GLOCAL: ELEMENTOS PARA UMA CRÍTICA DO MODO MEDIÁTICO DE REPRODUÇÃO DO CAPITALISMO TARDIO

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Hannah BLUE

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Nov 8, 2007, 11:49:39 AM11/8/07
to Midiateca da HannaH
GLOCAL: ELEMENTOS PARA UMA CRÍTICA DO MODO MEDIÁTICO DE REPRODUÇÃO DO
CAPITALISMO TARDIO

EDILSON CAZELOTO

(edcaz...@yahoo.com.br)

Este artigo visa articular as categorias de "Glocal" e "Império",
ressaltando a centralidade dos processos

comunicacionais na reprodução ampliada do capitalismo contemporâneo. A
análise, simultaneamente

cultural e política, busca interpretar como a intersecção de forças
globais e locais atua na construção de uma

nova subjetividade, ligada às necessidades de um modo de produção
calcado na circulação de valores

simbólicos.

Palavras- chave: glocal; império; capitalismo; cibercultura;
comunicação

* Doutorando, membro do CENCIB - centro interdisciplinar de pesquisas
em comunicação e cibercultura -

do programa de pós-graduação em Comunicação e Semiótica da Pontifícia
Universidade Católica de São

Paulo

2

3

1. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, as ciências humanas vêm travando um debate intenso
sobre a

singularidade histórica das sociedades contemporâneas. A diversidade
de conceitos-chave

introduzidos nos mais diversos trabalhos desde, pelo menos, a segunda
metade do século

XX (tais como capitalismo tardio, capitalismo pós-industrial, pós-
fordismo, capitalismo

imaterial, economia-mundo etc) ilustra a pluralidade de visões sobre o
tema1. Mesmo sem

que haja consenso firmado em torno da natureza e extensão dessas
mudanças, a noção

predominante é a de que o capitalismo expandiu-se por toda a
superfície do globo, ou,

como diz Jameson, ultrapassou as derradeiras fronteiras e colonizou a
natureza e o

inconsciente (JAMESON, 2002). Tal expansão (e suas conseqüências)
implicam mudança

qualitativa na compreensão desta nova fase.

Se não é nenhuma novidade o fato de que os meios eletrônicos de
informação e

comunicação jogam um papel decisivo neste contexto (seja pelo fluxo de
dados diuturno

necessário ao mercado de capitais, seja por difundir em escala global
as mercadorias e o

desejo necessários ao mercado de consumo), parece faltar à área de
Comunicação uma

visão mais consistente sobre a centralidade de seu objeto de estudo na
reprodução e

sustentação do capitalismo em sua nova fase. Em outras palavras, é
tarefa premente

daqueles que tomam a comunicação por objeto de pesquisa responder à
questão: em que

medida e sob quais procedimentos, a comunicação, mediada pelos
equipamentos

eletrônicos e, mais recentemente, informáticos, relaciona-se com as
atuais transformações

no modo de produção capitalista? Uma vez que tais mutações são
impensáveis fora dos

parâmetros da circulação global de informações, a área de comunicação
tornaria-se local

de fala privilegiado na análise de todo o contexto.

A farta bibliografia que trata dos meios eletrônicos de massa (mais
precisamente,

o rádio e a televisão) produziu (e ainda produz) uma grande quantidade
de textos críticos

capazes de permitir uma visão de conjunto das relações entre estes
meios e o modo de

produção, talhando conceitos-chave como o de "indústria cultural".

No entanto, devido a uma debilidade dos estudos críticos realizados
sobre o

ciberespaço, resta pouco explorado o papel dos meios eletrônicos
interativos (mais

precisamente, os computadores e outras tecnologias capazes de rede) no
contexto do

capitalismo contemporâneo. Tudo se passa como se a fascinação pela
linguagem e pelos

aspectos estéticos dessas novas tecnologias obliterasse a reflexão
mais aprofundada e

menos triunfalista de suas relações com o meio social e político
(TRIVINHO, 2001b,

4

p.153 e 154). Maior é a gravidade desta constatação se for levado em
conta o fato de que,

apesar de recente e largamente concentrada, as formas de comunicação
digital-interativas

são o vetor de organização dos novos arranjos de produção e difusoras
privilegiadas do

imaginário contemporâneo, ao menos nos enclaves economicamente
privilegiados das

sociedades industrialmente desenvolvidas. Mesmo diante da insofismável
baixa

penetração dos media interativos no planeta como um todo, a alta
concentração de acesso

nas áreas economicamente mais desenvolvidas basta para levantar a
hipóteses de que

essas tecnologias atuem como "ponta de lança", força de vanguarda na
reconfiguração do

capitalismo transnacional.2 Os computadores não estão em toda parte e
talvez nunca

cheguem a ter a penetração obtida pelo rádio e pela televisão mas,
mesmo assim, atuam

como formas privilegiadas na organização das áreas mais avançadas do
capitalismo,

produzindo sobre as demais uma sobredeterminação simbólica e material
e erigindo um

horizonte-meta, para o qual convergem os esforços e os investimentos
de estados e

organizações da sociedade civil3.

No intuito de colaborar para a superação dessa lacuna, usaremos a
noção de

glocalização da experiência cotidiana talhada por Trivinho (2001a)
como forma de ligar

as características da comunicação em redes informáticas ao ambiente
sócio-político das

sociedades contemporâneas. Neste âmbito, articularemos as categorias
de "Império" e

"Glocal"4, pretendendo fazer avançar a compreensão das implicações
mútuas entre o atual

estágio do capitalismo e o ciberespaço, na medida em que o estudo das
estruturas políticoinstitucional-

econômico globais ("Império") colabora para a concretização e
historização

do glocal, ao mesmo tempo em que a generalização do glocal colabora
para a superação

das lacunas do conceito de "Império". Trata-se, portanto, de uma
leitura política do

glocal, simultânea a uma leitura comunicacional do "Império".

Para iniciar essa análise, será útil uma breve incursão à teoria do
capitalismo

contemporâneo como "pano de fundo" para o desenvolvimento das noções
acima.

2. CAPITALISMO TARDIO E IMPÉRIO

Buscando apreender o que o momento atual possui como característica
distinta,

tanto no âmbito da economia quanto da sociedade, Jameson propõe a
plena atividade de

instituições e mecanismos nas sociedades contemporâneas que estariam
modificando a

própria forma do capitalismo. Não se trata de uma ruptura, mas de uma
continuidade em

aprofundamento e expansão. Sua face mais visível é, sem dúvida, o
crescimento

vertiginoso das empresas transnacionais, mas também

5

(...) a nova divisão internacional do trabalho, a nova dinâmica
vertiginosa de transações bancárias

internacionais e das bolsas de valores (incluindo as imensas dívidas
do segundo e do terceiro

mundo), novas formas de inter-relacionamentos das mídias (incluindo os
sistemas de transportes

como a conteineirização), computadores e automação, a fuga da produção
para áreas desenvolvidas

do terceiro mundo, ao lado das conseqüências sociais mais conhecidas,
incluindo a crise do

trabalho tradicional, a emergência dos yuppies e a aristocratização em
escala agora global.

(JAMESON, 2002, p. 22 e 23)

Aprofundando sua análise, Jameson conclui que uma das mais notáveis
mutações

do chamado capitalismo tardio5 é que esse opera com uma lógica
cultural. A cultura é a

lógica do capitalismo tardio, uma vez que, nas sociedades
contemporâneas, todos os

eventos, da economia à política, passando pelo próprio psiquismo,
podem ser

considerados "culturais", no sentido de operarem a transformação do
"real" em simulacros

e imagens (JAMESON, 2002, p. 74). Questionando a proposição
(tipicamente

mecanicista ortodoxa) do marxismo tradicional de que a infraestrutura
(a economia)

determina a superestrutura (o universo cultural lato senso), Jameson
propõe que, no

cenário atual, são as formas culturais que organizam o modo de
produção.

É radicalizando esta tendência que Baudrillard vai alertar para o "fim
da era da

produção" em que, desconectado de seus referenciais concretos "o
capital já não é mais da

ordem da economia política: ele usa a economia política como modelo de
simulação"

(BAUDRILLARD, 1996, p. 8). O capital é, antes de tudo, uma relação
entre signos

(código), desprovido de significado e finalidade, não referindo-se
mais a um "real".

No plano empírico, vemos esse movimento expresso, por exemplo, na
explosão do

valor das marcas (um logotipo pode valer mais que um parque
industrial), na obsessão

pela mais-potência informática (a velocidade como produto independente
de qualquer uso

ou necessidade concreta), na bilionária indústria do marketing e na
publicidade, todas

formas de valorização do capital que prescindem da exploração
intensiva do trabalho ou

do melhor aproveitamento de insumos..

As tendências captadas por Baudrillard e Jameson. apontam para um
cenário em

que a valorização do capital deriva de uma certa fluidez dos signos
postos em circulação.

No entanto, essa tendência à desmaterialização do capital não implica
que, liberto dos

constrangimentos da circulação concreta (máquinas e insumos) e do
espaço físico (canais

de distribuição e fábricas), o capital passe a fluir sem impedimentos
de ordem política ou

econômica. Relações hierárquicas, pólos de produção, zonas
privilegiadas,

regulamentações jurídicas e toda um conjunto articulado de mecanismos
supraestatais

6

exigem que a noção de que a lógica cultural e imaterial do capitalismo
seja

complementada pela constatação de que esse movimento obedece a um
fluxo específico e,

ainda que não possa ser circunscrito, possui um campo difusor
indeterminável

geograficamente a partir do qual lança-se pela civilização global
mediática em busca das

rentabilidades mais favoráveis6. Um primeiro momento para a análise
desse campo

produtor pode partir da idéia de Hardt e Negri (2000) de que vivemos
sob a influência de

um "Império", o qual determina (ou, pelo menos, condiciona) as "regras
do jogo" em

escala global.

O "Império" não é um estado em particular, mas um conjunto de
instituições com

a capacidade (militar, política, econômica, mas também comunicacional)
de influenciar

legislações locais, normas de comércio, formas de produção, aplicações
de recursos,

empregabilidade de insumos, trânsito de mercadorias e serviços etc. O
sucesso ou

fracasso destas intervenções modula o fluxo do capital, as áreas
economicamente

privilegiadas e a relação de forças entre Estados.

Não é o objetivo deste trabalho realizar uma crítica (de resto
necessária) ao teor

ideológico da noção de "Império" de Hardt e Negri. Deve-se reter, no
entanto, a idéia que

a "lógica cultural" do capitalismo global não pressupõe um livre fluxo
de influências, mas

obedece a difusão estabelecida por mecanismos nacionais e
internacionais não-isoláveis

que constituem o "Império" (empresas multinacionais, organizações e,
eventualmente,

estados economicamente dominantes), embora sempre sujeito a variações,
acelerações e

desacelerações. O caráter imaterial desse intercâmbio, a complexidade
das redes de troca

e a dinâmica do mercado são alguns dos fatores que impossibilitam a
circunscrição

inequívoca de um "emissor", da forma como o tratam os tradicionais
modelos de

comunicação (e na forma da geopolítica tradicional). No seu lugar,
surge uma certa

"região difusa", pressuposta logicamente, mas com contornos e
dimensões indecidíveis.

Esse caráter movediço desautoriza o simplismo de "teorias
conspiratórias" para

uma manipulação em escala global, destinada a atender os interesses
implícitos ou

explícitos das corporações multinacionais ou de um estado específico -
embora os autores

sempre façam questão de ressaltar a notável a presença das empresas e
instituições dos

Estados Unidos. A própria indeterminação das fronteiras do "Império" e
a instabilidade

de seus atores faz com que ele seja permeável a fluxos antagônicos
(tratados por Hardt e

Negri como forças "contra-imperiais"). Portanto, as fronteiras do
império não são

determinadas geograficamente, à maneira cartográfica, mas como um
"campo", mais

afeito à metáfora de modelo atômico, no qual atuam forças
contraditórias.

7

Os fluxos comunicacionais (ou seja, a própria essência "cultural" do
capitalismo

tardio) são propagados por todos os cantos do mundo a partir dos
resultados dos embates

neste campo de forças. Para esta propagação, são utilizados um
conjunto de mecanismos

em todos os níveis da sociedade. O "Império" se faz presente e
influente desde a formação

das grandes linhas macro-econômicas até o nível do indivíduo, atuando
na formação de

subjetividades. Seu poder está enraizado e disperso em toda a
sociedade, cristalizado nas

instituições, na práxis e no desejo de cada um de seus "cidadãos".

3. OS MEDIA E O GLOCAL

Que os meios de comunicação eletrônicos desempenharam (e continuam

desempenhando) um papel fundamental na construção desse cenário,
colaborando tanto

para a desmaterialização do capital quanto para a formação do
"Império" é fato

conhecido. Televisão, rádio e cinema já foram exaustivamente
criticados pelo seu caráter

"imperialista" e pela destruição de formas culturais locais. Mas é com
o advento dos

media interativos que a questão se reescalona, escapando das análises
tradicionais.

Essa passagem, dos media de massa para os media interativos,
representa um salto

qualitativo, uma vez que coloca em jogo mudanças estruturais de monta
nos efeitos

sociais dos processos de comunicação. Não se pode ignorar que os media
de massa

ocuparam (e talvez ainda ocupem, principalmente nas regiões
periféricas onde a expansão

do ciberespaço é insuficiente) um papel central no desenvolvimento do
capitalismo

contemporâneo. No entanto, para consolidar algum avanço na questão das
relações entre

capitalismo e comunicação na atualidade, é necessário analisar os
media interativos em

sua especificidade, como ambiente fértil para a expansão da lógica
cultural do capitalismo

tardio. Para tanto, utilizaremos a noção de glocal.

A idéia de glocal é desenvolvida, no contexto mediático avançado7, por
Trivinho 8.

O conceito de glocal oferece uma chave de leitura privilegiada para a
análise o conjunto

dos processos sócio-econômico-culturais contemporâneos porque "(...) o
fenômeno glocal

é, do ponto de vista social-histórico, o selo original, o sinete
genuíno da civilização

mediática, a sua face inconfundível e inelidível, capaz de diferi-la,
no fundamental, das

outras fases sociotecnológicas" (TRIVINHO, 2001a, p.76)

Como o próprio nome sugere, "glocal" é uma justaposição de uma esfera
global a

uma esfera local: a partir de um meio de comunicação operando em tempo
real

(prioritariamente o tempo real do ciberespaço ou o tempo real "live"
da televisão9) cria-se

um ambiente glocalizado, no qual o sujeito se vê imerso em um contexto

8

simultaneamente local (o espaço físico do acesso, mas também o seu
meio cultural) e

global (o espaço mediático da tela e da rede, convertido em
experiência subordinativa da

realidade)10. Sem o fenômeno da glocalização, suporte comunicacional
das trocas em

escala global, a derrubada das fronteiras para a circulação de
produtos, serviços, formas

políticas e idéias estaria prejudicada ou impossibilitada. Mas como
essa constatação

relaciona-se com a idéia de "Império"?

Segundo Hardt e Negri, o "Império" exerce e auto-legitima o seu poder
através de

"intervenções" nos espaços econômico, militar e jurídico (acrescente-
se, também político

e cultural). Essas intervenções atuam de maneira supranacional e são
expressas por

políticas macro-econômicas, flutuações nos mercados financeiros,
invasões armadas,

financiamento de exércitos, normas de direito internacional, programas
de ajuda

"humanitária", leis de comércio exterior etc.

Dentre essas, destaca-se a chamada "intervenção moral", considerada "a
linha de

frente da intervenção imperial". As forças dominantes num dado momento
histórico

possuem a capacidade de disseminar e naturalizar uma certa visão de
mundo, com seus

valores e moralidade intrínsecas (Gramsci referia-se a essa capacidade
como o exercício

da hegemonia que, grosso modo, pode ser compreendido com a capacidade
de fazer valer

o particular como se fosse universal). O exemplo mais claro disso é a
expansão da idéia

de democracia política e do "livre" mercado de trocas11. A intervenção
moral relacionase

claramente com a idéia de glocal, não apenas porque se dá de maneira
mais direta nos e

pelos meios de comunicação12 , mas porque essa modalidade vai
repercutir na visão de

mundo e na ação concreta dos indivíduos formando o "pano de fundo" ou
as condições de

racionalidade do agir local e cotidiano. Ao incidir diretamente na
formação das

subjetividades13, a glocalização da experiência consegue criar as
condições para sua

própria reprodução, tornando-se não apenas hegemônica, mas auto-
legitimadora14.

Porém, a análise do glocal não deve reduzi-lo apenas à hibridização
mecânica dos

contextos mediático e geográfico, nem a um meio de "subordinação". É
necessário

desenvolver uma certa "sociologia do ambiente glocalizado" uma vez que
o glocal, no

contexto do capitalismo tardio imaterial, torna-se um modo
privilegiado de experiência da

realidade e o modo como se organizam as sociedades contemporâneas
tecnologicamente

avançadas. (TRIVINHO, 2001a, p.64). O glocal reescalona a percepção do
local e do

global.

Percebe-se que essa compreensão do glocal sustenta a noção de
"Império": este

não pode realizar-se nem expandir-se sem uma lógica cultural
subjacente que permita lhe

9

permita a disseminação, mesmo que essa disseminação não ocorra sem
resistências. O

mais importante (e o diferencial da teoria do "Império") é que o
consenso é produzido

sem violência física (fora casos-limite), sem a ocupação por tropas e
sem a tomada dos

estados "externos". O "Império" se expande de forma biopolítica15
(agindo no corpo:

moldando gestos e comportamentos, percepções e sentidos), sustentado
pela glocalização

da experiência. Como já foi frisado, essa lógica cultural tem como
vetores de ação os

meios de comunicação offline (como a media impressa e o cinema) e os
veículos

eletrônicos de massa (rádio e televisão, principalmente), mas ganha
uma nova

especificidade e eficácia com as tecnologias capazes de rede,
acentuando com novas

colorações o fenômeno da "glocalização da experiência".

A glocalização da experiência, iniciada pelos meios eletrônicos
operando em

tempo real, só vai atingir a plenitude no contexto dos media
interativos. Não se trata mais

de "alienação" ou "massificação", termos largamente utilizados na
crítica dos modelos

comunicacionais anteriores: trata-se agora da "subjetivação", a
integração do sujeito aos

fluxos, e portanto, à axiologia do mercado imaterial. Nos modelos
anteriores ("alienação"

e "massificação") ainda persistia a idéia de um indivíduo externo,
alvo de "manipulação",

"indução", "influência". Mas a glocalização da experiência pelos meios
interativos anula a

distância entre o indivíduo e o meio (pelo fenômeno da
"interatividade"), trazendo o

indivíduo o para o interior do processo. Os pares dicotômicos emissor/
receptor,

produtor/consumidor, conteúdo/audiência perdem o sentido em proveito
de um único

mercado no qual os signos são transformados em capital16, em estrita
obediência à lógica

do "Império". Deste ponto de vista, o "usuário" da rede glocalizada
põe-se,

simultaneamente como produtor, consumidor e produto. É o usuário que
dá sua

subjetividade, na forma de signos, como produtos a serem consumidos
por outros

usuários, em benefício da lógica imperial.17

4. A FORMAÇÃO DAS SUBJETIVIDADES

Trata-se, neste momento, não mais de um "fazer-fazer", mas de um
"fazer-ser".

Não mais uma relação de produção/acumulação (consumo) mas uma forma de

circulação/integração (adesão). É essa via de integração extremamente
capilarizada que

permite ao "usuário" ser convertido em um nó da rede de influência do
"Império", como

sugerem Negri e Hardt:

10

As grandes potências industriais e financeiras produzem, desse modo,
não apenas mercadorias mas

também subjetividades. Produzem subjetividades agenciais dentro do
contexto biopolítico:

produzem necessidades, relações sociais, corpos e mentes - ou seja,
produzem produtores

(HARDT e NEGRI, 2000, p.51)

A formação de subjetividades (ou de produtores biopolíticos, na
terminologia que

Hardt e Negri tomam de empréstimo à Foucault) é o modo como a
glocalização da

experiência serve de sustentação e fator de expansão do "Império".
Este "fazer-ser", no

âmbito das relações políticas, econômicas e culturais, é a resultante
da ação (intencional

ou não) de atores concretos, que convergem no próprio corpo do usuário
pela imersão no

ambiente glocalizado, tendo aí o seu caráter de biopolítica18.

Uma vez que o fenômeno glocal engloba e amplia a noção de "Império"19
e

aceitando a hipótese de que esse atua na forma de "intervenções"20
sugere-se que o modo

de agir biopolítico da glocalização da experiência seja também uma
forma de

"intervenção". Essa forma específica, que contém a intervenção moral,
mas que não se

reduz a ela, será denominada "intervenção volitivo-pragmática".
Destaque-se que a

predicação "volitivo-pragmático" refere-se não à intervenção em si,
mas aos efeitos

produzidos por sua ação na formação de subjetividades. Trata-se de
propor que, se os

mecanismos do "Império", em geral, são capazes de disseminar,
naturalizar e legitimar

valores pela intervenção moral, a especificidade da atuação do glocal
é a modulação de

outras dimensões fundamentais do indivíduo, mais relacionadas à
biopolítica: o desejo e a

práxis. Não se trata de manipulação ou indução, mas de delimitação do
espaço de

inserção e criação dos pressupostos sobre os quais o indíviduo tende a
agir. A intervenção

volitivo-pragmática é o modo como o "Império" dissemina sua visão
tanto do que é

"desejável" (em termos de valor), quanto do que é "possível" (em
termos de ação). Essa

disseminação se dá de maneira mais acentuada por meio dos dispositivos
capazes de rede,

uma vez que esses anulam a distância entre o meio e o sujeito.

Portanto, a glocalização da experiência leva a termo o
"assujeitamento", formando

a subjetividade que será o paradigma do capitalismo tardio. Como não
estamos mais na

dimensão da produção/consumo, é importante ressaltar que a intervenção
volitivopragmática

molda um sujeito-padrão, que será o horizonte para todos os "cidadãos
do

império", independentemente de suas possibilidades econômicas reais.
Essa subjetividade

será a referência de identidade, mesmo para as parcelas
"desconectadas" dos media

interativos21.

11

O que esse enfoque permite é iluminar os mecanismo pelos quais é
permitido ao

capitalismo a "colonização do inconsciente e da natureza": a
experiência glocalizada,

dominante nos centros urbanizados do planeta, torna-se a referência
para a construção de

uma visão de mundo calcada na complexa síntese de geografia local e
ciberespaço.

Doravante a própria concepção da realidade e a percepção do desejo
passam a sofrer a

intermediação da lógica glocal 22. O processo, iniciado pelo rádio e
pela televisão, toma

seu contorno definitivo nos meios digitais, uma vez que eles permitem
a incorporação

desta subjetividade nos próprios fluxos, sob a forma da
"interatividade". Não é mais

necessária a divisão esquizofrênica entre emissor e receptor. Tudo que
circula nas redes é

signo e, portanto, tudo é produto.

Claro que essa dinâmica não está livre de contradições. A glocalização
da

experiência, ao mesmo tempo em que irradia a lógica capitalista do
"Império" (seus

desejos, práticas e valores), contém um contraponto possível a esta
mesma lógica, na

medida em que o glocal não é um fenômeno controlável. Como
salientamos, ele é o modo

de organização das sociedades capitalistas avançadas e, embora
repercuta na sociedade

mundial como um todo (mesmo nas zonas economicamente atrasadas e
desconectadas do

"Império"), está sujeito à mutações exatamente porque não encarna a
racionalidade de um

sujeito histórico específico. Assim, mesmo esse sujeito-padrão
glocalizado não se

confunde com a massa amorfa da indústria cultural. Ele é
pluridimensional, fractalizado23,

imprevisível. Porém, em todas as suas dimensões, relaciona-se de
alguma forma com o

capitalismo tardio imaterial: sua adesão é inelidível, ainda que
parcial. .

5. AUTO-LEGITIMAÇÃO NÃO-DISCURSIVA

Consideramos útil para o aprofundamento desta análise constatar que,
uma vez

que o "Império" não é uma instituição unitária e auto-consciente, mas
um complexo de

forças, algumas vezes contraditórias, a glocalização da experiência
promovida pelos

meios de comunicação digitais capazes de rede é gestada em um subcampo
que atenderia

a essa função específica de reprodução e expansão do capitalismo pela
via da

informatização das sociedades. É o locus prioritário da criação do
aparato tecnológico e

de sua utilização (softwares, hardwares, conteúdos para a web,
interfaces etc). Esse

subcampo, igualmente fluído e a desterritorializado é o que Trivinho
intitula

megatecnoburocracia ou megainfoburocracia 24 e que é, de fato, o
agente direto do da

expansão e renovação capitalista pela via tecnológica.

12

Além dos softwares, hardwares e provedores de conteúdo, esse subcampo
abriga

os órgãos de administração das políticas de informática (estatais ou
não), as instituições

de ensino e pesquisa, as ONGS voltadas à "inclusão digital", enfim,
toda a elite

diretamente responsável pela criação de produtos e serviços para e no
ciberespaço. É

valendo-se dessa megatecnoburocracia que o "Império" traduz suas
necessidades e

valores em "dispositivos glocalizantes", a estrutura física e
simbólica necessária ao

estabelecimento do fenômeno glocal e sua difusão. Ampliando a análise
de Jameson, a

tecnologia produzida pela megatecnoburocracia é, no seio do "Império",
a fonte produtora

de uma rede global descentrada de poder e controle (JAMESON, 2002, p.
64)

Isolar este aparato do conjunto do "Império" é importante para que se
possa

vislumbrar tendências de médio e longo prazo. Uma vez que, como
dissemos, a

glocalização da experiência não é um fenômeno controlável, mas a
resultante de vetores

em competição, a megatecnoburocracia situa-se em posição privilegiada
em relação aos

demais, por estar diretamente implicada na infraestrutura material e
simbólica do

"Império". Ela é o setor de vanguarda, capaz de reger os parâmetros
nos quais as demais

forças sociais, econômicas e culturais deverão se pautar. Em outro
registro, mais próximo

à dimensão do trabalho, a megatecnoburocracia prove a infraestrutura
tecnológica para a

elite profissional dos "analistas simbólicos" (REICH, 1994), os
grandes responsáveis

pelos processos de valorização do capital no mundo contemporâneo, além
de fornecerlhes

o ambiente propício para o exercício de suas funções. Assim, uma
análise detalhada

dos valores e critérios (em resumo, de alguns fragmentos da "visão de
mundo") próprios a

esse vetor pode fornecer subsídios vitais para a compreensão das
mutações de todo o

conjunto do capitalismo em sua fase atual. Tal procedimento requer, no
entanto, uma

dissecação aprofundada, atenta às grandes linhas de força construídas,
mas também às

suas contradições. Uma análise desta dimensão não será realizada neste
texto, mas

apontamos para alguns dos valores que estão emergindo neste contexto:

- Transformação da informação em mercadoria:

Fazem parte deste vetor, por exemplo, a lógica do copyright em
detrimento da

noção de "informação compartilhada como bem de interesse público" e os
mecanismos de

"assinatura de conteúdo", que prevê um pagamento mensal para uma certa
quantidade de

informações, medida em matérias de jornal, unidades de música,
capacidade de

armazenamento pessoal ou até simplesmente pelo trânsito de bytes
(franquia de

consumo).

13

- Nova lógica da divisão do trabalho:

Surgimento de novas divisões do trabalho, sendo que aos trabalhadores
da

"periferia" do "Império" cabe sujeitar-se à adaptação e utilização das
ferramentas

desenvolvidas pelos profissionais de alta qualificação do "centro" (as
noções espaciais

aqui são apenas metáforas: de maneira mais apropriada, devido ao
caráter indeterminado

das forças em competição, não como determinar "centros" e
"periferias"). Dito de outra

forma, a megatecnoburocracia cria as ferramentas-padrão (as
"plataformas" informáticas)

a partir de elites profissionais localizadas nas zonas de maior
influência, deixando à

maioria dos trabalhadores apenas a tarefa de criação de subprodutos
sem a capacidade de

influir ou intervir na concepção das ferramentas básicas.

- Inovação tecnológica pelo mercado:

O critério de "benefício social" é totalmente excluído da concepção de
produtos

informáticos, não cabendo a nenhuma instância da sociedade (nem mesmo
ao Estado)

intervir nessa operação. O ciberespaço e suas ferramentas são
considerados

"naturalmente" propriedades privadas e, pelo uso de códigos fechados,
não se submetem

às legislações locais25.

- Imperativo da mais-potência dos equipamentos26;

Os equipamentos e programas possuem uma obsolescência programada, ou
seja,

atuam em conjunto para promover a defasagem do parque instalado,
independentemente

das necessidades concretas dos usuários. Uma das técnicas para isso é
a

"incompatibilidade de versões", que força uma crescente e infinita
cadeia de atualizações.

O "capital cognitivo" dos usuários também passa pelo mesmo processo,
tendo que ser

renovado ciclicamente. Isso alimenta todo o setor de "reciclagem
profissional", com seus

cursos de formação e certificações técnicas.

Esses são apenas alguns dos valores que poderiam ser aprofundados numa
análise

mais detalhada da megatecnoburocracia e que tornam-se "senso comum" no
ambiente do

capitalismo tardio imaterial.. Ainda é importante frisar que a
glocalização da experiência,

além de difundir esses valores, colabora decisivamente para torná-los
auto-legitimados de

maneira não discursiva, uma vez que são hipostasiados nos objetos
tecnológicos. Eles (os

valores) estão na máquina, na interface, na conexão. Utilizar a
máquina é, implicitamente,

14

concordar com o modo de utilizar a máquina. O ambiente glocalizado é,
inerentemente, o

local onde esses valores estão naturalizados, ou seja, estão além da
adesão intencional de

seus usuários. A auto-legitimação da cibercultura é funcional, dada
não por uma "razão

discursiva" ou eticidade, mas em função de uma performance: "se a
coisa funciona assim,

então é natural que ela deva ser assim". Ao proceder desta forma, a
megatecnoburocracia

oblitera a categoria da política, uma vez que a "legitimidade do
político" calca-se na

construção de um consenso ativo, dependente, portanto, das formas
discursivas e da

amplitude de diálogo entre interesses divergentes27.

6. CONCLUSÃO

Como afirmava Poulantzas, uma formação social, para se reproduzir,
deve

constantemente criar "lugares" (posições relacionais) e "agentes"
prontos a assumirem os

seus "lugares" (POULANTZAS, 1978). Uma vez que o atual estágio do modo
de

produção capitalista é baseado em uma "lógica cultural", no qual a
dinâmica de produção

de valor vigente é atravessada por aspectos simbólicos e imateriais,
os meios de

comunicação atuam de forma determinante na construção desses "lugares"
e "agentes". A

geopolítica deve se articular com uma análise de fluxos, movente e
instável, como na

noção de "Império".

Nas últimas décadas, os objetos já consolidados pela área de
comunicação (como

os mass-media) se tornaram problemáticos à luz dos meios interativos,
uma vez que o

modo como atuam no social deva ser considerado em sua especificidade,
mesmo levando

em conta que tais meios talvez nunca atinjam o grau de penetração de
seus antecessores.

O momento aponta para a necessidade de uma renovação epistemológica,
abrindo-se para

as conexões entre as mutações no campo comunicacional e aquelas mais
amplas, que se

referem à organização das sociedades pós-industriais como um todo.

No mundo contemporâneo, a comunicação adquire centralidade em todos os

processos sociais e é na dinâmica destes processos que a comunicação
adquire

significado. A noção de glocal torna-se, neste contexto, uma chave
privilegiada de

análise. Nela se fundem as características diferenciais do aparato
comunicacional atual,

mas de maneira inteligível apenas pela rearticulação de categorias
tradicionais (como a

"mais-valia", o "Estado-Nação" e os "mass-media"). Ponto de
convergência entre o

político, o social, o econômico e a comunicação, o fenômeno glocal é
atravessado por

múltiplas leituras, sendo que nenhuma delas pode se completar sem o
auxílio das demais.

15

Não se trata mais apenas de comunicação, apenas de política, apenas de
economia, mas

de um local onde essas abordagens se cruzam e se interpenetram.

A partir deste ponto é possível uma contribuição original da
comunicação para

uma leitura de fenômenos que há anos ocupam o centro das discussões
nas ciências

sociais e políticas, como a noção de "globalização"28 e "pós-
industrialismo" (KUMAR,

1995). A glocalização da experiência guarda com esses conceitos uma
relação de tensão:

ao mesmo tempo em que as mutações no capitalismo deram margem à
generalização do

fenômeno glocal, essas mutações não poderiam ter sido levadas a cabo
sem a base de

difusão dos dispositivos que permitiram uma expansão sem precedentes
da lógica e dos

valores predominantes nos "centros" capitalistas desenvolvidos. Assim,
a crescente

influência do glocal interativo em detrimento da configuração rádio-
televisiva anterior,

aponta os caminhos que estão sendo abertos pelo novo ciclo do
capitalismo tardio

imaterial, ao mesmo tempo em que os desdobramentos no modo de produção
indicam as

características que prevalecerão na nossa relação cotidiana com os
equipamentos da

cibercultura.

O glocal interativo é a força que cria as condições de possibilidade
para a

construção dos "lugares" e dos "agentes" do capitalismo imaterial,
trazendo para o seu

âmbito o "usuário" vertido em produtor, consumidor e produto e
semeando o terreno no

qual a elitem imperial da cibercultura almeja colher seus frutos.

1 Para detalhes destas polêmicas, remeto à tentativa de totalização
das tendências contemporâneas realizadas

por Kumar (1995), destacando, porém, que o autor reflete sobre o
pressuposto de que mudanças profundas

efetivamente ocorreram, superando o industrialismo. Tal visão, embora
preponderante, ainda não se

configura como consensual.

2 Este aparente paradoxo entre a baixa penetração real e a
predominância na organização social será

discutido mais adiante.

3 Daí a proliferação global dos chamados programas de inclusão digital
e disseminação de tecnologias

informáticas, justificados sob o slogan de "democracia eletrônica" ou
diretamente focados nas vantagens de

competição econômica. (CAZELOTO, 2003).

4 A idéia de "Império" é desenvolvida em HARDT e NEGRI, 2000. Já o
conceito de "Glocal" será utilizado

como encontrado em TRIVINHO, 2001a e TRIVINHO, 2001b.

5 A noção de "capitalismo tardio" tem sua origem no pensamento do
economista marxista belga Ernest

Mandel que escreveu, entre outros, O Capitalismo tardio, referência
explícita de Jameson (2002, p. 396).

6 Parte deste movimento pode ser captada por uma nova visão
geopolítica dos fluxos comunicacionais.

Veja-se RAMONET, 1988 e MATTELART, 1994.

7 A idéia de "Glocal" consta em trabalhos de ordem econômica e
administrativa, sendo nesse contexto, um

conceito operacional, desprovido de viés crítico.

8 Cf. TRIVINHO, 2001a.

9 Embora o glocal não surja apenas no contexto da cibercultura, é nele
que ganha visibilidade, como afirma

Trivinho: "O fato de o fenômeno glocal aparecer com mais veemência no
âmbito ciberespacial deve-se,

16

com efeito, tanto a motivos empíricos peculiares a esse âmbito, quanto
à tendência internacional do espírito

intelectual da época (...)" (TRIVINHO, 2001a, p.67).

10 Como este trabalho tem como objeto apenas o papel do ciberespaço na
reprodução e expansão do

capitalismo, deixaremos de lado o "glocal televisivo" para colocar em
relevo apenas o "glocal interativo".

Na economia deste texto, as referências ao "Glocal" serão, portanto,
extensivas apenas a essa última

modalidade.

11 Essa expansão é um dos pontos centrais da obra de Norberto Bobbio.
Veja-se BOBBIO, 1992.

12 "O que chamamos de intervenção moral é praticado hoje por uma
variedade de entidades, incluindo os

meios de comunicação e organizações religiosas, mas as mais
importantes talvez sejam as chamadas

organizações não-governamentais, as quais, justamente por não serem
administradas diretamente por

governos, entende-se que agem a partir de imperativos éticos ou
morais". (HARDT e NEGRI, 2000, p. 54).

13 Há aqui todo um processo que pode ser identificado com o conceito
de "Habitus" de Bordieu (2004). Na

verdade, trata-se de um "Habitus glocalizado", no qual os pressupostos
e o "não-pensado" da ação cotidiana

são constituídos a partir desta fusão entre vivência local e global.

14 Considera-se, no âmbito deste trabalho, o conceito de "legitimidade
específica" de Bobbio, Matteuci e

Pasquino, ou seja" (...) um atributo do Estado, que consiste na
presença, em uma parcela significativa da

população, de um grau de consenso capaz de assegurar a obediência sem
necessidade de recorrer ao uso da

força, a não ser em casos esporádicos". (BOBBIO, MATEUCCI E PASQUINO,
2000, p. 675 - 679).

15 Sobre as relações entre corpo e poder veja-se FOUCAULT, 1979,
principalmente cap. IX.

16 Daí a abundância de idéias sobre o "Capital Social" e "Capital
Cognitivo" associadas às redes. Trata-se de

submeter sociabilização e cognição à lógica da mercadoria, reificação
balizada pela troca mercantil.

17 Um exemplo claro deste processo é o funcionamento dos "blogs", nos
quais um "usuário" é o responsável

pela produção de signos que serão consumidos por outro. A empresa que
mantém a estrutura técnica é

apenas uma intermediária entre esses dois pólos, capitalizando a
atenção e valorizando o próprio capital

simbólico. O número de "usuários" cadastrados é o produto, muitas
vezes vendido ao mercado publicitário.

18 A própria idéia de "imersão" tende a arrefecer diante das
tecnologias de glocalização portáteis, como o

celular. Neste panorama, o glocal já não é "ambiente", mas prótese,
situado a distância zero (ou

tendencialmente zero) do corpo (TRIVINHO, 2001b).

19 Pode-se inferir que o "Império" é um momento do glocal, a saber, a
sua face político-econômica. O

"Império" não poderia existir sem a infraestrutura simbólica e física
do glocal.

20 Ver acima.

21 Daí todos os esforços que se vê para a "inclusão digital", ou seja,
para aproximar, valendo-se de uma

noção imprecisa de democracia, todos os cidadãos de um modelo pré-
concebido de usuário. Ver

CAZELOTO, 2003.

22 Hardt e Negri também alertam para nova modalidade de produção de
subjetividades no contexto do

"Império", mostrando como essa produção se alterou nas sociedades
contemporâneas. A análise, inspirada

em Foucault, mostra que os centro de subjetivação migraram das
instituições fechadas para a totalidade do

terreno social (HARDT e NEGRI, 2000, p. 215 - 217).

23 A idéia de sujeito fractalizado deriva de RÜDIGER, 2002.

24 O conceito de megatecnoburocracia pode ser encontrado em TRIVINHO,
2001b, p. 213 e 214 . Em outra

passagem, o autor a denomina como megainfoburocracia e a conceitua
como "a instância sociotécnica

descentrada e rizomática responsável pela informatização,
virtualização e ciberespacialização das

sociedades contemporâneas" (TRIVINHO, 2001a, p. 79).

25 Como notou Lessig, o código é lei. A megatecnoburocracia prevê as
condições de uso de seus produtos

no momento em que são desenhados, de maneira que as possibilidades de
apropriação já estão inscritas nas

próprias máquinas e softwares. Quando ocorre algum "uso desviado", no
entanto, entram em cena os

lobbies para imputar como crime ou contravenção as "brechas" deixadas
pela codificação. Ver LESSIG,

2000.

26 Sobre a construção de novas necessidades imperativas e valores
sociais no âmbito da cibercultura, ver

TRIVINHO, 2003.

27 Para uma visão do glocal como obliteração do político ver TRIVINHO,
2001a, p. 84-89.

28 Mesmo os autores franceses, que preferem o termo "mundialização",
estão atentos à centralidade dos

processos comunicacionais nos fluxos de capital. Veja-se CHESNAIS,
1996.

17

BIBLIOGRAFIA

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18

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___________. Cibercultura, sociossemiose e morte: sobrevivência em
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dromocrático. São Paulo: 2003. 28 p. Cópia reprográfica.

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