual. Mas
nenhuma escolha vocabular resolverá qualquer esclarecimento conceitual.
O esclarecimento conceitual é anterior ao vocabulário.

(2) Quanto à polêmica "prova x demonstração", vou tentar argumentar
conceitualmente em favor do uso da palavra prova. Se entendi bem, você
não gosta do uso da palavra prova como sinônimo de demonstração porque
considera que a palavra prova é mais fortemente sinônimo da palavra
evidência do que o é da palavra demonstração. Se é assim, então, até
aqui, eu concordo com você. Entendo e uso a palavra prova como sinônimo
de ambas, demonstração e evidência, mas intuitivamente reconheço (não
sei se corretamente) que na linguagem ordinária os usos de prova como
sinônimo de evidência parecem superar em número seus usos como sinônimo
de demonstração. No entanto, numa mensagem anterior você escreveu:

> É claro que se você quiser, por isso mesmo, traduzir literalmente
> "Proof Theory" como "Teoria da Evidência" terá o direito de fazê-lo.
> Mas produzirá um monstro ainda pior do que "Teoria da Prova".

Bem, aqui eu discordo de você. Não acho que a expressão "Teoria da
Evidência" como tradução de "Proof Theory" represente qualquer erro
conceitual. Em última instância, uma prova/demonstração é
prova/evidência e, mais ainda, não só é o único tipo de evidência
pertinente em matemática, como é o único tipo de evidência que parece
requerer uma teoria. Qualquer outro tipo de evidência deve ser algo
imediatamente acessível, pré-teórico. Então não vejo onde está o
monstro. As demonstrações são as evidências para tudo o que não está (ou
não é) imediatamente acessível, tal como a pertinência ou validade de
certos argumentos. Bem, a palavra prova cumpre bem este papel, de ser
demonstração e de ser evidência. As derivações que fazemos nos sistemas
formais pretendem ser expressões para estas coisas que são demonstrações
e que são evidências, ou seja, que são provas.

(3) Mas, apesar disso, devo admitir, "Teoria das Demonstrações" é não só
mais bonito que Teoria da Prova (ou da Evidência), como é mais próximo
do padrão das outras áreas (Teoria dos Conjuntos, Teoria dos Modelos,
Teoria dos Tipos,...). No entanto, do ponto de vista conceitual, a
expressão "Teoria das Provas" seria igualmente boa, talvez até mais
pertinente, embora soe a mim horrorosa :)

Saudações,
Daniel

[PS] UMA DIGRESSÃO LÚDICA: usei de propósito a palavra semibreve quando
adjetivei meus comentários: "comentários semibreves". Talvez você e a
maioria dos colegas tenha entendido minha afirmação como: "comentários
um pouco mais longos do que o seriam se fossem comentários breves". Quem
entendeu assim, entendeu o que eu quis comunicar. Mas a expressão que eu
usei é ambígua. Semi indica "a metade", ou "um tanto". Mas 'a metade' de
'breve' é MAIS breve do que 'breve' ou é MENOS breve do que 'breve'? Eu
não sei. Em música, por exemplo, uma nota semibreve tem a metade da
duração de uma nota breve. Então, neste sentido musical, um comentário
semibreve deveria ser ainda mais rápido do que um comentário breve.
Vocabulário, vocabulário,... :)


Anderson de Araújo

unread,
Nov 9, 2011, 9:14:03 PM11/9/11
to Daniel Durante, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caro João Marcos e colegas,

Já faz algum tempo que apenas acompanho os debates da lista, mas dessa vez,
motivado pelas idéias apresentadas, gostaria de dizer algo. Tenho uma
observação `semibreve’ (no sentido definido pelo Daniel!) e uma dúvida.

Cabe observar que, recentemente, em teoria da computabilidade ocorreu uma
mudança terminológica importante. Graças a alguns artigos e iniciativas do
Soare, Cooper e Sieg, hoje está claro que os termos `recursivo',
'recursivamente enumerável', etc, não são termos adequados para descrever o
que se faz em teoria da computabilidade. Esse é um exemplo paradigmático
que mostra que discussões terminológicas, quando associadas a questões
conceituais, têm relevância – como já apontado pela Andrea. Por isso,
concordo com você: deveríamos ter mais cuidado no trato da terminologia da
lógica bem como deveríamos criar uma tradição de discussão frutífera sobre
ela e não simplesmente traduzir os termos sem um debate de idéias. Em
particular, não tenho nada contra usar, coloquialmente, o termo `prova'
para traduzir 'proof', mas parece-me que você apresenta boas razões para
usarmos `demonstração' enquanto termo técnico padrão para a tradução de
`proof' em nossa língua.

Nesse sentido, a discussão travada entre você, o Daniel, Adrea, Valeria,
Luciana, Marcelo Finger e outros tem sido, para mim, esclarecedora no que
diz respeito ao que está em questão na distinção entre `demonstrações' e
'provas'. No entanto, fiquei com uma dúvida que gostaria de compartilhar
com a lista.

Suponha, tal como sugerido em alguns pontos do debate entre João Marcos e
Daniel, que `demonstração’ denota certos procedimentos formais específicos
das ciências matemáticas ao passo que `prova’ denota o processo geral de
apresentação de evidências (um conceito não muito claro para mim). Ao fazer
isso, tal como de fato se faz atualmente na definição formal de
demonstração, não estaríamos desconsiderando um aspecto essencial do
conceito de demonstrabilidade? Noutras palavras, não seria justamente essa
componente intencional - apresentação de evidências - que está faltando na
formalização do conceito de demonstrabilidade, a fim de que possamos
resolver o problema da identidade das demonstrações?

Abraços,

Anderson
> ______________________________**_________________
> Logica-l mailing list
> Logi...@dimap.ufrn.br
> http://www.dimap.ufrn.br/cgi-**bin/mailman/listinfo/logica-l<http://www.dimap.ufrn.br/cgi-bin/mailman/listinfo/logica-l>
>



--
Anderson de Araújo
Posdoctoral Researcher at IME-USP
Associated Researcher at CLE-UNICAMP
Webpage:
http://www.cle.unicamp.br/principal/institucional/alunos/index.php?home=araujo

Valeria de Paiva

unread,
Nov 10, 2011, 3:23:21 AM11/10/11
to Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
oi Joao Marcos,
eu sabia que essa ia dar panos pra manga....

Ok, vamos la:
(0) Nao corro da raia e concordo plenamente que precisamos discutir
assuntos como a terminologia da area em que trabalhamos, mas nao
podemos exagerar, ne?

(1)
>Sobre a curiosa observação de que "não dá para proibir termos consagrados pelo uso"...
eu tb esclareço que nao disse isso. Disse que pra mim 'e o uso que
determina a lingua e nao pronunciamentos, seja de quem for. (Ainda que
eu concorde que 'e necessario batalhar contra usos que nos parecam
pouco apropriados, no final das contas vence o que o povo resolver
usar. Pra matematica e pra tudo mais na lingua. )

(2) o argumento da eufonia pra mim nao 'e tao importante.

(3)
>Não sei de onde exatamente teria saído a tal distinção entre
>"demonstration" (que segundo vocês significaria "demonstração com
>premissas") e "proof" (que significaria "demonstração sem premissas").

bom, pra mim saiu do pai de todos, "Natural Deduction: a proof
theoretical study, Dag Prawitz", pagina 24, linha -3, na edicao da
Dover. Exceto que , como a Andrea corrigiu 'e distinção entre
"deduction" and "proof".

(4)
>no discreto ramo da lógica contemporânea conhecido como *Teoria
> das Demonstrações* (que os matemáticos praticantes em geral ignoram
> por completo, e da qual poucos sequer ouviram falar, e que certamente
> ainda conta com pouquíssimas publicações realmente representativas na
> nossa língua) precisamos de termos técnicos precisos e cuidadosamente
> projetados/escolhidos, pois as "demonstrações", as proposições
> "demonstráveis" e a própria noção de "demonstrabilidade" são seus
> _objetos de estudo_!

Sim, concordamos em genero, numero e grau (com pedidos de desculpas
pela falta de um teclado competente que faca os acentos necessarios!)
com:

1. o fato de que poucos matematicos sequer ouviram falar da teoria em questao
2. que esta conta com pouquissimas publicações (cortar-e-colar
funciona...) representativas na nossa lingua;
e principalmente com
3. "precisamos de termos técnicos precisos e cuidadosamente
projetados/escolhidos, pois as "demonstrações", as proposições
"demonstráveis" e a própria noção de "demonstrabilidade" são seus
_objetos de estudo_!"

Sim! Exatamente. mas eu posso chamar as demonstracoes de "provas" e a
"Teoria das demonstrações" de "teoria da prova" pois acho que "Teoria
da Prova" e' um nome tao bom quanto o inicial.

Nao me sinto agredida de forma alguma pela mensagem, mas tambem (dessa
vez somente, normalmente voce me convence...) nao estou convencida de
que a mudanca de terminologia e' necessaria nesse caso. Os argumentos
apresentados nao foram suficientes. Tente de novo.

Abracos (com)provaveis,
Valeria



2011/11/9 Joao Marcos <boto...@gmail.com>:

Rodrigo Freire

unread,
Nov 10, 2011, 4:12:01 AM11/10/11
to Valeria de Paiva, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Apenas uma observação rápida sobre o que o Anderson apontou:

Acho que essa mudança de recursivo para computável, recursivamente
enumerável para computavelmente enumerável, etc, não se aplica sempre. Para
a expressão "recursivamente saturado" essa mudança não é aplicada e acho
que ninguém fala "computavelmente saturado".

Abraço
Rodrigo

Anderson de Araújo

unread,
Nov 10, 2011, 8:51:42 PM11/10/11
to Rodrigo Freire, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caro Rodrigo,

Eu não afirmei que a nova convenção terminológica em computabilidade tem
aplicabilidade geral, simplesmente porque é óbvio que ela não tem. Quando o
modelo de computação considerado são as funções recursivas, deve-se
expressar em termos de funções recursivas, quando é o lambda-cálculo,
deve-se usar sua terminologia, e assim por diante.

O que eu disse é que, após longo debate (o qual não o reproduzirei aqui),
concluiu-se que a terminologia da área de estudos dos procedimentos
efetivos deve ter como referência os conceitos associados à noção de
computabilidade. Ou seja, quando não se especifica um modelo de computação,
usa-se a terminologia 'computável', 'computacionalmente enumerável', etc,
i.e, a referência dever ser o modelo fundamental de computação: máquinas de
Turing. Quando nos referimos à noção intuitiva formalizada pela
computabilidade, convencionou-se que devem ser usadas expressões da forma
`conjunto efetivo', 'efetivamente enumerável', etc.

No caso específico que você mencionou, o correto é dizer `efetivamente
saturado', quando se está tratando em termos não formais do caráter
algorítmico do conjunto dos elementos que realiza um tipo, ou então
`computacionalmente enumerável' quando se tenciona indicar algum modelo
formal de computação. A expressão `recursivamente saturado' deve ser
restrita aos casos em que se tem em vista as funções recursivas.

Destaco que meu intuito não foi suscitar uma discussão sobre esse tema.
Limitei-me a apresentação de um exemplo que ilustra bem a importância de
discussões terminológicas, desde que associadas a questões conceituais - se
possível, com consequencias técnicas. Por isso, levantei uma questão sobre
a identidade das demonstrações.

Abraços,

Anderson

PS: Tanto quanto entendo esses debates terminológicos, do qual em geral não
participo, parece claro que são formas normativas de discussão. Não está em
questão a forma como esse ou aquele grupo de pessoas *se expressa*, isso é
uma questão empírica - motivada talvez pelo gosto -, mas sim como os mesmos
*devem se expressar*. Nesse contexto, deve-se apresentar razões. Dizer
coisas do tipo ``x ou y não fala assim'' ou ainda ``prefiro falar A em
detrimento de B'', ``Tanto faz usar a expressão K ou L'' etc não são
razões, são quando muito descrições de fatos. Vale lembrar a falácia
naturalista: em geral, do que é, não se segue o que deve ser. Portanto, se
um determinado grupo de pesquisadores se expressa de uma forma, isso não
faz diferença. Eles que mudem a forma de se expressar, caso estejam
equivocados, ou apresentem razões para tal prática linguística. Ciência não
é dança, onde cada qual se expressa segundo lhe convém.
> _______________________________________________
> Logica-l mailing list
> Logi...@dimap.ufrn.br
> http://www.dimap.ufrn.br/cgi-bin/mailman/listinfo/logica-l
>



--

Rodrigo Freire

unread,
Nov 11, 2011, 6:31:44 AM11/11/11
to Anderson de Araújo, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Claro Anderson, entendo o que você escreveu. Apenas apontei que as vezes
simplesmente não soa bem substituir "recursivamente" por "computavelmente".
Efetivamente saturado ficou bom.

Outro ponto sobre a linguagem usada em lógica: notações. Acho que notação é
um ponto crítico em lógica.

Acho que ainda não há um padrão de notação em lógica que seja satisfatório.
Por exemplo o símbolo usado para a relação de consequncia semântica, uma
barrinha vertical seguida por duas barrinhas horinzontais, que é mais ou
menos standard agora, é usado no mínimo para duas coisas diferentes: para
expressar que uma sentença é válida em uma estrutura e para expressar que
uma sentença é consequencia de uma teoria.

Outra coisa: notação para substituição de termos: por exemplo, é comum
encontrarmos a notação A(a_1,...,a_n) para expressar a substituição
simultanea de variáveis x_1,..., x_n por a_1,...,a_n na fórmula A. É comum
também encontrar outras notações para a mesma coisa que explicitam as
variáveis x_1,..,x_n. Como há outras operações que podem ser realizadas nas
fórmulas, as vezes a notação não deixa claro qual é a ordem das operações.
Já vi uma situação em que isso foi confuso: fazer substituição e
ralativização. Faz diferença a ordem em que essas operações são efetuadas e
em alguns contextos a ordem correta pode não ficar clara pela notação

Anderson de Araújo

unread,
Nov 11, 2011, 12:09:39 PM11/11/11
to Rodrigo Freire, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Rodrigo, concordo com você em ambos os pontos.

É duro de engolir a expressão `computacionalmente saturado', mas,
infelizmente, não tenho argumentos melhores do que aqueles apresentados
pelo Soare e outros. Então, quando tenho em vista a versão informal, uso
`efetivamente saturado' mas, quando está em questão uma versão formal
qualquer, uso, a contragosto, `computacionalmente saturado'.

Quanto à notação em lógica, realmente a situação é problemática; sobretudo
em teoria dos modelos e teoria da computabilidade. Em particular, o exemplo
que você apontou sobre a substituição de termos é emblemático. Algum tempo
atrás, li alguns artigos de pesquisadores renomados em teoria dos modelos
sobre quantificadores ramificados e fiquei incomodado com o descuido - e
justo nesse tema no qual qualquer deslize compromete muito a compreensão
dos resultados.

Talvez fosse o caso de abrir uma linha de discussão sobre a notação em
lógica aqui na lista. Quem sabe a coisa avança e no próximo EBL tenhamos
uma espécie de `Convensão Notacional da SBL', construída via debate. Se
essa iniciativa for endossada pelos membros mais experientes da lista, ela
ganhará força.

A unidade, assim como a discórdia, em ciência é um fator positivo. Também
acredito que passaria uma boa imagem para os lógicos de `outros mares'
saber que no Brasil há algo do tipo `Convensão Notacional da SBL'.

Abraços,

Anderson
> em alguns contextos a ordem correta pode não ficar clara pela notação.
>
> Abraço
> Rodrigo
>
>
>
>
>
>
>
>
> 2011/11/10 Anderson de Araújo <ande...@gmail.com>

Joao Marcos

unread,
Nov 12, 2011, 3:21:46 PM11/12/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
PessoALL:

Que bela se revelou esta discussão, afinal! Mais uma vez a lista
mostrou que pode ser arena para discordâncias, concordâncias, e muito
debate racional e inteligente. Os colegas apresentaram argumentos tão
superiores aos argumentos iniciais que ousei propor que ao fim fico
até tentado a concluir que Descartes estava afinal errado, e o bom
senso NÃO é a coisa mais bem distribuída deste mundo. :-)

Felicíssimos me pareceram ter sido, em particular, Anderson com o seu
PS esclarecedor e Daniel com sua inteligente Digressão Lúdica.
Anderson lembrou muito bem lembrado do imenso esforço recente que
custou à área de Computabilidade decidir-se pela maior adequação
conceitual da terminologia "computavelmente enumerável" onde antes,
por décadas, dominaram os termos "recursivamente enumerável",
"semidecidível" ou "Turing-reconhecível". O custo de mudarmos os
nossos hábitos lusófonos (orais, antes de mais nada) no que diz
respeito à boa tradução de "Beweis" será claramente muito menor.
Daniel mostrou ainda que "Teoria das Evidências" poderia se constituir
em uma tradução até mais adequada ao que a "Proof Theory" _deveria ter
sido_, para além do mero estudo da noção lógico-matemática de
*demonstração*. Deu-me até vontade de propor a revisão da
terminologia em todas as outras línguas, para manter a nossa
terminologia atual. :-) Mas vou ficar mesmo com "Teoria das
Demonstrações", que até agora me pareceu superior em termos de
adequação conceitual e etimológica --- deixando claro que, como
disseram os colegas, assim como a matemática não pode ser um
substituto para a filosofia (Kripke), a escolha de uma *terminologia
sã* não pode ser um bom substituto para o verdadeiro *esclarecimento
conceitual* por ela pressuposto.

Curiosamente, outro tema que foi recentemente citado nesta discussão e
em outra que tivemos antes trouxe justamente à baila um termo que
também tem estado atualmente em processo de transformação, na
literatura, a saber: aquele que outrora foi amplamente conhecido como
"Isomorfismo de Curry-Howard" e que hoje cada vez mais é conhecido
como "Correspondência de Curry-Howard", para evitar uma possível
imprecisão paradoxalmente ligada ao significado matemático preciso do
termo "isomorfismo". Por motivos semelhantes, também houve esforços
(menos bem-sucedidos) para rebatizar a famosa "Tese de Church-Turing"
como "Conjectura de Church-Turing". Por outro lado, quase ninguém
chamaria o "Último Teorema de Fermat" de "Última Conjectura de
Fermat", embora pareça claro que uma _demonstração_ do teorema não
havia realmente sido produzida pelo jurista que lhe deu o nome. (E na
informática ninguém cogitou, obviamente, substituir o termo anedótico
"Lei de Moore" por algo mais _adequado_.) Todas estas histórias
testemunham vivamente o quanto as linguagens técnicas evoluem, em
concurso com as linguagens naturais, e mostram como esta evolução pode
ser parcialmente dirigida pelos usuários/utentes destas mesmas
linguagens.

Finalmente, no que diz respeito à proposta recente de criação de uma
*Convenção Notacional da SBL*, ou de um *banco de terminologia* que
"nos ajudasse a escrever melhor", confesso-me um pouco descrente da
iniciativa --- e até temeroso. O bonito deste tipo de discussão que
estamos tendo agora está justamente na _possibilidade_ que temos de
propor a emenda, por exemplo, de termos técnicos que se revelem a
médio prazo conceitualmente (ou etimologicamente) equivocados, tais
como "consequência sintática" ou "teoria da prova". Ao decidirmos
contudo por uma convenção particular "universalmente partilhada em
nosso território", em detrimento de outras que possam ser _igualmente
adequadas_, engessamos outra vez a língua, e passamos a correr o risco
de falar de "erros" que, com mais tolerância, enxergaríamos justamente
como propostas de _revisão da norma_. Será que precisamos de mais
academias ditando regras? Parece-me mais saudável, ao contrário,
conviver com a diversidade, desde que bem justificada!

% % %

Termino com uma anedota. Quando eu vivia em Viena, surpreendeu-me o
comentário de um colega que afirmou que eu havia usado, em uma
apresentação, uma "convenção terminológica totalmente divergente do
padrão da literatura". O motivo da minha surpresa estava justamente
no fato de que eu havia usado a exata terminologia que encontrei na
literatura que eu li durante toda a minha formação, no Brasil, ou que
em alguns casos ajudei a desenvolver cuidadosamente, terminologia esta
que eu havia encontrado também em muitos artigos escritos por colegas
de várias partes do mundo. Notei contudo que estes colegas de outras
partes do mundo muitas vezes não deixavam de ser, por assim dizer,
"simpáticos à literatura produzida no Brasil". E compreendi por fim
que o que os colegas vienenses chamava de "padrão na literatura"
consistia simplesmente no padrão da _literatura escrita por eles_
(aliás, por um grupo pequeno deles, já que eles não hesitaram também a
me apontar um dentre eles que, detestavelmente, insistia em
desenvolver suas próprias e irritantes convenções terminológicas --- e
este parecia ser, a propósito, um dos principais objetivos da proposta
de vida daquele pobre sujeito). Mas por que deveria haver um "padrão
único", seguido por todos? (a única resposta razoável que me deram foi
de que isso facilitaria a leitura *deles* --- e fiquei pensando no
quanto seria bom se todos também decidissem escrever na minha própria
língua, para facilitar a *minha* leitura...)

Bom, esta era apenas mais uma faceta de um fenômeno muito natural que
encontrei antes na Alemanha, na Bélgica, em Portugal, em diferentes
ocasiões, e que por certo se encontrará n'outras partes: o fenômeno da
criação de convenções terminológicas e notacionais ^locais^, acordadas
por um grupo seleto e próximo de cientistas. Todas estas
terminologias e notações foram construídas com a melhor das intenções,
sem dúvida, com o intuito de facilitar a comunicação e a boa expressão
dos conceitos subjacentes. Com poucas exceções, contudo, nenhuma
delas me pareceu querer se *impor* a outras como "o padrão a ser
seguido". E por que deveriam? ("Por que sim" não é uma boa resposta,
logicamente...)

% % %

Joao Marcos


Anderson Araújo escreveu:
>
> PS: Tanto quanto entendo esses debates terminológicos, do qual em geral não
> participo, parece claro que são formas normativas de discussão. Não está em
> questão a forma como esse ou aquele grupo de pessoas *se expressa*, isso é
> uma questão empírica - motivada talvez pelo gosto -, mas sim como os mesmos
> *devem se expressar*. Nesse contexto, deve-se apresentar razões. Dizer
> coisas do tipo ``x ou y não fala assim'' ou ainda ``prefiro falar A em
> detrimento de B'', ``Tanto faz usar a expressão K ou L'' etc não são
> razões, são quando muito descrições de fatos. Vale lembrar a falácia
> naturalista: em geral, do que é, não se segue o que deve ser. Portanto, se
> um determinado grupo de pesquisadores se expressa de uma forma, isso não
> faz diferença. Eles que mudem a forma de se expressar, caso estejam
> equivocados, ou apresentem razões para tal prática linguística. Ciência não
> é dança, onde cada qual se expressa segundo lhe convém.


Daniel Durante escreveu:
>
> (3) Mas, apesar disso, devo admitir, "Teoria das Demonstrações" é não só
> mais bonito que Teoria da Prova (ou da Evidência), como é mais próximo
> do padrão das outras áreas (Teoria dos Conjuntos, Teoria dos Modelos,
> Teoria dos Tipos,...). No entanto, do ponto de vista conceitual, a expressão
> "Teoria das Provas" seria igualmente boa, talvez até mais pertinente,
> embora soe a mim horrorosa :)
>
> [...]

Joao Marcos

unread,
Nov 13, 2011, 9:25:51 AM11/13/11
to Ruy de Queiroz, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Vamos ver se entendo o ponto. A ideia seria usar a palavra "prova"
para designar as "construções" (dentre as quais as chamadas _árvores
de derivação_) e "transformações" (o tal _componente computacional_
que pretendemos enfatizar) que são objeto de estudo da "Teoria das
Demonstrações". É essa a proposta?

Valerá de todo modo a pena acrescentar a tudo isto, como apontei
antes, a cuidadosa escolha terminológica feita pelo pessoal da
"inferência profunda"
(http://alessio.guglielmi.name/res/cos/index.html), que deixam claro
por exemplo a diferença entre *metodologias* ("inferência rasa" e
"inferência profunda") e *formalismos* ("axiomático", "dedução
natural", "cálculo de sequentes" etc) que expressam *sistemas
dedutivos* para as diversas lógicas ("lógica clássica", "lógica
intuicionista" etc).

JM

2011/11/13 Ruy de Queiroz <r...@cin.ufpe.br>:
> Acrescento um exemplo relevante: apesar do termo "théorie de la
> démonstration" ser usado em francês, veja como se intitula o laboratório de
> Jussieu que faz pesquisa em teoria da prova no que se relaciona com a
> computação:
>
> Laboratoire
>
> Preuves, Programmes et Systèmes
>
> Ruy
> Em 13 de novembro de 2011 07:50, Ruy de Queiroz <r...@cin.ufpe.br> escreveu:
>>
>> Caro João Marcos,
>> Louvo teu esforço (hercúleo, por sinal) em tentar estabelecer uma
>> terminologia para uma área que já tem uma (bem) estabelecida. Concordo com
>> Valéria: há um limite para a discussão sobre terminologia. Francamente, os
>> argumentos em favor de "demonstração" não me convencem.
>> Como já te disse em mensagem anterior, considero o termo "prova" mais
>> adequado. Soaria no mínimo estranho o uso de "demonstração" para traduzir
>> diversos termos já consolidados como: "proof object" (concordo com Elaine),
>> "proof construction", "proofs as programs", "proof system", "zero-knowledge
>> proof" (e, nesse contexto, "prover" versus "verifier"), "proof term", etc.
>> Um abraço,
>> Ruy
>>
>> Em 10 de novembro de 2011 05:23, Valeria de Paiva
>> <valeria...@gmail.com> escreveu:
>>> > é que no discreto ramo da lógica contemporânea conhecido como *Teoria
>>> > das Demonstrações* (que os matemáticos praticantes em geral ignoram
>>> > por completo, e da qual poucos sequer ouviram falar, e que certamente
>>> > ainda conta com pouquíssimas publicações realmente representativas na
>>> > nossa língua) precisamos de termos técnicos precisos e cuidadosamente
>>> > projetados/escolhidos, pois as "demonstrações", as proposições
>>> > "demonstráveis" e a própria noção de "demonstrabilidade" são seus
>>> > ("decente" em um sentido técnico bastante preciso) *em português*.
>>> > Este é sem dúvida um problema que nunca precisamos enfrentar quando
>>> > escrevemos a maior parte dos nossos papers (nossos papéis?) em inglês,
>>> > ou quando vivemos fora do mundo lusófono...  Mas é um tema bastante
>>> > presente, no entanto, e de fato _premente_, na vida de pessoas (como
>>> > eu!) que se metem a traduzir longos textos técnicos para português ou
>>> > mesmo produzir material original e escrever manuais de Lógica para
>>> > fruição do público brasileiro e português.
>>> >
>>> > Com relação ao que podemos fazer para ajudarmos os nossos alunos a não
>>> > se perderem na selva de terminologias ---e notações--- da literatura,
>>> > creio que o mais racional seria simplesmente tentar mencionar para
>>> > eles aquelas que são mais difundidas ou importantes, seja na
>>> > literatura estrangeira seja naquela mais local (vá um aluno tentar
>>> > adivinhar que a tradução para "correção" é "soundness", ou tentar
>>> > entender a notação padrão para substituição, A[t/x], que só faz
>>> > sentido na cabeça de quem nasceu e cresceu pensando em inglês).
>>> >
>>> > Finalmente, no que diz respeito à nossa inépcia linguística geral e ao
>>> > nosso trogloditismo, não me parece, infelizmente, que ela esteja
>>> > circunscrita ao mundo da Ciência ---haja vista os exemplos que ofereci
>>> > no ponto (1) acima.  Usa-se muito mal a língua, pra todo lado, e a
>>> > justificativa de que "escrevemos os nossos artigos em inglês" não
>>> > explica o fenômeno generalizado.  No entanto, parece-me muito mais
>>> > grave o fenômeno no caso dos cientistas que não acreditam ser
>>> > necessário "dar o bom exemplo".
>>> >
>>> > Vamos então continuar fazendo ao menos a nossa parte.  E tentando
>>> > angariar adeptos para a Revolução. :-)
>>> >
>>> > Abraços demonstrados,
>>> > Joao Marcos
>>> >
>>> >
>>> > [*] Os dicionários de português que consultei dizem que o termo
>>> > "instância", no significado aqui empregado, é um neologismo
>>> > informático --- sem dúvida um neologismo _necessário_, vocês não
>>> > concordam?
>>> >
>>> > PS: Agradeço em particular a Valeria e Elaine, queridas amigas de quem
>>> > *dis*cordo "em gênero, número e grau", por se disporem a trazer para a
>>> > lista um tema que já discutimos no passado em privado, separadamente,
>>> > tornando desta vez públicos os seus sentimentos a respeito destas
>>> > coisas.  E a Andrea agradeço o cuidado erudito de quem já gastou
>>> > fosfato escolhendo terminologia a usar em competentes traduções
>>> > publicadas na língua brasileira!
>>> >
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Ruy de Queiroz

unread,
Nov 13, 2011, 8:38:29 AM11/13/11
to Valeria de Paiva, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Acrescento um exemplo relevante: apesar do termo "théorie de la
démonstration" ser usado em francês, veja como se intitula o laboratório de
Jussieu que faz pesquisa em teoria da prova no que se relaciona com a
computação:

Laboratoire <goog_52851488>
Preuves, Programmes et Systèmes <http://www.pps.jussieu.fr/>

Elaine Pimentel

unread,
Nov 13, 2011, 1:26:05 PM11/13/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
> "Inferência profunda" não lhe parece adequado?

Bem, eu tenho meus motivos "off topic" para não gostar muito da idéia..

Joao Marcos

unread,
Nov 13, 2011, 11:53:00 AM11/13/11
to Elaine Pimentel, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
>
> Acho interessante, entretanto, a discussão levantada pelo Walter. Eu
> tenho muita dificuldade em traduzir alguns termos, então simplesmente
> não o faço. Um exemplo é deep inference...
>

"Inferência profunda" não lhe parece adequado?
Haveria alguma alternativa interessante?

Abraços,
Joao Marcos

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Joao Marcos

unread,
Nov 13, 2011, 1:31:49 PM11/13/11
to Elaine Pimentel, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
>
> > "Inferência profunda" não lhe parece adequado?
>
> Bem, eu tenho meus motivos "off topic" para não gostar muito da idéia...
>

Off topic?!


> > Haveria alguma alternativa interessante?
>
> Não, realmente não. Talvez continue a usar o termo em inglês...
>
> Eu fui uma das primeiras pessoas (se não a primeira...) a trabalhar
> com proof search em deep inference. Devo dizer que se um dia for
> obrigada a dizer que faço "busca por demonstrações em inferência
> profunda" vou preferir mudar de área... :)
>

Você nunca vai ser obrigada a nada, Elaine.

Abração,

Elaine Pimentel

unread,
Nov 13, 2011, 11:39:39 AM11/13/11
to Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Oi, João,

Nao, acho que você não entendeu o ponto...

O ponto, penso eu, é que as palavras "prova" e "demonstração" são
utilizadas indissociadamente (em lógica e matemática) tanto em
português tanto, como você pôde ver, em francês (também pelo que tenho
escutado e lido em espanhol...). Portanto, não é nenhum crime contra o
português e a humanidade escolher teoria da prova como a melhor
terminologia para a área que eu atuo, trabalho todos os dias, escrevo
artigos sobre e sim, também textos em português

Eu acho que você colocou claramente os seus argumentos para a sua
preferência por "teoria da demonstração", eu e outros colocames
claramente os argumentos para "teoria da prova". Acho que não vai
haver consenso, não acho que uma argumentação seja melhor que a outra
e detesto ficar discutindo ad infinitum o que quer que seja. Por isso
eu (e acredito outras pessoas da lista compartilham a minha opinião)
não vou escrever mais sobre esse assunto.

Acho interessante, entretanto, a discussão levantada pelo Walter. Eu
tenho muita dificuldade em traduzir alguns termos, então simplesmente
não o faço. Um exemplo é deep inference...

Abraço,

Elaine.

2011/11/13 Joao Marcos <boto...@gmail.com>:

Valeria de Paiva

unread,
Nov 13, 2011, 9:07:29 PM11/13/11
to Elaine Pimentel, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Pois e', exatamente Elaine! Exatamente mesmo!..

eu quero poder usar prova e demonstracao como sinonimos.

mas tb acho a ideia de uma lista de traducoes bem legal, pois
1. ficamos sabendo o que os outros fazem
2. ficamos sabendo o que os outros acham dissonante ou nao...

Por exemplo:
Acho que a melhor traducao de turnstile 'e roleta, em vez de catraca
(mas tb gosto de catraca).

Fiquei pensando em topo=top e nadir= bottom, mas bottom= base, de
repente e' melhor mesmo.

Com relacao a 'deep inference' que tal 'inferencia interna' por
oposicao a 'inferencia imediata'?
em vez de inferencia superficial, que em portugues tem uma conotacao
muito pejorativa...

e eu realmente *nao* gosto de enquadramento pra frame, mas estou sem
saber o que recomendar.

Abracos lexicologicos,
Valeria

2011/11/13 Elaine Pimentel <elaine....@gmail.com>:

Ruy de Queiroz

unread,
Nov 13, 2011, 5:50:52 AM11/13/11
to Valeria de Paiva, Joao Marcos, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Caro João Marcos,

Louvo teu esforço (hercúleo, por sinal) em tentar estabelecer uma
terminologia para uma área que já tem uma (bem) estabelecida. Concordo com
Valéria: há um limite para a discussão sobre terminologia. Francamente, os
argumentos em favor de "demonstração" não me convencem.

Como já te disse em mensagem anterior, considero o termo "prova" mais
adequado. Soaria no mínimo estranho o uso de "demonstração" para traduzir
diversos termos já consolidados como: "proof object" (concordo com Elaine),
"proof construction", "proofs as programs", "proof system", "zero-knowledge
proof" (e, nesse contexto, "prover" versus "verifier"), "proof term", etc.

Um abraço,

Ruy

Em 10 de novembro de 2011 05:23, Valeria de Paiva <valeria...@gmail.com
> escreveu:

Anderson de Araújo

unread,
Nov 15, 2011, 8:37:58 AM11/15/11
to Valeria de Paiva, Elaine Pimentel, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Prezadas(os),

Após os esclarecimentos adicionais em prol da tradução de "proof" por
"prova" e considerando o que foi argumentado em favor da tradução de
"proof" por "demonstração", gostaria de saber se a maioria está de acordo
com as seguintes conclusões:

1) Em Lógica, os substantivos "prova" e "demonstração" são sinônimos e
ambos podem, portanto, ser usados como tradução de "proof".

2) Por questões históricas, há uma preferência por designar a área em
questão por "Teoria da prova", ainda que "Teoria da demonstração" também
seja uma designação aceitável devido à sinonímia entre "prova" e
"demonstração".

Se assim for, acho que a discussão chegou a bom termo. De minha parte,
agradeço a todos pelos esclarecimentos.

Abraços,

Anderson

PS: O debate pode continuar, claro, mas é importante haver entre os
especialistas uma conclusão parcial, pelo menos, para que possamos usá-la.


Em 14 de novembro de 2011 00:07, Valeria de Paiva <valeria...@gmail.com

Joao Marcos

unread,
Nov 16, 2011, 2:02:38 PM11/16/11
to Anderson de Araújo, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Olá, Anderson:

Agradeço o esforço no sentido de sumariar as conclusões da recente
discussão terminológica e conceitual acerca da tradução técnica mais
adequada de "Beweistheorie" e de seus objetos de estudo --- na
eventualidade de o debate desta vez ter realmente se encerrado, e
morrido assim de morte natural.

Como fui eu quem levantou o problema, só posso reiterar a minha
proposta e meus argumentos principais, apresentados seguidamente em:

http://www.dimap.ufrn.br/pipermail/logica-l/2011-November/006560.html
http://www.dimap.ufrn.br/pipermail/logica-l/2011-November/006600.html
http://www.dimap.ufrn.br/pipermail/logica-l/2011-November/006605.html
http://www.dimap.ufrn.br/pipermail/logica-l/2011-November/006630.html

Fico contente que a discussão levantada tenha sido bastante rica, e
acho que estão todos de parabéns!

De minha parte, as principais sugestões que foram arpresentadas para o
*Banco termino-Lógico Lusófono* foram:

"Beweistheorie"/ "Proof Theory" := Teoria das Demonstrações
"Beweis" / "proof" := demonstração
"beweisen" / "to prove" := demonstrar
"beweisbar" / "provable" := demonstrável
"Beweisbarkeit" / "provability" := demonstrabilidade
"beweistheoretisch" / "proof-theoretical" := demonstracional

Abraços,
Joao Marcos


PS: Curiosamente, o Google Translator, certamente bastante mal
informado, traduz "Beweistheorie" para inglês como "evidential theory"
e para francês como "la théorie de preuve". Nenhuma destas duas
traduções é usada tecnicamente, nas línguas-alvo mencionadas.


2011/11/15 Anderson de Araújo <ande...@gmail.com>:
> Prezadas(os),
>
> Após os esclarecimentos adicionais em prol da tradução de "proof" por
> "prova" e considerando o que foi argumentado em favor da tradução de
> "proof" por "demonstração", gostaria de saber se a maioria está de acordo
> com as seguintes conclusões:
>
> 1) Em Lógica, os substantivos "prova" e "demonstração" são sinônimos e
> ambos podem, portanto, ser usados como tradução de "proof".
>
> 2) Por questões históricas, há uma preferência por designar a área em
> questão por "Teoria da prova", ainda que "Teoria da demonstração" também
> seja uma designação aceitável devido à sinonímia entre "prova" e
> "demonstração".
>
> Se assim for, acho que a discussão chegou a bom termo. De minha parte,
> agradeço a todos pelos esclarecimentos.
>
> Abraços,
>
> Anderson
>
> PS: O debate pode continuar, claro, mas é importante haver entre os
> especialistas uma conclusão parcial, pelo menos, para que possamos usá-la.

--
http://sequiturquodlibet.googlepages.com/

Daniel Durante

unread,
Nov 15, 2011, 2:51:46 PM11/15/11
to Anderson de Araújo, Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de LOGICA
Oi Anderson,

É exatamente como você descreveu que entendo nossas conclusões.

Saudações,
Daniel
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