Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da constituição dos sentidos

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Hannah BLUE

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15 de jan. de 2008, 22:18:0115/01/2008
para Midiateca da HannaH
Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da
constituição dos sentidos


Wanda Maria Junqueira Aguiar*, Sergio Ozella**
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo




RESUMO

O artigo tem como objetivo instrumentalizar o pesquisador, segundo a
abordagem da Psicologia sociohistórica, nos procedimentos de análise
de material qualitativo, visando a apreender os sentidos que
constituem o conteúdo do discurso dos sujeitos informantes através do
que chamamos de núcleos de significação. Na primeira parte, é feita
uma retomada de aspectos teórico-metodológicos desenvolvidos a partir,
basicamente, de Vigotski, tais como a importância de um método
materialista histórico e dialético, as categorias linguagem e
pensamento e as noções de significado e sentido, necessidades e
motivos. Na segunda parte, propomos algumas etapas de procedimento de
organização e análise do material levantado, particularmente através
de entrevistas, visando a chegar aos núcleos de significação no
caminho da apreensão dos sentidos e da subjetividade dos informantes.
Destacamos três etapas: pré-indicadores, indicadores e núcleos de
significação. Complementando o texto, ilustramos os procedimentos
propostos com uma dissertação de mestrado e uma tese de doutorado
orientadas pelos autores, no sentido de visualizar a análise dos
núcleos de significação.


<><><>

Para iniciarmos nossa discussão sobre a categoria sentido e suas
implicações metodológicas, torna-se necessário, inicialmente, que se
destaque, mesmo que brevemente, alguns aspectos teórico-metodológicos
desenvolvidos especialmente por Vigotski, como : a importância de um
método materialista dialético, as categorias linguagem e pensamento e
as noções de significado e sentido.

Desde 1927, quando escreve O Significado Histórico da Crise da
Psicologia - uma Investigação Metodológica, Vigotski destaca a
importância de um método que desse conta da complexidade do que
entendia como objeto da Psicologia, ou seja, o Homem e suas funções
psicológicas. Fica evidente que a Psicologia seria impotente para
superar as tarefas práticas que se lhe apresentavam se não contasse
com uma infra-estrutura lógico- metodológica própria. Revela-se, dessa
forma, nas reflexões do autor, a necessidade de uma teoria que fizesse
a mediação entre o método materialista histórico e os fenômenos
psíquicos. Vejamos: ainda nesse texto, o autor afirma ter a clareza de
que não padece de mania de grandeza, pensando que a história começa
com ele, mas tem a pretensão de realizar a Psicologia como ciência. A
ciência, nessa perspectiva, deve ter como pedra angular a idéia da
inseparabilidade do lógico, da base material, da dialética e do
histórico. Dessa forma, concordamos com Vigotski quando este afirma
que a tarefa daqueles que pretendem aplicar o marxismo à ciência deve
ser a de elaborar um método, "...um sistema de procedimentos
mediadores concretos de organização dos conhecimentos que podem ser
aplicados precisamente à escala dessa ciência.....A dialética
( metodologia) é chamada a reproduzir, no plano do cognitivo, a
dialética objetiva do psiquismo (1996, p.471).

Sem a intenção de nos determos na análise dos aspectos que definem tal
método, destacamos, como decorrência da adoção dessa perspectiva
metodológica, a crítica radical das visões reducionistas, objetivistas
e subjetivistas, 1 a discussão sobre a relação aparência - essência,
parte - todo, a importância da noção de historicidade, de processo e a
noção de mediação.2

Desse modo, frisamos que nossa reflexão metodológica sobre a apreensão
dos sentidos estará pautada numa visão que tem no empírico seu ponto
de partida, mas a clareza de que é necessário irmos além das
aparências, não nos contentarmos com a descrição dos fatos, mas
buscarmos a explicação do processo de constituição do objeto estudado,
ou seja, estudá-lo no seu processo histórico. No entanto, ao nos
referirmos aos pontos essenciais a serem considerados sobre o método,
não podemos deixar de mencionar a impossibilidade de se construir um
método alheio a uma concepção de homem. Assim, falamos de um homem
constituído numa relação dialética com o social e com a História,
sendo, ao mesmo tempo, único, singular e histórico. Esse homem,
constituído na e pela atividade, ao produzir sua forma humana de
existência, revela - em todas as suas expressões -, a historicidade
social, a ideologia, as relações sociais, o modo de produção. Ao mesmo
tempo, esse mesmo homem expressa a sua singularidade, o novo que é
capaz de produzir, os significados sociais e os sentidos subjetivos.
Indivíduo e sociedade vivem uma relação na qual se incluem e se
excluem ao mesmo tempo. Quando afirmamos se incluem, lembramos
Vigotski (2001), quando afirma que o indivíduo é "quase o social";
para ele, não há invenções individuais no sentido estrito da palavra.
Em todas, existe sempre alguma colaboração anônima. E, quando
afirmamos se excluem, se diferenciam, destacamos a singularidade do
sujeito. Entendemos, dessa forma, que indivíduo e sociedade não mantêm
uma relação isomórfica entre si, mas uma relação onde um constitui o
outro. Concordamos quando Vigotski (1999) afirma que o Processo de
Internalização deveria ser chamado de "Processo de Revolução",
pressupondo uma radical reestruturação da atividade psíquica nesse
movimento chamado de Internalização.

Ainda nos detendo na questão metodológica, vemos a necessidade de
apresentar uma breve discussão sobre a categoria mediação, dada sua
importância para a perspectiva adotada. O uso dessa categoria nos
permite romper as dicotomias interno-externo, objetivo-subjetivo,
significado-sentido, assim como afastar-nos das visões naturalizantes,
baseadas numa concepção de homem fundada na existência de uma essência
metafísica. Por outro lado, possibilita-nos uma análise das
determinações inseridas num processo dialético, portanto, não causal,
linear e imediato, mas no qual as determinações são entendidas como
elementos constitutivos do sujeito, como mediações.

A apreensão do homem, como nos lembra Vigotski (2001), dar-se-á pela
compreensão da gênese social do individual, "pela compreensão de como
a singularidade se constrói na universalidade e, ao mesmo tempo e do
mesmo modo, como a universalidade se concretiza na singularidade,
tendo a particularidade como mediação" (Oliveira, 2001, p.1).
Entendemos, desse modo, que o homem, ser social e singular, síntese de
múltiplas determinações, nas relações com o social (universal),
constitui sua singularidade através das mediações sociais
(particularidades/circunstâncias específicas).3

Assim, ao falarmos em mediação, referimo-nos, como afirma Severino, "a
uma instância que relaciona objetos, processos ou situações entre si;
a partir daí, o conceito designará um elemento que viabiliza a
realização de outro que, embora distinto dele, garante a sua
efetivação, dando-lhe concretude" (2002, p. 44). A categoria mediação
não tem, portanto, a função de apenas ligar a singularidade e a
universalidade, mas de ser o centro organizador objetivo dessa
relação. Ao utilizarmos a categoria mediação, possibilitamos a
utilização, a intervenção de um elemento/um processo, em uma relação
que antes era vista como direta, permitindo-nos pensar em objetos/
processos ausentes até então. Assim, como já colocamos acima,
subjetividade e objetividade, externo e interno, nessa perspectiva,
não podem ser vistos numa relação dicotômica e imediata, mas como
elementos que, apesar de diferentes, se constituem mutuamente,
possibilitando um a existência do outro numa relação de mediação.
Nossa tarefa, portanto, é apreender as mediações sociais constitutivas
do sujeito, saindo assim da aparência, do imediato, e indo em busca do
processo, do não dito, do sentido. Colocadas essas questões
metodológicas, destacamos, como uma questão preliminar para a
discussão dos sentidos e significados, a relação pensamento -
linguagem.

Muitos autores têm debatido esse tema; assim, faremos uma breve
retomada de alguns pontos essenciais para essa discussão.

Retomando nossas reflexões sobre a constituição dialética do homem,
podemos afirmar que o plano individual não constitui mera transposição
do social. O indivíduo modifica o social, transforma o social em
psicológico e, assim, cria a possibilidade do novo. Isso posto,
podemos afirmar que a linguagem seria o instrumento fundamental nesse
processo de constituição do homem. "Os Signos, entendidos como
instrumentos convencionais de natureza social, são os meios de contato
com o mundo exterior e também do homem consigo mesmo e com a própria
consciência" (Aguiar, 2000, p. 129).4

Assim, os signos, instrumentos psicológicos, são constitutivos do
pensamento não só para comunicação, mas também como meio de atividade
interna. A palavra, signo por excelência, representa o objeto na
consciência. Podemos, desse modo, afirmar que os signos representam
uma forma privilegiada de apreensão do ser, pensar e agir do sujeito.

Como afirma Vigotski, "O Pensamento não se exprime na palavra, mas
nela se realiza" (2001, p.409), podendo, muitas vezes, "o pensamento
fracassar", não se realizando como palavra. Dessa forma, para que se
possa compreender o pensamento, entendido aqui como sempre emocionado,
temos que analisar seu processo, que se expressa na palavra com
significado e, ao apreender o significado da palavra, entendemos o
movimento do pensamento.

Temos, assim, que a relação pensamento-linguagem não pode ser outra
que não uma relação de mediação, na qual, ao mesmo tempo em que um
elemento não se confunde com o outro, não pode ser compreendido sem o
outro, onde um constitui o outro.

O pensamento passa, portanto, por muitas transformações para ser
expresso em palavras, de modo a concluir-se que a transição do
pensamento para a palavra passa pelo significado e o sentido. Dessa
forma, podemos afirmar que a compreensão da relação pensamento/
linguagem passa pela necessária compreensão das categorias significado
e sentido.

Isso posto, destacamos a necessidade da discussão das categorias
significado e sentido. Apesar de optarmos iniciar pela discussão da
categoria significado, faz-se necessário explicitar que essas duas
categorias, apesar de serem diferentes, de não perderem sua
singularidade (fato que nos leva a discuti-las em separado), não podem
ser compreendidas descoladas uma da outra, pois uma não existe sem a
outra.

Segundo Vigotski, (2001), o significado, no campo semântico,
corresponde às relações que a palavra pode encerrar; já no campo
psicológico, é uma generalização, um conceito.

Na verdade, o homem transforma a natureza e a si mesmo na atividade, e
é fundamental que se entenda que esse processo de produção cultural,
social e pessoal tem como elemento constitutivo os significados. Dessa
maneira, a atividade humana é sempre significada: o homem, no agir
humano, realiza uma atividade externa e uma interna, e ambas as
situações (divisão essa somente para fins didáticos) operam com os
significados. Nessa perspectiva, Vigotski (2001) lembra que o que
internalizamos não é o gesto como materialidade do movimento, mas a
sua significação, que tem o poder de transformar o natural em
cultural.

Os significados são, portanto, produções históricas e sociais. São
eles que permitem a comunicação, a socialização de nossas
experiências. Muito embora sejam mais estáveis, "dicionarizados", eles
também se transformam no movimento histórico, momento em que sua
natureza interior se modifica, alterando, em conseqüência, a relação
que mantêm com o pensamento, entendido como um processo.

Os significados referem-se, assim, aos conteúdos instituídos, mais
fixos, compartilhados, que são apropriados pelos sujeitos,
configurados a partir de suas próprias subjetividades.

Ao discutir significado e sentido, é preciso compreendê-los como
constituídos pela unidade contraditória do simbólico e do emocional.
Dessa forma, na perspectiva de melhor compreender o sujeito, os
significados constituem o ponto de partida: sabe-se que eles contêm
mais do que aparentam e que, por meio de um trabalho de análise e
interpretação, pode-se caminhar para as zonas mais instáveis, fluidas
e profundas, ou seja, para as zonas de sentido. Afirma-se, assim, que
o sentido é muito mais amplo que o significado, pois o primeiro
constitui a articulação dos eventos psicológicos que o sujeito produz
frente a uma realidade. Como coloca Gonzalez Rey (2003), o sentido
subverte o significado, pois ele não se submete a uma lógica racional
externa. O sentido refere-se a necessidades que, muitas vezes, ainda
não se realizaram, mas que mobilizam o sujeito, constituem o seu ser,
geram formas de colocá-lo na atividade. O sentido deve ser entendido,
pois, como um ato do homem mediado socialmente. A categoria sentido
destaca a singularidade historicamente construída. Como coloca Namura,

"A análise da relação do sentido com a palavra mostrou que o sentido
de uma palavra nunca é completo, é determinado, no fim das contas, por
toda a riqueza dos momentos existentes na consciência.[....]o sentido
da palavra é inesgotável porque é contextualizado em relação à obra do
autor, mas também na compreensão do mundo e no conjunto da estrutura
interior do indivíduo" (2003, p.185).

Fica evidenciada, desse modo, a complexidade de tal categoria, fato
que, sem dúvida, gera grande dificuldade nas formas de apreendê-la. No
entanto, é esse o caminho que nos propomos a seguir: apreender o
processo constitutivo dos sentidos bem como os elementos que engendram
esse processo. Queremos apropriar-nos daquilo que diz respeito ao
sujeito, daquilo que representa o novo, que, mesmo quando não colocado
explícita ou intencionalmente, é expressão do sujeito, configurado
pela unicidade histórica e social do sujeito, revelação das suas
possibilidades de criação.

O sentido coloca-se em um plano que se aproxima mais da subjetividade
que com mais precisão expressa o sujeito, a unidade de todos os
processos cognitivos, afetivos e biológicos. No entanto, dada a sua
complexidade, afirmamos como nossa possibilidade aproximarmo-nos de
algumas zonas de sentido.

Para que se possa melhor compreender a categoria sentido, retomamos um
dos princípios do materialismo dialético: a unidade contraditória
existente na relação simbólico - emocional. Para se avançar na
compreensão do homem, ou melhor dizendo, dos seus sentidos, temos que,
nas nossas análises, considerar que todas as expressões humanas sejam
cognitivas e afetivas.

Concordamos com González Rey (2003) ao afirmar que o pensamento é um
processo psicológico, não só por seu caráter cognitivo, mas por ser
sentido subjetivo, pelas significações e emoções que se articulam em
sua expressão.5

Como afirma Heller, "...não pode haver um rosto completamente
desprovido de expressão" (1986, p .74). Segundo a autora (1986), o
sentir - seja positiva ou negativamente, sempre significa estar
implicado em algo; a implicação vai, assim, ser vista como um fator
constitutivo e inerente do atuar e do pensar. As emoções não podem,
assim, ser vistas como passivas, como epifenômenos. Em Teoria da
Emoções, Vygotski, citando Spinosa, destaca o aspecto fundamental e
constitutivo dos afetos: "...afetos são estados corporais que aumentam
ou diminuem a capacidade do corpo para a ação, favorecem-na ou limitam-
na, assim como as idéias que se tem sobre esses estados"( 2004, p.16).

Na perspectiva adotada, portanto, a separação entre pensamento e afeto
jamais poderá ser feita, sob o risco de fechar-se definitivamente o
caminho para a explicação das causas do próprio pensamento, pois a
análise do pensamento pressupõe necessariamente a revelação dos
motivos, necessidades e interesses que orientam o seu movimento. Desse
modo, além de apontarmos a relação dialética entre o aspecto afetivo e
o simbólico, destacamos a importância de agregarmos a noção de
necessidade e motivos para a compreensão do sujeito e, assim, dos
sentidos. Isso posto, vemos como importante, mesmo que de maneira
breve, apresentarmos algumas reflexões feitas no campo da Psicologia
sociohistórica sobre esses conceitos. As necessidades são entendidas
como um estado de carência do indivíduo que leva a sua ativação com
vistas a sua satisfação, dependendo das suas condições de existência.
Temos, assim, que as necessidades se constituem e se revelam a partir
de um processo de configuração das relações sociais, processo esse que
é único, singular, subjetivo e histórico ao mesmo tempo. Além disso, é
fundamental ressaltar que, pelas características do processo de
configuração, o sujeito não necessariamente tem o controle e, muitas
vezes, a consciência do movimento de constituição das suas
necessidades. Assim, tal processo só pode ser entendido como fruto de
um tipo específico de registro cognitivo e emocional, ou seja, a
constituição das necessidades se dá de forma não intencional, tendo
nas emoções um componente fundamental. Pode-se dizer que tais
registros constitutivos das necessidades não são necessariamente
provenientes das significações, podendo constituir-se em afecções que
ainda não foram significadas. Como coloca González Rey, "Se a emoção
diz não, os meios não estão disponíveis.... A emoção é que define a
disponibilidade dos recursos subjetivos do sujeito para atuar" (2003,
p. 245).

Evidencia-se, desse modo, a complexidade desse processo, marcado
especialmente pela força dos registros emocionais, geradores de um
estado de desejo, de tensão, que mobiliza o sujeito, que cria
experiências afetivas que, como atividade psíquica, têm papel
regulador. Esse estado emocional, que mobiliza, que, como nos aponta
González Rey, "...caracteriza o estado do sujeito ante toda a ação
fundamental" (2003, p.242), deve ser analisado para chegarmos aos
sentidos. Mas ainda falta um elo. Essas necessidades, vividas como
estado dinâmico, ainda não dão uma direção ao comportamento. Esse
processo, de ação do sujeito no mundo a partir das suas necessidades,
só vai completar-se quando o sujeito significar algo do mundo social
como possível de satisfazer suas necessidades. Aí sim, esse objeto/
fato/pessoa vai ser vivido como algo que impulsiona/direciona, que
motiva o sujeito para a ação no sentido da satisfação das suas
necessidades. Tal movimento, ou seja, a possibilidade de realizar uma
atividade que vá na direção da satisfação das necessidades, com
certeza modifica o sujeito, criando novas necessidades e novas formas
de atividade. Afirmamos, assim, que a necessidade não conhece seu
objeto de satisfação, ela completa sua função quando o "descobre" na
realidade social. Entendemos que esse movimento se define como a
configuração das necessidades em motivos. Com isso, estamos dizendo
que os motivos se constituirão como tal somente no encontro com o
sujeito, no momento que o sujeito o configurar como possível de
satisfazer as suas necessidades.

Ao se apreender o processo por meio do qual os motivos se configuram,
avança-se na apropriação do processo de constituição dos sentidos,
definidos como a melhor síntese do racional e do emocional. Aproximamo-
nos, dessa forma, do processo gerador da atividade, ao mesmo tempo
gerado por ela. Apreendemos o que é a atividade para o sujeito, e,
assim, algumas zonas de sentidos da atividade, claro que atravessadas
pelos significados, mas, no caso, revelando uma forma singular de vivê-
las e articulá-las.

A apreensão dos sentidos não significa apreendermos uma resposta
única, coerente, absolutamente definida, completa, mas expressões do
sujeito muitas vezes contraditórias, parciais, que nos apresentam
indicadores das formas de ser do sujeito, de processos vividos por
ele.

Sabemos o quão difícil é sua apreensão; ele não se revela facilmente,
não está na aparência; muitas vezes, o próprio sujeito o desconhece,
não se apropria da totalidade de suas vivências, não as articula.

Não podemos esquecer que o pensamento, sempre emocionado, não pode ser
entendido como algo linear, fácil de ser captado; não é algo pronto,
acabado. É interessante quando Vigotski afirma que o pensamento muitas
vezes termina em fracasso, não se converte em palavras. Com essa
afirmação, podemos entender que vivências ocorrem, que um processo
está ocorrendo, mas que não se expressa claramente, ou nem é
significado claramente, objetivamente, e, assim, podemos concluir que
as vivências são muito mais complexas e ricas do que parecem.

Então, como apreendê-las?

Que caminho nos conduziria a tal tarefa?



Procedimentos para análise através dos núcleos de significação

Antes de entrarmos no tema da análise, consideramos adequada a
apresentação de alguns apontamentos sobre a "coleta" de material a ser
analisado, isto é, os procedimentos e instrumentos recomendados para
uma investigação dentro da abordagem sociohistórica. Não são
procedimentos ou instrumentos exclusivos, mas fundamentais para os
nossos objetivos dentro de uma proposta de pesquisa qualitativa.6

Neste artigo, trabalharemos com entrevistas, do nosso ponto de vista,
um dos instrumentos mais ricos e que permitem acesso aos processos
psíquicos que nos interessam, particularmente os sentidos e os
significados. Sem a pretensão de ampliar uma discussão sobre esse
método de coleta, gostaríamos de atentar para algumas características
que marcam esse instrumento e que, sem dúvida, interferem no seu
potencial de captação ou apreensão dos sentidos e significados
buscados.

* as entrevistas devem ser consistentes e suficientemente amplas, de
modo a evitar inferências desnecessárias ou inadequadas;

* elas devem ser recorrentes, isto é, a cada entrevista, após uma
primeira leitura, o informante deverá ser consultado no sentido de
eliminar dúvidas, aprofundar colocações e reflexões e permitir uma
quase análise conjunta do processo utilizado pelo sujeito para a
produção de sentidos e significados;

* mesmo considerando que uma boa entrevista possa contemplar material
suficiente para uma análise, se houver condições, alguns outros
instrumentos podem permitir aprimoramento e refinamento analítico.
Para isso, recomenda-se um plano de observação no processo das
entrevistas, tanto para captar indicadores não verbais como para
complementar e parear discursos e ações que estejam nos objetivos da
investigação.

Outros instrumentos úteis e possíveis de utilização: relatos escritos,
narrativas, história de vida, frases incompletas, autoconfrontação,
vídeo-gravação e, inclusive, questionários ou desenhos, desde que
sejam complementados e aprofundados através de entrevistas.



Leitura flutuante e organização do material

Os pré-indicadores

Consideramos que a palavra com significado seja a primeira unidade que
se destaca no momento ainda empírico da pesquisa. Partimos dela sem a
intenção de fazer mera análise das construções narrativas, mas com a
intenção de fazer uma análise do sujeito. Assim, temos que partir das
palavras inseridas no contexto que lhes atribui significado,
entendendo aqui como contexto desde a narrativa do sujeito até as
condições histórico-sociais que o constituem.

Tendo o material gravado e transcrito, iniciamos várias leituras
"flutuantes", para que possamos, aos poucos, nos familiarizar, visando
a uma apropriação do mesmo. Essas leituras nos permitem destacar e
organizar o que chamaríamos de pré-indicadores para a construção dos
núcleos futuros. Irão emergindo temas os mais diversos, caracterizados
por maior freqüência (pela sua repetição ou reiteração), pela
importância enfatizada nas falas dos informantes, pela carga emocional
presente, pelas ambivalências ou contradições, pelas insinuações não
concretizadas, etc. Geralmente, esses pré-indicadores são em grande
número e irão compor um quadro amplo de possibilidades para a
organização dos núcleos. Um critério básico para filtrar esses pré-
indicadores é verificar sua importância para a compreensão do objetivo
da investigação.



Os indicadores e conteúdos temáticos

Uma segunda leitura permitirá um processo de aglutinação dos pré-
indicadores, seja pela similaridade, pela complementaridade ou pela
contraposição, de modo que nos levem a menor diversidade; já no caso
dos indicadores, que nos permitam caminhar na direção dos possíveis
núcleos de significação. Esses critérios para aglutinação não são
necessariamente isolados entre si. Por exemplo, alguns indicadores
podem ser complementares pela semelhança do mesmo modo que pela
contraposição: um fato identificado como pré-indicador, ao ser
aglutinado, pode indicar o caráter impulsionador/motivador para ação
em uma determinada condição. Inversamente, o mesmo fato pode funcionar
como paralisador da ação em outro momento, mas ambos podem ser
indicadores importantes no processo de análise.

Esse procedimento tem analogia com o que coloca Vigotski (1998, p.182)
quando fala das peculiaridades semânticas da fala interior e destaca a
aglutinação como uma delas: "Quando diversas palavras se fundem numa
única, a nova palavra não expressa apenas uma idéia de certa
complexidade, mas designa todos os elementos isolados contidos nessa
idéia".

Tentaremos aqui ilustrar com exemplos esse processo, que resultará de
dois elementos: os indicadores e sua relação com situações ou
conteúdos temáticos. Um exemplo que pode esclarecer a organização de
pré-indicadores e indicadores pode ser encontrado no Anexo 1.

A partir dos pré-indicadores identificados, podemos avançar para
indicadores do tipo: violência, drogas, gravidez, sexualidade,
família, escola, consumismo, religiosidade, medo, alegria, tristeza,
prazer, etc. Entretanto, tais indicadores podem ter significados
diferentes dentro de condições específicas (lembrem-se dos critérios
de aglutinação citados acima: semelhança, complementaridade,
contraposição). Um indicador como a violência pode ter potências e
coloridos diferentes em condições diversas, tais como: fases ou etapas
de sua trajetória na vida, nas relações com "outros" (família,
trabalho, autoridades, namorada), em experiências de vida, etc. Estes
seriam os conteúdos temáticos junto aos quais os indicadores adquirem
algum significado. De posse desse conjunto (os indicadores e seus
conteúdos), devemos, nesse momento, voltar ao material das entrevistas
e iniciar uma primeira seleção dos trechos que ilustram e esclarecem
os indicadores.

Esse momento já caracteriza uma fase do processo de análise, mesmo que
ainda empírica e não interpretativa, mas que ilumina um início de
nuclearização.



Construção e análise dos núcleos de significação

A construção dos núcleos de significação

A partir da re-leitura do material, considerando a aglutinação
resultante (conjunto dos indicadores e seus conteúdos), iniciamos um
processo de articulação que resultará na organização dos núcleos de
significação através de sua nomeação. Os indicadores são fundamentais
para que identifiquemos os conteúdos e sua mútua articulação de modo a
revelarem e objetivarem a essência dos conteúdos expressos pelo
sujeito. Nesse processo de organização dos núcleos de significação -
que tem como critério a articulação de conteúdos semelhantes,
complementares ou contraditórios -, é possível verificar as
transformações e contradições que ocorrem no processo de construção
dos sentidos e dos significados, o que possibilitará uma análise mais
consistente que nos permita ir além do aparente e considerar tanto as
condições subjetivas quanto as contextuais e históricas. Espera-se,
nessa etapa, um número reduzido de núcleos, de modo que não ocorra uma
diluição e um retorno aos indicadores. É nesse momento que,
efetivamente, iniciamos o processo de análise e avançamos do empírico
para o interpretativo, apesar de todo o procedimento ser, desde o
início da entrevista, um processo construtivo/interpretativo7. Os
núcleos resultantes devem expressar os pontos centrais e fundamentais
que trazem implicações para o sujeito, que o envolvam emocionalmente,
que revelem as suas determinações constitutivas.

Uma sugestão para a nomeação dos núcleos é extrair da própria fala do
informante uma ou mais de suas expressões, de modo a compor uma frase
curta que reflita a articulação realizada na elaboração dos núcleos e
que explicite o processo e o movimento do sujeito dentro dos objetivos
do estudo.



A análise dos núcleos

A análise se inicia por um processo intra-núcleo, avançando para uma
articulação inter-núcleos. Em geral, esse procedimento explicitará
semelhanças e/ou contradições que vão novamente revelar o movimento do
sujeito. Tais contradições não necessariamente estão manifestas na
aparência do discurso, sendo apreendidas a partir da análise do
pesquisador. Do mesmo modo, o processo de análise não deve ser
restrito à fala do informante, ela deve ser articulada (e aqui se
amplia o processo interpretativo do investigador) com o contexto
social, político, econômico, em síntese, histórico, que permite acesso
à compreensão do sujeito na sua totalidade.

Como nos lembra Vigotski (1998), um corpo só se revela no movimento.
Assim, só avançaremos na compreensão dos sentidos quando os conteúdos
dos núcleos forem articulados. Nesse momento, temos a realização de um
momento da análise mais complexo, completo e sintetizador, ou seja,
quando os núcleos são integrados no seu movimento, analisados à luz do
contexto do discurso em questão, à luz do contexto socio- histórico, à
luz da teoria.

Parece-nos importante insistir que o procedimento adotado visa a
avançarmos do empírico para o interpretativo, isto é, da fala para o
seu sentido, entendendo que vamos em busca da fala interior, ou seja,
a partir da fala exterior caminhamos para um plano mais interiorizado,
para o próprio pensamento (Vigotski, 1998, p.185).

Caminhando na compreensão dos sentidos, relembramos a importância da
análise das determinações constitutivas do sujeito, e, para isso, é
importante apreendermos as necessidades, de alguma forma colocadas
pelos sujeitos e identificadas a partir dos indicadores. Entendemos
que tais necessidades são determinantes/constitutivas dos modos de
agir/sentir/pensar dos sujeitos. São elas que, na sua dinamicidade
emocional, mobilizam os processos de construção de sentido e, é claro,
as atividades do sujeito.

Para tentarmos deixar mais claro o processo por nós utilizado na
análise de pesquisas por intermédio dos núcleos de significação,
faremos uso de alguns exemplos retirados de dissertações e teses de
alunos que estiveram sob nossa orientação nos programas de estudos pós-
graduados em Psicologia social e Psicologia da educação da Pucsp. Os
exemplos não pretendem ser modelos concluídos e irrepreensíveis do
processo. Seu objetivo é ilustrar o processo, mesmo apresentando uma
ou outra falha, já que cada análise é única e encontra-se dentro de um
momento contínuo de construção e aprimoramento.

Serão utilizados dois trabalhos. Inicialmente, referir-nos-emos à tese
de doutorado de Célia Ferreira Novaes, As determinações sociais no
problema da escolha profissional: contradições e angústias nas opções
dos jovens das classes sociais de alta renda, desenvolvida no Programa
de Psicologia social, em 2003, sob orientação do professor Sergio
Ozella. Em seguida, ilustraremos com a dissertação de mestrado de
Agnes Maria Gomes Murta, de 2004, no Programa de Psicologia da
educação, orientada pelo professora Wanda Maria Junqueira de Aguiar,
Contribuições da Psicologia sociohistórica para a educação inclusiva.

Cada uma delas teve razões específicas para ser escolhida como exemplo
e não necessariamente ilustram de maneira perfeita todo o processo,
mas servem como referência para ao menos uma das etapas identificadas
no início desta seção.

Novaes, Célia Ferreira - As determinações sociais no problema da
escolha profissional: contradições e angústias nas opções dos jovens
de classes sociais de alta renda.

Como apresenta logo no início de seu resumo, Célia pretendeu, com seu
estudo, "compreender as contradições existentes na construção de
problema da escolha profissional, geradoras de sofrimento nos
adolescentes das classes sociais e econômicas de alta renda..." e
completa, no seu capítulo metodológico, que o fará através da
apreensão do "conjunto de significados e sentidos que compõem a
construção do problema da escolha profissional" (p. 116).

A autora justifica o interesse em estudar a população de alta renda da
seguinte maneira: "Em geral, encontramos trabalhos relativos ao
sofrimento daqueles que não dispõem de muitas possibilidades de
escolhas profissionais, constituídos pelos grupos sociais onde se
concentra a parcela da população economicamente carente ou
marginalizada, excluída da educação formal de qualidade e de um
conjunto de condições que facilitam o acesso às melhores oportunidades
de trabalho.[...] Entretanto, esses jovens (de classe alta) estão
também sendo forjados nesta mesma sociedade de cuja dinâmica extraem
os elementos a partir dos quais constroem os ideais e valores que
respaldam suas ações, enquanto agentes privilegiados que contribuirão,
no exercício de suas profissões, para o processo de construção desta
mesma sociedade.[...] A classe social é uma referência a valores que
definem possibilidades, limites e contradições [grifo nosso]" (p. 4).

O sujeito da investigação foi um jovem (Rafael) em processo de
orientação profissional na Puc-RJ. Cursava o 3º ano do ensino médio em
uma escola bilíngüe da zona sul da cidade. Pertencia a uma família de
altíssimo nível socioeconômico, residia em um condomínio fechado e
tinha sido alfabetizado na Europa. O material foi resultado de
entrevistas individuais ocorridas durante as sessões de orientação
profissional, que compuseram um total de 15 encontros.

A partir da organização das entrevistas, que resultaram nos
indicadores e nos conteúdos importantes para o objetivo do estudo,
Célia construiu seis núcleos de significação:

* a realidade que o confunde e incomoda;

* a experiência estética das profissões reificadas;

* a vida sob controle ou o atrevimento do real;

* o prazer como causa e conseqüência;

* as contradições e ambigüidades entre a autonomia protegida e a
rotina sempre nova;

* a condição de impotência do ser natural.

Por problemas de espaço editorial, iremos aqui ilustrar a análise com
apenas um dos núcleos. Entretanto, todos eles, de alguma forma, estão
muito inter-relacionados e imbricados entre si, configurando a
integração pretendida no procedimento proposto anteriormente.



A experiência estética da profissão reificada

Esse núcleo se constituiu a partir das narrativas referentes às duas
profissões que pautavam a dúvida de Rafael: a Medicina e o Direito.

"...acho a Medicina legal porque é a maior adrenalina ...tem sempre um
caso novo ...uma história toda complicada pra gente resolver ...tem
várias pessoas pra resolver junto com você ...você tem a maior galera
pra ajudar você."

Quanto ao Direito, sua referência pode ser identificada como:

"...aquela roupa ridícula ...tem que ler muito, os livros são
enormes ...é muito tudo sozinho ...ali na hora você decide a parada,
tem que convencer as pessoas, e se errar? ...também é uma profissão
poderosa como a Medicina."

... ambas as profissões têm algo em comum, sedutor e glamuroso. São
afirmações explicadas principalmente por imagens, onde a compreensão
do que sejam as profissões se faz a partir de experiências
marcadamente visuais:

"...eu não consigo ver quando tem operação e tiram as partes de dentro
da gente, o cara coloca a mão, não gosto de olhar."

A referência às profissões parece moldada por relações sensíveis,
segundo Rafael, oriundas de filmes da TV, que agradam aos sentidos e
excitam o sujeito.

Rafael se refere à profissão como um produto, cujo uso deve agregar
valor a quem o possui e identificar o sujeito enquanto classe de
consumidor a que pertence:

"...lugar desvalorizado ...num lugar que não te valorizam ...deve ter
coisa melhor que Medicina ...coisa que eu goste mais, me der
melhor" (p.128).

É interessante destacar aqui como a autora conduz sua análise. Célia
articula dados do sujeito, quebra a seqüência cronológica da
entrevista e busca a articulação entre fatos até então não articulados
pelo sujeito, revela relações, e, para isso, recorre, além das
categorias de análise da sociohistórica, a conteúdos de outras áreas
das ciências humanas e sociais para explicar (por exemplo) o poder da
mídia na constituição dos sujeitos.

A autora continua sua análise:

"A escolha se faz sobre um conjunto de profissões-coisas que são
avaliadas pelo seu valor de troca na sociedade, quanto de retorno
poderá ser obtido com sua posse. Há um distanciamento do sujeito com a
função social do exercício das profissões, avaliadas como produtos
para uso, consumo e troca... A hierarquização das profissões, feita
pelas escolas, e o respectivo status daqueles que as escolhem,
participam, também, da configuração desse núcleo de significação.
Assim,

`...Publicidade exige menos estudo do que Medicina ...não é tão
valorizada ...o pessoal de Medicina acha que é melhor que os
outros ...eu também achava.'

O status pessoal é denotado pelo status da profissão reificada, cujo
valor revela o status de quem a possui "(p.128).

Mais adiante, Célia considera o papel da mídia na produção de
significados sobre as profissões. Senão vejamos:

"Rafael compreende a Medicina, antes de tudo, pela simbologia de poder
e glamour que acompanham a apresentação das profissões na mídia, para
a qual só interessam os seus aspectos isolados, quer seja nas
publicidades, nos seriados, filmes ou novelas. A profissão costuma ser
parte do contexto do produto que pretende vender ou do personagem que
a representa, não tendo qualquer antecedente que a comprometa num
tempo histórico ou numa realidade social complexa. A Medicina que é
apresentada por Rafael está destituída de história, são fragmentos de
imagens e movimentos em que estão ausentes os elementos concretos que
constituem as relações de produção e o trabalho. Na verdade, sua
Medicina não está inserida em qualquer relação econômica, tudo é
funcionalmente articulado para o final feliz, isto é, aquele que faz
sentido para o roteiro. Isoladamente, nada é absurdo, mas tudo é
acrítico. Essa experiência guarda uma perigosa proximidade com outros
aspectos do cotidiano de Rafael" (p.139).

Outro destaque a ser feito se refere ao uso da literatura, não se
prendendo apenas às falas do sujeito, para justificar, e, dessa forma,
ampliar e contextualizar suas considerações. "Rocha (1995)8 nos mostra
que a sociedade na mídia é uma sociedade de abundância, resolvida e
absolutamente bem sucedida economicamente, sem nenhuma ênfase no
trabalho para que isso aconteça.[...] Na sociedade apresentada pela
mídia, só se colocam problemas que ela é capaz de solucionar. Há uma
permanente relação entre os desejos e os meios para a sua realização,
negando as condições concretas em que vivemos" (p.139).

A autora continua sua análise, agora contextualizando e teorizando
(sobre) suas reflexões.

"Vários contextos contribuem como processos mediadores da construção
da subjetividade de Rafael, de seus sentidos pessoais sobre o problema
que atravessa e suas possíveis soluções. Suas múltiplas relações
intersubjetivas servem de mediadores para a conversão desses contextos
e seus significados para o plano intra-subjetivo e de sentidos
pessoais de Rafael."... "Compreender a cultura e o conjunto de
relações sociais em que Rafael está inserido e suas atividades
interativas concretas no cotidiano permite-nos compreender os sistemas
de signos que medeiam e configuram o processo de subjetivação de
Rafael, como sente e interpreta a realidade a sua volta" (p.140).

Nesse trecho, vale destacar novamente o cuidado da autora em articular
a construção dos sentidos de seu informante com suas vivências, suas
experiências, como a soma dos eventos psicológicos despertados pela
palavra. Desse modo, fica clara a importância da teoria e da
contextualização para chegarmos aos sentidos entendidos (como dito
anteriormente neste texto) como atos do homem mediados socialmente.

Celia conclui, articulando seus sentidos e significados com o grupo
social onde Rafael está imerso.

"Rafael constrói a experiência do seu grupo social enquanto é por ele
constituído, através das significações que produz a partir das funções
distintivas de sua classe social. Essas funções se realizam por
diversos aspectos, pela posse de determinados objetos, pelo tipo e
forma de consumo e freqüência a lugares e, também, por práticas e
partilhas de significados que são formas de ser e vivências
emocionais, configurando o mundo de Rafael e ensejando novas
experiências reais em sua vida" (p.140).



O prazer como causa e conseqüência

Nesse núcleo, a autora trabalha um dos aspectos centrais no discurso
de Rafael, relacionando-o com o caráter hedonista presente nos jovens,
particularmente nos do segmento socioeconômico de Rafael e que parece
nortear não apenas suas escolhas profissionais mas também sua própria
vida. "Escolher aparece fortemente vinculado ao prazer como critério
decisório e que, ao ser atendido, efetivamente deverá levar a um
resultado igualmente prazeroso. Todo o processo seria um único momento
de um prazer que se expande. A certeza de Rafael de que isso é
possível vem de sua experiência de vida. Frente ao que lhe desagrada,
ele simplesmente não olha, troca de canal, como nas cenas dos filmes
de TV que lhe desagradam ou apenas exclui, como as partes da cidade
onde mora,

`...eu até penso nisso, mas não vejo saída e aí, desligo.'

Afirma que, quando está a fim de alguma coisa, sempre a consegue, seja
passar de ano no colégio, seja um carro novo. Sua preocupação
principal não é com seu desempenho na profissão, mas com a manutenção
de um estado de prazer com o que vai fazer, que, por sua vez, é a
garantia do sucesso. Esse gostar não só deve existir no momento da
escolha como deve manter-se no futuro, condição para que permaneça
exercendo qualquer profissão"(p.129).

A autora enfatiza o caráter e a importância desse núcleo de
significação,

"O prazer como causa e conseqüência, em si mesmo, é essencial em
qualquer avaliação que faz, se constitui na métrica daquilo que ele
observa, analisa, consome e decide, isto é, a realidade é aferida pelo
estado de ânimo que propicia. É ponto de partida, processo e objetivo.
Rafael diz que quer encontrar algo de que goste, e que só assim vai
querer estudar e terá garantido o sucesso e a realização profissional.
Os atributos da profissão deverão fazê-lo sentir-se animado o
suficiente para querer tal profissão. Ele a quer porque ela é uma
garantia de que terá prazer. Pode inclusive não ser a Medicina, pois
indaga sobre se

`...tem alguma coisa que eu possa gostar mais ...que seja melhor pra
mim.'

Mas não pode ser qualquer outra profissão, tem que preencher seus
vários critérios, numa liberdade de escolha que só permite um
resultado - o sucesso em todas as suas nuances" (p.149).

Mais adiante, Célia tenta compreender melhor a questão do compromisso
e do custo-benefício presente nas decisões de Rafael.

"Rafael define a dose de compromisso que está disposto a investir, o
tempo em que permanecerá na sessão e o término dos assuntos abordados.
Tem dificuldade para se comprometer com o outro, despejando
informações, fatos, alegrias e sofrimentos sem se deter sobre sua
própria história.

`...Eu até penso nisso, mas não vejo saída e aí, desligo.'

Mais que um processo de defesa circunstancial, é uma forma de lidar
com a experiência do cotidiano e um estilo de vida. Não lhe ocorre
procurar ou construir saídas que dependam de si mesmo, de sua
persistência ou esforço, pois os mecanismos de delegar as soluções de
seus problemas e o de desligar-se do que não gosta já lhe são
familiares e sempre funcionaram"(p.150). E continua:" Rafael não
pretende deter-se muito tempo sobre os mesmos fatos. Seus momentos
estão sempre repletos de fazeres, exigindo uma dispersão competente
para conseguir, ao mesmo tempo, marcar programas com amigos, resolver
seus problemas de estudo, atender às demandas que lhe chegam pelo
telefone celular, enquanto lida com os próprios sentimentos durante a
nossa relação de orientação. Rafael se liga e se desliga de um assunto
para o outro, num fluxo de fatos e emoções que carecem de reflexão (p.
150).

Rafael configura a escolha profissional de acordo com o seu cotidiano,
que ele não quer ver mudado porque `...minha vida é muito manera.' Não
se trata de querer manter-se criança, muito pelo contrário, a infância
impõe limites e barreiras indesejáveis, mas de ter uma vida adulta
repleta das possibilidades avidamente desejadas, ampliando espaços e
liberdades. Rafael quer ser adulto não com as facilidades infantis que
são muito tímidas para seus anseios, mas com as condições,
possibilidades e ações, sem conseqüências adversas, com as quais
convive no universo dos adultos que o cercam. É um modelo de adultez
que o inspira e não o retorno a modelos infantis (p.150).

A preferência profissional de Rafael, portanto, depende da capacidade
potencial de que algum curso suscite o seu gostar e que lhe permita
vislumbrar sensações novas e prazerosas que, por sua vez, desencadeiem
novos desejos, isto é, a profissão deve atender ao desejo de ser capaz
de desencadear novos desejos e assim sucessivamente. Para Rafael, as
profissões têm que extrair sentido de si mesmas e se autojustificarem,
oferecendo sua própria legitimação em cada momento e proporcionando a
maior satisfação possível. O prazer como causa e conseqüência da
escolha profissional força uma busca ansiosa de Rafael pelo curso que
mais o encante, com garantias de que continuará, no futuro, gostando
da escolha que fizer, `...se eu gostar vai ser legal ...não vou ter
problemas' (p.151).

Subjaz uma configuração de mundo profissional que só o interessa na
medida e extensão em que cumpre uma função sempre realizadora de
prazer. A profissão se apresenta liberta de qualquer compromisso com o
real a sua volta, da mesma forma com que Rafael recorta o mundo que o
interessa e apenas por ele circula. Não se trata apenas de negar a
realidade, mas de subvertê-la, travesti-la numa aparência de
realidade, formando uma ilusão de sociedade adequada a seus propósitos
e onde tudo é igualmente possível, basta querer `...se ele quiser
fazer, que faça', como afirma a mãe de Rafael. O real fica, assim,
submisso, incondicionalmente, a todas as hipóteses que se queira
lançar sobre ele" (p.152).

Novamente vale a pena chamar a atenção para a maneira como a autora
procura compreender e ampliar as considerações do seu sujeito
integrando-o ao contexto ideológico do capitalismo que o cerca e
determina seus significados e sentidos, bem como o movimento de
transformação e de contradição que pode estar em processo a partir das
discussões com a pesquisadora.

"Rafael convive e partilha da requerida flexibilidade para a mudança e
do afrouxamento das interdições nos deslocamentos, acompanhando as
práticas econômicas e as perspectivas de emprego. Saber-se móvel é
agora uma qualidade que Rafael deve cultivar, porque necessita dela
para cumprir suas metas de sucesso profissional, mas sente, com
apreensão, a conseqüente deriva interior. A lógica do capital
flexível, deslocada para trabalhadores igualmente flexíveis e
contingenciais, que possam ir e vir, fluindo pelos lugares sem
acusarem danos ou sofrimentos, encontra Rafael relutante em desprender-
se do próprio passado. Nesse momento de escolha, a flexibilidade
implica tanto riscos e perdas quanto soluções (p.154). Dá-se conta de
que, na vida, as coisas não funcionam como na prova do vestibular que
fez no ano anterior, só `...fiz para ver como era ...fazer de conta
sem ter que ficar nervoso.' No que concerne a sua escolha, além de não
ter um script, Rafael compreende que nem tudo pode ser ensaiado.
Situações imprevisíveis constituem o tipo da novidade que ele teme,
aquelas que podem expor o real que não o interessa e que fogem ao seu
controle. Se falar em um projeto de vida a seguir, soa pouco atrativo
porque retira a possibilidade de ser flexível e plural; fora dele,
surge a insegurança. Rafael necessita sentir-se seguro, protegido e
ciente de que está definitivamente certo naquilo que faz, mas suspeita
que não terá as certezas sobre o caminho que escolher antes de
percorrê-lo. Dá-se conta, também, de que sua liberdade de escolha é,
ao mesmo tempo, gratificante e dolorosa" (p. 154).

Nas considerações finais, a autora reafirma seus objetivos e faz uma
síntese de suas pretensões e do que foi atingido na sua investigação.

"Pretendemos, neste trabalho, chamar a atenção também para a
importância de acompanharmos os movimentos e as transformações que vêm
alterando as relações dos jovens com a educação, a informação e a
escola de ensino médio, especialmente como instituição garantidora de
empregos. Sem uma perspectiva crítica desse complexo relacionamento,
perdemos a possibilidade de compreender o que significa a educação
formal da escola para esses jovens, cuja insatisfação aponta um
esvaziamento do ensino médio, percebido como um curso de passagem e
tempo de sofrimento, destituído de significado próprio e sem utilidade
outra que não seja, ao terminá-lo, conseguir passar para uma
universidade, escamoteando-se todas as contradições desse relativo
sucesso (pp.161/162).

Nossa pesquisa nos faz reconhecer os paradoxos de vidas cercadas de
dispositivos de segurança que garantem a liberdade de movimento e
prazer e, ao mesmo tempo, incutem o sentido de vulnerabilidade,
opressão, incapacidade de superar obstáculos e medo das diferenças,
paralisando suas ações. A naturalização da individualidade
massificada, soberana numa sociedade invisível, desliza para a
impossibilidade da ação transformadora no mundo real.

É fundamental que aprofundemos nosso conhecimento sobre as múltiplas
oportunidades de construção de realidades fragmentadas que são
oferecidas pela mídia e sua programação para adolescentes, plenas de
materiais simbólicos de fácil digestão, incentivando consciências
planas e explicações lineares do real que circulam no cotidiano dos
jovens. Todo um ritmo veloz e superexcitado, predominando a cultura da
ação sobre a narrativa, oferecendo referências simbólicas na
ininterrupta tela eletrônica eivada de imagens e efeitos especiais,
numa estimulação sem memória, numa cultura sem rastro e sem
conseqüências, com primazia do tempo presente e do lazer imediato. São
estilos de vida lúdico-estético-hedonistas que insistem em se colar na
idéia do ser jovem enquanto uma criação da própria juventude, que
efetivamente se apropria desses significados e desenvolve um sentido
de participação e uma ética própria. A partir dessas concepções,
cremos poder ampliar nossa compreensão sobre a profundidade e extensão
com que a ambigüidade da urgência do novo, mantendo a responsabilidade
solitária de manutenção dos controles sobre os resultados, afetam,
estressam e paralisam os sujeitos"(pp.162/163).

Murta, Agnes - Contribuições da Psicologia sociohistórica para a
educação inclusiva: os sentidos produzidos por professores da educação
infantil de uma cidade do Vale do Jequitinhonha acerca da inclusão
escolar.

Essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de constituição
dos sentidos subjetivos de duas professoras de educação infantil
acerca da inclusão escolar de crianças com deficiência no ensino
regular (deficiências essas que geram necessidades educacionais
especiais).

Foram realizadas entrevistas com quatro professoras e uma
coordenadora. O critério, como não poderia deixar de ser, foi
qualitativo. Desse modo, foram escolhidos profissionais que podiam
falar com propriedade do tema a ser pesquisado. Dentre esses quatro,
foram escolhidas duas professoras que, no entender da pesquisadora,
melhor se adequavam aos propósitos da pesquisa. Com o intuito de
qualificar as informações obtidas, foram realizadas cinco entrevistas
recorrentes com cada professora.

Utilizaremos como exemplo apenas a análise referente a uma das
professoras, denominada Ferreira.

Como coloca Agnes (p.124), partindo do pressuposto que a análise é
construtiva e interpretativa, o procedimento para a apreensão dos
indicadores deu-se da seguinte forma: após a transcrição, foi
realizada uma leitura flutuante do material; em seguida, foram sendo
levantados indicadores, ou seja, questões que se repetiam, que eram
enfatizadas, que revelavam envolvimento da professora e que se
mostraram importantes, considerando o objetivo da pesquisa, ou seja,
apreender os sentidos e significados sobre inclusão. Como exemplo,
destacamos a questão da religiosidade, que se mostrou um indicador
fundamental para a organização de um dos núcleos, por atravessar e
mostrar-se constitutivo de muitas das experiências vividas pela
professora. Após esse momento, estavam criadas as condições para se
organizar, no caso, um dos núcleos de significação, ou seja, para
articularmos os conteúdos relacionados às experiências que tinham a
religiosidade como elemento essencial. Com esse processo de
organização dos núcleos, pretende-se, cada vez mais, criar as
condições de nos apropriarmos daquelas determinações que constituem o
sujeito

A autora (idem) frisa que o levantamento e organização dos núcleos de
significação já constitui um momento de análise, pois o ato de
"recortar" é realizado a partir dos critérios propostos pelo
pesquisador, e esses critérios são sempre escolhidos em função dos
objetivos da pesquisa, e, como diz Ozella (2003, p.114), "[...]nunca
são neutros".

Os núcleos de significação resultantes foram:

* o encontro com a religiosidade;

* ser normal ou estar deficiente: eis a questão;

* o papel do professor;

* inclusão/projeto creche inclusiva/sociedade inclusiva.

A título de exemplo, utilizaremos um dos núcleos: "O encontro com a
religiosidade".



"O encontro com a religiosidade"

Segundo Agnes, esse núcleo é capital porque evidencia a religiosidade
como um dos pontos fundamentais e constitutivos da vida de Ferreira,
sendo, portanto, um aspecto essencial que atravessa a forma como ela
sente, pensa e age sobre o mundo. Assim sendo, a religiosidade marca
profundamente a maneira como ela atribui sentidos à inclusão, à
deficiência, à sua vida profissional e às suas relações interpessoais.
Entendemos que a importância dada por Agnes a esse núcleo é adequada,
dado ser uma das funções centrais do núcleo de significação, que é
destacar aqueles aspectos fundamentais para a compreensão do sujeito,
aqueles aspectos que são constitutivos do sujeito a ser pesquisado.
Para fundamentar esse movimento de análise que levantou o núcleo,
Agnes destaca partes da fala de Ferreira que evidenciam a relevância
da religiosidade em sua vida, o quanto ela foi constitutiva das suas
formas de ser, pensar e sentir. Segundo Agnes (p.125), Ferreira nos
revela, por meio da sua história de vida, que, por ter sido
diagnosticada aos 14 anos de idade como pessoa com sofrimento mental,
teve que tomar "remédio controlado", era vigiada pela família e não
tinha autonomia para gerir a própria vida. "[...] os médicos falavam
com minha mãe que isso (os sintomas apresentados) era um princípio de
loucura". Ela relata que, nesse período, trabalhou e que não pôde
estudar de forma sistemática. Após os 24 anos de idade, e a partir da
intervenção de um médico espírita e da sua internação em hospital
psiquiátrico no qual a Doutrina Espírita orientava a atividade de
alguns profissionais, Ferreira se sente curada e ressignifica sua
existência. A Doutrina Espírita passa, então, a nortear de maneira
profunda a sua vida.

"(o médico) [...] fez um tratamento comigo, me desintoxicou, me
internou, tirou... todo o remédio, melhorou e me deu...ânimo. [...]

Quando ele me levou no Centro Espírita, foi onde eu melhorei, foi
aonde que, que tudo pra mim mudou, que eu fui ter vida... nova. Foi
onde eu tive minha vida renovada, minha vida melhorou, porque, eu...
eu vi a vida com outros olhos, eu não precisava de ninguém mais pra
ficar me vigiando."

Ferreira deixa claro como o período compreendido entre os 14 e 24 anos
foi doloroso e o quanto ser considerada "doente" a incomodava. Dessa
forma, após "sua cura", de pessoa que necessitava da ajuda de outros,
passa a ajudar. Ajudar os outros se torna, então, sua filosofia de
vida. Fica evidente o prazer e a felicidade que ela sente em tomar a
responsabilidade de sua própria vida para si e o prazer de dedicá-la à
ajuda ao próximo.

"[...] o médico falou que eu tinha que tomar remédio. Depois que eles
(os familiares) viram que o remédio estava me deixando daquela
maneira.... [...] Assim, me deixando... é, ... apática. Então eles
ficaram preocupados. Como é que eles iam deixar eu sair sozinha pra ir
pra algum lugar.... Então o dia que eu... me internei,....o doutor
falou que eu não tinha nada, que eu ia melhorar, esse dia eu renasci
pra vida.[..]a doença que eles achavam que eu tinha era um engano, não
era doença, porque mediunidade não é doença.... Aí comecei a decidir
minha vida, a andar sozinha.[...]O que faziam comigo eu comecei a
fazer pras pessoas [.......]E assim, comecei a ajudar as pessoas
mais... humildes que me procuravam, porque eu comecei a trabalhar no
espiritismo."

Na sua análise, Agnes destaca que a fala de Ferreira traz à tona
sentimentos e emoções sobre sua forma de ser e agir no mundo "antes e
depois da sua cura". Num esforço de análise e portanto, de apreensão
do processo de constituição dos sentidos configurados por Ferreira, a
pesquisadora em questão traz categorias que têm o potencial de
iluminar a realidade estudada. Vejamos um trecho de sua análise,
realizada por meio de algumas categorias da Psicologia
sociohistórica.

"Segundo Rey (2003, pp. 241-254), as emoções estão estreitamente
ligadas às ações, por meio das quais caracterizam o sujeito no espaço
de suas relações sociais. Para ele, a vivência da pessoa que é
constituída historicamente gera um conjunto de emoções, que, por sua
vez, geram necessidades. As necessidades são entendidas, aqui, como
"estados produtores de sentido, associados à atuação do sujeito numa
atividade concreta"; essas necessidades geram motivos que levam o
sujeito a atuar de forma particular no mundo. Podemos, então,
estabelecer relações entre as emoções vividas por Ferreira na fase em
que se via e era vista como "incapaz", a entrada da religiosidade em
sua vida e a sua forma atual de ação no mundo.

O sentimento de exclusão, de inferioridade, de incapacidade, de ser
doente, que ela deve ter vivido dos 14 aos 24 anos, geraram, para essa
segunda fase de sua vida, a necessidade de ter sua capacidade e
autonomia reconhecidas. "Aí comecei a ... a decidir minha vida,
sozinha; a andar sozinha; viajar sozinha, trabalhar sozinha, sem que
ninguém precisasse me levar. Eu comecei a fazer tudo sozinha aí... ao
invés "d'eu" ser ajudada, eu comecei ajudar as pessoas."

A Doutrina Espírita - que foi sua salvação - passa a ser parte
constituinte de sua vida e os preceitos que norteiam essa Doutrina
passam a nortear também suas ações e sua vida. Assim, ajudar, doar,
abdicar e a caridade permeiam não só todo o discurso de Ferreira mas
também sua ação/atividade" (pp.127-128).

Podemos perceber, então, que a partir do momento em que Ferreira
começa a `viver uma nova vida', as múltiplas necessidades constituídas
historicamente encontram novas formas possíveis de se configurar em
motivos. Dessa maneira, diante de sua realidade profissional, ela
passa a ajudar as pessoas, a doar seu tempo, a fazer caridade, a amar
a todos como irmãos, a encontrar novos motivos que impulsionam sua
vida.

Vejamos:

`[...] e assim, eu não cobro nada de ninguém, eu não peço nada pra
ninguém, meu trabalho, meu trabalho é gratuito.'

A APAE entra, então, em sua vida, como uma benção,

[...] eu não estou trabalhando só prá me sustentar; eu estou
trabalhando por prazer.[...]Eu estou trabalhando também por amor."

Segundo Agnes (pp.128-129), "...sentir-se útil a tira da esfera dos
inválidos, incapazes. Ajudar as outras pessoas passa a ser uma
necessidade pessoal e um motivo que a liga profissionalmente à atual
instituição em que trabalha. Esse aspecto é tão forte que ela recusa o
convite para trabalhar em uma outra atividade melhor remunerada.

Consideramos, nesse núcleo de significação, a caridade, a doação, a
ajuda, o amor como elementos que, a partir da religiosidade, irão
constituir os sentidos que serão atribuídos às experiências de vida de
Ferreira.

É necessário ressaltar que as falas de Ferreira são reveladoras dos
sentidos que se foram constituindo através das experiências vividas
por ela, ou seja, os sentidos foram sendo construídos ao longo das
suas experiências. Entretanto, esses sentidos, que são particulares,
são, ao mesmo tempo, compostos pelos significados sociohistóricos da
humanidade. Rey (2003, p. IX) nos ajuda a compreender esse caráter
dialético da construção dos sentidos quando, ao tratar das questões
referentes à produção dos sentidos e dos significados em Vigotski,
afirma que :

"[.....] as criações humanas são produções de sentidos, que expressam
de forma singular os complexos processos da realidade nos quais o
homem está envolvido, mas sem constituir um reflexo destes. Em outras
palavras, esses processos são uma criação humana, os quais, integrando
os diferentes aspectos do mundo em que o sujeito vive, aparecem em
cada sujeito ou espaço social concreto de forma única, organizados em
seu caráter subjetivo pela história de seus protagonistas."



"Ser normal ou estar deficiente: eis a questão!"

Segundo Agnes (pp.130-131), um ponto importante para a análise refere-
se à forma como, também inundada pelos princípios da religiosidade,
Ferreira concebe a deficiência e o deficiente. Esse aspecto constitui,
portanto, o segundo núcleo de significação.

Como explicitado anteriormente, nesse núcleo de significação, foram
agrupadas e articuladas as falas/conteúdos (indicadores) que se
referem às concepções, sentimentos e práticas sobre deficiência e
sobre a pessoa deficiente. Segundo a pesquisadora em questão (idem),
ao ser solicitado a Ferreira que explicitasse sua forma de ver as
pessoas com deficiência, ela parte do senso comum, de uma visão
estereotipada dessas pessoas. Atribui a elas características tais
como: "eles são dóceis", "carinhosos", "inteligentes", capazes", "não
metem medo", "são bonzinhos", "gratos", "calmos". Percebe-se aqui que
Ferreira apresenta uma visão ingênua, ideologizada, que
descontextualiza o deficiente como ser historicamente situado, sendo
essa uma visão que em nada contribui para a transformação das práticas
educacionais, uma vez que se trata da educação de seres abstratos e
idealizados. Retomando nossa intenção de exemplificar possíveis formas
de se realizar uma análise, na perspectiva sociohistórica, vale
destacar a importância de se buscar não apenas descrever os fatos, mas
explicá-los, ou seja, buscar formas de explicitar a gênese social do
individual. Agnes pretende, com sua análise, evidenciar que a fala da
professora tem como elemento constitutivo, determinante, a ideologia,
e o quanto esse tipo de visão (ideologizada) descontextualiza o
problema, não contribuindo para a sua superação.

Voltando à análise realizada por Agnes (pp.130), ela afirma:
"Interessante observar também que Ferreira, ao tentar apropriar-se dos
`discursos politicamente corretos' como aqueles que apregoam que somos
todos iguais e, portanto, todos somos deficientes, ela incorre em uma
contradição, pois, ao declarar a igualdade de todos, nega exatamente
aquilo que nos singulariza - a diferença. Igualdade, normalidade,
deficiência, direito, diferença, necessidades especiais são conceitos
que ela parece não dominar, ou, no mínimo, são pouco elaborados".

`Olha, eu não vejo elas como deficientes não. Eu vejo elas como ser
humano. Eu trato elas igual, eu não tenho esse negócio de que elas são
coisa não. Na hora de cuidar delas a gente cuida... com mais carinho,
cuida de... com um meio mais... adequado, mas olhar pra elas eu olho
como ser humano. Como um irmão... igual! eu não olho elas como
deficientes não. Porque deficientes somos todos, né?'

A idéia de que todos somos deficientes, de que todos temos uma
deficiência, ou de que todos nós, em algum momento de nossas vidas,
vivenciamos uma situação de "estar deficiente", foi muito difundida
por Mantovan (1997) e Werneck (1999); entretanto, observa-se que
muitos de nós, educadores, nos apropriamos dessa fala sem pensar nas
implicações que ela traz. Mais uma vez, nega-se a diferença e, de uma
forma simplista, reduzem-se as implicações político-pedagógicas, tais
como: eliminação das barreiras programáticas e arquitetônicas, maior
investimento em formação dos professores, etc., necessárias, por
exemplo, para a alfabetização de uma criança cega ou surda.
Concordamos com Sá (1992, p.14) quando afirma que a `corrente máxima
de que `somos todos iguais' serve antes para ocultar o preconceito e
justificar a exclusão do que para reconhecer a diferença'".

Nesse trecho da análise, destacamos a relevância do movimento
empreendido pela pesquisadora, de não se contentar simplesmente em
relatar a fala, mas em apreender as contradições presentes e buscar
outras formas de se compreender o fenômeno. Ainda nesse trecho,
evidencia-se a necessidade de o pesquisador conhecer as várias
leituras da questão estudada, de conhecer a literatura sobre o tema
para que possa realizar uma análise crítica, questionadora, que possa
propiciar novas formas de se olhar os fenômenos.

Para se evidenciar a importância de uma compreensão mais completa da
questão a ser estudada, destacamos o esforço analítico realizado pela
pesquisadora de inserir questões relativas a uma situação particular,
num contexto mais amplo, considerando os aspectos sociais e políticos,
inclusive articulando, em alguns momentos, os diferentes núcleos.

"Como apontado anteriormente, a religiosidade é marcante na vida de
Ferreira. Da mesma forma que a sua vida é inundada pela Doutrina
Espírita, também o é a concepção apresentada por ela sobre deficiência
e sobre a pessoa deficiente. Entendemos tal concepção como
naturalizante, ou seja, pouco ou nada analisa os aspectos
sociohistóricos imbricados na constituição/construção da deficiência.
Pelo contrário, para essa Doutrina, a deficiência e suas conseqüências
estão ligadas a questões cármicas, isto é, a pecados ligados a vidas
passadas. As pessoas deficientes teriam escolhido vir com deficiências
nesta vida a fim de resgatar dívidas acumuladas em vidas passadas. A
terra é considerada uma escola onde os espíritos, através da
experiência, podem evoluir. Dessa forma, a questão da deficiência é
abordada como se fosse a ordem natural das coisas. Ela acredita que
cada um de seus alunos é deficiente porque tem algo de outra vida para
resgatar, assim como também associa a sua "missão" na APAE como um
resgate cármico.

`Então eu levo isso muito a sério, que eu sei que... que existe outra
vida, e que eu já tive outras vidas passadas e vou ter outras, no
futuro, então acho que... eu aceitando isso, esse princípio, então eu
acho que todos aqueles que me procuram não me procuram por acaso
não.'

Essa visão naturalizante corrobora com práticas assistencialistas e
filantrópicas, mas é importante salientar que esse discurso
assistencialista e caritativo não é exclusivo da Doutrina Espírita e
de Ferreira. Ele está presente em nossa sociedade, evidenciando-se
principalmente na incipiente participação do poder público na gestão e
financiamento da educação das pessoas com deficiência. Diante dessa
falha ou, por que não dizer, diante do descaso do poder público, a
educação do deficiente tem sido desempenhada quase que exclusivamente
por entidades assistenciais e filantrópicas que, no dizer de Sá (1992,
p.15), muitas vezes têm `concepções autoritárias baseadas em
sentimentalismos em que o deficiente é tratado como inferior,
subalterno e infantil'" (pp.132).

Para finalizar as discussões sobre esse núcleo, apontamos ainda que os
sentidos e significados acerca da deficiência e do deficiente, do modo
como são apreendidos pela pesquisadora, aparecem como algo que faz
parte da natureza humana e que são extremamente atravessados pela
religiosidade, o que só pode ser globalmente apreendido também pela
articulação dos núcleos entre si.

Concluindo nossas considerações sobre as análises realizadas por Célia
e Agnes, afirmamos que, ao recorrerem a algumas das categorias
analíticas e metodológicas da Psicologia sociohistórica, criaram as
condições de ultrapassar a simples descrição dos dados, estabelecer
relações que até então não haviam sido feitas, detectar a gênese de
alguns fatos, afastar-se de explicações naturalizantes.

Importante ainda destacar que, para nos aproximarmos de uma apreensão
mais global do sujeito, é necessária a articulação de todos os núcleos
levantados. Em alguns casos, pela qualidade da informação obtida, num
primeiro momento, a análise pode ficar mais circunscrita a aspectos da
história do sujeito; entretanto, ao serem articulados com dados
advindos da realidade social, cultural e com os outros núcleos,
evidenciam-se outras determinações fundamentais, fazendo, inclusive,
com que os dados adquiram outra qualidade. Acreditamos que, nesse
movimento de articulação dos núcleos entre si, e com as condições
sociais, históricas, ideológicas, condição de classe, gênero, e, sem
dúvida, com os conhecimentos cientificamente produzidos sobre a área
em questão, uma nova realidade surge, mais complexa, integrada,
reveladora das contradições, movimento esse fundamental para a
apreensão da constituição dos sentidos.

Temos a clareza, no entanto, da complexidade desse exercício de
explicar, de como são múltiplas as determinações dos fatos. Desse
modo, percebemos que, sem dúvida, outros determinantes poderiam ser
contemplados nas explicações realizadas, mas que este é um momento do
conhecimento atingido.

Como já afirmamos anteriormente, uma das marcas desse tipo de análise
é ter como meta desvelar fatos e fenômenos, explicitar contradições e
assim, ousar apontar caminhos mais críticos, menos naturalizantes e
ideológicos .



Referências

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Endereço para correspondência
Wanda Maria Junqueira Aguiar
Rua Bagé, 230/182, bloco C, Vila Mariana
04012-140, São Paulo, SP, Brasil
E-mail:iajun...@uol.com.br

Sergio Ozella
Rua Martiniano de Carvalho, 669/1101, Bela Vista
01321-001, São Paulo, SP, Brasil
E-mail:oze...@uol.com.br

Recebido 18/08/05
Reformulado 17/03/06
Aprovado 24/03/06



* Professora titular da Faculdade de Psicologia e do Programa de Pós-
Graduação em Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo.
** Professor associado da Faculdade de Psicologia e do Programa de Pós-
Graduação em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.
1 Ver mais sobre essa questão em Vygotski - Obras Completas, vol. I -
El Significado Histórico de la Crisis de la Psicología. Una
Investigación Metodológica.
2 Ver mais sobre a questão em Vygotski. Formação Social da Mente. Ed.
Martins Fontes, 1994 , cap. 5, e Gonzalez Rey - La Investigación
Cualitativa em Psicología : Rumbos y Desafios. Ed. Educ, 1999.
3 Ver mais sobre tais questões em Lukács, G. Estética: Categorias
Básicas de lo Estético. Tomo 3. Barcelona - México,D.F: Grijalbo,
1967.
4 No artigo Sentido e Significação - sobre Significação e Sentido: uma
Contribuição à Proposta de Rede de Significados, in Rede de
Significações, Ed. Artmed, 2004, Smolka,A.L.B. discute mais
profundamente a questão do Signo.
5 Em Sujeito e Subjetividade,São Paulo: Ed. Thomson, S.P, 2003,
Gonzalez Rey faz uma discussão aprofundada sobre a questão das
emoções, necessidades e motivos.
6 Para mais detalhes sobre essa questão, consultar: Ozella, S.:
Pesquisar ou Construir Conhecimento. O Ensino da Pesquisa na Abordagem
Sociohistórica. In Ana M.B.Bock (org.) A Perspectiva Sociohistórica na
Formação em Psicologia. S.Paulo: Ed. Vozes, 2003, pp.113-131; González
Rey, Fernando: La Investigación Cualitativa en Psicologia: Rumbos y
Desafios. São Paulo: Educ, 1999; Vigotski, Lev Semenovich: A Formação
Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
7 Consultar obras citadas na nota de rodapé número
8 Rocha, Everaldo. A Sociedade do Sonho. Rio de Janeiro: Mauad
Editora, 1995.
9 Entrevista não utilizada na dissertação de mestrado de Elcio
Nogueira dos Santos Conto ou não Conto? O Significado e os Sentidos de
Tornar Pública a Orientação Sexual Homossexual para Adolescentes
Masculinosda Cidade de São Paulo. Psicologia Social. Pucsp, 2004.



Anexo 1

Anotações para análise de entrevista 9




http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?pid=S1414-98932006000200006&script=sci_arttext

Carregue em PDL
http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S1414-98932006000200006&lng=pt&nrm=iso&tlng=



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Psicologia: ciência e profissão
ISSN 1414-9893 versão impressa
Psicol. cienc. prof. v.26 n.2 Brasília jun. 2006
(c) 2008 Conselho Federal de Psicologia

SRTVN, Quadra 702
Edifício Brasília Rádio Center
4º andar - Conjunto 4024A
70719-900 Brasília - DF-Brasil
+55-61 2109-0100
rev...@pol.org.br

Hannah BLUE

não lida,
22 de jan. de 2008, 21:01:0022/01/2008
para Midiateca da HannaH


ARTIGOS

Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da
constituição
dos sentidos

The meaning core as an instrument for the understanding of the
sense
constitution


Wanda Maria Junqueira Aguiar*, Sergio Ozella**
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Endereço para correspondência
Palavras-chave: Psicologia sociohistórica, Metodologia,
Sentidos, Núcleo
de significação.



ABSTRACT

The main objective of this article is to give the researchers
tools,using
the sociohistoric psychological view, in the analyses procedure
of the
qualitative material, aiming to learn the sense that constitutes
the
speech content of the subject informant, through what we call
the meaning
core. In the first part, a retake of the theoretical
methodological
aspects developed basically by Vigotski is done, such as the
importance of
the historical and dialectical materialism method, the language
and
thought category and the notions of meaning and sense,
necessities and
goals. In the second part, we propose some stages of procedures
to
organize and analyze the collected material, mainly through the
interviews, aiming to get in the core of the meaning in order to
learn the
sense and the subjective quality of the informants. We point out
three
stages: pre - indicators, indicators and meaning core. To
complete the
text, we illustrated the proposals procedure with a master
dissertation
and a Phd thesis orientated by the authors as a way to visualize
the
analysis of the meaning core.
Keywords: Sociohistoric Psychology, Methodology, Sense, Meaning
core.
objetos/processos ausentes até então. Assim, como já colocamos
que a compreensão da relação pensamento/linguagem passa pela
ação, favorecem-na ou limitam-na, assim como as idéias que se
necessidades. Aí sim, esse objeto/fato/pessoa vai ser vivido
Aproximamo-nos, dessa forma, do processo gerador da atividade,
básico para filtrar esses pré-indicadores é verificar sua
importância para
a compreensão do objetivo da investigação.

Os indicadores e conteúdos temáticos
Uma segunda leitura permitirá um processo de aglutinação dos
pré-indicadores, seja pela similaridade, pela complementaridade
sob nossa orientação nos programas de estudos pós-graduados em
relutante em desprender-se do próprio passado. Nesse momento de
refere-se à
Histórico-psicológico. Madrid. Ediciones Akal S.A., 2004.
Pós-Graduação em Psicologia da Educação da Pontifícia
Universidade
Católica de São Paulo.
** Professor associado da Faculdade de Psicologia e do Programa
de
Pós-Graduação em Psicologia Social da Pontifícia Universidade
Psicologia: ciência e profissão
ISSN 1414-9893 versión impresa
(c) 2007 Conselho Federal de Psicologia
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