Lula não vê crise entre Brasil e Bolívia
Leonencio Nossa e Lisandra Paraguassu
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BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou nesta quarta-feira que haja uma crise entre o Brasil e Bolívia, depois na nacionalização do gás natural e do petróleo decretada pelo governo boliviano. Em discurso de 34 minutos na abertura da XVI Reunião Regional Americana, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o presidente ressaltou que reconhecer direitos do "povo sofrido boliviano" não significa negar direitos das empresas brasileiras. "Não existe crise, mas um ajuste necessário de um povo sofrido que tem direito de reivindicar maior poder sobre sua maior riqueza", afirmou.
O presidente fez referências à guerra travada pelos Estados Unidos no Iraque, a pretexto do uso de armas potentes pelo regime de Saddam Hussein. "Não vamos descobrir arma qualquer na Bolívia para justificar uma guerra", afirmou, sob aplausos de delegados de países das Américas. "O que não pode é uma nação impor sua soberania a outra", acrescentou.
No discurso de improviso, Lula se exaltou ao falar da relação "tranqüila" com a Argentina, lembrando que em outros tempos o país vizinho chegou a pensar em jogar "uma bomba atômica no Brasil", com medo de que a obra da usina hidrelétrica de Itaipu estivesse sendo construída por militares brasileiros para inundar Buenos Aires.
"A relação (entre Brasil e Argentina) não é política de empresários, de diplomatas e sindicatos. É política de Estado", ressaltou. "É com esse jogo de cintura que vamos consolidar o processo democrático na América Latina". Lula disse esperar que no encontro desta quinta-feira com os presidentes da Bolívia, Evo Morales, da Argentina, Néstor Kirchner e da Venezuela, Hugo Chávez, em Puerto Iguazu, "todos nós vamos nos acertar".
O presidente disse que a sua política de governo não prega o imperialismo brasileiro na América do Sul, que teria ocorrido no passado e que muitas vezes as divergências que aparecem ocorrem porque nações da região estão vivendo novos estágios nas suas relações internas e externas. "Até as disputas políticas que nós temos ocorrem porque a América Latina é um continente politicamente em formação".
Ele reclamou que certas vezes presidentes sul-americanos gastam tempo para discutir problemas de 200 anos atrás. "Nós somos a geração de governantes que tem de pensar no século 22 e não no século 19 ou 18".
Lula disse também que a disputa entre Uruguai e Argentina, por causa da instalação de indústria de celulose em território uruguaio, o incomoda. Mas, segundo o presidente, a chamada "crise da papeleira" deve ser solucionada pelos dois países vizinhos. Recentemente o presidente uruguaio, Tabaré Vasquez, declarou que pediria a intermediação do presidente brasileiro nessa questão. Na opinião de Lula, o povo latino-americano não pode perder a esperança de consolidar a democracia na região e parte dos problemas dos países na área ocorre por "mediocridades locais". Ele ressaltou que apesar da aproximação dos países da América Latina, a relação de países como Estados Unidos, China, Índia e Europa "é extraordinária".
O presidente ressaltou ainda pontos positivos do seu governo, na área econômica e do trabalho. Ele rebateu críticas da oposição e disse que em 39 meses de governo a média de aumento de emprego foi dez vezes superior à registrada nos oito anos do governo que o antecedeu.
Segundo Lula, a década de 80 no Brasil foi perdida e a de 90, do governo Fernando Henrique Cardoso, foi de estagnação. "Durante 10 anos não fizeram outra coisa senão desmontar o aparato dos estados, privatizando e não colocando nada no lugar". Ele voltou a dizer que não é possível um crescimento econômico por meio de mágica. "Procurei uma fada para convocá-la como ministra, mas não encontrei".
Dirigindo-se aos delegados latino-americanos, Lula disse que a solução para problemas do Brasil e da América Latina não depende do presidente ser de esquerda ou de direita, mas ter humanidade.
Argentina sediará discussões sobre decisão da Bolívia
Rosana de Cassia e Leonencio Nossa
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BRASÍLIA - O encontro marcado para amanhã entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Evo Morales (Bolívia), Néstor Kirchner (Argentina) e Hugo Chávez (Venezuela), para discutir a nacionalização do petróleo e do gás boliviano, será realizada em território argentino. Ontem, havia sido informado que a reunião seria realizada em Foz do Iguaçu, no Paraná. Ainda não se sabe o local exato e nem o horário do encontro, porém, a Secretaria de Imprensa da Presidência da República afirmou que a cidade escolhida foi Puerto Iguazú. Não foi informado o motivo da mudança.
O presidente Lula espera garantir, neste encontro, uma boa negociação em relação ao preço do gás boliviano. O governo brasileiro trabalha para evitar aumento no preço final para o consumidor, segundo informaram fontes do Palácio do Planalto. Essas mesmas fontes avaliaram que o noticiário de hoje sobre a decisão do governo boliviano de nacionalizar os setores de gás e petróleo não deixa claro que o decreto assinado por Evo Morales não prevê a expropriação de bens da Petrobras.
Os assessores ressaltam que apesar de Morales ter feito o anúncio da nacionalização das jazidas de forma simbólica, na presença de militares do exército boliviano, numa refinaria da Petrobras, o decreto determina que a Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolívia (YPFB) terá 180 dias para fazer a compra de parte das ações das empresas que quiserem permanecer no País.
Em nota divulgada ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já antecipou que reconhece a soberania do governo boliviano na decisão de nacionalizar as reservas e controlar o setor de petróleo e gás natural no país. Contudo, o governo brasileiro continuará negociando com a Bolívia para preservar os interesses da Petrobras, a maior multinacional em atuação no país vizinho.
Em conversa por telefone com o presidente boliviano, Evo Morales, no fim da tarde de ontem, Lula obteve a garantia da continuidade do fornecimento, ao Brasil, do gás natural usado em termelétricas, indústrias, residências abastecidas por gás canalizado e carros movidos a Gás Natural Veicular (GNV).
De acordo com esse auxiliar, no telefonema, dado por iniciativa de Lula, Evo mostrou-se "amistoso" e "cordial". "Ele demonstrou querer que as coisas com o Brasil fiquem bem", relatou a fonte. Antes de conversar com Evo, Lula falou com o Kirchner e com Hugo Chávez, nessa ordem. Dessas conversas nasceu a decisão do encontro.
Um assunto que entraria na pauta de discussões entre os presidentes, conforme avaliação de uma fonte oficial do governo argentino, seria a garantia para o fornecimento um preço acessível do gás boliviano.
Segundo a fonte, a Bolívia quer aumentar o preço do gás vendido à Argentina dos atuais US$ 3,18 o milhão de BTU (unidade térmica para o comércio internacional) para US$ 5,30. De acordo com a demanda argentina, o consumo interno de gás boliviano varia de entre 3% a 4,5% do total, em torno de cinco milhões de metros cúbicos de gás por dia. Enquanto o Brasil importa cerca de 24,3 milhões de metros cúbicos diários, o contrato entre a Argentina e a Bolívia permite que o primeiro compre diariamente até 7,7 milhões de metros cúbicos.
No entanto, o ministro de Planejamento, Julio De Vido, estava negociando com Evo Morales a elevação desse volume para 20 milhões de metros cúbicos diários em contrato que duraria 20 anos. A ampliação do volume deve-se às projeções de aumento da demanda para os próximos anos. Para tanto, o governo chegou a realizar uma licitação, em 2004, cujo vencedor foi o grupo Techint, para a construção do gasoduto do Nordeste, um projeto de US$ 1,5 bilhão.
Há duas semanas, De Vido tinha acertado com o ministro de Hidrocarbonetos da Bolívia, Andrés Soliz Rada, a criação de uma comissão binacional que deveria definir as regras para o novo contrato, antes de 15 de maio, data previamente marcada para as negociações. A fonte informou que esse prazo não poderá ser cumprido e que as negociações foram postergadas até que o governo boliviano negocie com as empresas.
Para diretor da Petrobras, Bolívia manterá preço do gás
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SÃO PAULO - Diretor de Gás e Energia da Petrobras, Ildo Sauer, acredita que os preços do gás boliviano não devem ter reajuste, já que há contratos em vigor que regulam a política de preços a serem praticados.
Segundo ele a Petrobras e outras sete companhias produzem gás na Bolívia que é vendido à estatal boliviana, que, por sua vez, revende o produto. Como o governo do país mudou a relação econômica entre os produtores e a estatal, que passou a ter uma fatia maior na receita do gás natural produzido lá, o que prejudica as companhias estrangeiras.
Sauer diz acreditar na ordem jurídica que faria o governo boliviano respeitar os direitos da Petrobras e das outras companhias que atuam naquele país.
Duende,
Sem querer ser do contra mas sendo,
me parece totalmente fora de contexto a atitude do Evo.
Não estamos mais em 1950.
Além do mais, a história toda é muito além da "lógica do lucro". No limite da análise, o Evo se apropriou do dinheiro de contribuintes brasileiros via Petrobrás, que é uma estatal.
Acho que existem muitas outras formas de se fazer cumprir a soberania boliviana afim de tentar tornar o país um pouco melhor.
Mas do jeito que a coisa está sendo feita, à la Chavez, que é retórico na sua briga com os EUA (ele só faz o que faz pq vende petróleo com o preço nas alturas para os EUA), só traz prejuízos pra Bolívia.
My two cents.
[]´s
cacá
EL PETROLEO DE BOLIVIA PARA LOS BOLIVIANOS
Por Editorial La Jornada 03/05/2006 às 22:23
El petróleo para los bolivianos
E parece que a discussão anda quente lá no CMI ( http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2006/05/352236.shtml)...
RadiobrÁs, Brasília
O físico José Walter Bautista Vidal disse que o Brasil precisa defender a nacionalização das refinarias de petróleo e gás na Bolívia, medida anunciada anteontem (1º) pelo presidente Evo Morales. "O Brasil tem que defender a todo custo esse princípio da soberania, porque é um país que tem tudo a perder. Se não respeitarmos esse princípio, os outros irão usar isso contra nós", afirmou.
Bautista Vidal, que coordenou a implementação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool) e hoje trabalha na implantação do biodiesel no País, afirmou que está sendo difundida uma idéia "errada", de que a Bolívia está agredindo o Brasil, uma vez que a Petrobras também foi afetada pela decisão. "Não é verdade. A Bolívia está resgatando um patrimônio estratégico fundamental", afirmou, em entrevista à Rádio Nacional.
Na opinião do físico brasileiro, Morales tomou uma decisão correta. "Ele está certo. O petróleo é um patrimônio do povo boliviano, assim como as reservas minerais do Brasil são um patrimônio do povo brasileiro".
Vidal citou como exemplo a mineradora brasileira Vale do Rio Doce, privatizada durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso. "Hoje, a Vale age de acordo com grupos internacionais e não de acordo com os interesses do Brasil. É um atentado contra a soberania das nações que grupos estrangeiros se apropriem desses recursos".
Sindicalista
O coordenador da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Hélio Sidel, apoiou o decreto do presidente boliviano, Evo Morales, de nacionalizar os negócios de petróleo e gás natural. "É legítimo, é uma posição sábia, nós também lutamos pela manutenção e proteção das nossas reservas", disse.
Na avaliação de Sidel, a decisão boliviana não é danosa para a Petrobras que, segundo o sindicalista, reduziu os investimentos naquele país desde que surgiram as discussões sobre a nacionalização.